quinta-feira, 31 de outubro de 2013

"MERDA DE PAÍS ESTE!", DIZEM TODOS, MAS SÓ ISSO!





"EDP cortou fornecimento de eletricidade no Bairro do Lagarteiro". LEIA AQUI.



Perante um acto aparentemente simplista como este, os legalistas vão dizer: “Muito bem! Assim é que é! A lei é igual para todos!

Os justicialistas clamarão: “Finalmente fez-se justiça! Eu também pago a electricidade!”

Os utilitaristas gritarão: “ Temos todos de entender a utilidade das coisas! Há uma relação directa entre utilidade e obrigação.”

Os “gajos” da direita escreverão: “Assim é que é! Essa “cambada”, que vive à custa do rendimento mínimo, quer consumir e não pagar? Ai é assim que se mantém o Estado social?”

Os “gajos” da esquerda mandarão o seguinte recado: “Estamos perante mais uma atrocidade deste governo fascista que quer enterrar todos os pobres em campa rasa e sem direito a epitáfio!”

Os liberais, lendo o que uns e outros escrevem e usando de alguma ponderação, exclamarão: “É uma medida que deveria exigir alguma reflexão! O Estado, com medidas avulsas como esta, sem ter em conta as dificuldades do cidadão, que deveria defender por contrato social, está a provocar a sua implosão a curto prazo!”

O Dr. Eufrásio da Silva (nome aleatório), reconhecido homem de negócios, proclamará: “Tenho pena desta gente, claro que tenho! Mas se não pagam o que gastam o que quer que se faça? Eu também pago os meus consumos! Vivemos num Estado de direito, não é assim?”

O Apolinário, reconhecido polidor de esquinas da Baixa de Coimbra, enfatizou: “Foda-se, pá! Isto é um insulto a quem trabalha! Estamos entregues aos bichos!”

O Marcelino (nome inventado), de 85 anos, reconhecido antifascista e que até esteve preso no Tarrafal, deixa escapar: “Fascistas de uma figa! Filhos de uma grande puta! Eles comem tudo e não deixam nada! Estamos pior que no tempo salazarista!”

O Avenal (nome fictício), palrador e seguidista da Mocidade Portuguesa e outras estruturas do Estado Novo, não deixa passar em vão: “Estava de ver que isto ia acontecer! Ando a dizer isto mesmo há 39 anos, desde que essa escumalhada dos militares entregou isto ao estrangeiro. Ainda vamos ver pior! Hão-de chamar por Salazar três vezes, mas ele não se levantará da tumba!”

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

"FAZ-ME UM LIKE"

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)

 Ontem, depois de sair do pequeno café onde almoço, na Rua da Sofia –deveria dizer o nome, não era? Pois era! Acontece que não me apetece. Sei lá se você ainda me lá iria cravar uma sandocha?-, deparei-me com um gajo ainda novo –deveria ter vinte e poucos anos calcorreados em caminhos de perdição, calculei- a pedir uma moeda a quem passava. Era magricela e com cabelo aparado à índio Cherokee –já sei que você não conhece este corte nem o povo de que falo. Só os licenciados em banda desenhada, com aulas e curso tirado no Quiosque do Senhor Machado, é que sabem de quem se trata. Mas não se preocupe, estou aqui para cuidar da sua ignorância, eu explico. É na forma de apresentar a cabeça rapada à melão e com uma trunfa alta no meio, a parecer as crinas dos cavalos da GNR. Entendeu? Se não, faça o favor de colocar o indicador no ar que volto a reformular. O que me fez estancar foi a forma como ele pedia o níquel. O rapaz, envolvido numa lengalenga que não percebi, contorcia-se todo, quase colocando-se de joelhos e com as mãos coladas em direcção ao céu como se estivesse a orar, punha-se mesmo à frente dos transeuntes e estes, como Ronaldo a driblar o esférico, lá tentavam evitar o seu olhar. Outro dado curioso e que também me chamou a atenção foi o facto de a camisola preta que trazia vestida ostentar no peito a inscrição “Faz-me um like”, acompanhada com uma mão fechada e com o polegar levantado.
Durante largos minutos que estive a apreciar o trabalho do pedinte, nem uma só pessoa lhe deu uma moeda ou sequer atenção. Evitavam-no como se evita um tipo bêbado e a cambalear. E ele, sem desanimar, com uma feição sofrida, estudada mais que certo, continuava. Era de tal modo realista o acto de pedir encarecidamente que me apeteceu passar para o outro lado e ver in loco a sua performance. Como espectador que assiste nas bancadas a um jogo, mantive-me a ver até que me deu na real gana e parti para outras paragens. Em frente à Pastelaria Palmeira um grupo de jovens, suponho que escuteiros, tentou impingir-me um calendário. Junto à Câmara Municipal mais dois rapazolas novos, certamente da mesma escola do “faz-me um like”, estendiam a mão, sem pejo e a arreganhar a fateixa. Mais à frente mais um peditório para uma instituição nossa conhecida. Nos parapeitos de pedra que estão junto à autarquia, no lado esquerdo, uns reformados tentavam ver nos raios solares uma esperança que se esfumou. No lado direito, a comer uma bucha, uns trabalhadores do “Bord’Água” tentavam acalmar o estômago. Reparei que nesta altura há um grande fluxo deste pessoal do leste europeu na Baixa. No Largo da Praça 8 de Maio, apesar de ninguém lhe ligar nenhuma, mais um homem de meia-idade estendia a mão. Na Rua Visconde da Luz, para variar, mais dois jovens pediam para as almas. Na rua Ferreira Borges mais um tipo, cujo corpo já não provava água há dias ou semanas ou meses sei lá!, tratava de ver se condoía o coração duro de quem calcava as pedras da calçada. Dei a volta ao quarteirão. Na Praça do Comércio mais um sujeito mal-encarado, muito feio graças a Deus, tentava a chance com uma moeda. Cortei para a Rua Adelino Veiga e na esquina da Românica lá estava uma velha conhecida destas ruelas estreitas, que prima por colocar as grossas coxas e mostrando um corte numa delas. Na Rua das Padeiras, junto à tasca do Eduardo, mais um, de mão estendida, tentava angariar vinte cêntimos para beber um copo de carrascão na taberna dos dois degraus.
Fosca-se para isto! Pensei cá com os meus botões. A Baixa está transformada num imenso albergue de gente nova, sem ocupação, a estender a mão. Perdeu-se a vergonha para pedir. Não sei se consigo ser claro, mas vou misturar tudo num caldeirão. Dei por mim a pensar na bagunça onde estamos todos metidos. Porra! Isto está um charco onde o cheiro fétido não se sente mas pressente-se. É como se, de repente, tivéssemos a percepção de que estamos a deslizar por uma cano cujo destino termina numa fossa de porcaria. Este pensamento não vem ao acaso. Lembro-me da pouca-vergonha do casal Carrilho, Barbara Guimarães e Manuel Maria Carrilho, e no triste espectáculo que estão a apresentar ao País. Penso no filme que vi no domingo, no cinema, sobre Hannah Arendt –filósofa alemã de origem judaica- e acabei a perceber toda esta mediocridade dos humanos no seu pior.

BOA TARDE PESSOAL...

terça-feira, 29 de outubro de 2013

POR SEIS PLANTAS DE CANNABIS

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



 O Diário de Coimbra (DC) de sexta-feira, dia 25, em título de primeira página, dava à estampa: “Moradores de república de estudantes arguidos por cultivo de cannabis”. No interior do jornal, em subtítulo, foi escrito que “PSP de Coimbra apreendeu seis plantas adultas de cannabis e ainda quantidade desta droga suficiente para 5400 doses no interior da residência”. E em desenvolvimento “Cinco indivíduos (de ambos os sexos) residentes numa república de estudantes localizada na zona da Sé Velha foram constituídos arguidos e estão sujeitos a termo de identidade e residência, por serem suspeitos de cultivo e posse de estupefacientes, nomeadamente cannabis”. Continuando a citar o DC, “(…) No interior da residência, em zonas comuns a todos os moradores da casa, foram encontrados pelos mesmos agentes seis vasos com outras tantas plantas adultas (….). No decorrer das buscas, e já no quarto de um dos moradores, foi encontrada uma caixa de papelão que a PSP de Coimbra confirma que continha “diversas cabeças de cannabis, prontas para secar e embalar” e ainda “uma saca em plástico com sementes de cannabis e um moinho próprio para o produto”. A conclusão a que chegaram as autoridades é que o material encontrado no interior da residência dava para cerca de 5400 doses.”
Depois da transcrição do periódico, demos uma vista de olhos na Internet sobre as consequências do haxixe, ou maconha como também é conhecida esta planta no mundo. Ficamos a saber que “Os efeitos variam se a droga é fumada ou tomada, e dependem da quantidade usada. Com vários efeitos comportamentais, consoante a quantidade usada, tem várias consequências para a saúde como por exemplo:fumar maconha traz os mesmos problemas que fumar cigarro de tabaco: bronquite, asma, faringite, enfisema e cancro; há maior risco de sofrer acidentes de trânsito; diminui a imunidade, aumentando a possibilidade de ocorrerem infecções; se for usada durante a gravidez, existe a possibilidade de prejudicar o feto. A dependência pode ocorrer por uso repetido, durante bastante tempo.”
A talhe de foice convém referir os ventos que sopram da América Latina, mais propriamente do Uruguai. Vamos espreitar: “No mês que vem, o Uruguai pode se tornar o primeiro país das Américas a legalizar o cultivo, a distribuição e a venda da maconha. O Senado, de maioria oficialista, deve transformar em lei a legalização da maconha, já aprovada pela Câmara de Deputados no final de julho. Esse pioneirismo pode representar um modelo para os demais países do mundo, especialmente aos vizinhos (…). Os consumidores vão poder cultivar até seis mudas de maconha em casa, com uma produção de até 480 gramas. O cultivo também poderá ser coletivo nos chamados "clubes do auto-cultivo", cujo limite será de 45 sócios. Também se poderá adquirir a maconha plantada, distribuída e vendida pelo Estado por meio das farmácias, numa quantidade mensal de até 40 gramas. Haverá um registro de usuários com identidade protegida, que impede a compra por estrangeiros, para evitar o "turismo da maconha". Depois de aprovada a lei em novembro e depois do plantio e da colheita, a maconha deve começar a ser vendida no segundo semestre do ano que vem. O chanceler uruguaio Luís Almagro explica que o objetivo final da lei será asfixiar financeiramente o tráfico de drogas e preservar os usuários que não vão mais precisar ir até uma boca de fumo, expondo-se à delinquência de traficantes."
Antes de prosseguir, vou fazer ressalvas de interesses: afirmo que não conheço as pessoas indiciadas; juro solenemente que nunca consumi o vulgar charro –embora, saliento, conto não morrer sem experimentar; nada tenho contra a PSP. Entendo que os agentes se limitam a cumprir a prescrição legislativa –no entanto, é minha convicção que, para mostrar trabalho feito à comunidade, há uma tendência natural para a especulação, quer na quantidade apreendida que resultará em n doses, quer partindo do princípio de que, instigados pelo espírito da lei, a produção tem sempre por objecto a comercialização futura, o tráfico. Na quarta emenda, não sou um patrocinador acérrimo da legalização da plantação de cannabis. O que defendo é que, de uma vez por todas, se clarifique a legislação vigente, se coloque em cima da mesa os danos e os proveitos para a sociedade. É um paradoxo, a cair no absurdo, o consumo de drogas leves estar despenalizado e ser sancionado o cultivo de plantas para o gasto pessoal. Ou seja, na lei, estamos perante um apriorismo bacoco de que um produtor é sempre um eminente traficante –lembremos, por exemplo, que os agentes da  PSP estão sempre vinculados ao mesmo procedimento de inquérito, quer sejam 200 plantas apreendidas ou apenas uma.
Gostaria ainda de apelar à reflexão no sentido dos custos. Comecemos pelos financeiros; terá lógica levar a julgamento arguidos primários cujo desfecho se sabe, em princípio, que será a absolvição? E os Sociais? Será justo a comunidade –ignorante e sádica, sempre ávida de um legalismo e justicialismo radicais- lançar um estigma de “criminosos” em cima destes e de outros jovens?
De uma vez por todas, era bom assumir que não devemos continuar a enterrar a cabeça na areia. O consumo de haxixe não existe apenas no nosso vizinho. Ainda que algumas vezes por ignorância tácita e confortável e outras por desconhecimento legitimador do não conflito, não vale a pena esconder: ele está mesmo dentro de nossa casa.








"PORTO DE FUTURO"... E COIMBRA? QUE FUTURO?



Projeto quer revitalizar comércio tradicional do Porto


"São três da tarde, está no centro do Porto e precisa comprar uma agulha. A tarefa pode ser mais fácil do que imagina, principalmente se conhecer o projeto Porto Paralelo, que pretende reatar os laços entre consumidores e comércio tradicional." (Continue a ler aqui)

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS




O VERDADEIRO BORDA D'ÁGUA


 Há anos e anos –se calhar, décadas, séculos, sei lá!- que passo por ele ali na Rua da Sofia, quase sempre no mesmo sítio, ora a plastificar documentos ora a vender o Borda D’Água. Tem 60 anos e dá pelo nome de Rui Jorge Pereira Almeida. Desde que saiu da tropa que está ali, junto à Pastelaria Palmeira, na Rua dos Colégios, a plastificar cartões e há cerca de 25 anos que vende o Borda D’Água. Tem noção de que a sua profissão está ameaçada. No tocante aos plastificados, qualquer dia já ninguém passa cartão a ninguém. No referente à popular cartilha do agricultor, se por um lado agora é tudo científico e em grande escala, por outro os romenos, a venderem gato por lebre como quem diz fotocópias, rebentam-lhe com o negócio. “Antigamente vendia 10 exemplares do Borda D’Água por dia, agora menos de cinco. E é quando é! Quando recebo a encomenda da Editorial Minerva –a empresa que edita o pequeno jornal de agricultura- lá vem o apelo para denunciarmos às autoridades qualquer facto anómalo que detectemos. Ai eu é que vou substituir a polícia? Eles não vêem? Se acaso o fizesse quem garantia a minha integridade no caso de haver represálias? Nunca vi a PSP ou outro qualquer ramo de polícia civil preocupar-se com isto. Sinto-me muito prejudicado. É com estas vendas que vivo. Ou melhor sobrevivo, porque os pobres não vivem; convivem arrastando-se por aí. Estou reformado por invalidez e recebo à volta de 250 €. É certo que estou numa casa camarária e pago apenas 5 euros mas, mesmo assim, só posso comer uma refeição de jeito diariamente. Vou almoçar à Liga dos Combatentes e pago 4 €. Ao jantar contento-me com uma sandes porque não dá para mais. O dinheiro não estica.
Não ligo à política. Tanto me faz! Não voto há mais de 30 anos. Estou profundamente desiludido com esta gente que promete tudo e depois desgraça os sem esperança. À minha custa não vão para lá. Não fazem nada por mim! Também é verdade que, pelos menos até agora, nunca me chatearam mas sei lá o dia de amanhã?!?”



GOODBYE LOU REED e... "perfect day"

sábado, 26 de outubro de 2013

BOA TARDE PESSOAL...

NATA LISBOA... EM COIMBRA


 Abriu esta semana, mais exactamente na quarta-feira, a Nata Lisboa, na Rua Ferreira Borges, em frente ao Arco da Barbacã e no antigo espaço do Último Figurino. Com uma decoração moderna e sóbria, entre o rústico e o revivalismo de vanguarda, o ambiente é deveras convidativo e acolhedor.
A Nata Lisboa é um conceito franchisado da Nata-Mundo, marca com sede na capital e com vários pontos de venda no País. Como se adivinha é uma aposta forte no celebérrimo pastel de nata. Não igual a um qualquer vendido num café de bairro. Nada disso! O docinho do Céu que aqui provei, quentinho e com um sabor nunca ensaiado por mim, é assim como usufruir de uma viagem aos confins do paraíso pantagruélico. O palato bate palmas, o estômago sorri e a barriga agradece. É um sonho realizado de duas jovens amigas, a Ana Ribeiro e a Raquel Bento. Contrariamente ao comum não estavam desempregadas. A Ana, de Pombal, foi até há pouco docente em design de moda. A Raquel, de Castelo Branco, é licenciada em Ciências da educação. Ambas estavam a trabalhar nas suas áreas de cursos e abandonaram os seus lugares para abraçarem este projecto. Confessam não perceber muito do universo hoteleiro, mas estão muito bem assessoradas pelo João Gerardo, que sabe muito bem quantas gramas de café são necessárias para tirar uma bica. Além disso, referem em coro, com a vontade férrea que as impele tudo rapidamente se aprende.
Então, com um sorriso enorme da Ana, da Raquel e do João, façam o favor de visitar o seu bonito estabelecimento, que muito vem engrandecer e valorizar a Baixa de Coimbra, e provar aquela maravilha de bolinho encantado. As maiores felicidades e toda a ventura são os nossos desejos sinceros.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

A GERAÇÃO DO PENICO



A GERAÇÃO DO PENICO

Andam em bandos pelas ruas da cidade,
parecem corvos negros a anunciar tempestade,
levam nas costas corcundas de uma mocidade,
que sendo novos, parecem não ter idade,
são mais velhos que os avós, mas com agilidade,
se os velhotes vissem bem a sua imbecilidade
procurariam morrer de vergonha por esta verdade,
são anjos negros, bonecos, sem autenticidade,
manipulados por outros bonecos sem sanidade,
dá uma tristeza ver esta gente, esta boçalidade,
a embebedar-se, a destruir com bestialidade,
levando tudo à frente com brutalidade,
não são corvos, perdão, são bestas sem civilidade,
são o produto resultante da desonestidade,
de uma política de educação sem dignidade,
também de uma urbe que sofre de enfermidade,
que é masoquista, tristeza da vil saudade,
que se põe de cócoras e apanha com ferocidade,
que deixou de se impor ao respeito pela facilidade,
olha para isto tudo com apatia e frivolidade,
perante este exército de bárbaros, sente a fragilidade,
é agredida, insultada, violentada, uma anormalidade,
mas ninguém ousa dizer: chega de alarvidade!

UM RETRATO PARA MEDITAR...


A BAIXA PITORESCA....


UMA IMAGEM POR ACASO...


LEIA O DESPERTAR...



Para além  do texto "O AFINADOR DE PIANOS", deixo também as crónicas "UM SAXOFONISTA NA VARANDA"; e "REFLEXÃO: QUO VADIS MACHADO?".



O AFINADOR DE PIANOS

 Quando dei conta da sua existência, recordo bem, teria sido há cerca de vinte e cinco anos quando, todos os dias, batia com os olhos no seu anúncio nos classificados do Diário de Coimbra (DC): “Afinador de pianos, Manuel dos Reis, Figueira da Foz”. Noutros tempos, quando os periódicos constituíam um dos poucos meios de publicitar a compra e venda ou prestação de serviços, os leitores diários, sem o querer e sem conhecer o anunciante, estabeleciam uma relação de proximidade. Ou seja, pela insistência propagandística, se, por um lado, se deixava de ler a mensagem, por outro, ela ficava gravada na nossa memória e era como se fizesse parte da nossa parte.
A primeira vez que o conheci pessoalmente foi há cerca de uma vintena de anos. Entrou-me pela porta da loja dentro. Afirmando ser natural da praia da claridade e que estava a residir na Baixa, apresentando-se e ao mesmo tempo que interrogava, disse: “chamo-me Manuel dos Reis, sou afinador de pianos. Não precisará o senhor dos meus serviços?”. Foi então que o relacionei com o anúncio no DC. Olhei para ele, como se faz quando falamos com alguém pela primeira vez, e vi um homem praticamente invisual, que não enxergava quase nada. Pensei para mim que se ele não via como podia afinar e reparar os martelos de ressonância? Nessa altura, por acaso, tinha um velho piano francês, armado em madeira, encostado e avancei para afinação ali mesmo. Então, nos dias seguintes, assisti à maior surpresa da minha vida. Com umas lentes grossíssimas e mal amanhadas –que lhe conferiam um aspeto de professor Pardal, da banda desenhada- este velho afinador fazia milagres. Com o tato, às apalpadelas, com uma mestria inigualável, ele reparava qualquer batente mesmo desmantelado. No final da operação vinha então a afinação. Com um ouvido musical invulgar, ele não necessitava de nenhum acessório digital. Enquanto morou por cá, pela cidade, ainda me reparou mais alguns. Depois regressou à terra do mar e só de vez em quando me visitava. Sempre foi marcante o sublinhado que empregava nas palavras, na sua inesquecível retribuição de cumprimento: “vou muito bem, senhor Luís! Vivo encantado!”


Há dias encontrei-o, sentado num banco, na Praça do Comércio. Sozinho, de olhos postos sabe-se lá onde e, se calhar, embrenhado numa vida que não viveu, abandonado como sós ficam os velhos, como se de trapo sem prestabilidade se tratasse. Sem levar em conta o seu passado tão rico em sabedoria experiencial. Como todos temos uma história para narrar, convidei-o a contar a sua. Vamos ouvir. Senhoras e senhores, na primeira pessoa, Manuel da Conceição dos Reis:
“Corria o ano de1932 quando nasci na Cova, Gala, Figueira da Foz. O meu pai era pescador de bacalhau e a minha mãe estava em casa a cuidar de mim e a rezar para que o Criador o trouxesse de volta, em bom regresso e são e salvo. Apesar do berço pobre em que cresci os meus pais sempre quiseram o melhor para o meu futuro. Deveria ter pesado o facto de, com cerca de 5 anos, ter ficado quase sem ver a pouco mais de um palmo do nariz. Assim que terminei a 4ª. Classe concorri ao exame de admissão e fui para o Conservatório de Música do Porto. Durante sete anos aquela escola foi a minha primeira e segunda casas. Com cerca de 18 anos regressei à Figueira e fui tocar piano para o Lagosta Vermelha –era um cabaret, uma espécie de casa de alterne, como se diz agora. O dono era o Joaquim Pereira da Silva, que era despachante oficial da Alfândega. Estive lá a trabalhar à volta de 9 anos. Havia lá umas sete mulheres –e que mulheres, senhor Luís?!- que serviam ao balcão e à mesa. Sempre a seguir a carreira musical, fiz parte de sete agrupamentos de música ligeira. Um deles era internacional, o Musisom. Corremos a França toda a tocar para os emigrantes.
Depois, já cansado daquela vida de jogral, não me lembro bem em que ano, talvez na década de 1970 ou 1980, sei lá!, comecei a apostar na afinação de pianos. Coloquei um anúncio no mais antigo diário da cidade e, aos poucos, comecei a ser solicitado por particulares, por conservatórios –durante mais de 30 anos fiz serviço no Conservatório de Castelo Branco e da Covilhã. No Casino da Figueira, antigo Peninsular, fui responsável pelos acordes também durante três décadas e cheguei a tocar lá com o conjunto residente. Era no tempo em que o piano era o rei. Veja que o Conservatório de Castelo Branco tinha 16; o da Covilhã 15; e o Casino Peninsular tinha 6 ao seu serviço –aqui, lembro-me, sempre que o Carlos Paião lá ia tocar, antes, tinha de ir lá verificar se o piano estava afinado. Trabalhei para muitos artistas de nomeada; para o Shegundo Galarza, para o maestro Vitorino de Almeida e para a Maria João Pires, de Castelo Branco. Sem margem para dúvida, esta senhora é a maior pianista do País.


Sou solteiro e bom rapaz. Nunca tive apetência para casar –até confesso, nunca amei verdadeiramente uma mulher. Nunca me atirei a um grande amor. Também nunca vi um interesse por aí além de nenhuma delas. Certamente pesou muito o facto de eu ser quase cego; é uma doença hereditária. Esta anomalia condicionou para sempre a minha vida. Mas agora pensando nisso, tenho a certeza, o que pesou mais foi o facto de eu ganhar pouco. Achava que o que eu auferia não chegava para a sobrevivência de duas pessoas. Comecei a vislumbrar o futuro e achei que o piano, enquanto instrumento de grande porte e símbolo de novo-riquismo, tinha os dias contados. Eu sempre gostei da solidão. Sinto-me bem só. Geralmente todos os artistas são assim. Dou-me bem, talvez, porque sou cem por cento autónomo.
Há uns meses saí da minha terra, a Figueira, por dificuldades económicas. Agora vivo numa pensão da Baixa de Coimbra. Tenho uma reforma baixita. Recebo 256,39 €. Pago 135 € na pensão e vou comer à Cozinha Económica. O que sobra é para a lavagem da roupa e para uma buchita e um copo… nem só de pão vive o homem! É pouco, bem sei! Merecia melhor sorte, não é o que está a pensar? Claro que do alto dos meus 81 anos considero-me injustamente tratado, mas se tem de ser assim, o que se há-de fazer? Uma pessoa tem de se resignar. Apesar disso não me sinto revoltado. Contento-me com o que tenho. A política não me interessa; a política é para os políticos. Eu sou músico. A música é o meu mundo! Quando morrer só levo a música comigo. De bens materiais tenho apenas as roupas que visto e uma mala de ferramentas. Absolutamente mais nada! Quando partir para a grande viagem sigo feliz. Se nasci sem nada porque haveria de sair de outro modo?”


UM SAXOFONISTA NA VARANDA

 O som harmónico e melodioso ecoava em toda a Praça do Comércio nesta manhã de quarta-feira. Quem passava, sem parar, olhava para o segundo andar do prédio onde durante mais de uma década funcionou o Milennium BCP e pensava para si mesmo que seria mais um estudante maluco, talvez músico frustrado, a tentar mostrar os seus dotes artísticos. A verdade é que o instrumentista, para além de ser um reconhecido músico na cidade e até na Europa, era mesmo bom. Tratava-se da performance do António Alves, professor do Conservatório de Música de Coimbra e membro do Quarteto de Saxofones de Coimbra, Sax Ensemble. E o facto da elevada qualidade musical, inevitavelmente, fazia parar o mais apressado. “Mas o que é isto?” –parecíamos todos interrogar em coro. Quem vai responder à questão colocada é o Bruno Cortesão, um “cara” nosso conhecido aqui dos becos e ruelas da Baixa da cidade:


“Este espetáculo insere-se na apresentação pública à Baixa de Coimbra da nossa firma Bettertech –dedica-se à criação e desenvolvimento de software profissional. Abrimos estas nossas novas instalações nesta última segunda-feira aqui, no antigo prédio do BCP. Esta singular forma de exibição constitui a nossa maneira de nos mostrarmos e, de motu proprio, darmos a nós mesmos as boas vindas. Para, através da maior linguagem universal que é a música, apelarmos à sorte e à boa aventurança. Para além disso é também nossa intenção, de um modo invulgar, ajudar a dinamizar este Centro Histórico.
Até agora sediados na Avenida Fernão de Magalhães, somos uma empresa tecnológica cem por cento portuguesa. Neste edifício trabalham 35 pessoas. Sem falsa modéstia, somos uma das melhores firmas de software do país. Temos já representação na Europa, em Espanha e no Reino Unido, e na América, no Chile, no Brasil e no México.
Aproveitando para dar os nossos mais humildes cumprimentos a todos os frequentadores da Baixa de Coimbra, comerciantes, prestadores de serviços, moradores e visitantes, convidamos todos a assistir aqui, na nossa varanda, à atuação do Sax Ensemble, hoje, sexta-feira, dia 25.”


REFLEXÃO: QUO VADIS MACHADO?

 Esta semana, numa entrevista ao Jornal Público, Manuel Machado, o regressado presidente eleito e empossado na Câmara Municipal, afirmava -pressentindo-se com vincado orgulho- ter sido o responsável pela pedonalização das Ruas Ferreira Borges e Visconde da Luz nas décadas de 1990. Já o escrevi várias vezes, se para a solução criada nessa altura nada há a apontar –já que a densidade populacional de pessoas era elevada-, hoje, constatando-se uma sentida desertificação de transeuntes nestas artérias, a continuar a tomar esse alegado remédio com vinte anos, pelo prazo de validade expirado, se não houver reflexão, pode contribuir para a  morte de quem cá está e tenta resistir. Pelas declarações ufanas dá a parecer que o novo presidente não está aberto a alterações ao passado e a novas soluções emergentes.
Com este regresso, uma vez que Machado conhece bem a casa e as maleitas da Baixa, os comerciantes, muitos deles agonizantes, geraram expectativas –esperando não serem goradas. Anseiam por uma nova postura democrática para a discussão dos problemas que os afligem. Uma das maiores barreiras sentidas nos últimos 25 anos foi o autismo, a falta de diálogo, o esquecimento a que foram sistematicamente votados. Foi sempre o “quero, posso e mando”. Sem escutar quem cá trabalha, reside e sofre. Se até aqui, em pró-forma, se fazia de conta que se ouvia a associação representativa de classe, agora, esta desapareceu, morreu, e os comerciantes estão entregues ao devir. Por isso mesmo, apela-se ao bom senso deste novo executivo. Se assim não for adivinha-se o resultado: os lojistas vão continuar a ser carne para canhão na frente de combate à crise.


quinta-feira, 24 de outubro de 2013

O BARCO FORA DO MAR



O BARCO FORA DO MAR


Ó barco ancorado no jardim,
a  ti que a estrada separa do mar,
diz-me, por favor, conta para mim,
sendo mareante, porque foste aí parar?
Aportaste aí renegado pelo oceano?
O Homem fez de ti um mostrengo?
Foste discriminado como um cigano,
calculo, que não sabe bailar flamengo;
Tens em frente o sinal obrigatório,
a indicar-te a direcção do asfalto,
como se alguém num directório
decidisse o teu destino sem sobressalto;
Qualquer um sentencia o nosso futuro,
sem olhar que causa tanto sofrimento,
é como o manto à tua frente, escuro,
que te faz morrer de desalento;
Não te importes meu barquinho,
tens para mim todo o valor,
olho para ti com todo o carinho,
junto, com os olhos do meu amor;
Sei que estás muito sozinho
como um velho abandonado
que daria tudo por um carinho,
num beijo e um abraço agrilhoado.


UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE...




Paulo F deixou um novo comentário na sua mensagem "UM SAXOFONISTA NA VARANDA":


Ontem voltámos a ter a visita do Professor António Alves.

Amanhã dia 25, pelas 18h00, prometem regressar todos os elementos do Quarteto de Saxofones de Coimbra, Sax Ensemble. Vamos ter um excelente fim de tarde!!

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

EDITORIAL: QUO VADIS MACHADO?




Esta semana, numa entrevista ao Jornal Público, Manuel Machado, o regressado presidente eleito e empossado na Câmara Municipal, afirmava -pressentindo-se com vincado orgulho- ter sido o responsável pela pedonalização das Ruas Ferreira Borges e Visconde da Luz nas décadas de 1990. Já o escrevi várias vezes, se para a solução criada nessa altura nada há a apontar –já que a densidade populacional de transeuntes era elevada-, hoje, constatando-se uma sentida desertificação de pessoas nestas artérias, a continuar a tomar esse alegado remédio com vinte anos, pelo prazo de validade expirado, se não houver reflexão, pode contribuir para a  morte de quem cá está e tenta resistir. Pelas declarações ufanas dá a parecer que o novo presidente não está aberto a alterações ao passado e a novas soluções emergentes.
Com este regresso, uma vez que Machado conhece bem a casa e as maleitas da Baixa, os comerciantes, muitos deles agonizantes, geraram expectativas –esperando não serem goradas. Anseiam por uma nova postura democrática para a discussão dos problemas que os afligem. Uma das maiores barreiras sentidas nos últimos 25 anos foi o autismo, a falta de diálogo, o esquecimento a que foram sistematicamente votados. Foi sempre o “quero, posso e mando”. Sem escutar quem cá trabalha, reside e sofre. Se até aqui, em pró-forma, se fazia de conta que se ouvia a associação representativa de classe, agora, esta desapareceu, morreu, e os comerciantes estão entregues ao devir. Por isso mesmo, apela-se ao bom senso deste novo executivo. Se assim não for adivinha-se o resultado: os lojistas vão continuar a ser carne para canhão na frente de combate à crise.

UM SAXOFONISTA NA VARANDA


O som harmónico e melodioso ecoava em toda a Praça do Comércio nesta manhã de quarta-feira. Quem passava, sem parar, olhava para o segundo andar do prédio onde durante mais de uma década funcionou o Milennium BCP e pensava para si mesmo que seria mais um estudante maluco, talvez músico frustrado, a tentar mostrar os seus dotes artísticos. A verdade é que o instrumentista, para além de ser um reconhecido músico na cidade e até na Europa, era mesmo bom. Tratava-se da performance do António Alves, professor do Conservatório de Música de Coimbra e membro do Quarteto de Saxofones de Coimbra, Sax Ensemble. E o facto da elevada qualidade musical, inevitavelmente, fazia parar o mais apressado. “Mas o que é isto?” –parecíamos todos interrogar em coro. Quem vai responder à questão colocada é o Bruno Cortesão, um “cara” nosso conhecido aqui dos becos e ruelas da Baixa da cidade:
“Este espectáculo insere-se na apresentação pública à Baixa de Coimbra da nossa firma Bettertech –dedica-se à criação e desenvolvimento de software profissional. Abrimos estas nossas novas instalações nesta última segunda-feira aqui, no antigo prédio do BCP. Esta singular forma de exibição constitui a nossa maneira de nos mostrarmos e, de motu proprio, darmos a nós mesmos as boas vindas. Para, através da maior linguagem universal que é a música, apelarmos à sorte e à boa aventurança. Para além disso é também nossa intenção, de um modo invulgar, ajudar a dinamizar este Centro Histórico.
Até agora sediados na Avenida Fernão de Magalhães, somos uma empresa tecnológica cem por cento portuguesa. Neste edifício trabalham 35 pessoas. Sem falsa modéstia, somos uma das melhores firmas de software do país. Temos já representação na Europa, em Espanha e no Reino Unido, e na América, no Chile, no Brasil e no México.
Aproveitando para dar os nossos mais humildes cumprimentos a todos os frequentadores da Baixa de Coimbra, comerciantes, prestadores de serviços, moradores e visitantes, convidamos todos a assistir aqui, na nossa varanda, à actuação do Sax Ensemble na próxima sexta-feira, dia 25.”

terça-feira, 22 de outubro de 2013

O AFINADOR DE PIANOS


 Quando dei conta da sua existência, recordo bem, teria sido há cerca de vinte e cinco anos quando, todos os dias, batia com os olhos no seu anúncio nos classificados do Diário de Coimbra (DC): “Afinador de pianos, Manuel dos Reis, Figueira da Foz”. Noutros tempos, quando os periódicos constituíam um dos poucos meios de publicitar a compra e venda ou prestação de serviços, os leitores diários, sem o querer e sem conhecer o anunciante, estabeleciam uma relação de proximidade. Ou seja, pela insistência propagandística, se, por um lado, deixávamos de ler a mensagem, por outro, ela ficava gravada na nossa memória e era como se fizesse parte da nossa parte.
A primeira vez que o conheci pessoalmente foi há cerca de uma vintena de anos. Entrou-me pela porta da loja dentro. Afirmando ser natural da praia da claridade e que estava a residir na Baixa, apresentando-se e ao mesmo tempo que interrogava, disse: “chamo-me Manuel dos Reis, sou afinador de pianos. Não precisará o senhor dos meus serviços?”. Foi então que o relacionei com o anúncio no DC. Olhei para ele, como se faz quando falamos com alguém pela primeira vez, e vi um homem praticamente invisual, que não enxergava quase nada. Pensei para mim que se ele não via como podia afinar e reparar os martelos de ressonância? Nessa altura, por acaso, tinha um velho piano francês, armado em madeira, encostado e avancei para afinação ali mesmo. Então, nos dias seguintes, assisti à maior surpresa da minha vida. Com umas lentes grossíssimas e mal amanhadas –que lhe dava um aspecto de professor Pardal, da banda desenhada- este velho afinador fazia milagres. Com o tacto, às apalpadelas, com uma mestria inigualável, ele reparava qualquer batente mesmo desmantelado. No final da operação vinha então a afinação. Com um ouvido musical invulgar, ele não necessitava de nenhum acessório digital. Enquanto morou por cá, pela cidade, ainda me reparou mais alguns. Depois regressou à terra do mar e só de vez em quando me visitava. Sempre foi marcante o sublinhado que empregava nas palavras, na sua inesquecível retribuição de cumprimento: “vou muito bem, senhor Luís! Vivo encantado!”
Há dias encontrei-o, sentado num banco, na Praça do Comércio. Sozinho, de olhos postos sabe-se lá onde e, se calhar, embrenhado numa vida que não viveu, abandonado como sós ficam os velhos, como se de trapo sem prestabilidade se tratasse. Sem levar em conta o seu passado tão rico em sabedoria experiencial. Como todos temos uma história para narrar, convidei-o a contar a sua. Vamos ouvir. Senhoras e senhores, na primeira pessoa, Manuel da Conceição dos Reis:
“Corria o ano de1932 quando nasci na Cova, Gala, Figueira da Foz. O meu pai era pescador de bacalhau e a minha mãe estava em casa a cuidar de mim e a rezar para que o Criador o trouxesse de volta, em bom regresso e são e salvo. Apesar do berço pobre em que cresci os meus pais sempre quiseram o melhor para o meu futuro. Deveria ter pesado o facto de, com cerca de 5 anos, ter ficado quase sem ver a pouco mais de um palmo do nariz. Assim que terminei a 4ª. Classe concorri ao exame de admissão e fui para o Conservatório de Música do Porto. Durante sete anos aquela escola foi a minha primeira e segunda casas. Com cerca de 18 anos regressei à Figueira e fui tocar piano para o Lagosta Vermelha –era um cabaret, uma espécie de casa de alterne, como se diz agora. O dono era o Joaquim Pereira da Silva, que era despachante oficial da Alfândega. Estive lá a trabalhar à volta de 9 anos. Havia lá umas sete mulheres –e que mulheres, senhor Luís?!- que serviam ao balcão e à mesa. Sempre a seguir a carreira musical, fiz parte de sete agrupamentos de música ligeira. Um deles era internacional, o Musisom. Corremos a França toda a tocar para os emigrantes.
Depois, já cansado daquela vida de jogral, não me lembro bem em que ano, talvez na década de 1970 ou 1980, sei lá!, comecei a apostar na afinação de pianos. Coloquei um anúncio no mais antigo diário da cidade e, aos poucos, comecei a ser solicitado por particulares, por conservatórios –durante mais de 30 anos fiz serviço no Conservatório de Castelo Branco e da Covilhã. No Casino da Figueira, antigo Peninsular, fui responsável pelos acordes também durante três décadas e cheguei a tocar lá com o conjunto residente. Era no tempo em que o piano era o rei. Veja que o Conservatório de Castelo Branco tinha 16; o da Covilhã 15; e o Casino Peninsular tinha 6 ao seu serviço –aqui, lembro-me, sempre que o Carlos Paião lá ia tocar, antes, tinha de ir lá verificar se o piano estava afinado. Trabalhei para muitos artistas de nomeada; para o Shegundo Galarza, para o maestro Vitorino de Almeida e para a Maria João Pires, de Castelo Branco. Sem margem para dúvida, esta senhora é a maior pianista do País.
Sou solteiro e bom rapaz. Nunca tive apetência para casar –até confesso, nunca amei verdadeiramente uma mulher. Nunca me atirei a um grande amor. Também nunca vi um interesse por aí além de nenhuma delas. Certamente pesou muito o facto de eu ser quase cego; é uma doença hereditária. Esta anomalia condicionou para sempre a minha vida. Mas agora pensando nisso, tenho a certeza, o que pesou mais foi o facto de eu ganhar pouco. Achava que o que eu auferia não chegava para a sobrevivência de duas pessoas. Comecei a vislumbrar o futuro e achei que o piano, enquanto instrumento de grande porte e símbolo de novo-riquismo, tinha os dias contados. Eu sempre gostei da solidão. Sinto-me bem só. Geralmente todos os artistas são assim. Dou-me bem, talvez, porque sou cem por cento autónomo.
Há uns meses saí da minha terra, a Figueira, por dificuldades económicas. Agora vivo numa pensão da Baixa de Coimbra. Tenho uma reforma baixita. Recebo 256,39 €. Pago 135 € na pensão e vou comer à Cozinha Económica. O que sobra é para a lavagem da roupa e para uma buchita e um copo… nem só de pão vive o homem! É pouco, bem sei! Merecia melhor sorte, não é o que está a pensar? Claro que do alto dos meus 81 anos considero-me injustamente tratado, mas se tem de ser assim, o que se há-de fazer? Uma pessoa tem de se resignar. Apesar disso não me sinto revoltado. Contento-me com o que tenho. A política não me interessa; a política é para os políticos. Eu sou músico. A música é o meu mundo! Quando morrer só levo a música comigo. De bens materiais tenho apenas as roupas que visto e uma mala de ferramentas. Absolutamente mais nada! Quando partir para a grande viagem sigo feliz. Se nasci sem nada porque haveria de sair de outro modo?”


BOA TARDE, PESSOAL...

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

POR TRÊS PLANTAS DE CANNABIS

(IMAGEM DA WEB)


(Retirado do Facebook, da página da PSP)



“APREENSÃO DE PLANTAS CANNABIS”

No dia 17 de outubro de 2013, pelas 11H20, esta PSP foi informada, de que na zona da Sé Velha- Coimbra, num imóvel alugado a estudantes universitários, se encontrava um residente, que se dedica ao cultivo de plantas de Haxixe.

Face à informação, elementos desta Policia deslocaram-se ao local, para verificar a veracidade dos factos. No local foi contactado o proprietário do referido imóvel, tendo o mesmo facilitado o acesso à residência. Já no interior os agentes verificaram, que na entrada se encontravam 3 plantas, que os mesmos identificaram como podendo ser “Cannabis”, questionado sobre a existência das mesmas, o mesmo afirmou que as referidas plantas, eram propriedade de um inquilino, estudante.

As referidas plantas foram apreendidas."

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O meu comentário sobre este assunto e apresentado em resposta:


 Companheiro “P’lo Comando da PSP”, pelo que vou escrever, vou borrar a pintura toda. Em minha opinião esta acção policial é um absurdo e digno de uma Estado de ficção. Saliento que não atribuo culpas aos agentes da PSP, que se limitam a cumprir a lei –dizia Cícero que “ Lei é a mãe de todas as virtudes”. Já agora convém explicar o significado de “virtude”, que é uma propensão, uma inclinação, para a prática do bem.
Então depois de conceituar Lei e Virtude já podemos avaliar se, aparentemente partindo de uma chamada anónima –o paradigma da cobardia e um procedimento tão condenável no Estado Novo por estes políticos hodiernos-, cumprindo uma lei sem virtude, que não visa a formação pública mas uma moral hipócrita para entreter as massas, estará correcto utilizar uma viatura policial, 3 agentes da autoridade e o Ministério Público e mais uma série de perdas de tempo para o respectivo processo de inquérito? Tudo isto por três plantas de Cannabis. Repito: três plantas de Cannabis! Repare que a imprensa diária refere constantemente a falta de meios da PSP para fazer face ao crime “organizado”, como assaltos a particulares e à propriedade.
Pode até o amigo “p´lo Comando da PSP” pensar que sou um patrocinador acérrimo da liberalização das drogas leves, nada disso. O que defendo é que, a bem da sociedade, é urgente levantar este véu de moral duvidosa e, em ponderação séria, avaliar os danos. Sobretudo sobre a acção dos políticos que nos têm governado nas últimas décadas e que, pela via legislativa, fazem uso em proveito próprio para atingir fins eleitoralistas, e pior, para manipular um povo estúpido e ignorante que não vislumbra o Sol através da peneira. Repare o amigo o que se tem feito nas duas últimas décadas, como, por exemplo, a liberalização do aborto, que, a meu ver, é uma das medidas mais prejudiciais à comunidade. E, sem peias, avançou-se para a liberalização, mesmo sabendo os efeitos nefastos que, juntamente com outros agravos, estão a causar a decrescência colectiva de um povo de nove séculos.
Pode até pensar o amigo “p´lo Comando da PSP” que defendo uma clareza legislativa para esta questão por ser consumidor, nada de mais errado. Nunca ensaiei nem consumi –mas não hei-de morrer estúpido, um dia destes, não sei quando, irei experimentar.
Em suma, meu caro, é uma tristeza constatar uma acção destas. Quando se pratica uma lei iníqua, injusta, que não procura alcançar um equilíbrio entre o bem e o mal, o resultado pode ser simplesmente catastrófico, gerando cidadãos desequilibrados –sem capacidade de os distinguir- desajustados de uma sociedade harmónica e, contrariamente ao bem virtude, propensos ao conflito, à anarquia, e ao crime.
Desculpe este desabafo. Muito obrigado.





sábado, 19 de outubro de 2013

AI OS HOMENS!



AI OS HOMENS!


“A receberes mensagens a esta hora?!?
Naah! Anda aí passarinho no beiral,
confessa! Quem anda por aí agora?
Sabes que te amo, não te quero mal,
gosto tanto de ti, minha amora,
só quero a tua felicidade total,
atenção a quem diz que nos adora,
sabes, o homem vive da mentira viral,
nunca acredites em nenhum que não namora,
são falsos como Judas, o traidor, o tal,
se algum te der flores, manda-o embora,
então se te oferecer um poema é fatal,
apenas busca o teu corpo, sem demora,
vive dentro do nosso coração, o chacal,
é um predador que só desflora,
é calculista, continua como sempre foi, igual,
só nos faz mal, a gente sofre e chora,
tem muito cuidado, olha a moral,
o que dirão os teus vizinhos dessa tua aurora?
E os teus amigos chegados? Serás boçal!
É todo um passado que se deteriora,
e quando fores à missa? Ai, vai ser brutal!
Até o senhor padre não perdoa, não desvalora,
mantém-te sozinha! Afasta-te dos homens, MÃE!”

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

LEIA O DESPERTAR...



Para além  do texto "A RUA DO VOLTA ATRÁS", deixo também as crónicas "SOMBRAS DE NÓS NA CIDADE"; e "REFLEXÃO: A ACIC EM CÂMARA ARDENTE".



A RUA DO VOLTA ATRÁS

 Durante a tarde do último sábado começaram a ser montados andaimes para restauro da fachada de um prédio, onde funcionou, durante décadas, uma das várias lojas Valise, na Rua Eduardo Coelho e à entrada da Rua das Padeiras. Salienta-se que a largura desta artéria é de cerca de dois metros e meio. A estrutura de ferro ocupou sensivelmente metade da via pedonal estreita. Convém salientar também que, pelo conhecimento que se tem, até agora e sempre que era necessário edificar estes pontos de apoio, era recorrente o requerente erguer uma plataforma em madeira assente em quatro barrotes, de modo a ficar um túnel e o acesso aos prédios e lojas confinantes não ser lesado. Os andaimes eram erguidos em cima do madeiramento e a partir do primeiro andar. Com esta medida, procurava-se criar o menos impacto visual negativo nos estabelecimentos para não prejudicar ninguém.
Francisco Veiga, reputado comerciante na antiga Rua dos Sapateiros e com loja de pronto-a-vestir quase em frente a estas obras, não se conforma. “Bolas, eu não gosto de empatar a vida a ninguém, mas exijo que haja um mínimo de respeito pelos meus interesses e, neste caso, também a salvaguarda dos meus colegas. Até agora, nestas passagens estranguladas, estas estruturas sempre foram edificadas em cima de uma outra em madeira. Por que razão a Câmara Municipal autorizou desta forma? Está de ver que, como está, está mal! Prejudica a circulação na rua, que por si só já é apertada. Fica mais estreita, dificultando a passagem de peões, e, acima de tudo pela visão mastodôntica, gera uma sensação de medo. As pessoas que vêm da Praça 8 de Maio chegam aqui e, perante a imagem, cortam imediatamente para a Rua das Padeiras. Se até aqui já havia poucos transeuntes agora ficamos muito pior. Eles, os pedreiros, dizem que têm licença. Não contesto a sua ação. Nada me move contra estas pessoas, antes pelo contrário. Até os admiro por estarem a fazer obras nesta altura. O que contesto é o licenciamento por parte da edilidade. Parece que quem cá está não conta, não tem interesses e uma vida difícil para aguentar. Além disso, aqui sempre passou um carro do lixo agora já não dá. Se houver um fogo, ou se for preciso uma ambulância, os carros não podem passar. Numa obra, por muito necessária que seja, tem sempre de haver o cuidado de harmonizar os interesses de todos os envolvidos. Os fins não podem ser atingidos por quaisquer meios.”
A loja Belíssima está mesmo em frente ao tapume. Rosa Maria, a lojista, um pouco conformada, lá vai dizendo: “prejudica muito. Tira a visibilidade e as pessoas deixam de passar por aqui e cortam para a Rua das Padeiras. Bem sei que temos, todos, de ter calma, mas as obras não podem ser feitas de qualquer maneira. O aspeto visual da rua é muito importante. Quem vem de Santa Cruz chega aqui, vê este monstro, e, como se imaginasse uma placa de stop, vira para a direita. Isto é mais um agravo, sobretudo numa altura em que precisamos de ajuda. Para além disso estorva a circulação. Por exemplo, ainda ontem reparei que um homem teve de transportar às costas uma série de encomendas.”

E O QUE DIZ O RESPONSÁVEL?



 Contactei o responsável pela obra. Depois de me identificar como colaborador do jornal O Despertar e procurando ouvir a sua versão, dando-lhe nota do descontentamento que a montagem desta estrutura em ferro estava a provocar nos lojistas vizinhos, sem disfarçar alguma má vontade, a mostrar que o problema reside no mensageiro, porque divulga os queixumes, este é que deve apanhar por tabela. Sem dar o nome e mostrando algum azedume, lá foi dizendo: “Temos licença passada pela Câmara Municipal”. À pergunta de durante quanto tempo iria estar a rua impedida respondeu: “Não se sabe quando termina. Depende do tempo. Vá lá à Câmara e pergunte. Ou então fale com Santo António ou São Pedro e eles lhe dizem!”


SOMBRAS DE NÓS NA CIDADE

 Passam duas horas deste meio-dia do último Sábado. Caminho na Rua da Sofia, em direção à Caixa Geral de Depósitos, na Baixa da cidade. Acabei de almoçar ali bem próximo e dou a minha volta para remoer –o circuito de um tolo, como costumo dizer. É neste calcorrear pós-almoço e digestivo que, mais calmamente, tento aperceber-me do que me rodeia. Olho as montras das muitas lojas encerradas e leio as comunicações coladas nos vidros. Leio os obituários nas paredes –estou acabadito, está de ver. Só nos preocupamos com a morte de quem parte quando estamos na fila de espera. Com o meu olhar, meço, de cima a baixo, tudo o que me rodeia, um edifício ou até um passarinho, em busca de algo que me prenda a atenção e faça parar. Para quem se cruza comigo tento adivinhar um traço singular que me leve a fotografar.
Nesta caminhada, neste penúltimo dia de uma semana que está a exaurir, de repente, cruzei-me com a sombraafinal o que somos todos senão sombras? Será que não somos simplesmente projeções de um passado? Glorioso ou não, mas cheio de força, e que, pela decadência física, nos tornamos amostras recordativas em que apenas sobram as memórias atrofiadas e as carências em demasia. Num balanço de sobras, parece que o que fica é pouco. É como se fôssemos confrontados com o princípio de Lavoisier, que defendia que nada se perde tudo se transforma, e chegássemos à conclusão de que o pai da química moderna estava profundamente errado. Nestes tempos hodiernos, sobretudo na velhice, tudo se perde nada se recupera.
A sombra que se cruzou comigo -vou chamar-lhe assim, primeiro, porque não sei o seu nome; segundo, porque, pela pose emproada, pelo que se conta, é mesmo uma silhueta do que foi. Há muitos anos que me cruzo com este homem na cidade, sobretudo na zona da Estação Velha, nos Campos do Bolhão. Sempre me despertou um sentimento de curiosidade: alto, de média compleição, cãs prateadas, a descaírem sobre os ombros, e passo cadenciado sobre o asfalto, como se fugisse de alguém, ou de si mesmo, de um passado que lhe pesa bestialmente. Embora de aspeto pouco cuidado e cabelos desgrenhados, sempre lhe reconheci um aparente porte altivo e orgulhoso. Uma aura aristocrática. Alguém que, provavelmente, será oriundo de famílias abastadas. Já li, não sei onde, que será herdeiro de uma grande fortuna no Baixo-Mondego, com casas de renda em que, para quem lhe pagou em cheque nunca os teria apresentado a desconto no banco. Segundo o que entendi, será um eremita dos tempos modernos. Terá esta narração fundamentação e um mínimo de verdade? Não sei! O que sei é que a sombra passou por mim e o seu estado andrajoso, de calçado e roupas rotas e miseráveis, impressionou-me. Será que está monitorizado pela Segurança Social? Será que está a ser acompanhado? São questões que, para já, ficam sem resposta.
Continuei a caminhar em direção à Praça 8 de Maio. Um homem completamente embriagado, ainda novo, quase choca de frente comigo. Junto à Pastelaria Palmeira um indigente estendido no chão, costumeiro no poiso, com a mão em concha e no meio de uma lengalenga, pede uma moeda. Junto à Câmara Municipal, como já é hábito, duas miúdas pedem também para a uma reconhecida obra social. Em frente à Igreja de Santa Cruz os cromos do costume tentam vender o Borda de Água aos poucos transeuntes que vagueiam na Baixa a esta hora.
Prossigo. Entro nas ruas largas da calçada. Sou invadido pelo silêncio sepulcral que me rodeia. Nem um músico de rua quebra a quietude do vazio. Dou por mim a pensar que, talvez pela partida forçada do Paolo Vasil o nosso simpático acordeonista romeno que abandonou Coimbra e regressou à sua terra, estas artérias, em solidariedade, ficaram de luto.


Junto ao Café Nicola é saliente, pela negativa invasora de um cenário que deveria ser harmonioso, uma tenda de um dos vendedores que habituais e diariamente têm lugar certo na Praça do Comércio. Continuo. Em frente ao Museu Municipal do Chiado mais outra barraca a fazer lembrar Marrocos. Ao lado mais três sombras humanas; dois posam para a fotografia a troco de uma moeda e um terceiro bate uma soneca, certamente cansado deste mundo cheio de traços, riscos e rabiscos, e futilidades.
Dou a volta pelo Largo da Portagem e verifico que aqui é outro planeta. As esplanadas estão cheias apesar do tempo climático não estar para grandes festarolas. Desço as Escadas do Gato, Rua de Sargento-mor e entro na Praça do Comércio. Como sempre o espaço histórico está repleto de automóveis estacionados em redor do pelourinho e mais além. Penso para mim que não vale a pena bater no ceguinho; esta praça, segundo alguns pensadores, dá um excelente parque de estacionamento. Não convencido mas vencido pelas minoritárias forças da utilidade automobilística, fico na minha. É assim uma espécie de braço de ferro entre a conservação histórica e a modernidade futurista. Naturalmente que perde a primeira.


Está explicada a razão dos vendedores de artesanato serem transferidos para as ruas de cima, é que está a decorrer no largo uma exposição de espantalhos –ou analogamente sombras dos humanos? Reparo que há pouca gente a visionar a exposição –uma belíssima mostra, diga-se a propósito. Tanta entrega para tão pouco reconhecimento público, penso para mim. Empregando alguma sátira social e política as várias entidades presentes tentaram dar humor aos bonecos, às sombras de nós. Vou-me embora, vou partir na sombra do dia.



REFLEXÃO: A ACIC EM CÂMARA ARDENTE



 No dia 9, deste mês de Cristo, depois de um pedido na instância judicial, pelo Tribunal Judicial de Coimbra foi decretada a Insolvência da ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra. Esta vetusta agremiação celebra no próximo dezembro 150 anos. Ou seja, não é uma coletividade qualquer na cidade. Talvez por isso se estranhe a passividade e o silêncio de todos; da imprensa local, dos associados e da atual direção –por parte desta ainda surpreende mais o facto de no dia 12, três dias depois da declaração judicial, ser publicado no Diário de Coimbra um anúncio de convocatória, cuja ordem de trabalhos era: “Ponto umApreciação, discussão e votação do Relatório e Contas da Direção Geral relativos à gerência de 2012 e do Parecer do Conselho Fiscal. Ponto dois Outros assuntos de interesse geral.” Mas há ainda outras surpresas. Quando a ACIC está em câmara ardente, surge uma nova associação liderada por Pina Prata, ex-presidente daquela corporação.
Pertenci à direção desta coletividade entre 1998 e 2003. Conto em próximas edições escrever sobre o que lá constatei e apreendi na última década.