sexta-feira, 3 de abril de 2015

O CINEMA DE LUTO E O RENASCIMENTO DO TEATRO





Morreu Manuel de Oliveira, o mais antigo cineasta em exercício. O cinema, pela perda deste grande realizador português, está de luto. Pela teoria da compensação, de que a seguir a um dano segue-se um benefício, o teatro português está a renascer das cinzas. Basta ver as imensas peças na arte cénica que, acompanhadas de lágrimas de crocodilo, estão a surgir de todos os quadrantes políticos. Grandes desempenhos, sobretudo da direita já que esta ideologia adora os bons profissionais que, apenas imbricados na sua arte, não se metem na política e que não fazem ondas. A ala conservadora ama este modelo de português “santo da casa não faz milagre” em que é menosprezado cá dentro e venerado lá fora. E sobretudo pela projecção identitária: porque vindo do mudo –como tantos personagens partidários que conhecemos bem- transforma-se num ícone do sonoro. Igualmente como estes figurantes, que até entrarem na política tinham uma vida a preto e branco e depois passaram ao arco-íris, até nisso Oliveira é o seu ídolo. Além de mais, a direita gosta da etnografia, do “Pintor e a Cidade”. A recompensa por tanta similitude é todos os que não levantam cabelo serem trasladados e repousarem eternamente no Mosteiro dos Jerónimos.
A esquerda, porque não alinha muito em contos de  meninos milionários e talvez porque os dez dias que Oliveira esteve preso pela Pide não fazem do indivíduo um revolucionário do contra, não vai muito na ilusão. Além de mais o homem da câmara de filmar colaborou na revista de cinema Movimento ligada à Mocidade Portuguesa Feminina: Boletim mensal. E também por que, entre o “passado e o presente”, não alinha muito bem com a memória histórica já que lhe traz à recordação trocadilhos mal digeridos, não se mostra muito esfuziante com este ressurgimento abrupto do teatro e prefere manter-se “nim”. Por “O Acto da Primavera” só conhece a Primavera de Praga. No entanto, “Aniki-Bobó” deixa que pensar no fascismo dos anos trinta e transversal à Europa e, com o tempo, até pode ser que venha a idolatrar o grande cineasta. Teatro nem com “Sapato de Cetim”. A esquerda odeia “Canibais”, mormente o grande capital. Mas vamos com calma!
O conservadorismo em Portugal está de parabéns. Pelo manifestado esgar de dor e contorcionismo está a mostrar ao povo que a tradição ainda é o que era. Sim senhor! Pelo menos durante uns dias e umas noites, coincidindo com a Páscoa, esquecemos o estertor do senhor dos Passos, n”A Caça”, e o aventureirismo do Costinha, da “Canção de Lisboa”. Durante três dias -dois de luto nacional- vamos todos assistir numa televisão perto de nós às mais pungentes manifestações teatrais de sofrimento e angústia plasmadas em máscaras sofridas de nada vezes nenhum. Nestas coisas, e como manda o costume, o povinho na sua habitual hipocrisia e “Non, ou a Vã Glória de Mandar”, agora também não esquece os imensos filmes que (nunca) viu de Manuel Oliveira. Ah grande Nação! Lá diz o povo, há males que sempre vêm por bem. Valha-nos "Quinto Império"!

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