quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

BAIXA: NOS PORMENORES ESTÁ A DIFERENÇA



 Quem faz o favor de ler o que escrevo, certamente, deve notar que faço um esforço para não cair na facilitista crítica destrutiva subsequente. Isto é, nas crónicas que apresento, para além de fundamentar e justificar o meu ponto de vista, procuro ser proactivo e credível. Se, por um lado, não me move o espírito jornalístico bombástico, por outro, não quero ser uma espécie de anjo da desgraça. Bem sei que não é fácil fugir a estes entendimentos, sobretudo sendo realista, que é assim que me classifico.
Serve-me esta longa introdução para dizer que não entendo, por exemplo, como é se gastam milhões de euros a preparar uma sala de atendimento público futurista num edifício centenário –refiro obviamente as recentes obras camarárias na sede da Praça 8 de Maio. Não entendo como se gastam 15 milhões de euros no (novo) Museu Machado de Castro e depois não há dinheiro para pequenas companhias independentes de teatro e outras entidades ligadas à cultura das populações urbanas e rurais –saliento que não estou contra o investimento no museu de Coimbra, contesto, isso sim, a gestão dos fundos. Pode argumentar-se que era um projecto antigo, mas um Estado não pode apenas afectar verbas numa obra e deixar outras à míngua. Não pode tratar uns como filhos e outros como enteados. Bem sei que esta minha posição não será unânime, mas, mesmo sabendo que estou a ir contra a corrente dominante, é assim que sinto. Já há muito que se deveria ter cortado com mausoléus que apenas servem para enterrar o futuro dos nossos netos.
Continuando na minha cruzada pouco clara, outro exemplo: há poucos dias foi anunciado na imprensa que a mesma autarquia de Coimbra iria contrair dois novos empréstimos, um deles, de 5 milhões de euros, para o novo Centro de Convenções e Espaço Cultural do Convento de São Francisco. Está bem? Está mal? Ora bem, na minha apreciação bacoca, vendo o adiantado estado de gravidez do mastodôntico imóvel, não haveria outra hipótese senão continuar com as obras para que o parto, no mínimo, seja assistido com segurança. Quanto ao futuro da criança, isso já será outra questão da qual não me quero pronunciar. Tal como nos exemplos anteriores, o que gostaria de chamar a atenção é que para estas grandes construções há sempre disponibilidade financeira e para pequenas minudências já não há. Pior do que isto, nem vontade de resolver os problemas, porque, às vezes, implica apenas o querer fazer e pouquíssimo dinheiro. Vou dar dois exemplos. Poderia apresentar muitos mais. Há mais de um mês que um triângulo constituído pelo Largo da Freiria, Rua Eduardo Coelho, Padeiras e Almoxarife, por aparentemente haver uma avaria no relógio da EDP, se encontra às escuras até às 18h00 diariamente, quando nas artérias limítrofes a iluminação pública acontece às 17 horas. É necessário dinheiro para repor a anterior situação? Não senhor. O que é preciso é vontade, interesse pela coisa pública de quem gere. E note-se, há uma série de entidades com responsabilidade pelo estado da Baixa. Sendo assim entende-se que esta situação se mantenha? Compreende-se porque não há ninguém que, mandando um murro na mesa, ligue para a EDP e diga, preto no branco: “os senhores estão a brincar com a Baixa?”
Outro exemplo: neste fim-de-semana, último, o país e a cidade foram assolados pelo temporal e com muitos estragos à mistura. Nas Escadas de São Tiago um candeeiro de rua deixou soltar uns vidros e ficou com uma porta aberta –repare-se que estamos a falar de uma pequena reparação ligeira. Qualquer pessoa sabe que basta colocar uma escada alta tirar as medidas aos vidros e em escassas horas estaria o problema resolvido. Ora o que fizeram os serviços? Logo na segunda-feira trataram de colocar umas fitas protectoras no perímetro do lampião. Hoje já é quinta-feira e, pelos vistos, a coisa estará para durar. Numa cidade que é candidata e pretende ser reconhecida pela Unesco como Património da Humanidade admite-se uma coisa destas? Falamos de minudências? É verdade, mas, em qualquer acto humano, é nos pormenores que reside a essência do todo. Esta zona velha, todos dizem, é uma jóia arquitectónica. Sendo assim, não deveria ter uma equipa para acorrer a estes pequenos desarranjos?
Valerá a pena escrever mais alguma coisa? Aliás, pelo constante desprezo a que se assiste por esta zona histórica só contar já cansa. Creio que por esta continuada apatia quem sai vencido é quem denuncia este laxismo e aqui reside e trabalha. Esta indiferença leva à desmotivação total. Como é que se há-de aguentar este reiterado comportamento?

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