sexta-feira, 30 de março de 2018

EDITORIAL: ESPANHA, VENHA A NÓS O VOSSO REINO





Hoje é Sexta-feira Santa, 30 de Março. Com um tempo a balouçar entre períodos de chuva forte e pausas de sol brilhante, a Baixa, para quem nos visita, apresenta-se com gaifanas, estremunhada, sonolenta e com remela no acordar.
Depois de uma quinta-feira, ontem, arrebatada com muitos espanhóis, o dia que se arrasta, para além de passar lentamente, parece mostrar que a instabilidade do clima assusta os turistas. Se vem uma bátega de água desaparecem todos como nevoeiro em manhã de Agosto. Se aparece uma luminosidade resplandecente parecem pássaros a invadir o torrão semeado.
Os comerciantes da Baixa, com a fé em Deus e um olhar perdido nos passantes de mochila às costas, de semblante duro, martelado pela estagnação que teima em fustigar uma esperança que não se materializa, estão encostados às portas de entrada dos seus negócios.
Ao longo das últimas décadas, depois dos saldos do final e começo de novo ano, a Semana Santa, desvalorizando o sacro e elevando o profano, para o comércio de rua foi sempre uma espécie de tábua de salvação para náufrago perdido nos confins do oceano. Vinham “nuestros hermanos”, compravam uns “regalos” e os lojistas ficavam mais aliviados nos compromissos financeiros. Por conseguinte, em Coimbra, as lojas sempre estiveram abertas neste Dia Santo, antevéspera da Páscoa, e encerradas na segunda-feira seguinte. Na época que corre já não justifica esta troca. Talvez por isso mesmo, por um lado, apesar do apregoado nos jornais de que os hotéis na cidade estão a 90% da sua capacidade, os espanhóis são menos do que antigamente, por outro, já não compram como era costume. E o pouco que adquirem é negociado milimetricamente ao cêntimo, ou seja, deixando pouca margem de lucro para quem vende. Isto é, tendo em conta que neste resguardo santificado pascal os serviços públicos estão fechados e segunda estão abertos, na prática, é uma permuta que não compensa. É óbvio que, tendo em conta a crise que se vive, a solução para muitos, é abrirem nos dois dias.

UMA COIMBRA ENCRAVADA. UMA BAIXA INACTIVA

Nesta Coimbra, capital do imobilismo, o tempo corre devagar. Assobiando a valsa da meia-noite, vamos todos fazendo de conta que nada se passa à nossa volta. Olhando as promessas das últimas eleições, já ninguém leva a sério as propostas que foram feitas nessa altura. Ao não exigir o seu cumprimento, estamos todos a colaborar numa mentira condescendente. Mas este alheamento afigura-se terrível para o futuro. Como alguém já disse, estamos a infantilizar a política. Confundindo a estrumeira com a central de efluentes, com o desprezo que votamos a mais nobre das virtudes da negociação social, ajudando a enterrar o que resta de uma classe de pessoas integras que levam o seu múnus, a sua função, muito a sério. Porque não tenhamos dúvidas que ainda há dirigentes que encaram o serviço público, o servir o próximo e não servir-se a si mesmo, como missão. 
Por outro lado, este desligamento está a conduzir os comerciantes para uma desmotivação sem precedentes.
Bem sei que a cidade e os seus arrabaldes são um todo e, naturalmente, com problemas para resolver em muitas freguesias. Quero dizer que, como escrevo muito sobre a zona histórica, não é só a Baixa que precisa de soluções políticas. Mas, mesmo assim, não posso deixar de lembrar que esta área velha precisa de intervenção urgente. Os custos da inacção, por não se interceder em tempo útil, vão ser incalculáveis. Está a deixar-se destruir uma zona monumental, habitacional, social e comercial que levou séculos a erguer.
Como se tratasse de um abate programado, as lojas continuam a encerrar. Batendo todos os anteriores recordes -em Janeiro foram 6-, neste mês de Março vão ser contabilizadas 7. Este facto completamente anómalo não deveria preocupar a maioria socialista?

(FELIZ PÁSCOA PARA TODOS, INCLUINDO OS MEMBROS QUE COMPÕEM A MAIORIA SOCIALISTA NO EXECUTIVO!)





quarta-feira, 28 de março de 2018

O BURACO SEM FUNDO



Novo Banco com prejuízos históricos (Estado vai injectar mais 800 milhões)”

RECUPERAR O COMÉRCIO TRADICIONAL COMO?




Há 22 anos que não pagávamos tantos impostos

A carga fiscal atingiu máximos dos últimos 22 anos em 2017. Esta subida é explicada com a evolução dos impostos indiretos e das contribuições sociais.

A carga fiscal atingiu, no ano passado, o valor mais alto dos últimos 22 anos, atingindo os 34,7% do Produto Interno Bruto (PIB), avança o Jornal de Negócios. Este é o valor mais alto desde 1995, ano em que o Instituto Nacional de Estatística (INE) começou a compilar dados sobre as contas públicas.”

“A partir de Abril, a Baixa de Coimbra passa a ter uma rádio”





Segundo o jornal PÚBLICO, “Depois de um processo de angariação de fundos, a Rádio Baixa está pronta a arrancar. As primeiras emissões a partir da Baixa de Coimbra começam a 14 de Abril e, numa primeira fase, acontecerão apenas aos fins-de-semana.

A sede da emissão é na antiga sapataria Reis e mais recentemente a desaparecida Loja da Laura, na Rua Eduardo Coelho, no redondo para o Largo da Freiria. Segundo um dos envolvidos no projecto, em conversa há dias, inicialmente serão realizadas emissões de rádio para a Internet em streaming -“tecnologia que envia informações multimédia, através da transferência de dados, utilizando redes de computadores, especialmente a Internet, e foi criada para tornar as conexões mais rápidas”- na primeira fase e numa segunda poderá vir a ser incluída reportagem.
Uma coisa é certa, dentro das novas tecnologias, é um projecto novo que, se for bem direccionado, poderá vir a ser um óptima ferramenta para a revitalização da depauperada Baixa de Coimbra.

terça-feira, 27 de março de 2018

A APARIÇÃO DO “COIMBRA PARTICIPA” (2)





Passavam quinze minutos das 19h00, dentro do horário pré-anunciado, quando a jovem simpática vereadora executiva Regina Bento, na pequena sala da antiga Casa dos Pobres, no Pátio da Inquisição, tomou a palavra de apresentação do “Coimbra Participa”. Bela, segura e de uma simpatia contida mas extemporânea, a nova aquisição do Partido Socialista para a vereação promete abrir corações rasgados e desiludidos com o elenco de Manuel Machado. Num partido local de “trombeiros”, de face martelada a escopro e martelo, onde a simpatia só se nota quando estão na oposição ou em período de eleições, a aparição de encanto resplandecia de luz. De tal modo foi o meu assombramento que, enfiando os pés pelas mãos, confundi-a como elemento da “Coligação Mais Coimbra”, a oposição.
Está mais que explicada a razão de apenas se encontrarem na sala quatro comerciantes, três hoteleiros, um curioso e quatro funcionários camarários. Não compareceram porque não sabiam quem dissertava. Está também explicado o facto de Vitor Marques, Presidente da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, também presente no pequeno compartimento, não ter aberto a boca para comentar o novo Orçamento Participativo. Ficou extasiado! Compreende-se! Se eu o entendo bem!
O que sei é que se, por acaso, a autarquia, em vez de anunciar a mostra do “Coimbra Participa”, tivesse proclamado aos quatro ventos de andarilho que ia estar na sala a estrela brilhante do sistema solar da cinzenta edilidade nem 20 compartimentos iguais chegavam para albergar todos os comerciantes da Baixa. Estamos sempre a aprender, não é verdade? Na próxima, se fizerem o favor, sigam a minha sugestão.
Prosseguindo a minha explanação sobre o que se passou ontem na apresentação do Orçamento Participativo, pela facilidade de comunicação da vereadora Regina Bento, como havia poucos assistentes, depressa o tema principal ficou esgotado. E passou-se às generalidades.

FALA O POVO

Uma senhora representante de um nobel e reconhecido empreendimento hoteleiro situado na zona das Escadas de Quebra Costas, tentando desnortear a segura vereadora, atirou a matar: “O lixo na Rua Fernandes Tomaz é uma vergonha! Todos os dias enfio as luvas e apanho os detritos dos meus vizinhos. Já estou a ficar farta! Está mal iluminada, tem uma luz intermitente. A toxicodependência barra tráfico de droga na zona envolvente é um problema sério! A Câmara está instalada na Baixa; os vereadores passam, vêem e não dizem nada! O que eu pedia é que o senhor presidente convocasse todos os comerciantes e os ouvisse! Temos propostas para apresentar!
Prosseguiu a voz do povo que lavra no rio da insatisfação, “Uns calam-se outros não! Confesso, eu já desisti. Farto-me de chorar! Fui a Braga, quando cheguei aqui só me deu vontade de chorar!
Porque as mulheres são a nova voz da revolução comercial, outra senhora comerciante, com loja na parte mais baixa, prosseguiu o rol de queixas: “Ao Domingo, na Baixa, os restaurantes estão praticamente todos encerrados. Para além disso, estão a praticar preços proibitivos, só para turistas.
Sem acusar os golpes, sempre hirta e firme, a ex-administradora dos SASUC, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, Regina Bento, que graças a Deus em boa hora trocou a Alta pela Baixa, lá foi dizendo que estamos a começar devagarinho mas no bom caminho.

CANDIDATOS A LOJA DE TRADIÇÃO PRECISAM-SE

A terminar a sessão pouco participada, ficou a saber-se que, na cidade, já está em vigor a lei 42/2017, de 14 de Junho, que diz respeito à classificação das “Lojas com história», os estabelecimentos comerciais com especial valor histórico cuja preservação deva ser acautelada”. Para ser mais rápido e não se perder mais tempo, alegou a vereadora, não se elaborou nenhum regulamento específico e aplicou-se a lei aprovada no Parlamento. Faltam os candidatos a benefícios fiscais. Podem propor-se todos os estabelecimentos com mais de 25 anos. 

A APARIÇÃO DO “COIMBRA PARTICIPA” (1)






Trocando por miúdos, ou seja, se você, que é um(a) cota,
é um daqueles comentadores que no Facebook está sempre
a debitar planos para transformar a Baixa, ou, no limite, até tem
uma ideia já há muito martelada em longas noites de insónia,
tem agora uma excelente oportunidade de passar à prática.”

Ontem, com apresentação de Regina Bento, a jovem estrela cintilante da maioria no executivo, foi apresentado na antiga Casa dos Pobres, no Pátio da Inquisição, o “Coimbra Participa”, a primeira edição de um orçamento participado, assentando num projecto dividido em dois escalões direccionados em função da idade, de ideias apresentadas por munícipes que residam, trabalhem ou estudem no concelho de Coimbra. A intenção subjacente é a dinamização do cento histórico.
O primeiro escalão, o “Coimbra Jovem Participa” destina-se aos mais novos, entre os 14 e os 30 anos. Com um orçamento plafonado de 50 mil euros, podem candidatar propostas até um montante máximo de 20 mil euros.
O segundo escalão, o “Coimbra Participa”, tem por objecto os mais velhos, a partir de 30 anos. Com um plafond de 100 mil euros, cada proposta tem um limite de 50 mil euros.
Tem 4 fases:
*A primeira é a apresentação de propostas entre 12 de Março e 30 de Abril.
*A segunda será a de análise técnica pelos serviços municipais, e decorre de 1 a 15     de Maio.
*A terceira será a votação dos projectos, e decorre de 01 a 30 de Junho.
*A quarta será a fase de execução, a partir da segunda semana de julho. Os vencedores terão 12 meses para os colocar em prática.

O período de reclamações será entre 16 a 25 de Maio.
A apresentação pública dos projectos vencedores está prometida para a primeira semana de Julho.
As ideias, que após análise técnica poderão ser transformadas em projectos, podem ser apresentadas durante a fase 1 no site municipal www.participa.cm-coimbra.pt.
As votações, a decorrer entre 01 e 30 de Junho, escolhendo o projecto que se identifica mais, serão obrigatoriamente admitidas através da Internet e, para isso, é preciso aceder a www.participa.cm-coimbra.pt e clicar em “votar”.
O prazo de execução é de 12 meses para cada propositura ganhadora.

Os critérios de selecção são os seguintes:

-As ideias não podem implicar construção ou requalificação de infraestruturas;
-Não podem configurar pedidos de apoio ou venda de serviços a entidades;
-Não podem exceder os montantes previstos nem o prazo máximo de execução estabelecido;
-Não podem encontrar-se em execução;
-Não podem ser demasiado genéricos ou demasiado abrangentes;
-Não serem tecnicamente inexequíveis;
-Não podem ser comissionados por marcas registadas, abrangidas por direitos de autor ou tenham sobre si patentes registadas;
-Não podem depender de parcerias ou pareceres de entidades externas cujo período de obtenção seja incompatível com os prazos do Orçamento Participativo.

Trocando por miúdos, ou seja, se você, que é um(a) cota, é um daqueles comentadores que no Facebook está sempre a debitar planos para transformar a Baixa, ou, no limite, até tem uma ideia já há muito martelada em longas noites de insónia, tem agora uma excelente oportunidade de passar à prática. Como escrevi em cima, Comece pela primeira fase, enviando a ideia para a triagem. Se passar da segunda, a da análise técnica, para a terceira, a fase da votação, acredite em si mesmo, está no papo! Eu vou dar-lhe dicas que, se seguir à risca, não falha.
Comece pela dica mais barata:
Envie mensagens pessoais a todos os seus cerca de cinco mil amigos no Facebook e, em nome da grande amizade que os une, rogue-lhes encarecidamente que votem no seu projecto;
A dica mais cara:
Contacte a Cambridge Analytica, em Inglaterra, e diga ao que vai. Posso assegurar-lhe que, pela manipulação de dados pessoais recentes, através do Facebook, para a eleição de Trump, é tiro e queda. Você, mesmo antes da votação, pode anunciar ao mundo a sua vitória.

ARTIGO RELACCIONADO:  A APARIÇÃO DO "COIMBRA PARTICIPA" (2)



segunda-feira, 26 de março de 2018

EDITORIAL: ESCREVER PARA CONSCIENCIALIZAR

Foto de Movimento HUMOR.


Neste movimento empenhado de denúncia pública, apesar de imensas condicionantes, há alguns cidadãos que, dando a cara, exercem muito bem a parte que, por responsabilidade ética, moral, civil e constitucional, deveria caber a todos. Refiro nomeadamente as pessoas que escrevem, quer em blogues quer nas redes sociais, ou desenham, já que a canção deixou ser uma arma há cerca de quatro décadas, quando a liberdade tal como o oxigénio passaram a ser bens negativos do ponto de vista económico. Ou seja, aparentemente, desde que usados pela via tradicional sem abusos, onde deve imperar o bom-senso, a ponderação e a racionalidade, não serão necessários esforços para os obter.
Antes de passar ao que me levou a escrever esta crónica, desprezando totalmente o elogio à parte que me toca, correndo o risco de cair no ridículo pela má caracterização, diria que quem tem a coragem de denunciar uma, algumas, ou muitas situações de atropelo social -convém definir atropelo: “deitar ao chão e passar por cima”- é um cidadão que protesta por se sentir inconformado. E mais:
É um cidadão, que gostando de política, da polis (cidade), sente-se afastado dos partidos tradicionais e defende uma cultura muito sua. É mais bem informado do que a maioria;
É um “sniper”, um franco atirador com elevada capacidade de fazer uso do seu talento, que, na maioria dos casos, age sozinho, sem rectaguarda, sem rede, sem amigos que o ajudem em extrema necessidade;
É um missionário, em muitos casos descrente das religiões mas, em paradoxo, não acreditando no transcendente, prega a sua “fé” na equidade e no aperfeiçoamento do homem;
É um incompreendido por todos, na generalidade. Tem uma visão pessimista-realista;
Olhado como visionário, curiosamente tem poucos amigos entre os que ajuda com o seu grito e, naturalmente, entre os que critica nem pensar;
Os que precisam deste lutador social servem-se dele, usando a manipulação e obtendo os lucros, da sua coragem, para que com a ousadia que o caracteriza, com alguma loucura associada, faça o que não conseguem: que é dar a cara;
Para quem não o conhece bem, parece estar sempre no contra, mas é pura ilusão, o anti não faz parte da sua cartilha. Sem guardar ressentimentos, perdoa facilmente e acaba a desvalorizar os erros do homem comum;
Fundamentando as suas proposições, em dúvida metódica, buscando matéria reveladora, procura ser convencido de que está errado;
Resumindo, este reivindicador de uma nova ordem (ou velha, perdida no tempo?) é alguém que, antes de aceitar a conclusão defendida pelo mensageiro, pensa duas vezes para si mesmo, começando na tese, passa à antitese e só depois, concordando ou discordando, retira a sua conclusão;
E comecei a escrever esta crónica, com este enorme preâmbulo, porque li o “desabafo” em quatro pontos de José Gomes, o artista-crítico de serviço, o desenhador citadino de excelência que, denunciando através da pena, nos faz sorrir. Foi menos cáustico e até mais aglutinador do que eu. Confesso, já me falta a  paciência para certos comportamentos que o José Gomes contemporiza. Se concordo com ele ou não, estou em crer, pouco interessa. A dar a cara, pegando o boi pelos cornos, salvo seja, somos poucos mas bons! Ó larilas! -este vocábulo destina-se aos que têm medo até da própria sombra.

sábado, 24 de março de 2018

DIZEM QUE LOGO MUDA A HORA. ORA, ORA! UMA HORA CONTINUA A SER IGUAL!

Resultado de imagem para muda a hora
(Retirado da Web)




Quando damos por nós, olhamos o espelho
e já não reconhecemos a imagem que nos
aparece reflectida. Parece de alguém muito
chegado, mas só isso.”

Ao que tudo indica, logo à noite, vamos, todos, adiantar os ponteiros do relógio para uma hora à frente –a chamada hora de Verão. Será que valerá a pena cumprir esta tradição anualmente? Ou seja, os proventos serão de tal importância que valham o desarranjo que esta alteração nos provoca no ritmo biológico? O facto de passar a amanhecer mais cedo, e com o alegado de não haver desfasamento na luz solar, justifica o alterar a rotina dos marcadores e controladores do nosso tempo?

Em conformidade com a legislação, a hora legal em Portugal continental:
  • será adiantada de 60 minutos à 1 hora de tempo legal (1 hora UTC) do dia 25 de Março e atrasada de 60 minutos às 2 horas de tempo legal (1 hora UTC) do dia 28 de Outubro.” –retirado da página do Observatório Astronómico de Lisboa

Confesso que gostava de escrever sobre este tema algo sério, mas não sei se sou capaz. É que este costume, a meu ver, intrometido e reaccionário, começa por me dar uma tremenda vontade de rir –lá para o fim do texto dá vontade de chorar.
Não é por nada, mas alguém apresentou um estudo científico a provar a mais-valia para a economia deste dogma? Ao que me parece “tudo começou com Benjamin Franklin, o político e inventor do para-raios e das lentes bifocais. Em 1784, num artigo publicado num jornal francês, Franklin sugeria que a França adiantasse uma hora no Verão, alegando que Paris poderia poupar anualmente 32 mil toneladas de cera de vela. Só mais de um século depois é que a sugestão seria tida em conta, no contexto da Primeira Guerra Mundial, para economizar energia”.
O facto de amanhecer mais cedo e anoitecer mais tarde, à hora da ceia, legitima tudo isto? É que esta convenção, embora provisoriamente, começou em 1992, com o governo de Cavaco Silva, e definitivamente com o Decreto-lei número 17, de 8 de Março, em 1996, e dando cumprimento a uma directiva europeia. E aqui faço logo a primeira pergunta estúpida: se com esta mudança se enriqueceu a economia, como é que, passados 20 anos, estamos mais pobres do que anteriormente?
Como duvido sempre dos axiomas, as tais verdades sem contestação, ainda faço outra interrogação sem pés nem cabeça: como é que sem esta tão iluminada medida viveram os nossos pais? E mesmo alguns de nós, em crianças?
Será que neste afã do homem querer controlar tudo, até a luz solar, nos tornou mais felizes? 
Com a desculpa do aproveitar o máximo de luz, enquanto fonte de energia bio-rítmica, nos dias que correm haverá menos solidão, menos depressão, menos suicídio, isto comparando com épocas recuadas?
O curioso é que nesta tentativa vã de apanhar o tempo ficámos sem tempo para olhar as estrelas, a Lua, o magnífico nascer do Sol no horizonte, a leste, o extraordinário Pôr-do-sol a cair sobre o mar, o crepúsculo, e toda a manifestação de uma Natureza viva e magnificente.
Perdemos hábitos de leitura, de escrita, de falar com o vizinho. 
Como se perdêssemos o romantismo e ganhássemos o facebookismo, deixámos de ter uma necessária contemplação introspectiva do mundo à nossa volta.
Vivemos o tempo da necrologia, que é o olhar a página dos jornais diários a ver quem dos nossos amigos morreu –ou, especulando um pouco, para vermos se a nossa foto lá está, porque, bem no fundo, já nem os jornais se lêem como antigamente. É tudo a correr. "Não temos tempo", dizemos todos em coro. Os dias, as semanas, os meses, os anos, todos são iguais e passam num ápice. Quando damos por nós, olhamos o espelho e já não reconhecemos a imagem que nos aparece reflectida. Parece de alguém muito chegado, mas só isso.
Até mudaram a ortografia –estou a escrever e, volta e meia, lá me surge o sublinhado vermelho a indicar erro, ou seja, o computador a querer controlar a minha vontade. Fosca-se para estas mudanças! Porque é que não inventam uma máquina do tempo, onde, em turismo, pudéssemos ir fazer umas férias de longo curso?
Mas, afinal, o que é que se alterou? Se, igualmente, uma hora continua a ter sessenta minutos, mudou o quê?

ASSINE ESTA PETIÇÃO, SE FAZ FAVOR






Começo por confessar -com a pouca humildade que me é característica- que esta petição já foi utilizada em 2010, em 2014 e novamente em 2016. Quero dizer, portanto, que me estou a repetir e estamos perante um refugado mais que fugado, visto e revisto. Acontece que funcionou sempre. Ora se teve êxito sempre é por que o administrador das lides climatéricas me teme. Não é como o “Manel da Pera”, o pretor urbano que lidera a facção dos satisfeitos, que não liga nenhuma ao que escrevo. Porra!, que uma pessoa até desanima! Valha-nos o Senhor do Infinito para a minha vontade não se deixar corromper e me tornar num indolente.
Palavra de honra (de político)! Juro que depois de mandar isto lá para cima, para o gabinete do Céu, tivemos sempre um verão de arfar... assim como um cão com língua de fora, sequioso... não sei se estarei a ser claro! Estou? Bom, mas isso também não interessa nada. O que me maça mesmo, deveras, é que esta chuva chata e aborrecida, de molha-tolos e curiosos, enviada lá dos confins do firmamento, sem critério e sem racionalidade, amesquinha deveras. Ao menos que chovesse de noite ou somente em cima de certos grandes capitalistas e políticos que estou a pensar. Por que raio há-de cair na tola dos trabalhadores? E dos mais pobres? É a mania da equidade, é o que é! Isto só pode mesmo ser conspiração! Por isso mesmo, antes que o caldo se entorne entre mim e o Criador, vou enviar novamente esta petição metafísica. Se concorda faça o favor de a subscrever.


Exm.º Senhor Presidente da Assembleia da República do Céu:


Luís Fernandes -um mero terráqueo, humilde às vezes, muito descrente graças a Deus, insignificante c'mó caraças, um bocado “pró feiote”, entradote e barrigudo, tão "bota-da-tropa" que nem a menina Ernestina, uma vizinha velhota de oitenta e picos anos, olha para ele-, farto desta escandaleira de, há mais de um mês, chover quase todos os dias cá no rectângulo, vem por este meio solicitar a V. transcendência se digne mandar criar uma comissão de inquérito a esta bandalheira.
Em juízo de valor, perdoe V. Santidade se ofende algum venerando vendido, mas tudo indica que estamos em face de actos de corrupção do camarada São Pedro. Perante tão notórios indícios, é mais que certo que Ele está a trabalhar –ou melhor, vendeu-se- por conta dos chineses. Como sabe, são eles que fabricam tudo o que são têxteis e guarda-chuvas. É mais que certo que o guardião dos céus “passou-se” para os lados do sol nascente. Isto até é muito fácil de constatar: antigamente, quando Portugal tinha muitas fábricas de têxteis e sombrinhas, quase que não chovia. Agora, que nem uma indústria de abafa-chuvas existe por cá, o gestor da grande chave económica do Céu abriu as torneiras completamente. É preciso escrever mais alguma coisa? Não é, pois não? Talvez, mas, mesmo assim, o peticionário escreve mais umas linhas porque está profundamente irritado, com o ânimo em baixo e os cabelos em pé.
Não era para pegar neste assunto, mas com esta coisa da Garraiada inserida na Queima das Fitas, entre o pega e larga o desgraçado do toiro, acabo a fazer uma pega de caras. É certo que ainda não houve inundações e o Parque Verde, que mais parece um cenário de guerra do filme “O Capitão”, graças ao altíssimo, lá continua abandonado mas sequinho. Não sei se também estaremos perante um caso de corrupção. Sei lá se o vereador do movimento “Somos Coimbra”, José Manuel Silva, -que mete o bico em tudo- não teria já mandado rezar umas missinhas para que a zona não seja inundada e, assim perante a calamidade, poder mandar mais umas farpas ao camarada holograma, como quem diz Manuel Machado, que desapareceu há muito tempo e agora só se vê na televisão. E sobretudo para que salte bem à vista a miséria e o descuido que os socialistas republicanos e laicos mostram pela Baixa da cidade.
Quando chegar a verdadeira Primavera, está de ver, passará tudo e os dois, Silva e Machado, assim no seguimento do exemplo prestado pelo Presidente da República e o Primeiro-ministro, irão dar dois beijinhos e um abraço no hemiciclo e, numa cena de “perdoa-me” (proclamado em inglês a pedido de Silva), ainda irão ser grandes amigos.
Sim, só poderia ser mesmo o liberal Silva a chatear o executivo rosa por que do PSD, a representar a direita na oposição e na cidade, nem se ouve falar. Aliás, ouve mas pouco. Acerca da Baixa nada. Ou fala da defesa das repúblicas estudantis, ou disserta sobre a candidatura de Coimbra Capital da Cultura Europeia para 2027. Às tantas, se calhar, nessa altura já não existe comércio algum no centro histórico, mas isto, para o PSD, não interessa nada.
Aproveita também o signatário a oportunidade para demonstrar o seu descontentamento com o Presidente Supremo do Céu. Nesta apatia, de nem atar nem desatar, no seguimento da filosofia do “sim… não… talvez antes pelo contrário… nin”, já parece o desaparecido doutor Aníbal Cavaco Silva, que Deus tem em boa guarda e a gozar várias e boas reformas.
Tudo indica, Eminência, que o responsável por esta contrariedade nem nota o que se está a passar por aqui. As pessoas andam todas abespinhadas, ensimesmadas e a contar as pedras da calçada. Esta rebaldaria não pode continuar. Merecemos respeito. Homessa! E é melhor tomar atenção antes que realizemos uma novena e uma promessa a Belém, a nosso senhor Rebelo de todos os Sousas, e se preciso for, faz-se um chinfrim do caraças. E mais ainda: todos juntos, incluindo o Bloco de Esquerda, vamos defender a nacionalização das águas da chuva.
Está de ver que São Pedro não percebe nada de gestão. Até aposto que deve ter uma licenciatura c´mó outro. Só o povo, que tudo paga e tudo aguenta como boi encabrestado, na sua douta e eterna sabedoria de nada saber e ser uma entidade abstracta de "Maria-vai-com-as-outras", que só serve para votar sempre nos mesmos, será capaz de administrar melhor a pluviosidade e fazer a distribuição como deve ser. E se não for capaz pede ajuda ao camarada Jerónimo.
Em nome de todos os humanos -da Terra, obviamente-, e essencialmente dos comerciantes da Baixa de Coimbra que já estão fartos de tanta soltura liquefeita, solicitam todos os subscritores abaixo-assinados que se acabe com esta pouca-vergonha.
Estamos todos fartos disto! Aja decoro na partilha das águas!
Seguem-se as assinaturas ilegíveis dos descontentes:

sexta-feira, 23 de março de 2018

BAIXA: MORREU "JOSÉ MANUEL DOS OSSOS"

(Imagem do semanário Campeão das Províncias)




José Manuel Ribeiro Franco, conhecido por “Zé Manuel dos ossos”, morreu, hoje, em Coimbra, vítima de doença, aos 85 anos de idade, soube o “Campeão”.
O antigo empresário da restauração, que deixa viúva Alice Anjos, era pai do director do Colégio da Imaculada Conceição (Cernache), António José Franco, e irmão do outrora cravador-joalheiro Fernando Ribeiro Lages.
O corpo vai estar, em câmara ardente, a partir das 18h30 de hoje, numa das capelas adjacentes à igreja de Montes Claros, realizando-se o cortejo fúnebre, pelas 15h30 de sábado (24), para o crematório de Taveiro.
Adoentado, José Manuel foi levado, quinta-feira (22), para o polo de Celas do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, a fim de ser assistido, mas ocorreram complicações que o fizeram sucumbir.
Também ontem, Alice Anjos, a sofrer de pneumonia, foi internada no polo dos Covões do CHUC.
O restaurante do Bêco do Forno a que “Zé Manuel dos ossos” esteve ligado durante décadas, gerido por Mário Simões, encontra-se encerrado e reabrirá na próxima semana.”


À família enlutada, em nome da Baixa comercial, industrial e serviços, se posso escrever assim, os nossos profundos sentimentos pela perda de um empresário que muito contribuiu para levar a marca Coimbra além-fronteiras. Que o “Zé Manel” descanse em paz.



É JÁ NA PRÓXIMA SEGUNDA-FEIRA...




Caro Colega,
Foi lançada a 12 de Março de 2018 a 1ª Edição do Orçamento Participativo do Município de Coimbra, na qual se pretende contribuir para o exercício de uma participação informada, responsável e ativa nos processos de governação de políticas públicas. Na prossecução dos objectivos desta iniciativa, a Câmara Municipal de Coimbra levará a cabo diversos encontros informativos, por forma a prestar esclarecimentos à população em geral.
No dia 26 de Março (segunda-feira), realiza-se o Encontro Participativo dirigido aos comerciantes e moradores da Baixa e Alta da Cidade, no Espaço Co-work, instalado no Pátio da Inquisição (antiga Casa dos Pobres e junto à 2ª Esquadra da PSP), entre as 19h15 e as 21h00, no qual a Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra será parceiro na divulgação.
Desta forma gostaríamos de apelar à participação de todos os comerciantes e moradores do Centro Histórico da cidade.
Também poderão participar neste encontro de esclarecimentos outras pessoas que procurem mais informações sobre o funcionamento do Orçamento Participativo.
Para algum esclarecimento poderão contactar o 914 872 418, o 239 842 164 ou através de mail: apbcoimbra@gmail.com.
Atenciosamente,

O Presidente da Direção da APBC
Vítor Marques

BOM DIA, PESSOAL...

UMA RESPOSTA A UM COMENTÁRIO RECEBIDO








Meu caro F. J., antevejo que o senhor até deve ser um sujeito simpático -isto, de certo modo para justificar as minhas longas explanações. Por isso, gostava de lhe lembrar outra vez que perante a vida prática, enquanto cidadãos governados por eleitos, temos sempre duas posições: optamos por nos calarmos e aceitamos tudo ou protestamos afincadamente mesmo sabendo que pouco se consegue. Enquanto escolha de uma ou de outra premissa, é uma manifestação de vontade individual que se deve respeitar. Como sabe os sistemas políticos, democráticos ou ditatoriais, fazem tudo para que o cidadão comum enverede pela primeira, isto é, que não faça ondas e aceite passivamente as deliberações verticais, de cima para baixo. Os que não enfiam o chapéu, agindo de diversos modos, quer escrevendo, cantando, manifestando-se publicamente, são tratados como marginais. Sempre foi assim e sempre assim será até ao fim dos tempos. A manipulação sempre esteve em cima da mesa para ser usada por quem governa, seja poder local ou nacional.
Claro está que quem cala consente -diz-se em aforismo- e escancara a porta para as maiores atrocidades. O mal entra sempre devagarinho e, até se instalar definitivamente, usando todas as armas para convencer, vai corrompendo pessoas neutras de modo a que continuem estáticas e não intervenham na vida pública, ou se o fizerem que sejam a favor. Depois de conseguir o seu objectivo, o sistema passa a usar estes cidadãos como infantaria, carne para canhão, na frente do combate ideológico. A não denúncia, ou denegrir quem o faz é um bom exemplo para se fazer o jogo do poder.
No caso do genocídio do comércio tradicional a tática seguida é a mesma. Convencer o máximo de pessoas, nomeadamente os consumidores, de que o encerramento contínuo de lojas tradicionais se deve à inoperância dos comerciantes e é da sua inteira responsabilidade. Por outro lado, investindo noutro argumento forte, o sistema tenta mostrar à força toda que a vinda de outros grandes investimentos no comércio de grandes áreas traz novos empregos e são o paradigma do progresso e desenvolvimento. Tome-se atenção num detalhe: ninguém está seguro! Seja patrão ou empregado, a ameaça está aí!
Não fui muito longo, pois não?

UM EXEMPLO DO QUE ESCREVI EM CIMA:

Não são os supermercados que destroem o comércio local,
eles fazem é concorrência entre si. A autarquia não tem o direito
de limitar o investimento privado”
Ana Carvalho, vereadora com pelouro no Executivo da Câmara
Municipal da Figueira da Foz, sobre a possível construção de mais dois hipermercados.”
(Diário de Coimbra, rubrica Região das Beiras,
de 20 de Março)

quinta-feira, 22 de março de 2018

BOM DIA, PESSOAL...

FALECEU O ALFREDO POÇO







Durante décadas a perder de vista o Alfredo Freire Poço, agarrado à sua inseparável bengala, foi um calcorreante destas pedras calcadas por todos e tão pouco valorizadas. Pelo anúncio necrológico colado em algumas esquinas da Baixa, ficamos a saber que, partindo para a eternidade, foi hoje o seu funeral.
O Alfredo tinha uma leve disfunção mental. Talvez por isso não publicou nenhum livro, não foi professor, não fez parte de nenhum governo central, não foi obreiro no geral. Se nós somos o que fazemos, e por impossibilidade psíquica o Freire Poço foi somente um humilde transeunte no nosso meio que se limitou a viver, logo, por silogismo, o Alfredo passou por nós como se não existisse. Como só tomei conhecimento agora do seu falecimento, desconheço se teria tido muitos ou poucos acompanhantes nas cerimónias funerárias. O Presidente da República não esteve lá de certeza hoje, porque a comunicação social local nada falou da sua deslocação a Coimbra. Esteve anteontem mas noutro velório. Por isso mesmo, por esta não-vivência, sem protagonismo, estou aqui para deixar um elogio fúnebre ao simples, ao amigo que partiu.
Conheci pela primeira vez o Alfredo nos idos anos de 1973, aqui na Baixa, quando comecei a trabalhar no comércio, nas lojas do também desaparecido José dos Santos Coimbra, na Casa Santiago, nas Galerias Coimbra, no Traje e outras cujo nome já não recordo. O pai do agora finado, também já falecido há muitos anos, era o senhor Miguel, o alfaiate sempre de serviço quando era preciso apertar ou alargar um fato de homem. Era um profissional muito discreto. A Amélia, a irmã do Alfredo, chegou a ter um pequeno café na Rua da Fornalhinha, por volta de 1980.
Como curiosidade, o Alfredo quase sempre que vinha à Baixa, fazendo um pequeno desvio, cá deixava o cumprimento repetido na forma seguinte: “Bom dia, Senhor Luís! Não me arranja uma nota de vinte escudos, de Santo António? É que dá-me sorte, sabe?
Às vezes, de tempos a tempos, lá lhe dava o amuleto pretendido.
Para a família enlutada, em meu nome e em nome da Baixa, se posso escrever assim, os nossos sentidos pêsames. Descansa em paz, Alfredo!


ROSTOS SEM ROSTO: A PROSTITUTA

(Imagem da Web)




Baseada em impressionantes declarações,
escrevi esta crónica em Março de 2014. Pela
verdade das coisas, pela crueza dos factos,
Descrito na primeira pessoa, deixo-vos o
retrato de “A Prostituta”.
Embora sejamos um resultado de vários factores,
afinal somos apenas o que podemos ser. E o que
somos, contrariamente ao que se diz, nem sempre
é aquilo que gostaríamos de ser. Somos somente
a consequência de vários efeitos. Quem discordar
que atire a primeira pedra.


ROSTOS SEM ROSTO: A PROSTITUTA


Sou prostituta, tenho 48 anos de idade, e exerço esta actividade nas ruas da Baixa há cerca de uma dezena de anos. Nasci em Miragaia, no Porto. Dei o primeiro grito numa família abastada. Muito abastada. O meu pai, hoje aposentado, era quadro superior de um banco. Estudei até ao 12.º ano num colégio católico. Não me faltou nada. Fui educada com muito amor e carinho. O problema, talvez maior, é que os meus pais são divorciados. A minha mãe é toxico-dependente e alcoólica. Depois tirei um curso de esteticista, massagista e visagista –assessora de imagem. Exerci na cidade Invicta. Casei cedo e assim me mantive durante 20 anos, até conseguir aguentar a porrada que levava do meu ex-marido e os maus tratos associados. Eu era uma mulher linda! Ainda hoje sou, apesar de estar um pouco estragada. Casei para me libertar do bloqueio da minha família, que nem um cigarro me deixava fumar. Sentia-me asfixiada pelos meus pais. Gostava do meu marido, mas depressa o meu sonho se desvaneceu. Ele comigo fazia pouco sexo, mas ia às prostitutas. Várias vezes apanhei doenças venéreas por causa disso. A nossa existência é muito cruel. Nunca pensei em enveredar por esta vida. Enquanto casada, tantas vezes me ofereceram dinheiro para eu fazer sexo mas eu nunca quis. Era o amor, sabe? Até que tive de fugir dele por não aguentar tanta pancada –pode ter a certeza de que, se calhar, como eu, a maioria das prostitutas que anda por aí foi vítima de violência doméstica.

A VIDA DEPOIS DA VIDA

Então, com, mais ou menos, 38 anos respondi a um anúncio de uma revista e conheci um homem. Ele trouxe-me para Coimbra embalada na esperança de uma vida melhor. Mas quem nasce atrás do sol-posto, com a má-sorte associada, dificilmente verá o astro-rei brilhar. O fulano tinha apenas uma intenção em mente: que eu me prostituísse. E depressa estava a aprender o “bê, à, bá” da mais antiga profissão do mundo. Ele pertencia a uma rede de carne branca com ligações a França e Holanda. Para me libertar dele foi o cabo das tormentas. Mas, nessa altura, ninguém me ajudou. Cheguei a ir pedir ajuda a um vereador da Câmara Municipal, para me arranjar um trabalho, e ele respondeu que eu fosse para o Largo do Paço do Conde. Que era lá o meu lugar –que, curiosamente, é onde estou quase sempre e junta com outras mulheres. Mais tarde apareceu-me um engenheiro de uma instituição do Estado, um chefe de serviço –que ainda hoje lá exerce- que, dizendo que gostava de mim, se revelou um gigolo. Pôs-me a trabalhar na noite. Eu gostava dele, por isso me tornei sua amante. Mas o interesse dele não era o meu amor. Tinha uma forma sub-reptícia, muito subtil, de se bater aos meus ganhos, pedia prendas de grande valor. Nunca me deu nada. E eu tive de aprender à minha custa. Os homens não valem uma merda! É amá-los e fornicá-los! Que é o que faço mesmo! Dão-me prazer, um gozo danado, e ainda me pagam. Quem é aqui o utilizado? São muito estúpidos! Às vezes perguntam-me se eu tenho orgasmo. Tenho sim, filho –respondo. Tenho dois. O primeiro quando me pagas e o segundo quando te vejo a puxar as calças para ires embora.

UM POUCO DE AMOR. PLEASE!

Sofro de esquizofrenia bipolar. Tenho de tomar medicamentos para me aguentar. Às vezes pareço zonza –sei lá quantas vezes você, ao passar por mim, assim teria pensado, que eu levava uma broa. Nada disso. Eu não me drogo. Os homens tratam-nos como coisas sem valor. Mas eu tenho sentimentos. Preciso de ser amada, ter um pouco de carinho. E não tenho. Por vezes, quando estou mais em baixo, ligo ao meu pai só para ouvir a sua voz, mas ele não me dá hipótese de continuar a conversa e corta logo: “fala-me em números! Quanto precisas?” –ele nem a minha voz quer ouvir. O meu progenitor, apesar de ter refeito a sua vida com outra mulher, vê em mim a minha mãe –que, quando nova, era muito linda-, na voz, na imagem e em tudo. Nunca superou isso. Ele todos os meses deposita cerca de 200 euros na conta do assistente social que me acompanha. É este técnico que me vai dando o dinheiro ao longo do mês. Estou a viver numa pensão da Baixa –mas não levo para lá clientes.

ESCORREGAR NO CAMINHO

Cai-se na prostituição por três motivos. Por expiação –no sentido de expurgar a culpa. Mas que culpa? Por inspiração –há mulheres que gostam mesmo desta vida. E por omissão –entregam-se à actividade sem recalcitrar. Sem se questionarem. Deixam-se ir na corrente.
Isto é também um vício. Às vezes saio à noite para levar um agasalho a uma colega e acabo por ficar. O dinheiro cega-me, sabe? Embora não precise de muito. Por conseguinte, logo que faça 20 euros por dia, com um ou dois clientes, chega-me. Não quero mais! Outras vezes também faço isto por missão. Pode achar inverosímil, mas eu tenho prazer em dar satisfação aos homens.
Esta vida fez de mim uma psicóloga. Olho para qualquer rosto e, sem nunca o ter visto, sou capaz de descrever a pessoa. Habituei-me a ler um homem através da face. Saber ao segundo o que é que ele quer de mim. Trabalho com homens sem taras. Estes indivíduos são perigosos. Tive más experiências. Já fui violada mas não comuniquei à polícia. Ele apontou-me uma pistola, amarrou-me e levou-me para a mata. Sei quem é, mas não quero falar disso. Nem os cães violam as cadelas, porra! Trabalho com viúvos, divorciados e solteiros. Já me propuseram casamento. Outros querem que eu vá viver com eles. Na maioria das vezes, sobretudo os mais velhos, querem-me como companhia. Sou mais virada para o trabalho de acompanhante… popular. Não é acompanhante de luxo! Vêem mais em mim a mulher e menos o objecto sexual. Está a perceber?!
As pessoas da Baixa tratam-me, todos, muito bem. Com muito afecto! Sou simpática, não me drogo e não sou malcriada para ninguém. Faço aqui as compras todas. Se tenho dinheiro pago logo, se não deixam-me levar. Confiam em mim. Sabem que, apesar de ser prostituta, sou séria. Tenho dignidade. Tenho coração. Aqui, dentro do peito bate uma alma. Entende? Sabem o que eu faço. Não ando mascarada. Sabem que tenho uma filha que é médica e um rapaz que é economista –os meus rebentos sabem muito bem o que faço. Dizem que a escolha é minha, é uma opção de vida, e não têm nada a ver com isso. São uns queridos, os meus filhos, não são?
Acabei a gostar desta vida. É uma forma de libertação. O patrão não bate e a patroa não ralha.
Não espero nada da vida! Não tenho ilusões. O amor é uma utopia!

A VIDA NUM CARTÃO


Anda sempre acompanhada com um cartão de vacinas que ostenta no cabeçalho “Cartão Controlo do GAT-UP-REDUZ”. Este serviço está sediado no Terreiro da Erva. É com ele que vai requisitar preservativos. “São muito bons para mim e para outras como eu” -enfatiza. “Se não fossem estas instituições o que haveria de ser de nós? Levam-nos ao hospital para fazer exames de três em três meses. Olhe aqui a data! Fiz há dias análises ao sangue. Faço amiúde vezes rastreio contra o HIV, Hepatite, Cancro do útero e da mama, e Sífilis. A maioria dos clientes nem sabe disto. Pouca gente sabe. Mas quando a polícia nos identifica pede sempre este cartão de vacinas. Você também não sabia, pois não?

MAIS UMA LOJA... QUE REABRE BREVEMENTE...




(Rua da Louça, Baixa de Coimbra, Coimbra outrora capital do Reino, Reino de Portugal Nação Valente...)

A RUA LARGA COM ALEGRIA ESTUDANTIL


quarta-feira, 21 de março de 2018

EDITORIAL: UMA CÂMARA COM PAREDES PROTECTORAS DE VIDRO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Quero aqui apresentar um problema que tem vindo
a agravar-se no tempo e que se situa no Ribeiro da
Póvoa, S. Martinho do Bispo, mais concretamente
na interseção da Rua Fonte da Preguiça com a Rua
do Lagar e Rua Adelino Batista, sem que tenha havido
qualquer tipo de intervenção por parte dos sucessivos
responsáveis locais.
(Extracto do comunicado de José Manuel Silva. Pode ler mais aqui)


Mais uma vez José Manuel Silva, vereador sem pelouro do movimento “Somos Coimbra”, recorreu às redes sociais, nomeadamente ao Facebook, para que os eleitores conimbricenses tomem conhecimento de uma proposta apresentada pelo movimento na última reunião do executivo, na segunda-feira 19. Por parte da imprensa diária, pelo menos eu não li nada, nem uma amostra do que se passou. Nada demove os periódicos da sua estaticidade.
O que nos deve chamar a atenção nesta comunicação de José Manuel Silva, representante e parte do bloco da oposição no Executivo camarário, é o facto da sua publicação funcionar com um grito de ajuda. Pelo mutismo imposto por “mordaça”, não sabemos se o assunto mereceu provimento pela vereação e teria sido motivo de discussão minuciosa. Como já vem sendo hábito, enquanto cidadãos, não sabemos nada! O que sabemos é que este silêncio atrofiante por parte dos jornais escritos em papel locais beneficia descaradamente o exercício do poder instituído. Embora indirectamente e sem poder ser criminalizado, o princípio da transparência da publicitação dos actos públicos está a ser beliscado. Bem sabemos que podemos sempre consultar as actas, mas quem faz isso? Se a imprensa publicada não dá relevância e a maioria com assento parlamentar nada faz para tornar público, está de ver, estamos a viver num viciado círculo fechado, estanque, onde só sobressai o que interessa à ordem instituída.
Como ressalva, declaro sobre palavra de honra que não fui nomeado defensor deste movimento e de outros partidos que compõem a oposição. O que me leva a manifestar opinião é ter noção de que enquanto sujeitos de direitos (e obrigações), deixando correr as coisas sem protesto, por um lado, estamos todos a ser coniventes com uma situação lesiva, por outro, estamos a contribuir para um situacionismo que tarda em alterar. O que estamos a assistir é demasiado gravoso e atentatório da vida política e social. Talvez seja por isto mesmo que cada vez mais o futebol é o rei das conversas de rua e a política a cortesã mal-vista de uma relação bilateral que devia ser incentivada.
Mas não é só o facto dos jornais não cumprirem a sua obrigação social que deveria fazer refletir o cidadão médio e mais ou menos informado, é também a conflituosa relação entre governo local e oposição que nos deveria deixar preocupados.
Quem segue a forma de actuar desta maioria socialista desde 2013, e relembra as queixas amiúde nesse distante mandato de quatro anos de José Ferreira da Silva, ex-vereador do movimento Cidadãos por Coimbra, facilmente chega à conclusão do que está por trás deste procedimento de José M. Silva. Ou seja, em especulação, parece que a tentativa de furar o cerco, a fuga para a frente do movimento “Somos Coimbra”, é, em metáfora, como um náufrago perdido no oceano a colocar os braços no ar, a mostrar que está vivo e a pedir auxílio. Como a oposição não é tratada com o respeito e a dignidade que merece, vê-se na necessidade de, para levar a sua mensagem aos conimbricenses, tentar furar todos os muros de silêncio imposto com o conluio de uma imprensa local que deixa muito a desejar.
Enquanto cidadão e munícipe que lê os jornais diários e parcialmente vai apreendendo o que se passa, sinto-me profundamente ferido com a manifesta falta de exercício democrático, isenção e independência e, acima de tudo, pela falta de formação cívica e humana, com laivos de autoritarismo, de certos eleitos que deveriam primar pelo respeito inter-pares.
Por notícias que se vão sabendo e lendo pela Baixa, muito baixinho para não causar mossa em contrabalanço entre o que se sabe e o que se desconhece, o panfletarismo apregoado em artigos de opinião na imprensa não passa de uma manobra de diversão. E como se fosse pouco, o clientelismo virulento continua a estender a mão.
Com franqueza, estou muito preocupado. Ou melhor, enquanto cidadão comum, sinto-me profundamente irritado. Coimbra, a nossa polis do conhecimento e da sabedoria, que deveria ser um exemplo de liberdade para o país, não merece ter certas pessoas tão limitadas, que numa pomposa arrogância parecem ter a pose do dono disto tudo, à frente do fórum que governa a cidade. Esquecem que foram eleitas para servir e não para se servirem do lugar que ocupam.
Nestes vinte dias que já leva este mês de Março, em torno da degradação da Baixa e do encerramento da livraria do meu amigo Miguel Carvalho, uma ou outra pessoa -nomeadamente Carlos Fiolhais-, poucas, colocaram o dedo no rasgão que dilacera a alma da cidade. A maioria prefere perder-se em choros de carpideira que não conduzem a nada nem mudam uma única pedra da calçada.
É preciso trazer para a rua, para a discussão pública, este sufoco democrático de que Coimbra sofre. Se é uma obrigação de toda a oposição denunciar o que está acontecer -e nem por isso se vêm grandes protestos-, não o é menos por parte dos cidadãos que compõem a base activa deste lugar milenar, mais antigo que o país.