quarta-feira, 2 de junho de 2010

EDITORIAL: ESTES POLÍTICOS QUE NOS GOVERNAM

(Foto do Diário de Coimbra)







 Como noticiavam ontem os dois jornais da cidade, o Diário as Beiras e o Diário de Coimbra, e eu também escrevi aqui, uma senhora, de nome Maria Emília Lourenço, vinda de Alcarraques, uma povoação a cerca de meia dúzia de quilómetros, nos subúrbios da cidade, instalou-se com um grande cartaz às portas da Câmara Municipal de Coimbra. O que reivindicava a dona Emília? Tão só que o poder político lhe resolvesse um problema que a incomodava, pelos vistos demais. Porque falei pessoalmente com ela, disse-me que há mais de uma década que vê o seu terreno, nomeadamente um pátio, ser invadido por águas provindas de uns terrenos vizinhos que se encontram num plano acima da sua propriedade.
 Antes de prosseguir, lembro um factor importante, é o facto da senhora apresentar no cabeçalho do grande cartaz manuscrito com a seguinte frase: “Estou a pão e água”.
 Armado em sociólogo, vou tentar analisar este acto de protesto individual sob vários prismas.
 Começarei pelo ponto de vista societário. A comunidade, neste tipo de protestos, cinde-se em duas facções. Uma, que olhando para o tipo de reivindicação, na forma quixotesca de executar, e para mais quando é feita referência a pão e água, sorri. Desvaloriza completamente a acção e acha que se está perante uma pessoa desequilibrada e que procura apenas fama e glória.
A outra facção, a que se põe ao lado da “grevista”, age por sentimentos psico-empíricos de vida e até ideológicos –sobretudo se o poder que se pretende atingir é o oposto à sua ideologia individual. Normalmente, neste apoio duvidoso do ponto de vista da seriedade, impera o ressabiamento contra a ineficácia dos políticos locais ou nacionais, sobretudo porque se revêem, em paradigma, nestas pessoas que, sozinhas, sem apoios, ousam afrontar um sistema que habitualmente só reage ao ruído da turba colectiva e raramente dá ouvidos a reclamações individuais. Ou seja, este grupo de apoio fá-lo muito mais em proveito próprio, quase exclusivamente, porque está mais interessado no seu ego do que verdadeiramente na resolução dos problemas que atrofiam o protestante.
 Certamente, poucos terão a noção de que estes actos isolados serão muito mais do que parece ser. Isto é, este acto potestativo individual de protestar, encerra em si mesmo uma frustração contida. Significa um grito surdo, talvez uma última esperança na comunicação de massas, no apregoar da imprensa e na esperança de que, através deste instrumento, a justiça funcione finalmente. É muito mais do que alertar a opinião pública de que se está a exercer um direito sem contestação. Só não vê quem não está interessado nos problemas alheios. É uma espécie de derradeiro acto “suicida”, pacífico, à portuguesa e em contraposição com as reacções de motivação de um “serial killer” americano ou actos de assassínios à luz do dia por vingança de um processo mal resolvido que afectou profundamente o interveniente.
 Do ponto de vista político, isto é, visto de dentro para fora, pelos governantes da polis, encaram estas reclamações dos cidadãos com algum distanciamento, desprezo, e até algum gozo à mistura. Lembro as declarações do presidente da Câmara Municipal de Coimbra hoje no Diário de Coimbra. “ o que a munícipe pretende é “chamar a atenção”, por isso “pode continuar (com o protesto) o tempo que quiser” porque “não pactua” com este tipo de manifestação”, in diário de Coimbra de hoje.
 Lembro que há cerca de uma década a cidadã Emília Lourenço, segundo me disse, e também ratificado nos dois jornais, já foi várias vezes à sua junta de freguesia e também à reunião pública do executivo camarária em 1 de Fevereiro último. Como também conta o Diário as Beiras, nas declarações da munícipe, “já corri tudo. Escrevi ao governador civil, à delegação de Saúde, à câmara…eu sei lá!”. Por conseguinte, é fácil de ver que este comportamento último vem em consequência da inércia do poder político e de este não conseguir resolver um problema que a aflige.
 O que quererão políticos eleitos como o presidente da autarquia de Coimbra? Será que para “pactuarem” com as reivindicações justas de cidadãos, estes, para se fazerem ouvir, terão de assassinar um ou vários  representantes partidários como nos Estados Unidos? Ver aqui, no JN, o caso de hoje no noroeste de Inglaterra.
 A Política, tal como a Justiça, que aliás deveriam andar de mão dada, é uma das maiores virtudes do homem –e também assente num Contrato Social, pelo menos nas Democracias modernas- e será o instrumento possível para, em convergência social de interesses mútuos rumo ao futuro, dar solução a problemas individuais aparentemente impossíveis no presente.
 Ora, em resumo, se estes eleitos se candidataram para dar satisfação às justas aspirações dos cidadãos, gerir interesses e dirimir conflitos sociais, e, depois de ganharem o pleito eleitoral em sufrágio popular, olham para reivindicações, como esta da dona Emília Lourenço, com apatia e displicência, o que estarão a fazer no lugar que ocupam?

2 comentários:

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