Hoje, por volta das 10h00, a
denominada “Orquestra de Músicos de Rua de Coimbra”, composta pela Celeste,
pelo Paolo, pelo Emanuel, pelo Armando, pelo Lourenço, pelo Luís, pela Fátima e
este vosso serventuário, começou a terceira ronda e última, a cantar as
Janeiras. Saliento que hoje a nossa actuação foi filmada pelo nosso “camaraman”,
operador de filmagem, o Luís Filipe Perdigão que, mais uma vez, fez o favor de
registar em vídeo a nossa passagem pelas ruas da Baixa.
Foi interessante porque, para
aquecer as vozes e desentorpecer as mãos –hoje estava um frio cortante-,
começámos a ensaiar às 9h30 no Largo da Freiria. Como as lojas ainda não tinham
aberto ao público, num relance, foi bonito ver alguns funcionários comerciais a
cantar connosco. É curioso também verificar que, num registo alargado, contribuíam
mais facilmente os empregados do que os patrões. Por parte de alguns empresários deu
para sentir um certo desligamento. Vi alguns, incluindo pessoas com
responsabilidades no sector, dizerem ostensivamente que não traziam carteira.
Estas pessoas ocupam lugares políticos, na relação com a polis, no mínimo
era-lhes exigido uma performance nem que fosse teatral, no gesto de dar uma moeda
grande ou pequena, para que não passassem por insensíveis e pelintras. É óbvio
que estas pessoas ocupam estes cargos apenas pelo protagonismo e nunca
estiveram interessados nem em dar qualquer exemplo aos seus pares nem em
representar quem quer que fosse. Infelizmente o país está cheio destes modelos.
Passemos à frente.
Assisti a outros profissionais do comércio que
ao serem confrontados pela Celeste, de uma forma depreciativa, se afastavam sem
uma única palavra de cumprimento. Vi outros que, por exemplo, a limparem um
vidro, sem um único olhar ou palavra assim continuaram. Bolas, isto é uma
declarada falta de respeito. A maioria destes comerciantes começaram do nada e
depressa esqueceram o que passaram para alcançar a posição que detêm hoje –ainda
que, pela crise sentida e olhando para mim, é de supor que não seja invejável-,
mas há muita falta de cultura, sobretudo educação e respeito pelo próximo, por
parte destes profissionais. Nem a letra da “Canção das Janeiras” os fazia darem
um olhar de consideração:
CANÇÃO DAS JANEIRAS
Senhora que estais lá
dentro
vem cá fora, vem-nos
ver,
traz contigo qualquer
coisa,
qualquer coisa p’ra
comer;
Já agora sem abusar,
um dinheiro, por
favor,
é p’ra dar ao
Deus-menino,
filho de Nosso
Senhor;
Tenta ser mui generosa,
dá uma nota de
contente
a ti pouca falta faz,
e a nós muita,
certamente;
REFRÃO
Somos os Reis cá da terra,
vassalos e sem peneiras,
cantamos
canções de amor,
na
tradição das Janeiras
Nesta casa mora gente
com coração p’ra
sentir
ainda lembra, certamente,
quando ao rico foi
pedir;
É triste não recordar
e a memória esquecer
se não tem nada p’ra dar
ao menos venha nos ver;
Obrigada gente boa,
alma
muito generosa,
que
nunca vos falte a broa,
nem o brilho de uma rosa.
Dizia eu então que cerca das
10h00 recomeçámos a nossa via-sacra pelas ruas estreitas. Estivemos em frente à Câmara Municipal e
acabámos na Rua da Sofia. Hoje, ou por ser Sábado ou por que a maioria dos
transeuntes tinha conhecimento, já que ontem saiu em todos os jornais locais e
nacionais a nossa prestação de cantar as Janeiras na Baixa, a verdade é que dos
três dias este foi mesmo o melhor. Vários anónimos deram notas de 5 e 10 euros.
Juntou-se 183,00 euros, e que, em resultado dividido, deu cerca de 26 para cada um dos sete músicos –como
já disse, repito para não haver confusão, eu não conto nesta divisão. Só quando
ganharmos milhões é que vou buscar a minha parte, com juros. Por enquanto, como
são cêntimos, não aceito. Nós os ricos somos assim.
Em resumo final, deu para ver que
esta iniciativa, de um modo generalizado, foi muito bem aceite por todos e
correu muito bem. Proximamente virão outras festividades, como o Carnaval, a
Páscoa, Dia da Cidade e outras, ora estes músicos, com um custo mínimo, podem
muito bem serem aproveitados para alegrar a Baixa. Para além disso, tenho a certeza,
com este passo, estamos todos a começar a aceitar melhor que estas pessoas prestam
mesmo um bom serviço para alegrar as ruas e são muito importantes para a cidade.
Durante este desempenho de hoje
os baixos do acordéon do Paolo Vasil, o músico romeno, resolveram ir-se ainda
mais para baixo. Por outras palavras, o instrumento avariou. Mesmo assim o
Vasil, muito menos ritmado, andou até ao fim. Depois da prestação o Paolo veio
ter comigo e, naquele seu olhar terno de meiguice, com a voz entrecortada dividida
entre “pretoguês” e “romenês, disse: “sinhôr”… Luís, “estar” em dificuldade…
Não ter dinheiro para “concirtar” instrumento de música. O “qui” posso fazer?
Quem “mi” pode ajudar? “Mi” precisa de juntar todo o dinheiro para a renda “di”
casa. O “qui” posso fazer, “sinhor” Luís?”
Naturalmente que não tive
resposta para esta questão. Trabalho todos os dias e, como todos, também tenho
dificuldades. Sou um pequeno comerciante remediado, mas que para andar com eles,
músicos, durante todo este tempo, tive o meu estabelecimento encerrado e tenho
alguns custos a que não dou importância. Dito de uma outra forma: tenho cara
igual ao Pai Natal, mas não sou igual. Não tenho barbas brancas como este e sou
muito mais novo. Dito de outra maneira e em apelo: se durante a próxima semana
você, leitor, passar junto ao Museu Municipal do Chiado e encontrar lá o Paolo
Vasil seja generoso. Lembre-se que a sua “enxada” de trabalho está avariada.
Obrigado.
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