sexta-feira, 17 de abril de 2015

LEIA O DESPERTAR...



LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Para além  do texto "COMO É QUE É? CONTINUAMOS NA MESMA COM OS SEM-ABRIGO?", deixo também as crónicas "SEIS MESES DEPOIS FINOU-SE A "PEPPEROSSO""; "ADEUS AMIGO ILDEFONSO"; e "ENCHER A BOCA DE ÁGUA AOS POBREZINHOS"



COMO É QUE É? CONTINUAMOS NA MESMA COM OS SEM-ABRIGO?

Começo por apresentar o problema concreto: há um homem a dormir durante a noite e algumas vezes de dia numa entrada de um prédio, na Rua Eduardo Coelho, há mais de duas semanas. A seguir formulo questões, entre elas, a filosófica e do direito e a responsabilidade das instituições.
Principio pelas filosóficas e do direito. Qualquer indivíduo, em pleno gozo das suas faculdades mentais, tem o direito de escolher a rua como morada. Qualquer sujeito nestas condições de opção, em pleno gozo das suas faculdades, pode não aceitar ajuda para troca da sua, aos nossos olhos, indigente vivência por uma habitação de bem-estar mínimo. Se ficasse por aqui, sem entrar em grandes análises interpretativas, aparentemente tudo estaria resolvido. Acontece que nas duas frases há uma prerrogativa que se repete e que torna a preferência sob condição: “em pleno gozo das suas faculdades mentais”. E aqui reside o busílis da questão. Se tomarmos em boa conta os dados extraídos da Internet e que a seguir reproduzo facilmente se chega à conclusão que o livre-arbítrio, a vontade livre de escolha, pode estar diminuído: “cerca de 160 mil portugueses devem sofrer de demência, que afeta sobretudo pessoas a partir dos 60 anos” -declarações de Álvaro de Carvalho, coordenador do Programa Nacional de Saúde Mental, em Maio de 2013- e “Cinco das dez principais causas de incapacidade a longo prazo e de dependência psicossocial são doenças neuro psiquiátricas: depressão unipolar, problemas ligados ao álcool, esquizofrenia, distúrbios bipolares e demência, sendo as perturbações depressivas a primeira nos países desenvolvidos” –dados extraídos do Programa Nacional para a Saúde Mental, 2013.
Ora, está de ver que, mais que certo, este homem estará doente. Já levo alguma experiência destes assuntos –já foram vários os casos iguais a este que denunciei e esbarram sempre na mesma provocatória interrogação: “o senhor é psiquiatra?”. Até parece que se sentem incomodados por haver alguém que se incomoda e pede a sua intervenção. Por parte das entidades competentes, há uma certa apatia, um deixar correr, como se esperassem que o visado, sem-abrigo, morra e resolva a situação do próprio e os técnicos encarregues de velar pela sua vida possam dormir descansados. Pode até parecer arrogância da minha parte, mas já escrevi e me envolvi muito em acontecimentos como este e sei qual é o procedimento habitual. Para eles, o maluco sou eu. Se o homem quer estar na rua é uma escolha dele, ponto final e parágrafo, invocam os representantes destas entidades que, saliento, recebem dinheiro do Estado para velar por estas pessoas disfuncionais. É lógico que, bem sabemos, mesmo num sistema perfeito nunca se acabará totalmente com amostras de pobreza como esta. No entanto, tenho para mim que se aposta menos na prevenção e terapia e mais nos “cuidados continuados”, como quem diz, na distribuição de comida e roupas. Acredito que possa estar a ser injusto mas as instituições ligadas à pobreza social deveriam em primeiro lugar intervir para quem é sinalizado a dormir na rua, tentando a recuperação, e só depois passar ao acompanhamento.
Depois deste desabafo generalista, e não se pense que não dou valor a quem se ocupa da pobreza, vou voltar ao caso em análise. Podemos formular a pergunta: mas alguma entidade já tomou conhecimento de que o Joaquim Cadaxo, de 57 anos de idade, que até recebe uma reforma acima dos valores mínimos e lhe permite arrendar um quarto para se alojar –como teve até há pouco- está a dormir na entrada de um prédio como um cão vagabundo? Já sim. No dia 1 de Abril fui pessoalmente à Cáritas, no Terreiro da Erva, e dei conta deste triste quadro humano a uma técnica. A seguir escrevi um texto poético sobre o Cadaxo e postei-o na Internet, no site da Cáritas. Até agora, segundo declarações do Joaquim, ninguém se importou em falar com ele e tentar dar um rumo à sua vida. Se o Cadaxo fosse um animal abandonado, tenho a certeza, já teriam sido acionados todos os meios de socorro. Embirro completamente com este procedimento desigual e hipócrita, sobretudo nesta cidade Património Mundial, em que a autarquia paga mensalmente 600 euros a uma associação para cuidar de gatos vadios. Deve ser obsessão minha. Também não será de admirar, a minha saúde mental, mais que certo, já viu melhores dias.


SEIS MESES DEPOIS FINOU-SE A “PEPPEROSSO”

Em Outubro do ano passado a “Pepperrosso” marcava presença na Baixa, no Centro Comercial Visconde, na Rua Visconde da Luz. Neste final de Março e seis meses depois, sem pompa, sem glória, sem oração de encomenda, este estabelecimento ligado a acessórios de moda, carteiras, echarpes, cintos e bijuteria, partiu sem um adeus –lembro que a marca detém no país, creio, 17 lojas.
Por unanimidade, há duas semanas, o executivo municipal “aprovou a redução de 95 por cento das taxas relativas à instalação de atividades económicas nas áreas de reabilitação das zonas urbanas da Alta, Baixa, Rio e área classificada como Património Mundial. (…) A medida pretende funcionar como incentivo à criação de micro, pequenas e médias empresas, de modo a contribuir para a dinamização e a impedir a fuga de atividades económicas da área do centro histórico da cidade”, in Diário de Coimbra.
Naturalmente que não pretendo ser somente um bota-abaixista ao criticar esta medida –até porque estaria certa se fosse alargada a todos os operadores incluindo os já implantados-, mas ninguém me tira da ideia de que estamos perante um defender para a frente, um atirar fumaça para os olhos de quem não pensa muito sobre o que se passa verdadeiramente nesta zona velha. Se assim for, emerge a pergunta: mas houve unanimidade, não houve? E a oposição não cogita pela sua própria cabeça? Não deveria ver os problemas com outros olhos? Pelos vistos, constata-se, há unanimismo na forma de sentir sem saber o que se passa no comércio local. Executivo e oposição estão todos tão perto mas agem como se estivessem no Terreiro do Paço. Não sabem nem querem saber.
Vou tentar ser mais claro. A Câmara Municipal verdadeiramente deveria estar preocupada com quem está e, dentro das suas prerrogativas, criar condições para os negócios se aguentarem. O que está acontecer é que os estabelecimentos mais antigos estão a desaparecer perante a nossa total passividade. É certo que quem vem de novo deve ter apoio. Deve sim, mas não em regime de exclusividade. Se entendermos que o comércio (e hotelaria) é cada vez mais um exercício de alto risco e de perigosidade iminente, deve haver algum cuidado ao fomentar novas atividades. Se assim não for, poderemos até pensar que o poder local está a servir-se da inexperiência dos incautos para mostrar que a cidade comercial está de boa saúde e recomenda-se. Claro que nem ligo estas medidas a eleições próximas, já que a oposição alinhou na mesma bitola, mas quem governa está obrigado a uma ponderação constante entre a execução e a consequência.
Voltando ao claudicar da “Pepperosso”, para alguns políticos locais que, na sua verborreia carregada de nadas e vazios de coisa alguma porque não estão interessados em aprofundar seja o que for, sustentam com grande solenidade que Coimbra é a cidade do país com maior poder de compra talvez este encerramento devesse suscitar a discussão –porque, infelizmente, vai haver muitos mais.
Com toda a franqueza, por já escrever tanto sobre o que se está a passar na Baixa –em que contrariando o bom-senso económico, com a procura no vermelho, cada vez abrem mais estabelecimentos- até a mim me aborreço. Ora sendo assim, a pergunta emerge: porque continuo a malhar na pedra dura? Se calhar, mais que certo e na minha inocência de tontinho, ou obsessão de esquizofrenia, estou à espera que quem detém o poder na Praça 8 de Maio venha para a rua ouvir os interessados, pare, leia e, antes de regulamentar seja o que for, se informe e pense no que está acontecer.
É óbvio que ao pretender tal reflexão, porque alegadamente extrapolo os factos, sou mitómano. Só posso mesmo ser!


ADEUS AMIGO ILDEFONSO

Repentinamente, sem que nada o indicasse, o nosso amigo Ildefonso José dos Santos partiu sem avisar mesmo até os mais próximos. O Ildefonso, de 75 anos, foi comerciante estabelecido com a Casa Sacril, na Rua das Padeiras, durante cerca de quatro décadas. Por volta de metade da primeira deste novo milénio cedeu a loja às suas duas filhas. Por razões que todos conhecemos mas recusamos comentar –como quem diz a crise económica que se abateu sobre o comércio-, a Casa Sacril encerrou em 2012. Hoje foi o funeral do seu fundador. Com ele vai um pouco da história comercial desta zona velha da cidade.
Ildefonso era vizinho e amigo de Henrique Ramalhete, comerciante na mesma rua e na Casa Bambina. Henrique, que o conheceu bem, deixa-nos um pouco do sentimento de pesar que lhe carrega a alma com esta despedida sem acenar. “Era uma boa pessoa, de trato fácil e bom vizinho. Relacionava-se com todos e não lhe aponto seja o que for. Durante décadas convivi com as suas histórias comerciais que contava no meio de um sorriso. É uma pena ver partir um de nós. É a vida!”
Por todos, em nome da Baixa, se posso escrever assim, os sentidos pêsames para a viúva, Arlinda, e filhas, Sandra e Anabela, e restante família. As nossas condolências.




ENCHER A BOCA DE ÁGUA AOS POBREZINHOS

Há menos de uma semana os jornais diários e as televisões encheram a alma dos conimbricenses com a notícia “Coimbra avança com ação judicial contra fusão no sector da água”. Prosseguindo com o anúncio, “Câmara também vai nos próximos dias “intentar uma providência cautelar contra o Estado português” para inviabilizar a concretização da fusão daqueles três sistemas multimunicipais, que representa “um esbulho ao município conimbricense” –os sistemas multimunicipais são de Águas do Mondego, do Lis e da Ria de Aveiro. Segundo as declarações de Manuel Machado, presidente da Câmara Municipal de Coimbra e também, “ex-aequo”, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, “Estamos perante uma operação muitíssimo ardilosa que não podemos aceitar. A água é um bem público que não é mercantizável. Segundo o autarca, a Câmara tudo fará para impedir esta «operação de confisco de bens municipais», na defesa dos «interesses legítimos dos cidadãos de Coimbra e dos bens próprios do município.”

QUAL É A SUA COERÊNCIA, SENHOR PRESIDENTE?

Até agora, sempre que um cliente das Águas de Coimbra se atrasasse no pagamento da fatura recebia uma carta com aviso de corte –normalmente com cerca de 20 dias de distância. O usuário logo a seguir ia liquidar o seu consumo e, pela prorrogação, eram acrescentados um montante de juros a uma taxa legal e correspondentes pela demora.
Agora, a partir destes primeiros dias de Abril, para além dos juros, são somados mais 4,31 Euros. A explicação do funcionário é que é assim porque sim! As pessoas que não cumprem o prazo têm de pagar esta espécie de multa imanada “lá de cima”. “Se é verdade que alguns reclamam a maioria paga”, enfatizou.

É UMA MEDIDA PARA AJUDAR OS POBREZINHOS?

Escusado será dizer que hoje a fatura da água constitui um peso demasiado oneroso para uma família média que viu, nos últimos anos, o seu rendimento diminuir fortemente e, para poupar, até nos banhos diários teve de cortar. Do ponto de vista público, desnecessário é aflorar que esta medida é selvática e desprovida de sensibilidade social. Mas se as pessoas se atrasam por dificuldades económicas e a seguir levam uma bojarda chapa quatro como é que ficam?
Do ponto de vista do direito quase garanto que estamos perante um abuso de posição dominante, uma ilegalidade, já que não se percebe muito bem este absurdo. Sabe-se apenas é que estamos perante uma dupla tributação –já que são pagos juros.

TAXA OU IMPOSTO?

A cabeça iluminada que lançou este aborto em forma compulsória de sacar está obrigado a explicar aos munícipes se se trata de uma taxa. Mas, a ser assim, a ser taxa, tem de ser mostrado em que é que a prestação efetiva melhora e passa a ser usufruída pelo munícipe, já que este tributo tem de ter acoplado uma contrapartida direta e imediata. É que sem prova passa a ser considerado enriquecimento sem causa, vulgo especulação.
Já no limbo de ser imposto naturalmente que a autarquia não tem competência legal para o instituir, já que é competência exclusiva da Assembleia da República.
Para terminar, vou repetir as palavras de Machado: “Estamos perante uma operação muitíssimo ardilosa que não podemos aceitar. A água é um bem público que não é mercantizável.”









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