Nesta sexta-feira fui à Loja do Cidadão para
alterar a morada fiscal. Encaminhei-me para o placard –que, já escrevi aqui, é
pouco acessível mesmo até para quem está habituado. Sabia que o que procurava
era os serviços do Instituto dos Registos e Notariado. E cliquei na sigla IRN.
Apareceu-me uma ementa de opções. Como se tratava do “Cartão de Cidadão” seleccionei duas opções: “Cartão de Cidadão –pedido”
e “Cartão
de Cidadão –entregue”. E agora? Qual destas preferências trataria do
meu caso? Inclinei-me para colocar o indicador no “Cartão
de Cidadão –pedido”. Retirei a senha e, de olhos colados no visor, aguardei
pela minha vez cerca de dez minutos. Quando o placard ribombou e o número
começou a piscar levantei-me e dirigi-me ao guichet
indicado. Azar danado, tiro ao lado, não era ali. Deveria ter escolhido a opção
“Cartão de Cidadão-entregue”.
Retirando o tempo económico perdido –que poderia ser evitado se a indicação
fosse clara, como por exemplo se mostrasse “renovação”, “alteração”-, não havia
problema de maior. Retirei outra senha e aguardei –não sem deixar de reflectir,
num misto de irritação, que as coisas poderiam ser tão fáceis se quem manda
nesta sinalética fosse menos egoísta e, por um momento, pensasse um pouco nos
outros, sobretudo nas pessoas simples, algumas, que mal sabem ler quanto mais
interpretar algoritmos.
Como já ia prevenido para esperar, levando um
jornal, os meus olhos iam alternado entre o LCD,
pregado na parede, e a notícia “Atrasei-me
por distracção e por falta de dinheiro”, declarações do Primeiro-ministro e
plasmada no semanário Sol. Para
ventura minha –mais que certo, pela teoria da compensação, que se acredita que a
seguir a um azar ocorrerá algo de sorte- estive pouco tempo à espera e fui
chamado para ser atendido. À minha espera tinha uma funcionária na idade de
ouro, entre os quarenta e os cinquenta. Na pequena chapa identificativa
estava escrito: Aldora Couceiro. Dei-lhe os bons dias. Fixando-me, retribui-me com
uma saudação efusiva, viva, com o mais lindo e encantador sorriso que fui presenteado nos últimos tempos. Senti a sua gentileza da mesma forma que se recebe um raio
de Sol em pleno Inverno, frio e desaconchegado. Aquela amabilidade foi como um
manto de luz espiritual que nos fortifica o corpo e enche a alma de
contentamento. Com uma simpatia invulgar, enquanto tratava do caso específico,
eu ia pensando: digo-lhe o quanto foi
importante receber o seu cumprimento? Ou não digo? Mas se não lhe der
conhecimento, saberá esta funcionária pública quanto está a contribuir e a fazer
bem a quem tem a felicidade de lhe calhar em vez?
No fim do atendimento esmerado e de
simpatia, atirei: já lhe disseram hoje
que a senhora é muito simpática? Já lhe confiaram que a senhora, em modelo, é o
funcionário público que qualquer cidadão espera encontrar? Muito obrigada!
E as órbitas e os olhos de Aldora inundaram-se de lágrimas.
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