Ontem uma loja comercial foi inaugurada na
Baixa de Coimbra –no caso, tratou-se de uma galeria de um conhecido fotojornalista, colaborador de vários jornais, Carlos Jorge Monteiro, mais conhecido por “Cajó”. Desde Janeiro, último, só nesta
área velha abriram cerca de 15 estabelecimentos comerciais -mais à frente vai perceber a razão de ter feito referência a este número.
Por ser um óptimo profissional,
uma boa pessoa e muito popular na urbe, nesta abertura da galeria do Monteiro, para
além da “high Society”, a alta
sociedade da cidade, esteve também presente Manuel Machado, presidente da
Câmara Municipal de Coimbra, acompanhado de um séquito de vereadores, assessores
e chefes de gabinete.
Antes de prosseguir, tentando colocar ordem no
raciocínio, vou fazer algumas perguntas. A primeira é: tendo em conta o facto
em causa, não seria esta delegação camarária de peso ridícula?
Agora, indo em sentido contrário
na argumentação, interrogo: e porquê ridícula? O chefe de governo local não é
livre de ir onde lhe apetece? Não tem o direito de nas suas visitas privilegiar
os amigos? Vou responder a estas duas questões. O presidente da edilidade,
enquanto “homo economicus” e sujeito
de direito privado, pode almoçar, comprar sapatos, adquirir cuecas e meias,
cortar o cabelo e barba e fazer as visitas a quem e onde entender. Repito, é do
seu foro privado. Depois desta alegação surge outra: e enquanto sujeito de
direito público? Onde acaba o âmbito privado e começa o público? E chegados
aqui temos a confusão completa. E porquê? Porque não sabemos responder. E esta
balbúrdia já vem de longe, sobretudo nos mandatos do actual Presidente da
República, Cavaco Silva, esta falta de destrinça tem vindo mais ao de cima. É
óbvio que, admitamos, estabelecendo uma linha entre a pessoalidade e o geral de
função, não será fácil determinar a fronteira e por isso mesmo o critério fica
no livre-arbítrio do estadista. Ou seja, pressupõe-se que o interveniente
na acção política que desempenha utilizará o bom-senso para não cair no
prejuízo ou favorecimento de alguém. Mas para complicar ainda mais, mesmo sendo
de projecção pública, não pode o mandatado escolher, de per si, os acontecimentos que lhe aprouver? Pode, mas sendo
criterioso e tendo sempre em conta o interesse social e político.
Voltamos novamente à visita da comissão
encabeçada por Machado à galeria e perguntamos: à luz da reflexão, esta
visitação foi privada ou pública? Antes de responder podemos indagar: e isso
interessa? Acho que interessa sim, sobretudo se a deslocação foi pública. Pela
composição do elenco, tudo indica que foi. E interessa? Porquê? Porque nestes
dois anos de reinado do presidente camarário, e sobretudo nos últimos quatro meses, em tantos espaços comerciais que
já abriram nesta zona, nunca este edil se deslocou a qualquer um. Ora, esta
excepção, enquanto serviço público, deveria ser a regra e não a anormalidade. Já
escrevi várias vezes que sempre que alguém abre um negócio deveria ser
obrigação do presidente da edilidade apresentar-se ao investidor e desejar-lhe
boa sorte. Esta proximidade entre pessoas é política de relações humanas. É viver
a polis em toda a sua globalidade, mostrando uma necessária equidade e igualdade,
num respeito por quem arrisca.
Tenho para mim que os ocupantes da cadeira
presidencial que passaram nos últimos anos na Praça 8 de Maio foram acima de
tudo burocratas e péssimos políticos, no sentido em que privilegiaram o
gabinete em detrimento do contacto com os munícipes. Aliás, exceptuando a
campanha eleitoral, parece que fogem dele. E Machado, sendo reservado, foi o
semeador da cartilha de manga-de-alpaca –já que esteve à frente da Câmara desde
1989 e até 2001 e foi reeleito em 2013. Encarnação ganhou a edilidade em 2001 e
foi dono do seu destino até Dezembro de 2010, quando renunciou a favor de
Barbosa de Melo. Estes dois edis, numa linha fechada onde prevaleceu o “low profile” –o aparecer pouco nos
media-, seguiram o mesmo exemplo de pouca afectividade com os citadinos. A meu
ver, curiosamente passa-se um fenómeno curioso com a imprensa local na cidade.
Quando se é poder não é preciso fazer nada para os jornalistas comparecerem aos
eventos mais vulgares e serem objecto dos holofotes. Quando se é oposição esta
sofre de um nevoeiro demasiado denso e claramente notório.
Respondendo à questão inicial, se toda aquela deslocação
presidencial e de vereação para inaugurar uma pequena galeria não era ridícula,
não o será se for para fazer o mesmo em investimentos similares futuros. Se foi
um caso isolado, mesmo em nome da amizade privada, fica mal tanto aparato
público.
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