Quem não conhece e chega de carro ao Estádio Universitário, junto ao rio Mondego, para estacionar no terreiro em frente, depara-se-lhe um “homenzarrão”, alto e entroncado, que mais parece um atleta. Se não fosse o boné identificativo, certamente, interrogar-se-ia: “que fará este homem aqui?”. É que a razão da pergunta tem a ver com o estereótipo que todos nós fazemos de determinados profissionais. No caso presente, de arrumador de automóveis, imaginamos ora um velho a arrastar os pés, ora um toxicodependente de mau aspecto.
O José Costa, de 51 anos, foge à figura-padrão de arrumador. Então, conte-me lá, ó Costa, como é que veio aqui parar?! “Olhe, eu trabalhava na construção civil. Ajudei a construir a ponte-açude ali à frente –e aponta com o dedo-, junto ao Choupal. Era funcionário da Sorefame, fazia soldaduras nas comportas. Quando acabou esta obra, por volta de 1981, fui para o desemprego. Entretanto, como passava aqui todos os dias, e soube que o velhote que prestava aqui serviço tinha morrido, como havia vaga, fui à câmara e pedi para trabalhar aqui. Tratei dos papéis –estou mesmo legal, quer ver?- e, passados quase 30 anos, cá estou eu”, conta-me o Costa.
E dá para viver?, interrogo. “Olhe, vai dando para educar os meus dois filhos. A minha mulher, felizmente também trabalha, é funcionária pública, e, tenteando, aqui e ali, poupando o máximo, vamos vivendo dignamente –ou sobrevivendo, diz-me no meio de um sorriso largo”.
E, conte-me, José, como é que as pessoas que não o conhecem bem, como eu, reagem quando encontram um “atleta” a arrumar carros? “Quem me conhece respeita-me. Sabem que sou muito responsável e cuido das viaturas como se fossem minhas –é evidente, não é? Isto é o meu ganha-pão!- é a minha profissão, por isso levo-a mesmo a peito. Dizem-me, quase sempre, que faço muita falta aqui. Quem não conhece, às vezes, manda bocas, do tipo “Vai trabalhar para as obras, malandro”, outras vezes, demonstram admiração –sabe?, as pessoas estão habituadas a ver só desgraçadinhos a arrumar carros, de mão estendida à caridade. Eu desempenho a minha função o melhor que posso, mas não peço nada a ninguém. Quem entende que deve contribuir, fá-lo. E eu aceito, claro! Eu não tenho ordenado. É daqui que pago a renda de casa ali para os lados de Santa Apolónia”, enfatiza o José.
Para além do tempo que ocupa na profissão, o Costa pratica pesca de competição. Quando pode também pratica desporto.
Imagine, Costa, que era nomeado para administrador deste grande espaço pertencente à Universidade, o que fazia imediatamente? “Se eu mandasse, no mínimo, ordenava que toda esta grande área fosse alcatroada e colocava faixas separadoras para arrumar os carros. Fazer isso, nem ficava muito caro. Já viu estes buracões? –fala, apontando as grandes crateras no chão. No inverno, isto é só lama. Não podemos esquecer que estamos às portas da cidade, mesmo na entrada da ponte de Santa Clara. Não acha?!”, interroga-me, sabendo bem que a minha resposta, para o caso, é irrelevante.
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