terça-feira, 31 de dezembro de 2013

sábado, 28 de dezembro de 2013

CONVITE DOS BOMBEIROS





Caros Sócios e Amigos:

Vimos renovar o convite para participarem na sessão de tomada de posse dos novos órgãos sociais desta Associação Humanitária que terá lugar nas nossas instalações no próximo domingo, dia 29 de Dezembro, pelas 17,45 horas.
A Vossa presença é imprescindível!

João Silva
Presidente da Direcção da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Coimbra

124 ANOS DE SERVIÇO E DEDICAÇÃO!

BOM DIA, PESSOAL...

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

BOM DIA, PESSOAL...

´DE FACTO, PENSANDO BEM....

UM TEXTO LONGO... MAS VALE A PENA!

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



(RECEBIDO POR E-MAIL 
-OS SUBTÍTULOS SÃO DA MINHA RESPONSABILIDADE)

Introdução ao texto da Cruz Vermelha Internacional

Júlio Marques Mota

"Uma história paralela ao grande texto que foi publicado pela Cruz Vermelha
O quarto artigo da Série Falemos de Economia, Falemos então de Política, é um texto extenso, muito extenso mesmo e trata-se de excertos apenas. De excertos longos, é certo, mas de excertos, de um grande texto, seguramente. Um olhar de ternura e fraternidade sobre toda esta Europa em crise, neste caso, o olhar de milhares e milhares de voluntários a trabalhar para a Cruz Vermelha, voluntários que procuram ajudar os mais atingidos pela crise e com isso a ajudarem-se emocionalmente a si-mesmos mas com o drama de que as vítimas da crise são muitas, são mesmo muitos milhões. O olhar da Cruz Vermelha internacional sobre a Europa em crise. Um relatório que aqui em Portugal mal se ouviu falar. Boicote? Ignorância da nossa imprensa? Incapacidade dos nossos jornalistas estagiários, a menos de 800 euros mensais talvez, em pegarem num texto com esta profundidade? Pressão do poder instituído? Não sei, sei apenas que é um texto que todos nós devemos ler e nele meditar, um texto que é simultaneamente um apelo. Um apelo a que se pense diferente, a que se reaja diferentemente se quisermos sair da crise, um apelo portanto a que se saia do modelo que gerou a crise. Um texto que é simultaneamente uma crítica a tudo o que se tem feito, a convidar-nos a uma profunda reflexão a partir dos factos e das histórias pessoais aqui relatadas.
Um texto a publicar por partes e no fundo por temas, a Introdução em primeiro lugar, e depois por capítulos, pela “descrição” das grandes Tendências que se desenham na Europa e adicionalmente por dois capítulos mais:

1.        Primeira Grande Tendência- A pobreza está a aumentar, e os pobres estão a ficar ainda mais pobres.
2.        Segunda Grande Tendência- Os novos pobres na Europa
3.        Terceira Grande Tendência- Enfraquecimento na saúde – os cortes podem vir a saírem bem caros.
4.        Quarta Grande Tendência- O desemprego: dignidade e desespero.
5.        Aprender a lidar com a Crise
6.        Propostas da Cruz Vermelha Internacional.
Ainda o trabalho de tradução dos textos escolhidos não estava concluído, eis que telefona um grande amigo meu. Precisava de falar comigo. Tudo bem, combinei uma hora e esperei.
Trata-se de alguém que a roleta da crise atirou por terra, como aconteceu a tantos outros de que se fala neste relatório. Jovem na casa dos 30 anos, em tempos, há 4 anos ainda, tinha uma vida farta. Comerciante, gerente de duas empresas que facturavam bem, a mulher gerente igualmente de uma terceira que não facturava mal, era um homem que “fardava” e bem, à grande burguesia da cidade onde cresceu. As grandes marcas internacionais, de homem e senhora passavam-lhe pelos dedos, pelos olhos, pelas idas a exposições e pelas escolhas do seu mapa de vendas. A crise chegou e com uma loja em regime de franchising num dos grandes centros comerciais, tipo Colombo, centros que o capitalismo internacional arranjou para dar cabo do pequeno comércio e depois de o explorar até ao tutano, cuja administração estará no Luxemburgo, em Madrid ou em Amsterdão, com rendas de casa leoninas, negociadas caso a caso e de garantia bancária assegurada por 5 anos, este meu amigo sentiu a crise, sentiu que tinha que rapidamente se desfazer da loja, dos direitos e sobretudo das obrigações que esta acarretava. Inteligente, sentiu nas narinas os ventos terríveis da crise. Passou a firma à multinacional que o fornecia, pois estava em regime de franchising. Acordo? Bom, deixem-me explicar: a multinacional que o fornecia fica-lhe com toda a existência, de resto bancariamente já paga ou de pagamento garantido. A que preço, a preço de custo, certamente. Quando ele me contou este acordo deixei escapar um sorriso amargo. E disparei: quer isso dizer que se uma camisa custa ao cliente 110 euros mais IVA significa que ela te custou 60 euros à entrada da loja. Certo? Certo, respondeu-me. Mas quer isto dizer que a camisa saiu de outro lado, saiu do produtor, que neste caso é agora o comprador. Estás a seguir? Estou, estou, respondeu. Então o preço que te terá sido pago pelo actual comprador foi o custo que lhe saiu enquanto produtor e esse será, por exemplo 40 euros, uma redução de 33% (1/3). É mais ou menos isto, mas porque é que acha que necessariamente tinha que ser assim, pergunta-me com ar espantado. As narinas dilatavam-se-lhe a fazer-.me lembrar o meu cão perdigueiro, de nome foguete, felino que nem o diabo quando sentia a caça. Simples, pela teoria do valor. As mercadorias não têm um valor como essência, dito valor trabalho, têm um valor do mercado, um valor de venda estabelecido na circulação, na venda, mas é um valor do mercado em que se situam os operadores. Ora, neste caso um situa-se na esfera da produção, a multinacional, e o outro na esfera da circulação ou da venda a retalho, o meu amigo. Não há aqui um mercado, mas sim dois e haverá então dois valores diferentes para o mesmo produto. Qual é o preço que domina, qual é o preço que vai prevalecer? Necessariamente o que convém ao operador mais forte. Assimetria de operadores, impõe-se a lei do mais forte. Se fosses vender a existência a um empresário de venda a retalho venderias ao teu preço de custo, mercado em que tu e o teu comprador se situam. Mas neste caso, azar, estás a vender as peças de roupa a quem as produz. Porque é que ele te iria dar 60 euros se as pode produzir a 40? És capaz de me dizer? E assim perdeste por cada camisa já paga 20 euros, dados assim de bandeja à multinacional. Mas há mais acrescenta-me ele. Mais, o quê, questiono eu. Olhe, nas existências com mais de um ano e menos de 2 anos de presença na loja a regra era a mesma mas, depois de ter sido deduzido a margem de 33%, um desconto de saldo . Exemplo, a mesma camisa se com mais de um ano e menos de 2 anos, seria primeiramente avaliada a 60 euros menos 33% deste valor, ou seja avaliada a 40 euros. Achado este valor haveria agora a redução do produtor que por hipótese é de um terço e a camisa seria agora paga ao meu amigo por [40 – 40(1/3)], ou seja aproximadamente 27 euros! E já agora, as mercadorias com mais de dois anos? Que preço te foi imposto? Aí passei-me, uma vez que a resposta foi sibilina: não valeram nada. Entregues pura e simplesmente ao comprador da loja. Nem podia ficar com elas! Bom, no meu tempo de adolescente quando se ia às “putas” dizia-se que íamos ser esfolados como um cabrito. Não há dúvida, foste esfolado que nem um bode, meu Deus. E assim este meu amigo durante 4 a 5 anos esteve a fazer a casa para a multinacional ficar com ela, praticamente oferecida de bandeja, de borla. Um detalhe mais: a loja estava mobilada pela multinacional mas bem facturada a mobília para ser paga com o suor de português. Ninguém a este nível oferece seja o que for e seja a quem for. E com a mobília como foi? Eles não produzem mobília e então como foi? Aqui o meu amigo gaguejou. Bem, sabe, tinha quatro anos, quatro anos de amortizações, estava pois amortizado em 80 % do seu valor de factura, o valor que a multinacional me facturou. Então pagaram-me apenas o valor da instalação menos os 80 % desse valor como amortização, como quebra do valor comercial. Pagaram-te o valor contabilístico, nada mais a dizer. Confirmou-me que assim foi. Dei um salto da cadeira quando me contou, em tempos, esta história. 
Depois, foi a segunda loja, a mais importante, a fechar. Loja que eles tinham comprado e não arrendado, loja que estava garantida ao banco com uma hipoteca. Naturalmente assim, pois a aquisição do espaço tinha sido muito cara, dado que o sítio era muito bom e o espaço muito grande. O ciclo é pouco mais ou menos equivalente com algumas nuances. Mudam de local, para uma loja de renda mais barata: 3000 euros. Esperam arrendar a loja grande que largaram para mudar para esta mais pequena. A loja grande tinha sido comprada com crédito bancário. Apostaram na venda deste activo e pagariam depois à banca, a ficarem ainda com uns bons milhares. Mas o Diabo tinha entrado na vida dele e ele tinha sido lançado na espiral recessiva para a exclusão. Vendida em Maio, o seu comprador fica, por contrato, a pagar arrendamento durante 6 meses até arranjar crédito bancário e pagar a casa. Destes seis meses a comerciante compradora da casa só pagou um mês e ao fim de seis meses devolveu-lhe a casa. Sem lhe dar um cêntimo mais, sequer. Também tinha falido e bem antes de  não ter conseguido arranjar crédito. A contracção do crédito, o credit crunch, típico das crises tinha-lhes estoirado com o negócio. Depois tentaram vender a casa para uma clínica mas já não houve tempo, as mensalidades da hipoteca deixaram de ser pagas e o banco ficou com tudo o que restava.
E na crise, já completamente falidos, ele e a mulher, por causa das garantias recíprocas dadas aos bancos, largam a casa muito boa que tinham comprado com hipoteca e arrendam uma antiga para eles e para os filhos. Entretanto alugam a casa deixada vazia a médicos estrangeiros aqui a fazerem o seu estágio. Dava para pagar a casa alugada e ainda ficam com quase outro tanto. Numa noite de vazio brutal e com a vida afectiva já a rebentar pelas costuras, com a mulher também ela cansada de perder uma vida de “mulher da burguesia local” para andar a distribuir mercearias pelas pequenas lojas deste seu distrito a seiscentos euros por mês e com horário das 9 às 19 horas com uma hora para almoço e carro completamente controlado  por GPS nem ao almoço poderia estar com os filhos como também nem sequer os poderia ir buscar à escola, iam os avós,  numa noite de desolação os corpos falaram mais alto, a linguagem que está para lá de todas as crises, às vezes até mesmo das afectivas, e desse encontro, desse apelo à vida e à reprodução, nasceu nove meses depois uma menina muito bonita, o segundo filho, portanto. Casal a romper-se, casal que a seguir se recoseu e mais um ano assim permaneceu. Mas a crise não passou.
Diremos antes que a crise apertou mais ainda, a espiral tornou-se mais comprida e menos larga, tornando a velocidade da queda ainda maior. O processo de falência é concluído, os bens entregues a um gestor de massa falida e a casa alugada até aí alugada a médicos a fazerem a especialidade fica na posse deste gestor. Os estudantes de medicina, já médicos, desaparecem e o dinheiro que ao meu amigo e mulher tanto jeito lhes fazia, desaparece igualmente. Financeiramente a situação torna-se insuportável. Precisa de saltar, de agarrar a vida num outro lado, onde pensa que a pode apanhar. E foi-se embora.
Num outro continente emprego foi procurar e durante um ano por lá andou a trabalhar. Mas não dava, a instabilidade política de lá e de cá, não dava para que a família se mudasse com armas e bagagens para lá do mar. Regressou, mas falido em Portugal se ganha para lá do salário mínimo é-lhe todo o dinheiro apanhado. Só tem uma saída. Procura-a, um contrato de trabalho em que para lá do salário mínimo, seja todo ele pago por baixo da mesa. Ilegalmente, portanto, livre de impostos. Encontrou-o, numa empresa a criar por um amigo seu. Trabalha intensamente durante quatro meses em que se cria a empresa, em que ele na verdade ficava como gerente, mesmo que no contrato estivesse escrito de servente. Mas a crise muda tudo, até os comportamentos. O seu patrão, seu amigo de anos, ficou portanto com um trabalhador fiel e competente que ele conhecia bem, mas ficava com alguém que podia ser tratado como um imigrante, ilegal, se necessário fosse, pois era essa a garantia que lhe oferecia o contrato. E foi isso mesmo que aconteceu. Ao fim de quatro meses, porque a empresa ainda não tinha começado a trabalhar, começado a ter receitas, recebeu, por conta, 500 euros! E depois dizem-lhe que ou ficas assim, por este ordenado, ou podes ir embora e vai reclamar para a “p. que te pariu”. Foi assim mesmo, um contrato entre amigos estabelecido, um contrato entre inimigos rompido. E entretanto os filhos vão crescendo, o outro lado do mar vai ficando distante, não navegável agora esse oceano, e a precariedade instalou-se e difundiu-se a todos os membros da família. E a consequência lógica, natural, inscrita na ordem da crise, aconteceu, isto é, veio a separação, veio o divórcio. Agora sem casa,  nem barata nem  cara, agora volta para casa dos pais. Está sem nada, o fim de um ciclo, talvez. Assim penso. 

UM PROBLEMA TRANSVERSAL

Aliás o texto da Cruz Vermelha vai no mesmo sentido: “O diretor-geral do Comité Internacional da Cruz Vermelha (ICRC), Yves Daccord, referiu-se a esta situação, de forma semelhante durante um encontro organizado pela Cruz Vermelha finlandesa em Julho de 2013. "A Europa tem um longo registo de manutenção de uma plausível confiança no futuro dos seus jovens, mesmo durante crise económica e social. Nada mais. Com os preços a subirem e com o desemprego a aumentar de forma galopante, os jovens citadinos já não vejam nenhum futuro para si mesmos, e os governos começam a perder a credibilidade e a sua própria legitimidade," disse ele, advertindo que algo de dramático pode acontecer na Europa.
Nós iremos ver algo a acontecer. Não necessariamente uma repetição do que aconteceu algures, onde as pessoas gritaram por liberdade, mas vamos ver alguma coisa. Está já a haver muita pressão dirigida contra os governos."
Fim de um ciclo, penso eu a propósito do meu amigo que quer emigrar mas não sabe sequer para onde, se é que há um onde para onde possa emigrar. Sinceramente duvido que haja. Fim de um ciclo e ele está na parte mais funda do ciclo, como está praticamente quase toda a Europa. Em termos gerais, o director-geral da Cruz vermelha fala no mesmo sentido, creio. A saída da crise não se determina nas ruas é certo, fiquem disso descansados, até o meu amigo Ventura Leite e  todos os que estiveram na conferencia realizada na Culturgest sobre a crise do euro, mas o pontapé de partida necessariamente passará pelas ruas. Passará por serem as ruas a impor as medidas que nos farão sair da crise, com a diferença de que isso terá que acontecer em várias cidades e em vários países ao mesmo tempo, ou pelo menos a começar num dos grandes países da zona euro, disso não tenho dúvidas. Até porque a marcha da História ninguém a pode deter, uma vez criadas as linhas de força que a fazem cavalgar sobre as forças da desumanidade agora instalada. Fim de um ciclo, na parte mais baixa do ciclo, à espera da força da História, do desencadear da sua dinâmica, é isso, o necessário para dessa parte baixa todos nós nos erguermos.
Fim de um ciclo, em que o neoliberalismo tentou destruir o estado Social e veja-se a fúria e o despudor com que o está a fazer, ao que dele ainda resta. Ramaux tem razão quando nos disse na Culturgest:
A grande crise atual tem duas vertentes: a do modelo neoliberal, é o Ato I da crise aberta em 2007; a da Europa, é o Ato II começado em 2010 e que é a crise do próprio euro. A segunda vertente, em parte, deriva da primeira: tendo sido o euro introduzido na base de um modelo liberal, a sua crise exprime a do neoliberalismo em geral. Mas não se reduz à primeira vertente: o euro acrescentou um suplemento ao modelo neoliberal, o qual se acrescenta à crise. É por isso que o Velho Continente é hoje o grande paciente da economia mundial, apesar de a crise ter nascido nos Estados Unidos e ter uma dívida pública, para citar apenas esta vertente, em média menor do que a dos Estados Unidos ou a do Japão.
(…) O modelo neoliberal impõe-se como dominante a partir do final da década de 1970 e com um projeto claro: pôr em causa a grande revolução do Estado Social (ou Estado-Providência). O Estado Social é aqui entendido em sentido lato: não inclui só a proteção social, função à qual é frequentemente reduzido, mas inclui também a regulação das relações de trabalho e de produção (principalmente o direito do trabalho), os serviços públicos e as políticas económicas keynesianas (de rendimentos, orçamental, monetária, industrial, comercial...) de apoio à atividade económica e ao emprego. Com estes quatro pilares, as economias já não poderão ser consideradas, estritamente falando, como sendo economias de mercado, são antes economias mistas com mercado, são economias de iniciativa privada, mas também de intervenção pública. O capital ainda domina, certamente, mas o seu poder é limitado (fiscalidade, direito do trabalho) e segmentos significativos da atividade escapam ao seu controlo e à sua dinâmica (serviços públicos, proteção social). O Estado, porque é um campo específico, não é, decididamente, apenas uma muleta ao serviço do capital contrariamente ao que defende o pensamento marxista. Existe uma mão esquerda do Estado como o reconhecerá tardiamente — e sem chegar a teorizar — Pierre Bourdieu. O capital compreendeu-o perfeitamente: a partir do fim dos anos de 1970 e do início dos anos de 1980, este retoma a ofensiva contra o Estado Social. E é a atacar cada um destes quatro pilares do Estado Social que ele encontra a sua coerência global: reorientação das políticas económicas num sentido liberal, privatização e reorganização sobre um modo mercantil da proteção social e dos serviços públicos, flexibilização do direito do trabalho.2
O resultado desse combate está bem à vista. Como nos assinala o texto que estamos a querer apresentar publicado pela Cruz Vermelha :
“Há cinco anos, teria sido inimaginável; tantos milhões de europeus em filas de espera a pedir alimentos em cozinhas de sopa para os pobres, a receberem pacotes de comida em casa ou a serem indicados como pessoas com direito a compras com enormes descontos (lojas onde eles podem comprar alimentos a preços muito reduzidos após terem sido encaminhados pelas autoridades sociais). Pessoas outrora pertentes à classe média moram agora em reboques, roulottes, em barracas, nas estações do caminho-de-ferro ou nos abrigos para os sem-abrigo, hesitando em ir à Cruz Vermelha e ao Crescente Vermelho ou a outras organizações pedir ajuda.
Quando as pessoas pedem ajuda, é muitas vezes como um último recurso. Elas estão a pedir comida ou medicamentos ou dinheiro para pagar os serviços públicos ou o aluguer de casa para não serem despejadas das suas casas. Milhões são afectadas pela pior crise desde há seis décadas; uma crise que tem visto as pessoas estarem a perder os seus empregos e as casas, e isto quando elas nunca tenham imaginado que alguma vez uma tal situação lhes poderia acontecer; uma crise que fez com que os pobres fiquem ainda mais pobres. 'Crise' era suposto significar dificuldades temporárias, um solavanco na estrada da vida e que iria, em breve, passar. Quem teria imaginado que isso duraria tanto tempo e que iria afectar tantas pessoas e em tão grande profundidade ? Actualmente existem mais de 18 milhões as pessoas que receberam ajuda alimentar financiada pela UE, 43 milhões que não recebem o suficiente para comer todos os dias e 120 milhões em risco de pobreza no conjunto dos países abrangidos pelo Eurostat. E enquanto isso, ainda esperamos que a crise vá acabar em breve, quando para muitos a crise apenas começou. Ou está ainda prestes a começar.”
É tempo de mudança. Seguramente, iremos assistir a mudanças, temos a certeza disso, só não temos a certeza de quando. A dimensão do desastre é tal que só podemos esperar e desejar que seja em breve.

EMIGRAR É A SOLUÇÃO FINAL?

A pensar assim, meio adormecido meio acordado, sonhei afinal a pensar em tudo isto e desperto ao ouvir tocar à campainha. Vou abrir. Era o meu amigo. Sentamo-nos. Convido-o a um café que aceita. Olho-o bem, de lado e sinto (…) sinceramente sinto que nada vai bem, a sua cara está deformada, um ar até febril enche a minha sala, a partir da cara dele.
            Diz-me que quer ir embora, quer ir para fora mas (…) não sabe línguas, ao menos que soubesse francês. Queria saber como é que eu aprendi francês como autodidacta, já lá vão cerca de mais de 50 anos! Diz-me que no centro de Emprego e Formação profissional há cursos de alemão, francês, inglês, mas o curso de francês só abre para Março e ele tem pressa, pressa de se ir embora, precisa de saber se conheço algum programa gratuito com que possa aprender a escrever e falar francês.
E no meio de toda esta ansiedade diz-me: sabe, professor Júlio, estou disposto a tudo. Levanta-se da cadeira, virado para mim inclina-se levemente para a frente, com os braços para a frente e depois virados para traz como quem tem uma criança nos braços, e, de punhos apertados, diz-me com uma força anímica brutal: estou disposto a fazer de tudo, professor Júlio. Fazer de tudo, preciso de trabalhar, preciso de sobreviver para já. Emigrar, trabalhar, aguentar, tenho filhos a alimentar. E mais, quero que eles, um dia,  deste seu pai ainda  se venham ainda a orgulhar. Emigrar, trabalhar, aguentar, eis pois a trilogia dos tempos modernos a substituir aquela que nos alimentou durante uma vida, a de Liberdade, Igualdade, Fraternidade. A trilogia da Revolução contra a trilogia da submissão, é isso. Hoje, está sem nada. A crise tirou-lhe quase tudo o que tinha, tirou-lhe  a roupa de fora, a multinacional levou-lhe o resto, levou-lhe a roupa de dentro. Nem sequer casa já tem, nem casa nem carro, e está exactamente como muita gente da classe média em Milão, centro financeiro por excelência da Itália, uma das economias mais importantes da zona euro, está sem nada. Só lhe falta dormir na rua, como em Milão o faz muita gente que foi da burguesia!
Mas aquele fazer de tudo fez-me lembrar uma outra história que se passou comigo, fez-me lembrar Faro, a Rua Teresa Ramalho Ortigão ondo morei,  numa tarde de sábado, fez-me lembrar a minha generala, uma mulher russa imigrante em Portugal e que me disse ela?
Passo a citar a crónica escrita de então:
Viro-me para a imigrante russa e pergunto de modo bem delicado: diga-me, profissionalmente como é que tem sido a sua vida?
A forma como a pergunta foi formulada, o termo profissionalmente, bem enquadrado da na pergunta, deu-lhe confiança. É ela que agora me olha com ternura, digamos com confiança e com a sua resposta deixou-me pregado ao chão. Profissionalmente, fiz de tudo. Estamos num país estrangeiro. Ninguém nos conhece, ninguém nos vê, ninguém que seja das nossas gentes para me ver, para me criticar. Sublinha com mudança de tom a palavra, ninguém!
Fiz de tudo. Muitas escadas terão sido lavadas por esta emigrante, muitas escadas terão sido subidas e descidas, com todo o respeito pelas mulheres de limpeza, muitos horários de trabalho terão sido sistematicamente violados.
Fiz de tudo. Muitas estufas de morangos foram apanhadas, muitas caixas foram carregadas.
Fiz de tudo. Muitos campos de feijão-verde foram apanhados, muitas caixas de tomates por ela apanhados foram encaixotados. Muitas noites de sono de má qualidade, muitas dormidas pelos campos abertos certamente, muitas dormidas, na melhor das hipóteses, em quartos de 8 a 10 pessoas, por quarto com a cama sempre quente já como na China, perto da rotunda do Hospital de Faro passadas ou algures e caladas pelo silêncio de toda a gente, inclusive pela ignorância sistematicamente assumida pelas autoridades oficiais responsáveis pelas condições de trabalho de toda a gente.
Fiz de tudo. Algumas noites também por esses mesmos campos ao luar e enrolada poderá ter andado com quem não sabe quem, no quadro de uma torre de Babel de ucranianos, russos, moldavos, e pasme-se, de chineses e chinesas também, com horários de 12 horas a 16 horas talvez. Sobre esta gente, não quer o governo nada saber, sobre esta gente não se pronuncia o Serviço de Fronteiras, sobre esta gente quer o Ministério do Trabalho tudo ignorar, até porque do ponto de vista neoliberal é gente completamente descartável. Como assinalava o antigo ministro Oliveira Baptista, como é que dormem as romenas, por exemplo, da apanha do morango, ninguém sabe, ninguém quer saber. Gente descartável, a lembrar os textos de Kevin Bales, gente a que a Troika, a Comissão Europeia, o BCE, o FMI, os Passos Coelho andam ainda ao assalto, como verdadeiros ladrões, mas não na calada da noite, a lembrar Zé Afonso, mas sim à luz do dia, munidos de um poder que lhe dás o voto que lhes confiámos, a lembrar Marx também, ele que está cada vez mais actual.
Fiz de tudo, é a sua expressão, e nas condições em que fez de tudo, meu Deus, muita gente não fez nada, porque simplesmente neste tipo de trabalho os trabalhadores nacionais com direitos são excluídos pelos patrões e acusados depois pelo CDS e outros de que os portugueses não querem é trabalhar, porque o subsídio de desemprego é elevado. Deslocalização no local, diriam os economistas: já que os terrenos não podem ir ter com os trabalhadores onde eles estão, então que venham os trabalhadores para onde estão os terrenos mas com os níveis salariais dos seus países de origem ou muito pouco mais. Adicionalmente, estes podem aceitar outras condições de trabalho bem mais gravosas, menos custosas para os patrões, até porque ninguém conhecido os vê.
 Fiz de tudo. E com isso foi assim a sua luta pela vida para mais além e mais alguém, a luta pelos seus a tudo exigia. Pela sobrevivência, foi isso, é isso.
E terminava aqui essa crónica. E eis que agora, dois anos depois, alguém me vem dizer que está disposto a fazer de tudo, não aqui, lá fora, onde ninguém está lá para o ver, para o criticar. A história repete-se, terá dito Hegel, terá repetido Marx, mas como drama e depois como tragédia, penso eu.
Tudo isto vem a propósito desta nossa Europa e do texto da Cruz Vermelha. Neste texto da Cruz Vermelha temos ecos da mesma realidade e de um discurso tão sério como a da minha generala, imigrante russa, por acaso encontrada e conhecida numa rua de Faro há dois anos. Com um detalhe importante, a “minha generala” fala dos netos, a Maria Miteva fala à Cruz Vermelha dos seus filhos. Ambas com uma certeza, a de que o futuro deles passava pela educação e formação que lhes conseguissem dar. Ou seja, pensam para eles o contrário do que o governo português, verdadeiro funcionário ao serviço de Bruxelas, está a impor aos nossos filhos em geral.
Com efeito o texto da Cruz Vermelha relata-nos uma situação na Bulgária. Basta transcrever:
“O meu nome é Maria Miteva Tenev-Tropolova e tenho 47 anos de idade . Eu tenho três crianças adultas de um casamento anterior. Eu casei pela segunda vez em 1993 e nós temos quatro crianças, a mais nova nascida em 2011. Tenho trabalhado como uma auxiliar de jardim de infância durante oito anos, mas eu estou actualmente em licenças de parto. Contudo quando eu puder trabalhar, limparei casas desde muito cedo, desde quase de madrugada, de modo que eu possa acabar e levar os meus filhos ao jardim de infância e à escola.
O meu marido trabalha como electricista e trabalha sempre que tenha serviço para fazer, mas nós não podemos viver sem os meus rendimentos extra.
Nós na verdade sentimos a crise durante os dois anos passados com os preços do aluguer da casa, da alimentação e do aquecimento a subiram, a subiram. Nós pagamos mensalmente cerca de 1.000 lev búlgaros (500 euros) pelo nosso aluguer e serviços públicos associados e então não nos fica nada para viver. A Cruz Vermelha búlgara ajudou-nos, e nós estamos-lhe muito gratos à directora de um dos centros sociais, que é uma mulher excepcional. Esta conseguiu arranjar-nos alguma ajuda financeira, mas deu-nos igualmente o apoio moral e psicossocial durante uma época em que o nosso filho mais novo esteve muito doente e nós não tínhamos nenhum dinheiro. Nós realmente precisávamos de alguém para conversar, estávamos a passar por um momento muito difícil.
Ivan, o nosso filho mais novo, tem agora dois anos de idade e está à espera de ir para o infantário. Nicola, que tem cinco anos de idade anda no jardim de infância, Nevena estará no segundo ano da primária e Paul estará na quarta classe no próximo ano. Os nossos filhos mais velhos saíram da Bulgária em 2010, quando a situação se agravou e o desemprego aumentou. Estão agora em Itália e completamente independentes financeiramente. Todos os meus filhos são uns bons filhos – desejados e amados.
Nós, de toda a maneira, lidamos com a situação graças a amigos que nos dão roupas para os nossos filhos e assim por diante, e eu não gosto de me andar a queixar. No entanto, se alguém nos der uma mão, nós provavelmente deixaremos a Bulgária – toda a família, todos nós o faríamos.
É o pior para as crianças. Eu quero-os a ler livros, a fazer desporto e a desenvolverem os seus talentos. Eu não espero muito e eu sei que os dias de festa e descanso são apenas um sonho distante para nós, mas faço por acreditar que não devemos privar as crianças de ler um bom livro. Deve haver mais que fazer na vida do que apenas andar a sobreviver .
Eu ensino os meus filhos a não separar as pessoas de acordo com a raça, religião ou estatutos. Eles devem acreditar no bem e devem ter uma atitude positiva para com todos. Mas é difícil para eles viver entre no meio de outras crianças que não sejam 'socialmente fracas'. Eu tento incutir-lhes auto-confiança e explicar-lhes que mesmo se eles são socialmente fracos , isso não faz com que eles sejam diferentes ou piores que os outros.
Eu realmente gostaria que a Bulgária se tornasse um país melhor para aqui vivermos. Tudo o que precisamos é de boa saúde e de um emprego. Eu quero que os meus filhos sejam educados. Nevena desenha muito bem, ela tem talento. No entanto, não tenho a coragem de pensar sobre o futuro, porque quando eu penso e as coisas não acontecem como espero, fico decepcionada."

ONDE É QUE EU JÁ VI ISTO?

A minha generala mandou os netos para a Rússia, para aprenderem como deve ser. Quer-lhes preparar o futuro, e para isso, é necessário garantir a sua devida formação. Formação cívica e técnica.
Encontramos aqui o mesmo discurso, os filhos mais novos a serem vistos pelo prisma da educação, da formação técnica e cívica, enquanto os mais velhos desta “nossa” búlgara estão em Itália, financeiramente independentes mas sem dinheiro para ajudar os pais e os irmãos, estão como está a mãe dos netos da minha generala russa, sem dinheiro, na Rússia. Se alguém lhes dar uma mãozinha, uma ajuda financeira diríamos, vão todos embora, como o meu amigo se quer agora ir embora também, se lhe derem a mãozinha de que ele precisa. E todos, numa Europa que temos, se querem ir embora para uma Europa que não temos, e vão para uma Europa afinal onde andam milhões a querer ir embora, de um lado e do outro, é só gente a somar, gente que não está bem, que quer ir fazer de tudo, concorrentes uns contra os outros, gente que basicamente só quer ir embora. A lembrar Francis Coppola e Apocalipse Now, onde o oficial americano já não estava bem em lado nenhum, nem nos Estados Unidos, nem no Vietname. O exemplo de que se fala no texto da Cruz Vermelha a propósito de Itália, onde os não-italianos são mal vistos, é disto um bom exemplo. Para onde ir, afinal? Para onde deve o meu amigo emigrar para as linhas da vida voltar a encontrar? Face ao que se passa na Europa, esta é uma pergunta a que não sei responder. Como se assinala no texto da Cruz Vermelha:
“Tendo de enfrentar o impacto da crise económica, muitos europeus estão actualmente a serem deixados para trás; inactivos, desempregados, dependentes, excluídos e sem quaisquer recursos”, sem nada, ou ainda:
“Como uma organização, estamos empenhados em ajudar as pessoas quer nas situações imediatas, as de curto prazo, quer nas situações de longo prazo, e estamos continuamente a rever como é que nos podemos ajustar e adaptar a nossa assistência às necessidades novas e emergentes, continuando ainda a ajudar aqueles que já estavam em necessidade antes da crise.
Ao mesmo tempo, vemos o perigo de se transformarem milhões de pessoas em destinatários passivos da ajuda; estamos empenhados em desempenhar um papel na prevenção desse fenómeno e estamos a envolver pessoas mais activamente na procura de soluções para esta situação.
Para fazer isso, em primeiro lugar precisamos de pensar de forma diferente – e então devemos actuar de forma diferente. Há uma necessidade para todos nós em examinarmos se as nossas sociedades estão adaptadas para resolver a situação presente ou então como é que nos podemos ajustar face à necessidade de implementar novas iniciativas, para implementar novas intervenções preventivas ou ainda para alcançar uma melhor cooperação assim como para criar novas abordagens, mais flexíveis e holísticas. (…)
Afim de agir de forma diferente devemos então e primeiro que tudo pensar de forma diferente. Obter melhor compreensão de como é que os indivíduos, famílias, sociedade civil e instituições se podem adaptar às realidades de hoje e reforçar a sua resiliência é uma necessidade de partida. O Governo nacional e local, as grandes empresas, incluindo o sector bancário, os cidadãos e as organizações humanitárias devem pensar em formas inovadoras para encontrar soluções viáveis, sustentáveis e de longo prazo, para se mitigarem os impactos humanitários desta crise económica.”
Se assim não for, se assim não fizermos, manter-se-á a mesma trajectória de desgraça escolhida pelas Instituições Europeias e como se assinala no texto que temos vindo a citar:
“Enquanto outros continentes com sucesso reduzem a pobreza, a Europa [com sucesso] aumenta-a.”
É de tudo isto que nos fala o texto da Cruz Vermelha cuja leitura recomendamos e garantidamente o meu amigo passa por todo ele. Seguramente verdade."


Júlio Marques Mota

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

MENINA....

(Imagem da Web)


MENINA…


Menina…
Tu que corres em busca de um tempo perdido,
como a onda que se forma lá longe no horizonte,
 cavalgando, é empurrada pelo vento aguerrido,
passas por tudo e todos a atravessar uma ponte,
manténs a esperança de um mártir sofrido,
que um dia se alavancou ao cimo do monte,
subiu, escorregou, caiu e ficou muito ferido
e passou a beber da mágoa como de uma fonte;
Menina…
És tão terna quando embrulhada num abraço,
tão apartada quando estás na distância vazia,
insegura a caminhar na rua em desembaraço,
és um barquinho de papel a navegar na maresia,
a folha que no Outono voa movida pelo cansaço,
calcada por uns, amada por poucos, sem alegria,
afinal, o que queres tu desta vida, deste espaço,
define-te, deixa de ser sombra, de ser acrobacia;
Menina…
Carrega contigo o sonho de dormir acordada
numa qualquer noite de montanhas de luar,
naquela cidade costeira muito afeiçoada
onde as rimas são encadeadas pelo mar,
e lá nas nuvens a Lua, meio envergonhada,
só mostra meia-face, quase pronta a chorar,
ficará para sempre a tua alma soterrada
em fios de prata dourada na areia a brilhar.

BOM DIA, PESSOAL....

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

BOAS FESTAS AOS MEUS AMIGOS

Foto de Mãe Natal.



FELIZ NATAL PARA OS MEUS AMIGOS


Meus amigos:
 Eu não queria deixar passar esta quadra sem vos dar uma prenda. Estou é com um grande problema: não sei o que vos dar. Vocês já têm tudo. Fartei-me de pensar o que vos haveria de oferecer. Tive imensa dificuldade em optar. Depois, deve ser desta altura meio lamechas, ando sem grande inspiração. Mas, mesmo assim, ainda pensei em mandar algo incomum, assim tipo do “Ambrósio, apetece-me algo diferente” mas esbarrei logo na dificuldade. Ainda fiz uns contactos para enviar para as minhas amigas assim um “presentão” daqueles, como quem diz, um gajo todo musculado, sem barriga e sem uma ruga –exactamente o contrário da minha santa pessoa- mas não tive sorte. Os tipos estavam todos a passar o Natal em casa com a família.
Para os meus amigos, homens –está de ver-, andei por aqui, pela net, a dar umas voltas assim a ver se arranjava também um  material que fizesse história na minha amizade, mas qual quê? Nesta noite não havia noite, disseram-me, fosse lá por que preço fosse. Ainda meti umas cunhas mas nada. “Nesta noite é só mesmo “c’o mê home”, respondeu-me uma boazona, assim com um material de fazer ressuscitar um morto, com muito mau humor, diga-se, que até temi poder levar nas trombas, através do telefone, da púdica rapariga.
Assim sendo, por amor da nossa amizade, não me levem a mal, mas tenho mesmo de ficar só por um abraço. Se vocês soubessem como me sinto constrangido?!? Não estava à espera de um falhanço meu assim. Deixei tudo para a última hora. Foi o que foi!! Desejo-vos então um Feliz Natal. Bem sei que, em face da minha lacuna, já não será o que deveria ser. Mas tenham lá paciência. Para o ano podem contar. Obrigado a todos e as minhas desculpas.

BAIXA DE COIMBRA PARCIALMENTE INUNDADA




 Por volta das 15h30, bastaram cerca de dez minutos de intensas bátegas de água para inundar parcialmente o centro da Baixa. Como já é peculiar, sempre que São Pedro se aborrece, a Praça 8 de Maio, e por inerência a Igreja de Santa Cruz, fica intransitável. A seguir, porque os vazadouros não dão escoamento a tamanho caudal de águas, são as ruas estreitas, da Moeda, da Louça, do Corvo e Eduardo Coelho a levar com toda a carga líquida que, a grande velocidade, provém das partes altas da cidade.
Num espírito de grande solidariedade para salvar os haveres comuns, foi interessante de ver vários comerciantes e funcionários com os pés alagados agarrados a vassouras para encaminhar o grande lençol de água para os “boeiros”.
Nem tudo foi mau. Mais que certo e presumivelmente, pelos imensos telefonemas de reclamações que teria recebido –com algumas acusações de estar ao serviço do grande Capital-, São Pedro,  a entidade divina que gere as águas das águas da cidade, porque teria ficado com as orelhas a arder, ou talvez condoído com toda a pobreza natalícia que por aqui se sente, ou ainda, sei lá, se calhar com medo que o Menino Jesus molhasse os pés, no Museu Municipal do Chiado, fechou as portas da comporta do céu e o susto passou e o ambiente serenou. Mas que a coisa chegou a ficar preta, lá isso chegou!

E DEPOIS DA BORRASCA, PÁ?

A seguir ao temporal os poucos transeuntes que circulavam por aqui desapareceram e a Baixa encerrou mais cedo para a consoada.Perante isto e como é de prever, as compras de última hora foram transferidas para as grandes superfícies. Sem dúvida que a causa deve-se a fenómenos naturais mas que gera um desânimo danado nos comerciantes, já de si tão vulneráveis, isso não há dúvida. Às 17h00, com a Praça 8 de Maio e a Igreja de Santa Cruz a serem limpas de entulho pelos Bombeiros, praticamente já todas as lojas tinham cerrado portas.




BOM DIA, PESSOAL...

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

CONTO DE NATAL: MULHER-MÃE BANDEIRA DA VIDA

(Imagem da Web)



 Neste 20 de Dezembro o autocarro parou junto ao rio Mondego. Estava o Sol no centro de um dia friorento à sombra. Do meio da pequena multidão uma mulher esguia e de meia-idade saiu em passo ligeiro mas resoluto. Era baixa, com pouco mais de metro e meio. Era incrivelmente magra, muito magra, como se a gordura numa qualquer reivindicação se negasse a encher o corpo. Vestia com simplicidade roupas que, de tanto serem repetidas, pareciam querer manifestar-se pelo excesso de uso. Quem olhasse aquele rosto fechado de frente veria dois olhos negros, embaciados de tristeza mas, ao mesmo tempo, um olhar duro, petrificado pela mágoa, como se o pouco e o muito já não fizessem qualquer diferença, se tivessem imunizados à dor, e estivessem prontos a levar qualquer pancada do destino.
Como fantasma perdido nas trevas em busca de um encosto que lhe consubstanciasse afirmação, atravessou a avenida quase sem dar pelos carros e, no seu andar rápido, entre o suave vacilar de pena e o carregar os pés no chão de dentes cerrados, entrou nas ruas largas da calçada. A sua mente estava longe, cavalgava sobre um corcel de memórias. As pessoas que consigo se cruzavam sem as ver com definição, aos seus olhos, pareciam sombras que se moviam em câmara lenta. Nem a música espalhada ao vento de “O Natal existe” a fez hesitar em calcar as pedras quase com raiva. A letra da canção parecia gozar com a sua disposição “quero ver você não chorar, não olhar para trás nem se arrepender do que faz”. Pensou para si, “não chorar como? Só se fosse pelo motivo da fonte das lágrimas ter secado”. Sentiu-se invadida por uma irritação surda. Se não fosse por coisas, apetecia-lhe mandar um grito para o ar acompanhado de uma grande asneira. “Que merda de tempo este que se vive agora no Natal! Anda tudo lixado, com a alma mais negra que a chaminé da casa de aldeia onde nasci, e tudo finge que é feliz. Esta época natalícia faz-me lembrar o período pré-eleitoral em que anda tudo a cantar hossanas ao candidato. Passado um mês desaparece a nuvem de euforia, vem a solidão e a falta de expectativa, e regressa a realidade que sempre esteve no meio de nós e nos há-de acompanhar até ao fim dos nossos dias. Nunca gostei muito do Natal. Nesta quadra sou assolada por memórias que de boa vontade expurgava. Casei próximo de Dezembro. Rodou o calendário e quando pari os meus filhos andavam S. José e Maria à procura de um estábulo indecente para parecerem os mais segregados desta vida simbólica de pobreza. Também nesta época, estava o solstício de Inverno a preparar-se para polvilhar tudo de branco, foi quando a minha mãe morreu –que saudades que eu tenho dela!
Faz tantos anos que dei o sim lá na igreja da Rainha Santa –tantos, tantos! Quantos? Sei lá! Até já me esqueci. Tantas esperanças que coloquei naquele ramo de camélias amarelas! Era o tempo das flores. Quando casei ainda se apanhava no ar o cheiro dos cravos. Agora o cravo feneceu, já só resta a memória e o espírito revolucionário num livro que tenho lá em casa e nos móveis que ainda mantenho e não pude trocar por outros mais modernos. Do cravo passámos a escravo. Mas, agora que penso nisso, somos subjugados a quê? E Porquê? E Eu? Sou submissa a quem? Se calhar do destino, deste fado de má-sorte. Sempre trabalhei tanto, tanto, até agora para eles! Para todos! Para a minha família! Nunca cuidei de mim. Não soube pugnar pelos meus interesses. Há décadas que não vou ao cinema! Há séculos que não vou dançar. E quando foram as últimas férias que gozei fora? Estive sempre em segundo lugar. A primeira escolha era deles. Eu apanhei sempre o que restava, o que não lhes interessava. Porque é que este meu filho me havia de fazer isto? Deus queira que ele se safe! Tive mesmo azar! Anda uma pessoa a criá-los para isto! Porque é que ele me fez isto? –E olhos começaram a humedecer. Ao longo destas décadas, tanta escada que encerei! Tanta casa que arrumei! Tanta roupa que passei a ferro em casa das senhoras! Tanta merda que eu limpei depois de sair da repartição pública em segundo trabalho forçado e até às tantas. Porque é que ele me fez isto? O que eu sofri para pagar as propinas lá na Faculdade de Economia e não o consegui ver licenciado. Mas ele é tão inteligente! Como é que os mais espertos, tendo um talento inato, se transformam nos mais burrões? Porque é que o meu filho me fez isto?”
Quase sem dar pela distância, chegou à Praça 8 de Maio e entrou na Igreja de Santa Cruz.

II

Transpôs a porta do templo e foi banhada pela atmosfera fria da pedra secular, onde o silêncio envolvente convida à introspecção, ao remanso da essência, e a oração surge sem ser requisitada. Havia um cheiro a Natal misturado em odores de incenso e vela queimada. Algumas mulheres, com ar solene, de cabeça baixa, em sinal de respeito total, encaminhavam-se para um dos lados, presumivelmente onde estaria representada a Sagrada Família e com o Menino Jesus.
Como um saco de águas rebentadas para dar à luz, as lágrimas irromperam por aquela face martirizada pelo tempo e o sossego como testemunha. Num dos muitos bancos de madeira corridos, acomodou-se, deu um último olhar para o púlpito reluzente a ouro enegrecido pelos anos e fumo de velas, marcas de fé num derradeiro milagre, e cerrou os olhos. O pranto, como fio de água provindo das profundezas da terra, continuava a correr pela pele sulcada de bainhas madrastas. Como um condenado à morte, em que lhe resta apenas uns minutos de vida e só um milagre a pode salvar, ajoelhou e mentalmente encetou um monólogo emudecido: “Senhor, ajuda o meu filho! Sabes que nunca Te pedi nada para mim. Dá-me uma mostra de que és bom. Bem sei que não fui boa mãe ao dar-lhe tudo de mão-beijada. Pensei que estava a fazer o melhor. Enquanto eu trabalhava pela noite dentro, correndo de Seca para Meca, contando os cêntimos, ele moinava. Quando eu me levantava de madrugada para deixar o seu almoço prontinho em cima do fogão chegava ele meio borracho e com outras coisas mais que o alucinavam. Eu via mas não queria ver nem crer. Tive sempre esperança que ele mudasse. Ele é bom menino, Senhor! Tenho a certeza. É certo que é muito manipulador e, fazendo que ouvia, nunca escutava ninguém. É muito inteligente, mas pouco disciplinado. Talvez seja este o verdadeiro problema. Nunca tive mão na sua vontade. Às vezes irritava-me com ele mas quando se abraçava a mim, naquele gesto apertado, acabava a derreter-me e estragava tudo. Sempre foi diferente do irmão, o outro meu filho que está lá longe do outro lado da fronteira. Ajuda o meu filho, Senhor! Dá-lhe uma outra oportunidade. Apesar dos seus quase 35 anos continua a ser uma criança crescida. Bem sei que contribuí para ele ser assim. Eu sei! Mas tem dó! Ele é um fruto desta sociedade conspurcada pelo vício, onde a necessidade de abstracção implica a recorrência a ansiolíticos, a álcool, a droga, como ele. Foi por esta que o meu filho, em associação com outros, começou a assaltar pessoas na cidade. E eu sem saber de nada! Levei um baque, Senhor! Quando a polícia me bateu à porta para o levar sob prisão fiquei em choque. Como foi possível? Como foi possível  ter-me feito uma coisa destas?
Daqui a meia-hora vai ser lida a sentença no Tribunal. Pela Tua incomensurável misericórdia, neste Natal de 2013, ajuda o meu filho! Pelo Teu omnipotente poder de influência sobre a humanidade, prepondera a juíza. Faz com que ela tenha compaixão e lhe dê uma oportunidade de reinserção social. Fazes isso, Senhor?”

III

A sala fria do Tribunal estava repleta. O ambiente era de tensão, emoção e expectativa. Sabe-se lá o que iria na cabeça de todos aqueles familiares?! Dentro de momentos, pela leitura da sentença proferida pela juíza presidente do colectivo, iria ser decidida a vida, o futuro daqueles três jovens. A súmula de crimes cometidos pelos arguidos contra a comunidade ficou ali bem vincada e esclarecido que causaram temor social, como tal iriam ser castigados. E foi lido o acórdão na parte decisória que mais interessava. E num caso nunca visto a magistrada chorou. De entre os presentes, uma mulher suspirou fundo e olhou para cima. O seu menino tinha sido condenado a pena suspensa.


(BASEADO NUMA HISTÓRIA REAL)

BOM DIA, PESSOAL...

sábado, 21 de dezembro de 2013

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

A ANGÚSTIA DO NATAL

(Imagem da Web)

 Sempre me fez muita espécie a razão de, mesmo sem motivo aparente, ficar angustiado entre Novembro e Março. Costumo dizer em jeito de brincadeira que, se pudesse, sairia de Portugal no começo do Outono e só regressaria na Primavera. Até já tenho os países escolhidos e tudo. Se optasse pela Europa, inevitavelmente, tomaria por destino Espanha –mais exactamente Benidorm. Se optasse pela América, escolheria o Brasil –como não conheço, sei lá, talvez o Rio de Janeiro. Uma coisa sei, a terra que eu escolher tem de ter mar. Então o período que se aproxima do 25 de Dezembro é, para mim, profundamente depressivo. Sempre pensei que esta forma de sentir fosse muito minha. Detesto o frio –qualquer corrente de ar coloca-me a espirrar sem destino; detesto a noite, pelas sombras que provocam a solidão; detesto a chuva –mesmo a bater na vidraça, que é um quadro tão recorrente e poético. Sou uma pessoa polarizada no calor. Aguento altas temperaturas. Preciso de muita luz para sobreviver. Os raios solares são para mim o carregamento necessário da minha bateria existencial.
Tenho reparado que não sou o único a sofrer a apoquentação do Natal. Conheço muitas pessoas que sentem o mesmo que eu, ou pior. Há algumas que não podem sequer ouvir a música ambiente das ruas que, nesta altura, é tão característica desta quadra.
O que concorre para ser assim? Fui socorrer-me de um trabalho de Célia Pinheiro, sobre psicanálise, e que encontrei por aqui, na Internet, por acaso. Diz ela que “Sinto que há uma tristeza que desperta nas pessoas nesse tempo natalino. Afinal esse é um tempo onde alguns ideais – impossíveis de alcançar, diga-se – são preconizados e de certa forma exigidos. É um tempo onde se vende a idéia da família perfeita, aquela livre de questões, de intrigas, de diferenças, de rancores, etc, etc, etc. O pior é acreditar que esse ideal se fez realizar no vizinho ou naquela família mostrada nos comerciais que vendem seus produtos natalinos. Daí, há uma diferença muito grande entre o ideal e o real. Essa diferença é angustiante quando se deixa levar pela crença que no outro há essa paz possível de ser alcançada.
A comparação logo ganha seu lugar e aí, é claro, o sujeito vê-se na posição daquele que não conseguiu. Logo, considera-se o infeliz diante daquele que é feliz, o azarado diante daquele que tem sorte, o pobre diante daquele que tem mais posses. Tudo ilusão! Cada sujeito tem suas questões e um modo muito particular de se posicionar diante delas. O que vemos muitas vezes é um triste encaminhamento da subjetividade humana reduzidas nas armadilhas do TER. E é claro que um reflexo disso vai também no mostrar o TER. TER PARA SER. Ser o que afinal?
(…) O final de ano traz consigo a marca de coisas que se acabam. De um tempo que se vai, de uma passagem que aumenta mais um ano na contagem do tempo. É um significante forte por lembrar que coisas acabam e, opa! também estamos incluídos nessa temporalidade. De um lado um ideal que não se pode alcançar, de outro um tempo que se marca trazendo a idéia de finitude. Será por isso que nos presenteamos nessa época e fazemos tanta festa? Para aliviar o peso que essas questões vem nos trazer? Bom, e onde é que tudo isso se relaciona com a sexualidade? Em tudo. Vamos ver.
É também pela marca da reprodução que é sexuada que a temporalidade se faz marcar para o sujeito humano pois as gerações sucessivas registam o caminhar do tempo. Nota-se um final de ciclo se marcando ai. Quando se nasce, passa-se a ser um ser para a morte. Afinal começamos a morrer ao nascermos. Natal, a palavra refere nascimento. Temos aqui envolvidos três termos: sexualidade, nascimento e morte. Ninguém passa impune e sem trazer consequências destes três conceitos ao longo da vida. Longe de ser esse texto uma posição desesperadora frente à vida, ele tem mais como pretensão podermos questionar nosso destino errante e aí sim podermos usufruir de parcelas possíveis de uma felicidade. Felicidade esta não calcada nos engodos modernos.”
Penso que está muito bom este trabalho acima referenciado. Na análise, quanto a mim não como especialista da matéria nem coisa que o valha, apenas peca por conceituar o sofredor angustiado somente num sentido único, de baixo para cima. Isto é, este trabalho dá como certo que “o sujeito vê-se na posição daquele que não conseguiu. Logo, considera-se o infeliz diante daquele que é feliz, o azarado diante daquele que tem sorte, o pobre diante daquele que tem mais posses”. Penso que o sentimento depressivo opera nos dois sentidos. Ou seja, contrariamente ao aflorado no estudo, se o indivíduo provir de reminiscências humildes e tiver atingido um estatuto financeiro fora do comum, com família funcional e tudo o que possa concorrer para a sua felicidade, pode sentir a mesma aflição. O que quer dizer que o padecimento não será apenas de fora para dentro –pela forma de ver o outro bem e não estar igual-, mas também de dentro para fora. Neste caso é como se o tempo passado de miséria ficasse para sempre gravado a fogo no consciente/inconsciente e, pela sua memória marcante, nesta altura de envolvimento humanitário, saltasse sempre ao de cimo.
Para terminar, e para quem sofrer desta agonia, uma palavra de muita força: faltam apenas três meses para chegar a Primavera.


TEXTO RELACIONADO
 "Mulher..."


LEIA O DESPERTAR...


LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Esta semana deixo o textos "REFLEXÃO: MUDA-SE O PENICO MAS..."




REFLEXÃO: MUDA-SE O PENICO MAS…

Na terça-feira passada, os dois jornais da cidade, Diário de Coimbra e Diário as Beiras –este em notícia online- plasmavam que “Os Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra (SMTUC) anunciaram que o estacionamento automóvel em alguns locais da Baixa da cidade será gratuito no sábado e ainda a 21 e 28 deste mês (…). A medida, segundo os SMTUC, pretende incentivar os munícipes a realizarem as suas compras na Baixa de Coimbra, contribuindo para a dinamização do comércio local” –prosa transcrita do Diário de Coimbra.
Antes de dar a corda toda de uma vez só à argumentação -porque estou irritado-, respirando fundo e contando até dez, vou tentar mostrar que esta ação, contrariamente ao que parece, não é uma medida séria mas antes um truque de magia, de onde sai um coelho da cartola falsamente vestido de Pai Natal. Vamos por partes:
Primeiro, por acaso, pensarão as ilustres cabecinhas pensantes dos SMTUC que são umas “alvíssaras” oferecidas, de três sábados de manhã gratuitos nesta quadra, que vão espevitar e revitalizar o comércio local? Se esta medida não fosse tão desgraçadamente irrisória, tão pobre, porque pobres são quem assina ordens assim, diríamos que dava vontade de rir. Saberão estes senhores administradores alguma coisa da Baixa? Já entraram alguma vez numa rua estreita? Já entraram em alguma loja? Já falaram com algum comerciante? Fazem alguma ideia de como está o tecido comercial no seu todo? O mais certo é conhecerem apenas o trajeto direto, que separa a margem esquerda do rio, entre a sede dos SMTUC, atravessando a Portagem e ruas da calçada, e a Câmara Municipal. E mais nada! Do Centro Histórico não sabem nada –nem querem saber! Falam de dinamização do comércio local como se revitalizar este sector fosse assim uma espécie de dar uma moeda a um mendigo e este, pelo gesto metafísico, imediatamente dar saltos de contente por ficar rico e feliz. É assim, por um lado, um descarregar de consciência subjetiva e, por outro, para mostrar a quem assiste ao ato que se está muito preocupado com os pobrezinhos. Verdadeiramente é uma ação fingida que busca apenas os holofotes públicos. Constata-se, infelizmente, que estamos na mesma; mudaram as caras mas o mesmo ostracismo em relação à Baixa, o desleixo que se tem por uma coisa imprestável, continua. Tal como os anteriores executivos de coligação, cujos líderes foram Carlos Encarnação e Barbosa de Melo, que nunca tiveram vontade nem uma política clara de revitalizar esta parte velha da cidade, verifica-se que, embora ainda estejamos no princípio do mandato e sujeito à dúvida metódica, o abandono, a displicência, a falta de planos para reerguer uma zona comercial da cidade, que já foi de excelência, segue a mesma cartilha. Pelo menos até agora, do horizonte político dos novos ocupantes da Praça 8 de Maio não se vislumbra uma ponta de esperança para a recuperação desta parte histórica e comercial.
Segundo, saberão estes iluminados dos SMTUC, com rendimentos garantidos por força da nomeação política, que, entre o nin e o talvez, desde 2009 que o estacionamento público deveria ser gratuito por promessa dada mas nunca cumprida? Ou seja, em 2009 o vice-presidente da Câmara Municipal, João Rebelo, prometeu que para ajudar a desenvolver a Baixa, incentivando os comerciantes a abrir ao sábado e em face de uma crise crescente no comércio, o parqueamento de automóveis na via pública seria desonerado. Acontece que nunca as máquinas de cobrança automática foram alteradas nem foi colocada qualquer sinalização a indicar a gratuitidade. Resultado: quem sabia da notícia vinda nos jornais não pagava, quem desconhecia pagava. Mais ainda, tanto quanto sei, como não houve despacho regulamentar, postura, tudo ficou assente na discricionariedade –ou arbitrariedade- dos agentes da Polícia Municipal. Umas vezes multavam outras vezes não.
Terceiro, em 16 de Março de 2010 titulava o Diário as Beiras: “A Polícia Municipal deixou aviso: o estacionamento aos sábados de manhã na Baixa de Coimbra vai voltar a ser pago”.
Em 19 do mesmo mês de Março, em reunião conjunta da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, e da ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, com o então, na altura, vice-presidente Barbosa de Melo ficou assente que a autarquia deixaria cair o pagamento do estacionamento ao sábado de manhã, até às 14h00 –já há muitos anos, a partir desta hora passa a ser livre. Como já era de prever, porque, salvo exceções, palavra de político não vale uma pirisca de cigarro, tudo continuou como dantes, isto é, pagavam os parvos e os espertos safavam-se. Resultado: como sempre, perdia o elo mais fraco, a Baixa.
Quarto, em 4 de Março de 2011, na Assembleia Municipal e em recomendação ao Executivo da Coligação por Coimbra, era o Bloco de Esquerda a defender que “o comércio tradicional da Baixa de Coimbra atravessa uma conjuntura de profunda
crise, que se traduz, nomeadamente, no definhamento das actividades, por falta de
procura, a que não é alheio o panorama de crescente e contínua degradação urbana
e desertificação habitacional; a instalação prolífera de grandes superfícies comerciais veio gerar novas
centralidades e acentuar o esvaziamento de consumidores da Baixa da cidade”.
Entre outras medidas pugnava: “Que se facilite o acesso e mobilidade na Baixa de Coimbra, nomeadamente, facilitando o
estacionamento gratuito na Baixa e no Mercado D. Pedro V aos sábados de manhã;
proporcionando a gratuitidade da 1.ª hora de estacionamento nos espaços públicos de
estacionamento automóvel (durante a semana?).”

ATÉ TU, INDEPENDENTE?

Agora, depois de este novo executivo tomar posse, que em tudo se esperava ser diferente, verifica-se que apenas mudaram os penicos, o hábito continua, para não dizer pior.
Atente-se também neste facto, na reunião do executivo camarário da segunda-feira passada, o representante do movimento independente Cidadãos por Coimbra (CpC) votou favoravelmente, por unanimidade ao lado dos seus compartes, o Estudo de Impacte Ambiental referente à instalação da nova grande superfície IKEA, no Planalto de Santa Clara, e que vai nascer sobre um terreno onde foram cortados ilegalmente sobreiros cuja lei prescreve a proibição de edificação durante 25 anos. De salientar que o delegado do CpC que votou era Pedro Bingre, o número dois da lista, em substituição de Ferreira da Silva. Há ainda outro pormenor interessante, Bingre, que é especialista em Ambiente, Planeamento Regional e Urbano e Políticas de Solos, perante esta aprovação por unanimidade, não teria nada a dizer? Não saberá ele o quanto este licenciamento vai custar a centenas de famílias que trabalham na Baixa?
É minha noção de que para os eleitos tanto faz ser independente, ser representante do Bloco de Esquerda, do PSD, do PS, como ser da CDU, ninguém se importa com o estado caótico da Baixa. Desgraçados dos comerciantes que por aqui tentam aguentar-se. Se algum estiver à espera da solidariedade de qualquer um daqueles, vale mais ir apanhar gambozinos para o Choupal.

(Na próxima edição transcreveremos a intervenção de Pedro Bingre, no executivo, sobre este mesmo assunto)