Esta semana, ao que parece,
encerrou a “Leya”, que funcionava, desde Novembro de 2011, no prédio da “Coimbra
Editora”, na Rua Ferreira Borges, junto ao Arco da Traição e paredes meias com
o Arco de Almedina. Não faço ideia em que regime contratual trabalhava esta
marca editora nacional com a “Coimbra Editora”, no entanto, o que se espera é
que esta loja, que em carga memorial tanto significa para todos nós, reabra
proximamente sobre orientação da velha casa-mãe –se é que a “Leya” já não teria
adquirido a “Coimbra Editora”.
Depois de há cerca de quatro anos
a livraria Almedina ter encerrado duas lojas nesta mesma rua principal e no ano
passado a livraria 115 ter fechado o seu espaço na Praça 8 de Maio, agora foi
esta distribuidora de livros. Bem sei que ninguém se questiona, mas talvez
fosse bom pensar o que está a acontecer à Baixa. Paulatinamente, pé ante pé, as
suas casas com meio-século de existência mais identificativas de um passado
comercial glorioso estão a desaparecer todas. Nos últimos anos, só para
amostragem, encerraram de uma assentada a Casa São Tiago, as Galerias Coimbra e
a Traje; O Saul Morgado; o Turíbio de Matos; a sapataria Satélite; a Topal; a
sapataria Reis; a Casa Ramiro; a Arca; os Marthas; a Fetal; o Infinito; a
sapataria Charles; a Casa Ruben; a Sacril; a Casa Bonjardim; a Chuteira; a Jezequel; etc, já poucos ícones restam na cidade. É
certo que, apesar de toda esta razia, muitas delas voltam a abrir com outros
ramos, o problema é que não duram mais do que escassos dois anos, que, sem
dados estatísticos, será a média de duração de uma loja comercial renovada,
isto é, que foi ocupar o espaço de uma antiga. Por outro lado, assistimos a um
cada vez maior enfraquecimento de oferta comercial nesta zona de compra e venda e
constatamos uma repetição de roupas e sapatos, que, como se sabe, são excedentários. Sem planeamento, a diversidade é cada vez mais uma utopia. Depois destes
encerramentos de livrarias, que tudo indica não ficar por aqui, seguir-se-ão
outras áreas, por exemplo, como lojas de decoração, lojas de desporto, bazares
de brinquedos, etc.
Ainda há escassas duas semanas
fiz um levantamento de lojas encerradas na Baixa. Dizia eu, aqui, que eram 125.
Agora já são 127. Só este ano já contei 13 estabelecimentos que claudicaram.
Por outro lado há uma questão que
se levanta e que urge analisar: por que razão há 13 lojas encerradas nas duas
ruas mais importantes da Baixa? Ou seja, que motivos pode haver para o canal
comercial que, no último século, foi o mais rico em termos de oferta, hoje
estar transformado num cemitério de estabelecimentos mortos há vários anos? As
interrogações poderão ser várias e urge dar respostas. Pode-se aventar que um dos
motivos será o facto de haver várias lojas pertencentes ao mesmo proprietário?
Pode conjecturar-se que o facto de esta rua estar transformada em pedonal, sem
trânsito de transportes colectivos, pode estar a condicionar e afundar o seu
comércio? Poderá ser o facto de os proprietários, apesar da queda abrupta de
negócio, incompreensivelmente continuarem a considerar estas ruas largas ainda
as melhores e pedirem valores acima de 1000 euros? Como curiosidade, saliento o
dado de os ex-comerciantes ou profissionais ainda no activo serem os piores
carrascos para os seus pares. Vou contar um pequeno episódio que está a
acontecer aqui numa destas ruas. Há poucos anos, um estabelecimento com cerca
de meio século foi passado pelos pais já entradotes e cansados aos filhos sem
estes pagarem renda. Sem culpa atribuída especificamente, estes, foram à
falência. Agora a renda pedida pelos velhotes –ex-comerciantes, lembro- é de 1500
euros. Em resumo, para os filhos, que não pagavam mensalidade, não deu e foram
para a insolvência, mas para quem vier de novo tem de dar. Admite-se uma coisa
destas? Admite-se sim. Vivemos num sistema de livre concorrência, isto é, cada
um pode pedir o que bem entenda pelo que é seu. O que estamos todos a esquecer
é que este processo –que tem entre nós cerca de 25 anos- está a desgraçar a economia
moderna e a provocar um verdadeiro desfiladeiro entre ricos e pobres. Confesso
que sou um dos enganados. Sempre defendi este sistema económico.
Está de ver que é preciso debater
este problema sério que está a enviar a Baixa para um precipício sem fundo. É
preciso ver, com olhos de ver, de que maioritariamente os comerciantes
profissionais aqui a laborar têm mais de 50 anos. Para piorar, o consumidor,
também maioritário, que frequenta estes negócios, para além de ter pouco poder económico,
é também muito envelhecido. Juntando estas duas premissas explosivas, podemos
perguntar: que futuro espera os centros históricos? Todos sabemos que o
comércio nas cidades foi sempre a sua alma revivificadora. Se, como se está a verificar
progressivamente, assistirmos pacificamente ao seu enterro sem nada fazer o que
vai acontecer às zonas históricas do país? Sim, porque este é um problema
transversal a todo o nacional. Poderá haver um repovoamento habitacional sem
comércio? Será que os novos habitantes ousarão transferir-se para uma zona
interessantíssima do ponto de vista urbanístico e monumental, mas vazia de
animação e insegura? O que se quer para o futuro desta zona velha? Mais bares?
Mais serviços? Mais pólos universitários espalhados por aqui? Ou em resultado final
espera-se um gueto, onde proliferam animais abandonados, toxicodependentes e sem-abrigo,
e onde será impossível penetrar?
Esperemos que nos próximos
tempos, e agora que se aproxima o pleito eleitoral, haja um debate sério sobre
a Baixa, e sobretudo que conduza a obra feita. Refiro sério, porque até agora
não o tem sido. O que se assiste é toda a gente, alguns com muita
responsabilidade nesta morte anunciada e incluindo os candidatos autárquicos, a
lamuriar-se pelo envelhecimento e afundamento, em palavras condoídas de paixão
e sofrimento atroz, mas na prática não se vê nada de novo.
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