sábado, 11 de abril de 2015

LEIA O DESPERTAR...



LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Para além  do texto "O ARTISTA DE LESTE", deixo também as crónicas "VICTOR SANTOS NO RANCHO DE COIMBRA"; "REABRIU A "TOCA DO GATO""; "HÁ SEMPRE ALGUÉM QUE RESPONDE"; e "FALECEU O NEVES, DAS AZEITEIRAS"



O ARTISTA DE LESTE

Veio ter comigo há dias. Transpôs a porta, meteu a mão no bolso e puxou de uma carteira recente. Pretendia vendê-la, defendeu. Era o único bem que possuía e o único meio de fazer algum dinheiro. É um homem mediano, de meia-idade, cabeça calva, onde os cabelos que já a cobriram por inteiro decidiram emigrar, olhos vivos e perscrutadores. Exprime-se num português mal-amanhado e a fazer ressaltar a pronúncia de leste. A carteira não tem qualquer valor, repliquei para seu desalento. Em última cartada, em desabafo, o homem atirou: “Não ter uma única moeda no bolso. Estar muito aflito para pagar quarto e não quer estender a mão à caridade. Não ser capaz. Sempre trabalhar na vida. Nunca estar numa situação assim! Ser pintor e escultor. Ser ucraniano! O Marco enviar cá e dizer que você tinha escrito a história dele e também escrevia a minha” –contei a narrativa do músico polaco Marek Kepacs n’O Despertar, da edição de 20 de Março, e no seu fremente desejo de ter um acordeão para poder dar sentido e cor à sua vida.
Dei-lhe uma folha branca e um lápis e pedi-lhe para me mostrar o seu talento. Passado um bocado, e sob o meu olhar, tinha um Cristo, com ar sofrido, bem desenhado e com traço inconfundível de criador. Não tinha dúvida, à minha frente estava um artista, sem margem para dúvida. Se lhe arranjasse uma cana para pescar, como quem diz, tintas, pincéis e papel de aguarela será que estaria na disposição de ir para a rua pintar e tentar arranjar um meio de sobrevivência? Interroguei. “Claro! Claro! Só precisar mesmo de tintas e pincéis para trabalhar. Todo meu “respeto” para o senhor que tenha um grande “coraçau”. Neste meio tempo apareceram dois meus amigos e ouvindo a conversa e perante o desenho um disse logo que lhe oferecia um cavalete. O outro que lhe comprava as tintas e os pincéis. No dia seguinte o Sergiu Stefanov –conhecido por Sérgio- já estava a pintar no Largo da Freiria e pronto a tentar a sua sorte na rua. Ainda teve tempo para me mostrar uma espetacular escultura de um busto feito com jornais e farinha –e sempre a repetir: “eu não enganar. Eu ser artista! Acreditar em mim!”
Mas afinal quem é o Sergiu Stefanov? É ele que se vai apresentar. “Tenho 49 anos de idade, nasci em 1965. Sou romeno. Disse que era ucraniano para não me tomar por pedinte. Infelizmente sinto que o meu povo está muito malvisto por cá. Estudei na Roménia até ao 10º ano. Fui funcionário da Romtelecom durante cerca de uma década e até 1999. Deixou de haver trabalho e o dinheiro começou a escassear. No regime comunista de Nicolae Ceausescu vivi sempre bem, até à sua queda em Dezembro de 1989. Foi uma mudança violenta que resultou em mais de mil mortes. Desde cedo estive sempre ligado à escultura e pintura. Fiz três exposições em Botosani. Já em democracia, com a economia a dar voltas na barriga de miséria, desde pedreiro a pintor de interiores, a estucador, a artesão, a restaurador de móveis, até passando pela eletromecânica, fiz de tudo e não chegou. Atirei-me à Europa e fiz dela a porta da minha esperança. Passei por Itália, Bulgária, França, Holanda. Nestes países fazia de tudo o que aparecia, desde a construção civil até apanhar fruta, e aproveitava o que calhava para sobreviver. Em 2013 vim para Portugal. Por cá, trabalhei numa quinta, na construção civil. Recusei sempre a estender a mão na rua. Tenho dignidade. Continuo a procurar trabalho. Estou inscrito no IEFP, Instituto de Emprego e Formação Profissional. Já tirei vários cursos profissionais, incluindo de português, mas não tem aparecido nada para eu mostrar o que sei fazer. Nunca recebi nada do Estado português até agora –embora já tivesse tratado da documentação para futuramente poder receber o RSI, Rendimento Social de Inserção. Até há pouco, com os trabalhos precários que tenho arranjado, fui conseguindo saldar a renda do quarto. Pago 135,00 euros. Mas agora é que toquei no fundo. Não sei o que fazer nem a que porta posso bater. Não quero ir para debaixo da ponte. Para as refeições, diariamente, vou à Cozinha Económica. Foi então que o Marek Kepacs me indicou o senhor. Pode fazer alguma coisa por mim? Pode ajudar-me?”


VICTOR SANTOS NO RANCHO DE COIMBRA

Victor Santos, o nosso mais querido e famoso cantor e artista de variedades, esvoaçando entre as nossas margens esquerda e direita do Mondego e do Sena, na terra de Obelix, vai atuar no Rancho das Tricanas de Coimbra no próximo domingo, 12 de Abril, entre as 16 e as 20h00, em mais uma extraordinária matiné promovida pela nova direção da coletividade recreativa com sede na Rua do Moreno, na Baixa da cidade.
Pelo que sei, por parte do seu público admirador, sobretudo o feminino, a expectativa é enorme e conta os dias que faltam com ansiedade. Segundo as declarações do artista, “tenho a certeza de que não irei defraudar as minhas fãs. Vou cantar entre oito a dez canções. A minha participação é gratuita para poder contribuir para a revitalização deste grande espaço de memória. A talhe de foice, aproveito para informar que proximamente vou gravar um novo cd com 10 temas. Provavelmente será depois da minha “tournée” que vou realizar entre a Suíça, Alemanha e Luxemburgo. Vou atuar para a comunidade portuguesa. Sinto um grande contentamento por poder mostrar o meu talento para os nossos emigrantes que tão bem conheço e mantenho no coração.”


REABRIU A “TOCA DO GATO” COM NOVA GERÊNCIA

Com nova gerência, reabriu a semana passada a “Toca do Gato”, uma nossa bem conhecida taberna da Baixa de Coimbra. Ao leme desta reconhecida embarcação pantagruélica está o João Pedro Almeida Braga, dono da Retrosaria Ziguezague e situada ao lado do novo estabelecimento.
Encerrada desde Dezembro do ano transato, a “Toca do Gato” a laborar desde 1930 na cidade, pela sua convivência revitalizadora fazia falta nas Escadas do Gato. Quem nos vai fazer a apresentação é o João Braga: “já sonhava há muito tempo em ter uma tasquinha típica e, agora, surgiu a oportunidade. Até porque, para melhor e pela proximidade dos dois estabelecimentos, com a ajuda da minha mulher, Anabela, consigo conciliar o comércio com a hotelaria. É certo que será muito mais esforçado mas os tempos de dificuldades que atravessamos assim obrigam. No meu novo investimento e na minha reconhecida casa histórica, como manda a tradição, o cliente pode continuar a provar a boa bifana, a sardinha frita, a patanisca, o croquete e o rissol e o ovo cozido. Diariamente, para acompanhar um bom tinto, também temos o pires de orelheira e o polvo em mistura ensalsada. Para além destes petiscos, terá também um prato do dia bem confecionado e por um preço ótimo.
Aproveito o ensejo para convidar os leitores a visitarem esta minha casa típica.”


HÁ SEMPRE ALGUÉM QUE RESPONDE

Há cerca de duas semanas escrevi uma crónica n’O Despertar a contar a história de Marek Adam Kepacz, mais conhecido por Marco, polaco e nosso conviva diário destas ruelas e becos. No texto subscrevo a sua vontade de conseguir um acordeão para ganhar algum dinheiro a tocar na rua. Para minha surpresa e a mostrar que há muita gente boa a responder a estes apelos, o polaco já tem um instrumento, cedido a título de empréstimo, que lhe permite ganhar a vida. O benemérito é o meu amigo José João Cardoso. Obrigado João! Esperemos que o Marco esteja à altura do gesto altruísta do Cardoso. Ou seja, ansiamos todos ver o músico a tocar proximamente na via pública. A ver vamos! Mais uma vez, e por que não me cansa enaltecer e agradecer, bem-haja João!


FALECEU O NEVES, DAS AZEITEIRAS

Foi sepultado na semana passada, no cemitério de Chelo, Penacova, o nosso colega Manuel Aguiar Neves. O Neves, com 70 anos de idade e pessoa muito estimada na Baixa da cidade, esteve estabelecido, durante muitos anos, com uma taberna e casa de pasto na Rua das Azeiteiras. Era pai do Jorge Neves, meu amigo e grande defensor da Baixa da cidade. Sei que foi bem cuidado pelo filho Jorge e tudo foi feito para lhe prolongar a vida. Infelizmente estava escrito nas estrelas que o seu caminho tinha chegado ao fim. E quando assim é, por mais que se corra, nada se pode fazer.
Para o Jorge Neves e restante família, em nome da Baixa –se posso escrever assim- as nossas sentidas condolências. Um grande abraço de solidariedade nesta hora de sofrimento e pesar.







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