AUDÁCIA E
DEMOCRACIA PARA COIMBRA
José Dias
José Manuel Pureza
1. Num tempo tão
castigado e violento como aquele que o país vive às mãos de uma política de
abate sistemático de direitos e dos serviços públicos que lhes dão suporte
indispensável, num tempo assim em que as vidas das pessoas são castigadas e a
sua esperança é apagada, pensar nas cidades como lugares de dignidade começa
por ser um exercício de resistência mas tem que se tornar num exercício de
ambição para o futuro. O que torna reconhecíveis as cidades mais do que os
Estados onde se situam, o que lhes dá notoriedade e força, é a sua capacidade
de atrair habitantes, trabalho e talentos. E para isso têm que ser sítios onde
se vive bem porque os direitos de todos são honrados como prioridade pelos
poderes e pelos cidadãos e porque todos se sentem parte de um projeto que
mobilize para novos e melhores horizontes.
2. Coimbra é há tempo
demais uma cidade que desperdiça o seu melhor. Que tem tudo para ser uma cidade
fantástica mas que não o é nem para quem nela vive nem para quem a visita. Uma
cidade que, desperdiçando as suas melhores diferenças, fica aqui mas poderia
ficar em qualquer outro lugar sem diferença.
É mais que tempo de olhar esta cidade com
ambição estratégica. De trazer de volta tudo o que de melhor Coimbra tem,
aquilo que os visitantes referem com pena de não ser mais forte e os
conimbricenses assinalam com raiva de não ser mais essencial. Uma cidade que
tem a sua universidade como pólo de um conjunto classificado como património mundial
tem forçosamente que colocar no centro da sua estratégia de afirmação nacional
e internacional o setor criativo – a cultura e as humanidades,
as artes performativas, visuais e do digital, a ciência e a engenharia, as
indústrias de base tecnológica e as profissões ligadas ao conhecimento, a
música e a publicidade, a arquitetura e o cinema, a escrita e o design, a rádio
ou o software. A este respeito, convém lembrar que o QREN 14-20, último
grande pacote financeiro a receber da UE, constitui um teste decisivo à ambição
e à clarividência de quem nos governa: vai ou não prevalecer uma visão
estratégica que seja capaz de mobilizar os recursos necessários para potenciar
uma Coimbra como património comum a puxar pelo seu melhor?
3. A
exigência dessa estratégia tem que ser feita a quem governa o país – porque
Coimbra é um assunto nacional – e a quem governa a cidade – porque foi para
isso que o povo os/as escolheu e não para, como qualquer quadro intermédio,
gerirem bem o dia a dia trivial. A quem nos governa exige-se que se dote de
instrumentos de prevenção do futuro, na ausência dos quais corre o risco de
pilotar à vista, de ser submerso pela gestão das urgências, de ditar a sua conduta
pelos acontecimentos. Quem governa, como os capitães dos navios, necessita de uma
vigia para discernir, para lá da espuma dos dias, as tendências macro e
emergentes que impõem lucidez e arrojo no caminho a traçar, e de um leme para
traçar a sua rota com firmeza em cada momento, em função dos objetivos definidos.
4. Mas que fique claro:
Coimbra não precisa de uma estratégia vendida por uma qualquer empresa de
consultoria e marketing, traçada nos seus gabinetes a pensar tanto em Coimbra
como noutra qualquer cidade do pais ou do mundo. O leme e a vigia do governo de
Coimbra têm que ser feitos do envolvimento ativo de todos os cidadãos e
cidadãs. A transparência, o diálogo com as pessoas e, mais que tudo, a
democracia participativa que mobilize as inteligências e as boas vontades de
todos/as são os suportes da vigia e do leme para a Coimbra que precisamos de
trazer ao entusiasmo das nossas vidas. A afirmação do Movimento Cívico “Cidadãos
por Coimbra” foi um passo importantíssimo nesse sentido. Outros e novos passos
têm que ser dados agora.
5. 45 anos depois do
levantamento académico de 1969 e 40 anos depois do 25 de abril de 1974, urge
regressar ao entusiasmo e à mobilização do I Congresso da Cidade, realizado em
25 e 26 de maio de 2001, que aprovou a Carta Constitucional de Coimbra. Este é o tempo de resgatar essa mobilização cívica
e essa co-responsabilização da cidadania pela nossa cidade. Uma governação
municipal à altura dessa exigência será a primeira a valorizar todas as formas
de iniciativa cidadã – da mais anónima até ao horizonte de um novo Congresso da
Cidade – como base partilhada imprescindível para uma estratégia de futuro, a
exemplo de tantas cidades europeias (como Bilbao 2030), e assim prevenirmos cair
numa futura Detroit.
Ano Europeu dos Cidadãos, Coimbra, 15 de Dezembro
de 2013
(Recebido por e-mail e com pedido de divulgação)
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