sábado, 27 de junho de 2009
COMO RESOLVER O PROBLEMA DA ABSTENÇÃO?
Nas últimas eleições para o Parlamento Europeu a percentagem de portugueses que se esteve a marimbar para quem disputava um lugar ao sol em Bruxelas, ultrapassou os 60 por cento.
Uma das preocupações manifestadas pelos partidos, exceptuando o PSD, com a data da marcação das próximas eleições autárquicas e legislativas, pelo Presidente da República, era exactamente a possibilidade de serem marcadas para o mesmo dia. E, neste caso, que veio a ser contrariada pelo Chefe de Estado, o que estava em causa era a abstenção maciça dos eleitores, descontentes com a prestação dos políticos, poderem, tal como nas europeias, não comparecerem. E, se assim fosse, é óbvio, a abstenção alastraria às duas eleições, legislativas e autárquicas, e, pela ausência de votos, beneficiaria o PSD.
É evidente que este recurso à votação em separado pode ter resolvido o cenário que se apresenta para este ano, mas não resolverá os problemas da abstenção futura.
Talvez valha a pena, por momentos, perorar sobre este assunto. O que poderão os partidos fazer para levar os eleitores até às urnas?
Vamos analisar a razão da maioria dos portugueses não votar. O que invocam para a escusa?
A maioria, alega, sente-se defraudada com as promessas dos políticos em campanha eleitoral e depois de eleitos fazerem exactamente o contrário do prometido.
Mas será mesmo este argumento, “ipsis verbis”, o causador deste desinteresse? Estou convencido que não.
Para dar provimento a esta razão avocada seria preciso que os portugueses, noutras eleições ou de actos de participação política, acorressem em massa. Acontece que não. As pessoas, na maioria, estão completamente a leste para o que se passa à sua volta. Seja para a eleição do seu clube de futebol, seja para defender uma qualquer acção que vise prejudicar a sua cidade, pura e simplesmente, não participam.
Sociologicamente, sabe-se que quanto mais alto o cidadão atingir um estádio de desenvolvimento e de bem-estar, paradoxalmente, vai-se alheando dos problemas e perdendo a capacidade de reivindicar. Para pugnar é preciso ter sentidas necessidades. Ora não as havendo, deixa de existir o “late motiv” para se expor ao esforço e sacrifício. Não é por acaso que na Alemanha há firmas de contratação de figurantes para manifestações públicas de desagrado.
E nós, em Portugal, apesar de muito se falar em crise económica mundial e de dificuldades financeiras do povo, estaremos mesmo mal? Se assim fosse, tenho a certeza, os cidadãos revoltavam-se e vinham para a rua. E porque não vêm? Porque, verdadeiramente, as dificuldades só chegaram a alguns. E são mesmo uma minoria sem expressão.
Já agora, seguindo o meu raciocínio aleatório, imaginando uma pirâmide, vamos tentar dividir a sociedade portuguesa por classes, de cima para baixo. No vértice estarão cerca de 10 por cento dos milionários mais ricos de Portugal, segundo a Revista Forbes, com uma correspondência a mais de um milhão de euros, e que com esta crise mundial, apesar de terem perdido valor nos activos que possuíam –nomeadamente na bolsa-, nunca ganharam tanto dinheiro como agora.
Descendo, entramos então na chamada “classe média”, que poderemos supor andar na ordem dos, talvez, 80 por cento –mas, aqui, nesta classe média, teremos de, novamente fazer divisões. Teremos 10 por cento de pessoas que estarão pouco abaixo da fasquia da Forbes, e que continuam a ganhar dinheiro nesta depressão; teremos 30 por cento de pessoas com activos em património completamente pago e que sempre viveram muito bem, embora, nos últimos anos, tenham perdido qualidade de vida, continuam bem; e a seguir, vêm os restantes 40 por cento, que, nos últimos 15 anos, sempre andaram na corda bamba, com casa e carro a pagar em trinta anos ao banco, sempre viveram acima das suas possibilidades, e que estiveram na origem do “sub prime” português. Apesar disto tudo, continuam a viver de esquemas, fazendo o mesmo que sempre fizeram: dormir descansados sobre o que devem aos outros.
E depois, na base da pirâmide, vêm os restantes 10 por cento, que nada tendo, não pagando impostos, através de subsídios, vivem à custa do erário público e à sombra do Estado-Providência.
Ora, tendo consciência de que estou a escrever um texto fastidioso, chegamos à conclusão de que, na verdadeira acepção da palavra, todas estas classes –umas melhores do que outras- estão melhores do que nunca estiveram .
E então, repescando o tema inicial, verdadeiramente, precisarão todas estas pessoas de reivindicar alguma coisa? Materialmente, nada, absolutamente "rien de tout". Como a coisa está mais difícil, lamuriam em surdina, queixando-se do governo, dizem que isto está muito mau, mas não trabalham mais e, na ponte de feriado, continuam a ir com a família para o Algarve.
Então, a ser assim, dando algum crédito à minha argumentação, como levar as pessoas às urnas, a votar? Quanto a mim, através do voto obrigatório, tal como se faz nos Estados Unidos.
Pode argumentar-se que, através da obrigação coerciva, nada se consegue. Mas haverá outras soluções? Não vejo quais. O sistema Republicano, para o bem e para o mal, continuará. Os políticos, no seu modo de ser condenável, em princípio, não mudarão. Então, creio, não resta outra solução se não levar os eleitores, mesmo que à força, a manifestar a sua vontade política.
Parece surreal esta obrigação de votar? –Lembro que em Portugal, nos primeiros anos de democracia, o voto foi obrigatório, embora sem nunca terem sido aplicadas sanções aos faltosos.
A democracia é um sistema político que assenta em dois vectores: os direitos e as obrigações. Por que razão há-de o Estado ser obrigado a conceder subsídio de desemprego a quem perdeu o emprego e, em contrapartida, não lhe exigir a obrigação de votar? Será aberrante o Estado pedir uma obrigação em troca?
Se nada se fizer, daqui a poucos anos, as eleições passam a ser algo formal em que os eleitos não têm qualquer representatividade.
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