sexta-feira, 17 de julho de 2009
UM JARDIM MCARTISTA
A “caça às bruxas” anda por aí. O recente anúncio de Alberto João Jardim querer propor a proibição do comunismo na próxima revisão constitucional, a trinta e cinco anos depois do 25 de Abril de 1974, não lembraria ao diabo. Ou, pelo contrário, se levarmos em atenção o que este senhor tem feito nos últimos anos na Madeira, fará mesmo? Inclino-me fortemente a considerar que, vindo dele, tudo faz sentido.
Sinceramente, como eleitor, o que incomoda nem é tanto as diatribes deste senhor “Chaves” em reverso de medalha. O que me causa alguma perplexidade é o silêncio do PSD, e nomeadamente de Manuela Ferreira Leite. Para continuar a manter o bastião da Madeira vale tudo, a qualquer preço? Há muito que a direcção do partido laranja deveria ter retirado a confiança política a uma série de oligarcas que só enlameiam a doutrina de Sá Carneiro e desacreditam a política partidária. Indo a Doutora Manuela no próximo dia 22 à festa de Chão da Lagoa, na Madeira, o que vai dizer? Para não se meter em complicações verborreicas valia mais entrar de quarentena no dia 21, com a Gripe H1N1.
Claro que, no limite, até podemos dizer que saia lá o que sair do parlamento Madeirense é simplesmente uma proposta de revisão constitucional, e que, na prática, não tem qualquer valor. As revisões constitucionais são de reserva absoluta da Assembleia da República e, para as levar a efeito, será necessária a concordância de uma maioria de 2/3 dos deputados no parlamento nacional. Portanto, estrebuche lá o senhor à vontade que os seus troantes gritos, quanto muito, se chegarem aqui, ao “Contenente”, não passarão de uns gemidos parecidos com um miar de gato.
Esmiuçando um pouco, para quem não souber, o que quer verdadeiramente o homem que põe o PSD de cócoras, vou contar resumidamente. Este senhor revisionista, entre outros, quer alterar o artigo 46º, nº 4, da Constituição da República, que diz o seguinte: “Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista”.
Abro aqui um parênteses para dizer que se, ao longo dos anos, o final da frase “ou que perfilhem a ideologia fascista” nunca gerou consenso entre constitucionalistas, hoje, em face de novas organizações racistas não fascistas, muito menos sentido fará. Este actual ratificado vem da Assembleia Constituinte, reunida em sessão plenária de 2 de Abril de 1976. Nessa altura, tínhamos saído de regime autoritário, fazia todo sentido. Hoje não. Falar em fascismo, é transportarmo-nos para a Europa de 1930, para Hitler, Mussolini, e Franco. E sendo honestos intelectualmente, com todo o respeito por quem sofreu na pele a tirania da PIDE, Salazar ao pé destes assassinos era um menino de coro. Podem avocar-se mil argumentos mas a história não engana. É assim mesmo.
O que quero dizer é que as novas ideologias racistas que proliferam no hemisfério na maioria dos casos já pouco têm a ver com o “fascismo” idiossincrático daquela época. Terão muito mais a ver com ódios étnicos, motivos ligados à economia pela ocupação de empregos em detrimento dos nacionais, etc. Ou seja, quanto a mim, este “fascismo” de que “fala” a Constituição é apenas um papão para inglês ver, uma bandeira continuamente içada por um partidarismo ou ideologia absolutista, que para continuar a sobreviver precisa continuamente de clamar pelos seus fantasmas. Já há muito que o complemento “ou que perfilhem a ideologia fascista” deveria ter desaparecido do livro “master” português.
Ora se defendo a exclusão do que lá está muito menos defenderia a inclusão de uma outra relativa a comunismo.
O que se passa é que quer Jardim, quer outros, para se manterem vivos, precisam de chicana política. Sem ela já há muito que teriam desaparecido do mapa em que se inscreve um eleitorado atrasado e com pouca cultura e tolerância política. O que é deplorável, como no caso em apreço, é o apoio tácito, em forma de silêncio, de partidos históricos que são, já foram, e querem voltar a ser governo, em darem cobertura a estes trauliteiros e facciosos personagens que, pelos seus actos, só teriam lugar na literatura de banda desenhada.
Talvez esteja explicada a chafurdice em que mergulharam os partidos políticos desde a esquerda até à direita nas últimas décadas em Portugal.
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