Encontrei-o ontem, à hora do almoço, junto à
Câmara Municipal. De cabelo prateado, bem penteado, e barba hirsuta bem cuidada,
óculos de sol vanguardistas –um pouco efeminados mas não interessa nada-, três
terços enrolados no pescoço –porque numa altura destas quantos mais rosários
melhor-, um cheirinho a lavadinho, eis o senhor Mendes, mais conhecido e
baptizado por mim como o “Fura-mundos”.
Notei que está magrote, o Mendes!
Quando me avista corre –como quem diz, anda
devagarinho e amparando-se na bengala- na minha direcção e repete: “ó mano! Estás bom, mano?!”. E eu fico
sempre a balouçar na metódica dúvida: se somos irmãos quem lançou a semente?
Teria sido o pai dele ou o meu? Penso que o meu não seria, porque, enquanto
andou por cá, viajou pouco e nem sequer era caixeiro-viajante. As voltas que o
meu pai deu foram de circum-vida. A
tentar safar-se de um tempo de miséria. Às tantas seria o progenitor do “Fura-mundos” que, viajando lá para os
meus lados da Bairrada, teria feito das suas. Em conversa há uns anos, o Mendes
afirmou-se de sangue azul, de origem monárquica. Vendo bem, olhando-me de alto-a-baixo,
pelas minhas manias e de tanto gostar da cor do céu, e das estrelas, se calhar,
sei lá, às tantas, quem sabe?
As nossas conversas terminam sempre como
começam: “estás bom, mano? Empresta aí
uma moeda para eu beber um café! Obrigado, mano!”
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