quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

EDITORIAL: ESTA CIDADE...

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)


 Coimbra é uma cidade estranha. Estranha, não no sentido de ser diferente para melhor, mas para o pior. É uma urbe de pequenas ilhotas onde pululam os amigalhaços, nas confrarias, nos clubes, nos partidos, onde o que conta verdadeiramente para a maioria é a importância do “Dr” a anteceder o nome, ou a posição que ele ocupa na administração da cidade, ou, se escreve, e desde que seja jornalista, mande uns bitaites mesmo que sejam uns disparates ofensivos à honra e dignidade, todos batem palmas. Basta abrir qualquer um dos dois jornais diários locais e analisar os articulistas. Coimbra é uma cidade cínica, calculista, subserviente e hipócrita. Onde a sua alma errante, o seu espírito negro como negro é o seu fado, vagueia entre a Câmara Municipal e a Universidade. Vale mais uma bufa mal cheirosa de um doutor ou de um político partidário que um frasco de perfume com cheiro a rosmaninho se vier de um qualquer trabalhador. O sumo da razão, enquanto ideia equilibrada e ajustável, nunca interessou nada. É uma cidade vazia, desprovida de ideias novas. Tal como o país, vive do passado e à espera de um D. Sebastião que, embrulhado em capa de super-homem, a venha retirar deste estado amorfo de letargia. Porém, vá-se lá entender, se ele aparecer não será levado em boa conta, será expulso e corrido a pontapé.
Outro dado a merecer reflexão, pode até ser a maior aselhice e badalhoquice do planeta mas desde que venha de um iluminado com orelhas de burro todos vão atrás a lançar loas ao mastronço. Mas depois do personagem virar costas, no diz-que disse, gritam-se cobras e lagartos contra a sua arrogância imperialista e contam-se segredos de alcova. Este comportamento arregimentado passa-se ao nível da classe média superior e que detém algum poder, não de facto, mas de influência. Curiosamente, do meio para baixo, para além de se projectar um ódio visceral ao grupo altaneiro, nunca é possível apelar ao sentido ético-moral corporativo onde o espírito de união deveria funcionar como defesa, colmatando a fragilidade.
E servi-me desta longa introdução para manifestar a minha indignação. O que vou escrever a seguir é um exemplo, entre outros, que mostra bem a apatia que reina em alguns sectores da vida profissional da cidade e que explica a causa deste grande lugarejo com várias capelas nunca passar da cepa torta. O Arménio Pratas é um reputado comerciante estabelecido na Rua da Sofia. Para além disso –que não é pouco, já diz muito da sua loucura, se tivesse juízo há muito tempo que tinha ido fazer outra coisa qualquer e largado o negócio- é um cidadão preocupado com a situação premente que o comércio tradicional atravessa.  Vai daí, há umas semanas contactou a CPPME, Confederação Portuguesa das Micro Pequenas Empresas, para vir à cidade debater esta grave crise que se abateu na compra e venda de rua, incluindo a fiscalidade, o investimento e o crédito, a justiça e o apoio social, entre outros temas. A CPPME aceitou, com a promessa de vir o seu presidente João Pedro Santos, mas ainda fez mais, prometeu trazer consigo um experimentado fiscalista e reputado economista, Eugénio Rosa, ligado ao PCP. Ficou assente que seria feito um jantar-debate na próxima sexta-feira, dia 22. O Pratas andou esta semana a contactar todas as lojas da Baixa para que cada comerciante pudesse colocar a sua questão, reportando dúvidas, e, neste jantar com um custo de 10 euros por pessoa, ficasse minimamente esclarecido quanto ao presente nebuloso e futuro mais que certo na pobreza. Tendo em conta o momento gravíssimo que se assiste, em que fecham mais lojas do que bocejos dos donos são detectados, seria de supor que a Baixa não teria um restaurante com uma sala suficiente grande para albergar tanto descontentamento. Seria assim? Não, não é. O Arménio, ontem, cancelou o encontro por falta de interessados. Conseguiu 8 inscrições e 6 prováveis sujeitos a confirmação.
Como entender um resultado destes? É a pertinência titânica que se impõe. Como é que se pode compreender que uma classe que, pela indigência crescente, precisa de apoio urgente reaja desta maneira? Será comodismo? Será pela desmotivação que, atingindo o incomportável, está ao nível do “estou por tudo. Já não me importo com o que vier!”? Ou falamos de hipocrisia, no pior deste sentimento, onde impera a dissimulação, a falsidade, o fazer de conta de que ainda se é, ou tem, sem nada ser e sem nada ter? Onde grassa o individualismo, no grau mais elevado de egoísmo, desligado do que se passa à sua volta? Com este procedimento caminhamos para onde? Com comerciantes assim alguma vez se consegue recuperar a Baixa? Como a culpa não pode morrer sozinha, bem podem continuar a culpar a classe política de todos os males. TRISTEZA!






1 comentário:

Liliana Azevedo disse...

Excelente reflexão e que, infelizmente corrobora o que digo muitas vezes sobre o comércio e alguns comerciantes da baixa de Coimbra. A crise financeira / económica, neste caso, não justifica tudo e é uma pena que assim seja.