sexta-feira, 23 de março de 2012

OS EXCESSOS DA MAIORIA

Greve Geral: Um detido e três feridos em manifestação em Lisboa 
Greve Geral: Um detido e três feridos em manifestação em Lisboa 



 Quem faz o favor de ler o que escrevo, certamente, já se apercebeu da minha moderação na avaliação de uma qualquer situação. E o que quer dizer ser moderado, pelo menos no meu entendimento? Pode você interrogar? É olhar para um qualquer quadro, retirando ilacções, e não se deixar ficar petrificado na primeira impressão sobre o que se vê. É imaginar o que estará por detrás do facto, sendo este consequência de algo que o gerou.
Antes de emitir uma opinião, a frio, tento fazer exercícios mentais de modo a colocar-me no lugar do “vilão”. Tenho para mim que nada é o que parece. Para além da primeira verdade evidente e notória, há outra segunda verdade menos visível, mas que se tornarmos esta despicienda a primeira será sempre um resultado falacioso. É mais que certo que, na maioria das vezes, falho redondamente, mas fica a tentativa.
No caso das agressões de ontem, em Lisboa, da Polícia de Segurança Pública (PSP), sobre os manifestantes e, sobretudo, sobre mulheres e jornalistas, à luz da introdução deste texto, o que apreendo acerca da actuação da PSP?
Primeiro, dá para ver que os 150 manifestantes, onde estavam incluídos os membros da “Plataforma 15 de Outubro” que desfilaram da Avenida Almirante Reis até ao Rossio, ao arremessarem ovos às instalações bancárias e a transeuntes, tinham por propósito provocar desacatos com a polícia –e aqui já dá para constatar que resultaram em pleno. Ou seja, os agentes da PSP, ao não manterem a calma, caíram numa armadilha. Dá para ver também que o derramamento de sangue sobre os protestantes e, mais notoriamente, sobre os jornalistas foi ouro sobre azul para os reivindicantes.
Não alinho muito nos comentários infelizes de Marinho e Pinto, Bastonário dos Advogados, que, como sempre, se excede no que observa –colocando-se sempre em 1969, na crise académica, e esquecendo que ocupa um lugar que exige alguma assertividade e sobretudo equidade, e defesa das instituições, na análise de todas as partes-, mas uma coisa ele terá razão quando afirma que “os polícias têm de ser bem preparados e não pode ser qualquer pessoa a ir para polícia”.
Dá também para ver que os ministros da Administração Interna do PSD, contrariamente aos do PS, lidam mal com manifestações de rua –lembremos as ocorridas na vigência de Cavaco Silva, na ponte, e em que um assistente ficou paraplégico. E já agora, ainda não se ouviu o ministro da pasta. Não tem responsabilidade política? Quem vão ser as vítimas deste incidente? É mais que certo cair sobre os agentes que carregaram sobre os indefesos jornalistas. Estará certo? E as chefias? Não lhes acontece nada? É que estamos perante um erro crasso de avaliação sistémico na segurança interna.
Dá também para antever que este derramamento de sangue foi a gota necessária para que, em futuros eventos, os manifestantes, mais provocadoramente, se sintam legitimados a fazerem o mesmo e de modo a encherem o copo com mais derramamentos.
Uma coisa é certa, nestas alturas, temos todos de usar alguma ponderação nas análises. Com isto não quero dizer que esteja bem bater em mulheres indefesas e jornalistas, como se vê em vários vídeos, mas, acima de tudo, é preciso estarmos atentos e não nos deixarmos envolver passando do fundamental para o acessório. E ao estarmos a concentrar toda a nossa atenção nas agressões a dois profissionais da imprensa, esquecendo o que lhe deu origem, estamos todos a fazer o jogo de uma facção de portugueses que procura apenas sangue, desordem e nada mais. O que buscam é somente a anarquia. Ora é nestas alturas que, mesmo sem o sermos, temos de fazer um esforço para ser justos e não criarmos uma onda de azedume contra a PSP –mesmo se eventualmente se culpabilizarem os dois agentes, estes, não representam esta prestigiada polícia no seu todo. Tenho para mim que, neste momento, com tudo o que subjaz, ser polícia é uma profissão de alto risco, mal paga, mal reconhecida, e injustamente maltratada.
Só para que não se pense que eu não sei sobre o que estou a escrever, em 1969, aquando da crise académica, eu trabalhava no café Mandarim e assisti à GNR a entrar nesta desaparecida catedral de paz e concórdia. Lá dentro vi este corpo de polícia de intervenção bater indiscriminadamente sobre homens e mulheres. Algumas destas, estudantes, corriam para dentro dos balcões e a GNR, perseguindo-as, entrava e batia a bom bater. Isto aconteceu ao meu lado. Eu vi, ninguém me contou. Em resumo, não defendo o mesmo, mas é preciso separar o trigo do joio. Com isto não quero dizer que os manifestantes não tenham razão. São jovens e outros mais velhos sem futuro que se vislumbre no horizonte. Porém, de um lado e de outro, é preciso alguma calma e, sobretudo, não provocar vítimas inocentes, porque ou me engano muito, ou vai mesmo acontecer.
Acima de tudo, mesmo sentindo todos que os nossos direitos de cidadania diariamente estão a ser espezinhados e cada vez mais somos escravizados por este Estado ditatorial, temos de saber o que queremos. E o que queremos é o mesmo que há meses vimos passar nas televisões na Grécia, quando, perante a passividade da polícia, uns bandos de jovens destruíam e roubavam tudo à sua passagem? É isto que queremos em Portugal? É que ainda estamos no princípio. E se agora, com base numa pequena escaramuça, não tivermos o bom senso de não maltratar demasiadamente a polícia o que vai acontecer dentro de breve tempo é assistirmos à ruína completa do que construímos, e perante a passividade da PSP –isto se o Estado não provocar entretanto a nossa total miséria.

2 comentários:

António Martins disse...

Meu Caro Amigo

Li o seu texto com toda a atenção e, sem dúvida, concordo com muito do que nele afirma.
Mas, no final, pergunto a mim mesmo: o que queremos, reconhecendo que não há situações perfeitas ? Não subscrevo agressões indiscriminadas, mas não defendemos nós a necessidade do reforço da autoridade ? É que as rosas também picam.
E já agora: será que "Marinho e Pinto" ( dantes era Marinho Pinto, mas com um "e" fica muito mais in ) defende para si próprio também uma adequada formação como advogado e, maxime, como Bastonário da Ordem ?
Um abraço amigo.

António Martins

Anónimo disse...

Caro amigo

Foi a primeira vez que vim a este blog e gostei muito do que li pois as suas palavras revelam sabedoria e experiência de vida. No entanto gostaria de expressar a minha opinião que é na sua quase totalidade concordante com a sua. No entanto como o Senhor diz e muito bem que a verdade é uma mas o que nos tentam às vezes mostrar não é bem a realidade. Como pessoa que esteve presente no local constatei efectivamente que no seio do nosso grupo haviam pessoas que não partilhavam o espírito de manifestação pacifica e ordeira, e não queriam fazer uso desse belo direito consagrado na nossa bela democracia. Constatei ainda que os senhores jornalistas presentes no local usaram e abusaram do seu direito ao trabalho interferindo indirectamente mas de forma constante no trabalho dos agentes que nos acompanhavam, que quase se punham em cima dos agentes e de nós para fazerem o seu trabalho, o que achei um pouco exagerado. A dado momento e olhando para toda aquela massa explosiva passei a não me identificar minimamente com o que ali se estava a passar, pois fartei-me de ver atropelos de tudo e de todos às varias liberdades pessoais e valores gerais como o direito à propriedade, livre circulação expressão, ao olhar para as caras do agentes que foram a parte que até àquele desfecho ainda não tinham infringido ou violado qualquer liberdade, previ que aquele acumular iria resultar numa explosão, por isso saí daquela vergonha e passei a ser um espectador à distância e senti vergonha por todos os presentes eu incluindo-me pois aquilo que se passou não foi mais do que vários repetidos deliberados e graves atropelos às liberdades e valores do estado democrático e à própria liberdade que nos custou tanto a ganhar em 74. Como penso que "Para se ter primeiro temos que ser" achei que todos os intervenientes nenhum deles esteve bem.
Viva Portugal vivam as varias liberdades e quem as defende...

Abraço