Há vários meses que tencionava assistir a uma
sessão na União das Freguesias de Coimbra –com sede no Bairro de Sousa Pinto, e
que agrega as extintas freguesias de Santa Cruz, São Bartolomeu, Almedina e Sé
Nova. Confesso que, apesar de freguês interessado no que por lá se discute, a
minha ida não foi totalmente inocente. Desde há um ano para cá, consta-se que as relações
políticas entre o presidente eleito, Hélder Abreu –PSD/PPM/MPT- e a força representada no executivo, o PS, são pouco
profícuas. Dizia-se também que, nas assembleias de freguesia, o ambiente era de cortar à faca com os restantes eleitos,
nomeadamente, o CPC, a CDU e até mesmo com os próprios correligionários
do PSD. Alegadamente, os próprios
deputados do PS, o partido
representado no executivo, já não sabiam o que haviam de fazer com este imbróglio.
Em Junho, de 2014, foi aprovada uma moção de censura ao executivo e movida pelo
movimento CPC, Cidadãos por Coimbra. Embora
sem efeitos jurídicos e unicamente almejando a consequência política, esta admoestação
visava o apoio do parceiro no órgão administrativo, o PS, e o comportamento relacional com a Assembleia do próprio
presidente da União de Freguesias de
Coimbra, Hélder Abreu. Repare-se na indicação do sentido de sufrágio que
levou à aprovação da moção com 7 votos: 2 do CPC, 2 da CDU e 3 do PSD. Houve uma abstenção do PSD e cinco contra, 4 do PS e uma do PSD.
Lembro também que em Julho, deste
mesmo ano de 2014, o Ministério Público ilibou sete autarcas desta Assembleia,
cujos mandatos foram postos em causa pela Junta. Segundo o Campeão das Províncias da altura, “A pretensão dos elementos da Junta consistia na cassação do mandato a
sete membros da Assembleia (três deles social-democratas), porquanto o órgão
executivo considerou que eles cometeram uma ilegalidade ao votarem desfavoravelmente
o Plano de Atividades e orçamento.”
Não fazendo a menor ideia do que iria
encontrar nem o que estava ali a ser discutido, estava presente neste
ajuntamento de coração aberto. Apesar
de influenciado pelo precedente noticiado na comunicação social, não era nem é
minha intenção tomar partido. O que escrevo é uma transcrição absoluta sobre o
que se passou na Assembleia de Freguesia
da União de Freguesias de Coimbra (UFC) realizada na terça-feira, 30 de Dezembro de 2014.
MALDITO QUARTO DE HORA ACADÉMICO
A reunião política estava marcada para as
21h00. Com algum público presente, à espera e a olhar o relógio, a abertura dos
trabalhos começou às 21h24 com a intervenção do presidente da Assembleia,
Armando Agria (PS) a pedir aos
deputados presentes que a sessão decorresse com a maior serenidade. Passou-se
aos pontos em agenda e iniciou-se com a aprovação da acta anterior, assunto
polémico, este das actas, que atravessou toda a sessão. Já com alguma tensão no
sótão do edifício onde decorria o encontro, as indirectas a Hélder Abreu saídas
das várias bancadas iam surgindo umas atrás de outras. Ficou provado de que o
sumário não traduzia o que se passara e foi votada e aprovada a alteração
subsequente.
Seguiu-se o ponto seguinte e
discutiu-se os vários assuntos em análise. E pelo presidente da Assembleia,
Armando Agria, foi trazido à colação o nome de um elemento que não se
encontrava presente e que durante bastante tempo ocupou os vários deputados.
Segundo Agria, pelo teor de uma acta anterior, este vogal ausente nesta
sessão exarara um pedido de reparação ao seu bom nome e ameaçara recorrer à via
judicial. O presidente da Assembleia proclamou que o que estava no documento
era um resumo de todos os membros e, para além de não poder ser alterado, não
poderia ser atribuído a um único elemento. Sublinhou Agria que, em seu nome e
do órgão a que presidia, “não aceito qualquer ameaça. Considero até abusivo. Este assunto está devidamente
esclarecido e encerrado”, disse.
AFINAL HAVIA OUTRA
E saltou para a ribalta a alteração com rasura a
outra acta, a número 24, indicada como referente a 21 de Maio. Apolino Pereira,
tesoureiro e eleito pelo PS, instado a pronunciar-se sobre a posterior modificação,
alegou que “tal possibilidade deixa-me
incrédulo”. O presidente da Assembleia, Armando Agria, virando-se para
Hélder Abreu, presidente da UFC, com voz firme, ordenou: “senhor presidente da Junta da União de Freguesias de Coimbra responda
se foi ou não alterado o documento”. Respondeu Hélder: “não passa de uma falácia. Não houve qualquer
alteração nesta acta ou em qualquer outra que não tivesse sido aprovada por
todos os elementos, a menos que algum, abusivamente, tivesse feito tal
subtracção dos documentos”. Enfatizou Agria, “reuni com o presidente da UFC e chamei a atenção para a gravidade de
ter havido alteração à acta. Era uma situação melindrosa que se poderia
incorrer. A postura do selo branco nos documentos não acontece. Tenho em meu
poder duas actas, uma rasurada e outra não, sem selo branco. E outras que
consultei também não detêm o selo branco. Pergunto ao presidente da UFC se a
partir desta data em que falámos houve alguma alteração. Isto tem contornos
ilícitos”. Respondeu Abreu: “não tenho conhecimento de mais nada!”
UM CASO DE POLÍCIA
Gonçalo Almeida, eleito pela CDU, ligando a
acta rasurada e à motivação que lhe deu origem, declarou: “Os pagamentos estão todos mal marcados. É uma situação muito grave. O
secretário, que não está aqui hoje, é o responsável por isto. Andam aqui a fazer
trapaças. A acta foi entregue pela Junta de Freguesia”. Interrompeu o
presidente da Assembleia, Armando Agria, pedindo para não nomear nomes, “ninguém pode ser culpado sem ser julgado”,
aludiu. Seguindo o mesmo entendimento não denomino o nome do visado intencionalmente.
Pinto dos Santos, eleito pelo PSD, pedindo a palavra, proferiu: “ o Gonçalo já disse o que eu ia dizer. Fico
desorientado. A emenda foi feita ou pelo presidente ou outro membro. Isto não
vai ficar assim! Se nada for feito vou denunciar às instâncias competentes. Eu
já opinei sobre uma auditoria a esta UFC. Alguém está a mentir. Alguém não
merece estar à frente da Junta de Freguesia.”
Carlos Lopes, ex-presidente da
junta de Almedina, tal como Pinto dos Santos social-democrata, reiterou que “pelo que tenho a dizer passa a ser um caso
de polícia. Cabe à Assembleia mandar indagar.”
O presidente da Assembleia,
Armando Agria, virando-se para a secretária Regina Oliveira, interrogou: “qual o motivo de enviar as actas pelo
Correio?”. Respondeu a visada: “eu
não sei quem fez esse trabalho. Eu não fiz! Enviei porque me foi pedido e
mandei para todos.”
Helena Loureiro, eleita pelo CPC, referiu: “o executivo tem cinco elementos. Dois denunciaram. Um deixou de estar
presente, mas restam dois. Olhos nos olhos, nos da secretária Regina e nos do
presidente Hélder, há uma acta rasurada que não tivemos conhecimento. Digam-me
que não têm nada a ver com isto!”
Respondeu Regina: “eu tenho vergonha como as actas estão a ser
elaboradas. Não admito que duvidem de mim. Não tenho muita prática nestas
coisas. Eu tive a ingenuidade de emendar mas foi do conhecimento e não foi com
intenção. Efectivamente alterou-se, mas com conhecimento das pessoas”.
Hélder Abreu, presidente da UFC,
disse que não tinha conhecimento. Retorquiu Regina, “o senhor presidente estava presente. Não se lembra?”
Apolino Pereira, tesoureiro,
instado a pronunciar-se, declarou: “quando
assinámos foi a versão integral para justificar a importância devida ao senhor
secretário. Lamento as palavras da senhora secretária”. Atalhou o
presidente da Assembleia: “a acta
original foi enviada pelo executivo a pelo menos duas pessoas!”
Raquel Santos, membro do
executivo e eleita pelo PS, expondo a
sua versão, disse: “assim que me apercebi
das rasuras comuniquei ao senhor presidente”.
Ricardo Nóbrega, eleito pelo CPC, arguiu: “é obrigação da Junta entregar as actas a tempo e horas. A acta entregue
foi rasurada e isto é profundamente ilegal. Há aqui uma ilegalidade grave.
Temos uma autora que assumiu estas ilegalidades.”
Pinto dos Santos, do PSD, referindo-se ao vogal que não estava presente
e alegadamente esteve na origem da necessidade da alteração da acta, remoeu: “isto
foi atirar poeira para os olhos das pessoas. Assiduidade e pontualidade? Só se
for virtual!”
Interrompeu Armando Agria: “não há contrato nenhum entre a UFC e o
vogal que não está cá hoje. Vou remeter os documentos à Administração Local. Há
uma configuração de crime público. Como presidente da Assembleia, esta a posição
que me vejo forçado para que esta UFC seja tida como pessoa de bem. Vou
participar do senhor presidente do executivo. Convido-o colaborar comigo na sua
elaboração. É num espírito de boa-fé que estou aqui!”
GRANDES OPÇÕES E O
ENTORNAR DO COPO
Passou-se a outro ponto agendado: A aprovação
do Plano de Actividades e Orçamento. Mais um problema, um “quid pro quo”, tomar uma coisa por outra. E começou logo na
introdução do documento, cheio de metáforas alusivas a Luís de Camões e a “Mirabeau”,
eloquente parlamentar francês da segunda metade do século XVIII. O prefácio, presumivelmente
escrito por Hélder Abreu, classificava a oposição de destrutiva e dava as boas-vindas aos contributos de quem vier por bem e
que não alimente vaidades e posições destrutivas numa lógica de “terra queimada”.
Foi a gota que faltava numa noite onde nada parecia encaixar. Quem deveria
estar não esteve como, por exemplo, o Técnico Oficial de Contas efectivo, que
se fez representar por outro, alegadamente, sem estar mandatado para o efeito. Como seria de
prever, as coisas correram mal e os disparos menos cordiais entre Hélder Abreu
e alguns membros da Assembleia –estes acusando a recepção do documento de
ilegal porque apenas subscrito por três membros, entre outras deficiências- fizeram-se
ouvir e, obrigando à intervenção de Armando Agria a repor a tranquilidade, o diploma
foi retirado para melhor apreciação por parte do executivo.
Não se percebendo muito bem o procedimento, o
público presente e pronto a participar com assuntos pessoais começou a intervir
a dez minutos da uma hora da manhã. No fim da sessão, depois de ter exposto as
suas preocupações e referindo-se a tudo o que ouviu e viu, Maria do Carmo Ferreira
rematou: “isto não é uma comédia, é um
drama!”
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