(A "CARRAÇA", DE COSTAS, CRAVANDO MAIS UMA VÍTIMA)
Já todos, pelo menos quem circula por estas ruas da Baixa, fomos interpelados por uma mulher, creio, de origem romena. Traz uns pensos na mão, e, de uma forma algo inusitada, cola-se a nós, ao longo da calçada, com uma ladainha imperceptível. É uma autêntica “carraça”.
Bem sei que a mendicidade não é proibida –se calhar, até concordo na essência, mas, no acessório, acho que precisava de ser reformulada. Tenho para mim, que quem pede deveria ser obrigado a dar algo em troca a quem dá. Fosse música; fosse uma palestra sobre os ricos; fosse qualquer coisa de original e saído do candidato ao óbolo. A ninguém deveria ser permitido explorar os sentimentos de outrém com base numa lengalenga que ninguém entende. É que, repare-se nesta injustiça, um bom músico, muitas vezes com muitos anos de Conservatório, a dar um espectáculo na rua, os transeuntes passam ao lado, sem o olhar sequer, e, sem contribuírem com absolutamente nada, consideram-no um indigente. Quando é um pedinte, se for esperto, tocando no lado mais fundo da alma, pode ganhar o que quer. Pode até pensar-se que estou para aqui a semear trigo em seara alheia. Isto é, que eu não sei nada sobre o que estou a escrever. Acontece que eu sei qualquer coisa. Sou suficiente maluco para entrar em certos campos para ver, e sentir na pele, como é. Foi o que aconteceu com esta experiência. Ora leia.
Voltando à senhora, a romena, que nos atropela na rua, acho que há aqui um certo exagero por parte desta mulher. Ora, considerando que há mesmo, alguém, por parte de quem tem responsabilidades na segurança, terá de a advertir para este facto anómalo. O que se passa é que ninguém se importa. Basta qualquer um de nós interpelar um agente da PSP a pedir intervenção e é mais que certo o cívico responder que nada pode fazer porque “ a mendicidade não é proibida”. Ou seja, numa espécie de resposta de “chapa 5”, que é o hábito que nos evita chatices, com o invocar da norma, está logo tudo resolvido. Porque, vejamos, um agente não pode mesmo intervir? Se o guarda quiser ser diferente e apresentar trabalho em prol do cidadão, claro que pode. É óbvio que pode demandar uma pessoa como esta, sobretudo quando incomoda quem passa, e até pelo facto de ser estrangeira –não estou a dizer que, por essa razão, se deva constituir implicância sem fundamento. Nada disso. O que quero dizer é que quando, numa espécie de “laissez-faire, laissez-passer”, se deixa fazer tudo a pessoas que nos importunam é preciso levantar o braço e dizer: “alto e pára o baile!”
Porque dizer que “é a lei, é a lei”, não é verdade. Isto é apenas uma argumentação de quem não está para se chatear com nada.
Em contraposição, a esta possibilidade legal de mendigar, todos sabemos, há princípios consignados, como por exemplo, neste caso, o de atentar à liberdade de circulação, que podem ser perfeitamente avocados. É precisamente por ninguém se importar que, cada vez mais, estamos a deslizar para o fundo do cano. É por essas e por outras que depois aparecem certos populistas, por parte dos políticos, como é agora o caso de Sarkosy, em França. Numa hipocrisia completa, vem chamar à colação o problema dos imigrantes para agradar ao eleitorado de extrema-direita. Mas durante vários anos, como presidente do país de Obélix, nunca se importou nem com a avalanche de estrangeiros, nem com as importações exteriores em massa que estão a destruir a Europa. Um Menir, do herói da banda desenhada, Obélix, em cima daquela mioleira deste artista de circo -sem ofensa para estes profissionais- ainda era pouco. Escusado será dizer que por cá, na terra dos Afonsinhos, é igualzinho. Ninguém se importa. Vamos mas é todos pedir esmola, que vale mais. E eu que o diga, porque tenho já alguma experiência.
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