Em Janeiro de 2011 escrevi sobre este mesmo
assunto e enviei para conhecimento às entidades competentes. Nenhuma delas me
ligou ou respondeu. Quero dizer, portanto, que estou a chover no molhado. Mas,
levando a ousadia ao cúmulo de me auto-classificar e salvo melhor opinião, numa bipolaridade existencial, quem
escreve será sempre um pessimista -realista, de pés assentes no chão- e com os
olhos num optimismo moderado, mas sem descurar o romantismo e o encantamento
das estrelas. É uma espécie de em cima/em
baixo –acredita em tudo, não acredita em nada-, um cai/ levanta. Tudo por que se, por um lado, desvaloriza, perdoa, porque entende a natureza humana –no sentido de que sabe e apreende que somos todos incompletos e
o errar faz parte da nossa essência-, por outro, nunca perde a fé nesta mesma
humanidade, já que a imprevisibilidade, como que a compensar, complementa todo
o lado negro e selvagem que existe dentro de nós e, a qualquer momento, sem que
nada o faça pressagiar, repentinamente, as coisas mudam.
Há quatro anos entrei numa loja de artesanato
de um amigo, na zona do Largo da Sé Velha, e, com ar pungido, lamentava-se o
meu conhecido sobre o escândalo das comissões “exigidas” por alguns –sublinho alguns- guias turísticos aos donos
das lojas para levarem os turistas que acompanhavam aos seus estabelecimentos. Nessa
altura, dizia-me ele, que se por acaso algum “tresmalhado” entrasse e estivesse prestes a comprar o guia chegava
a ir chamá-lo dentro do estabelecimento e convencia-o a ir a outro congénere.
Esta semana fui visitar outro amigo que abriu
a sua loja há cerca de um ano na mesma zona. E, sem que na conversação houvesse
intenção, veio à baila o mesmo assunto. Quanto a mim, o problema continua por que
os comerciantes do ramo alegadamente lesados não dão a cara. Neste caso a mesma
coisa, vou apresentar o seu depoimento sob anonimato. Achei muito curiosa esta conversa. O meu amigo chega a apresentar uma solução muito interessante,
dirigida à Câmara Municipal, para que a rota
viciada, seja alterada. Vou então transcrever as suas declarações.
“O que está a acontecer com alguns guias turísticos é um verdadeiro escândalo!
Saliento que este suborno não é extensível a todos mas apenas a alguns. Como em
todas as profissões também aqui há gente com dignidade. Disse-me um guia meu
conhecido que as comissões cobradas, em “cash”, em dinheiro vivo, sobre o total
das vendas são de 20 por cento. Isto é um esbulho! É a máfia em toda a sua
imponência, nas nossas barbas e com a nossa permissão.
Os turistas vêm em rebanho e o pastor (o guia) encaminha-os para as
casas com quem tem contrato. Já me tem sucedido ver um grupo na minha montra e
o guia a apontar para os meus produtos e adereços e quando um deles vai para
entrar ele chama-o. Ainda há poucos dias aconteceu. Parou um grupo, viram a
montra e a guia -era uma mulher- apontando cá para dentro, esteve a mostrar os
bens que comercializo e a explicar os meus adornos decorativos e desandaram, com
a timoneira a “arrastá-los” para onde lhe convinha, Isto, porque a minha loja
não faz parte do seu roteiro concebido anteriormente e de acordo com a sua
execrável forma de ser. Passado um bocado entrou a guia cheia de pressa. Veio
comprar-me um artigo e a bater-se ao desconto. Isso é que era bom! Até porque,
com as margens de lucro que pratico, se alguma vez me “vendesse”, nunca poderia dar
vinte por cento de comissão a essa gentalha indigna, que abandalha a sua
profissão e desgraça quem trabalha honestamente. Eu já vi um responsável de
grupo a empurrar os excursionistas para uma loja. Não alinho nestes jogos miseráveis
de bastidores. A maioria dos guias turísticos procede assim. Levam os turistas
para as lojas que lhes pagam por debaixo da mesa. É uma indecência! Infelizmente,
tenho de confessar, não tenho grande esperança que esta situação alguma vez
seja alterada. Não há interesse na mudança porque, se for modificada, é um
corte no ordenado do guia.“
É PRECISO TROCAR AS
VOLTAS AO MONSTRO
“Você já
pensou porque é que não há lojas de artesanato na Rua Visconde da Luz, Praça 8
de Maio e Rua da Sofia –esta que até foi declarada, pela Unesco, como
Património Mundial- e está tudo concentrado entre a Rua Ferreira Borges, Arco
de Almedina, Escadas de Quebra Costas e Largo da Sé Velha? Eu explico! Porque
os autocarros param todos no Largo da Portagem e os turistas, como carneiros,
são ali despejados de qualquer maneira e feitio e encaminhados para os
repetidos roteiros: Rua Ferreira Borges, Arco de Almedina, Escadas de Quebra
Costas, Largo da Sé Velha, Universidade e voltam pelo mesmo caminho.
Já reparou que poucos são os grupos que passam do Arco da Barbacã e vão
até à Igreja de Santa Cruz? Então para a frente, em direcção à Rua da Sofia, é
um milagre.
Se houver vontade política camarária, é muito fácil de trocar as voltas
ao monstro. Basta consignar o espaço de estacionamento em frente ao Mercado
Municipal D. Pedro V para os autocarros turísticos e, para além de o próprio
mercado passar a ser visita obrigatória, toda a Rua da Sofia e congéneres passa
a fazer parte de um novo itinerário. Mas isto não é claro como a água? É
preciso fazer um desenho?”
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