Quem faz o favor de ler o que
escrevo, certamente, deve notar que faço um esforço para não cair na facilitista
crítica destrutiva subsequente. Isto é, nas crónicas que apresento, para além
de fundamentar e justificar o meu ponto de vista, procuro ser proactivo e
credível. Se, por um lado, não me move o espírito jornalístico bombástico, por
outro, não quero ser uma espécie de anjo da desgraça. Bem sei que não é fácil
fugir a estes entendimentos, sobretudo sendo realista, que é assim que me
classifico.
Serve-me esta longa introdução
para dizer que não entendo, por exemplo, como é se gastam milhões de euros a
preparar uma sala de atendimento público futurista num edifício centenário –refiro
obviamente as recentes obras camarárias na sede da Praça 8 de Maio. Não entendo
como se gastam 15 milhões de euros no (novo) Museu Machado de Castro e depois
não há dinheiro para pequenas companhias independentes de teatro e outras
entidades ligadas à cultura das populações urbanas e rurais –saliento que não
estou contra o investimento no museu de Coimbra, contesto, isso sim, a gestão
dos fundos. Pode argumentar-se que era um projecto antigo, mas um Estado não
pode apenas afectar verbas numa obra e deixar outras à míngua. Não pode tratar
uns como filhos e outros como enteados. Bem sei que esta minha posição não será
unânime, mas, mesmo sabendo que estou a ir contra a corrente dominante, é assim
que sinto. Já há muito que se deveria ter cortado com mausoléus que apenas
servem para enterrar o futuro dos nossos netos.
Continuando na minha cruzada
pouco clara, outro exemplo: há poucos dias foi anunciado na imprensa que a
mesma autarquia de Coimbra iria contrair dois novos empréstimos, um deles, de 5
milhões de euros, para o novo Centro de Convenções e Espaço Cultural do
Convento de São Francisco. Está bem? Está mal? Ora bem, na minha apreciação
bacoca, vendo o adiantado estado de gravidez do mastodôntico imóvel, não
haveria outra hipótese senão continuar com as obras para que o parto, no
mínimo, seja assistido com segurança. Quanto ao futuro da criança, isso já será
outra questão da qual não me quero pronunciar. Tal como nos exemplos
anteriores, o que gostaria de chamar a atenção é que para estas grandes construções
há sempre disponibilidade financeira e para pequenas minudências já não há.
Pior do que isto, nem vontade de resolver os problemas, porque, às vezes,
implica apenas o querer fazer e pouquíssimo dinheiro. Vou dar dois exemplos. Poderia
apresentar muitos mais. Há mais de um mês que um triângulo constituído pelo
Largo da Freiria, Rua Eduardo Coelho, Padeiras e Almoxarife, por aparentemente
haver uma avaria no relógio da EDP, se encontra às escuras até às 18h00
diariamente, quando nas artérias limítrofes a iluminação pública acontece às 17
horas. É necessário dinheiro para repor a anterior situação? Não senhor. O que
é preciso é vontade, interesse pela coisa pública de quem gere. E note-se, há
uma série de entidades com responsabilidade pelo estado da Baixa. Sendo assim
entende-se que esta situação se mantenha? Compreende-se porque não há ninguém
que, mandando um murro na mesa, ligue para a EDP e diga, preto no branco: “os
senhores estão a brincar com a Baixa?”
Outro exemplo: neste fim-de-semana,
último, o país e a cidade foram assolados pelo temporal e com muitos estragos à
mistura. Nas Escadas de São Tiago um candeeiro de rua deixou soltar uns vidros
e ficou com uma porta aberta –repare-se que estamos a falar de uma pequena
reparação ligeira. Qualquer pessoa sabe que basta colocar uma escada alta tirar
as medidas aos vidros e em escassas horas estaria o problema resolvido. Ora o
que fizeram os serviços? Logo na segunda-feira trataram de colocar umas fitas
protectoras no perímetro do lampião. Hoje já é quinta-feira e, pelos vistos, a
coisa estará para durar. Numa cidade que é candidata e pretende ser reconhecida
pela Unesco como Património da Humanidade admite-se uma coisa destas? Falamos
de minudências? É verdade, mas, em qualquer acto humano, é nos pormenores que
reside a essência do todo. Esta zona velha, todos dizem, é uma jóia
arquitectónica. Sendo assim, não deveria ter uma equipa para acorrer a estes
pequenos desarranjos?
Valerá a pena escrever mais
alguma coisa? Aliás, pelo constante desprezo a que se assiste por esta zona
histórica só contar já cansa. Creio que por esta continuada apatia quem sai
vencido é quem denuncia este laxismo e aqui reside e trabalha. Esta indiferença
leva à desmotivação total. Como é que se há-de aguentar este reiterado
comportamento?
Sem comentários:
Enviar um comentário