sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

DEIXAI REPOUSAR EM PAZ




 Sempre que alguém importante morre faz-me muita impressão a louca corrida aos encómios, aos louros de eternidade, os discursos exaltados para o falecido. Andamos todos carecentes de ícones que nos façam lembrar de que, enquanto andarmos por cá a percorrer esta estrada, devemos ser boas almas. É uma constatação. A nossa rua precisa de projectar o melhor de nós no senhor “Jaquim”, um pacato vizinho que se limita a sorrir para nós quando estamos ensimesmados? A cidade precisa de se ver na vida de um político que, sem fazer grande obra mas era um tipo porreiro, partiu cedo e deixou muitos amigos? O País precisa de continuar a venerar um homem que morreu num acidente de avião, provocado ou não, e a achar que se ele estivesse vivo esta Nação seria tudo menos igual? O mundo precisa de se rever num homenzinho de metro e meio, que descalço e túnica branca, renegou a violência e fez curvar uma das maiores potências mundiais da altura à sua vontade férrea? O planeta precisa de se remirar em Nelson Mandela que foi tudo, na fragilidade e na fortaleza, o que um humano pode ser desde pobre, agitador, terrorista, presidiário, libertário, até presidente de uma imensurável terra da África Austral? Precisa! Faz-nos bem ao ego. O que não precisa é de exagerar. O universo está pejado de exaltações de bem-aventurança. Basta atentarmos para a Igreja Católica que, desde pastorinhos, passando por madres, até papas, todos servem para canonizar –o que, a talhe de foice, dá para especular que se Mandela fosse um bom praticante cristão –e fosse branco, claro-, mais que certo, teria um lugar garantido na candidatura à Congregação Para a Causa dos Santos do Vaticano.
Pelo respeito destas pessoas que passaram pela história e nela permanecerão até um dia que por conveniência serão apagados, que pelas circunstâncias acabaram heróis –na maioria das vezes de efabulação- haja alguma contenção na verve. Deixemo-nos de hipocrisias, de mentiras descaradas. Não façamos do homem um santo que nunca foi, nem do santo o homem que nunca existiu. Tomemos mais atenção ao homem simples da rua.



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