sábado, 10 de janeiro de 2015

CONVERSAS À MESA: ALEXANDRE, O GRANDE DA IMAGEM





Depois de muita insistência -que diga-se, a propósito, foi bastante difícil-, consegui convencer o meu amigo Alexandre Ramires para nos encontrarmos e trocarmos umas impressões para escrever um pouco da sua vida. Conheço este professor, escritor, investigador, intelectual, há cerca de uma vintena de anos. No entanto, curiosamente, não me é fácil falar dele. É o arquétipo da discrição. No seu falar suave e doce parece estar constantemente a pedir licença para intervir e quando expõe a sua teoria pausadamente ficamos deliciados a ouvir e presos na sua dissertação e elevado saber.
Fomos então almoçar ao Restaurante "Giro”, na Rua das Azeiteiras. É uma casa acolhedora que, pela elevada qualidade da sua cozinha tradicional e prática, aconselho vivamente. Recomendado por mim, porque gosto imenso, aceitou comer o prego no prato. Escrito assim, até parece que é uma refeição ligeira. Nada disso! É o melhor prego no prato que conheço na cidade, a fazer lembrar o célebre combinado número 5 do desaparecido Café Mandarim, por volta dos anos de 1970.
Vou começar por apresentar o meu convidado. O Alexandre Manuel Severino Afonso Ramires nasceu em Olhão em 1955. Desde muito cedo começou a manifestar interesse pela imagem, começou na escola primária, através da banda desenhada, e pela educação. Seguiu-se o contacto com o cinema, por volta dos anos setenta e o conhecimento com o mestre das recolhas etnográficas, sobre a música tradicional portuguesa, Michel Giacometti. Ganhou gosto a filmar com película super-8 e antes desta invenção da Kodak desaparecer e dar lugar ao vídeo. É actualmente professor de física na Escola Secundária da Infanta D. Maria, em Coimbra. Foi fundador e coordenador da Imagoteca, da Câmara Municipal de Coimbra, entre 1996 e 2000. Já escreveu tantos livros que nem lembra ao certo quantos –ainda neste Sábado, 10, lançou na Livraria Miguel Carvalho, na Rua Adro de Baixo, o último do prelo, desta vez em inglês: “The voyage of the Daguerreotype”. Para além de ministrar aulas,  debruça-se em áreas de investigação como a História, Técnica, Autoria e Linguagem da Imagem Fotográfica e a História da Fotografia, sobretudo, nos seus primeiros cem anos, e a partir de 1842, logo que teria aparecido em Coimbra. “A Lusa Atenas sempre teve uma ligação muito forte com a fotografia, enfatiza. Logo em 1864 instalou-se na cidade um grande precursor da imagem a preto e branco: Arséne Hayes. Durante a sua última década de vida –morreu em 1874- assumiu-se como republicano e morreu aqui como republicano e socialista. Então aconteceu um facto muito curioso: as autoridades eclesiásticas locais não permitiram que o féretro entrasse no cemitério e, por isso mesmo, foi enterrado fora do denominado campo-santo. A consequência disto foi a alteração da lei e o funeral de Arséne Hayes acabou por constituir o primeiro enterro civil em Portugal”.
Embora a fotografia que conhecemos seja um resultado contínuo, cuja produção de imagens através de processos químicos teria começado com Aristóteles, na Grécia Antiga, a primeira que se conhece no mundo teria sido conseguida em 1826, por Joseph Niépce. Conjuntamente com Louis-Jacques Daguerre, em 1829, iniciaram os seus estudos e cerca de uma década depois foi lançado o processo daguerreótipo.
Inevitavelmente a conversa teria de incidir na paixão da sua vida: a investigação a partir das primeiras imagens fotográficas. E naturalmente que se aflorou algumas exposições que tiveram a sua orientação: “Passado ao Espelho”, que decorreu em 2006 no Museu da Física da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, e “Ver A República”, no Centenário, em 2010, e que foi “uma exposição sobre o papel da imagem na construção do ideário republicano e na luta política nos anos que antecederam e se seguiram à implantação”.
O tempo voa e chegámos à sobremesa, no Restaurante "Giro”. Optámos pelo doce da casa –um espectáculo! E a seguir o café. A conta, que desta vez ficou por minha conta, ficou em 25 euros. Como diria o Ramires acerca da fotografia: “O mundo da imagem é uma porta para todas as narrativas!”

 

Sem comentários: