Na página "OLHARES... POR COIMBRA E PELO PAÍS", na rubrica "NÓS POR CÁ..." leia o texto "AUTOMÓVEIS NA FEIRA DE VELHARIAS" e "O OUTONO... E AS NOSSAS VIDAS";
e na rubrica "OLHAR PARA NORTE... "A ÚLTIMA ODISSEIA DE HOMERO"
AUTOMÓVEIS NA FEIRA DE VELHARIAS
A última Feira de Velharias, a primeira de
2015 -que se realiza sempre ao quarto Sábado de cada mês- primou pela inovação:
teve dois automóveis usados no seu recinto e no meio dos espaços cedidos aos
vendedores de usados e antigos. Há muito tempo que ando a pregar aos peixes que este certame precisa de uma volta. O
aborrecido foi que, apesar de alguns curiosos pretenderem saber o preço das
viaturas, ninguém sabia responder, o que, só por isto, somente, constituiu uma
violação dos princípios da arte de comprar e vender. Sublinhei “somente” porque, provavelmente, não
deixa de ser um gozo dos os proprietários das viaturas para as polícias
–Municipal e PSP. Se é certo que mesmo levando em conta os papelinhos no para-brisas
e teriam sido multadas, há aqui uma dose de ousadia, em provocação, e uma certa
ironia: mostra bem o estado a que a Baixa chegou. Qualquer um estaciona onde
bem lhe apetece e pronto! Quem vier a seguir que grame o monstro! Sobretudo a
Praça do Comércio e a Rua Adelino Veiga são mártires, alegadamente por
implicação dos comerciantes instalados. Não deixa de ser curioso que no “ancien regime”, como quem diz no mandato
do anterior presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Barbosa de Melo, alguns
membros da, na altura, então oposição, do Partido Socialista (PS), eram os
primeiros a lançar cobras e lagartos
contra a “incúria” da Polícia Municipal. Agora, para além do PS estar à frente
do executivo e alguns destes membros até estarem dentro da autarquia a ocupar
lugares de relevo, não se vê um movimento de um dedo para resolver esta
questão. Este pelouro tem uma vereadora, não tem? Porque será que não faz nada?
Não terá, no mínimo, uma palavra a dizer?
Ainda esta semana, no jornal O Despertar, dois
comerciantes da Rua Adelino Veiga apontam o dedo ao desleixo rodoviário, no
deixa-andar, que se passa naquela artéria de trânsito diurno proibido. Há
qualquer coisa que não bate certo! Ou antes pelo contrário. Já se sabia que,
pessoas como eu, só refilam contra o poder por não fazerem parte desse mesmo
domínio. Portanto, aos senhores da Praça 8 de Maio, façam um favor aos leitores,
que fazem o obséquio de seguir os disparates que escrevo, não me ofereçam um
lugar.
O OUTONO... E AS NOSSAS VIDAS
Depois de dias longos, plenos de luz e cor, prenhes
de temperaturas quentes e vitalidade de mais um verão, que, pelo bem ou pelo
mal, por uma recordação qualquer, ficou preso na nossa memória, pé-ante-pé e
com sapatinhos de algodão, eis que devagarinho vai conquistando o seu território.
Começa por cortar no espaço dos dias,
tornando-os mais pequenos e mostrando que tudo o que é longo, inevitavelmente, se
tornará pequeno. Depois, vai impondo um progressivo calor tépido e mais frio,
como a sensibilizar-nos para a necessidade de tomar atenção de que os calores
não são eternos, e a seguir a um período “caliente”,
inexoravelmente, virá um frio de rachar.
Aí está o Outono. Depois de um revestimento de verde, como plumas a cobrir uma ave exótica, as árvores do nosso encantamento vão ficar despidas. Iremos, quase sem querer, numa qualquer avenida, chocar com uma folha amarelecida que, antes de outras que se lhes irão seguir, tendo-se desprendido de um qualquer ramo, de um qualquer plátano, esvoaça ao vento, ziguezagueando, por entre transeuntes, uns mais apressados outro nem tanto, que irão pontapeá-la ou pura e simplesmente ignorá-la, e nós, feitos poetas de ocasião, segui-la-emos. E nela, prendendo o nosso olhar entre o subir e o descer, ao sabor do vento e de um tempo imprecisos e ocasionais, gostávamos de nos deixar ir.
Aí está o Outono. Depois de um revestimento de verde, como plumas a cobrir uma ave exótica, as árvores do nosso encantamento vão ficar despidas. Iremos, quase sem querer, numa qualquer avenida, chocar com uma folha amarelecida que, antes de outras que se lhes irão seguir, tendo-se desprendido de um qualquer ramo, de um qualquer plátano, esvoaça ao vento, ziguezagueando, por entre transeuntes, uns mais apressados outro nem tanto, que irão pontapeá-la ou pura e simplesmente ignorá-la, e nós, feitos poetas de ocasião, segui-la-emos. E nela, prendendo o nosso olhar entre o subir e o descer, ao sabor do vento e de um tempo imprecisos e ocasionais, gostávamos de nos deixar ir.
As andorinhas, feitas viajantes
pela força da natureza, começarão a fazer as “malas” e, deixando desgostos ou frustrados desenganos, abandonarão
os seus beirais que, durante escassos meses, foram os seus lares e ali
assistiram ao nascimento dos seus filhos. Nestes ninhos deixarão mil
recordações mas mesmo assim, aceitando esta partida como natural e símbolo de
partilha, irão levar aos povos do norte de África o mesmo chilrear e a mesma
alegria, viva e sonora, que nos presentearam os dias. Para a próxima Primavera,
sem pungentes lamentos, num eterno retorno, aí estarão elas, novamente,
pujantes de força e refarão os berços para os seus novos filhos e comporão as
suas existências.
Assim é a nossa vida. Tão cheia de calor, como um verão solarengo, inevitavelmente, teremos períodos frios mas, como na natureza, em vai e vem, as temperaturas quentes retornarão. E, se por motivos imponderáveis, nos tornámos andorinhas de trouxa às costas, aceitemos com a mesma naturalidade com que aqueles passarinhos acolhem o seu destino fatalista. Não tenhamos medo de voar em frente. Quem sabe se no norte não estará um outro futuro sorridente. Porque, avessos ao risco e acomodados, haveremos de ter medo do desconhecido e de abandonar o nosso beiral? Serão apenas as recordações que nos prendem? Valerá a pena continuarmos no aconchego cómodo do ninho, mesmo não nos sentindo amados e pouco reconhecidos, só porque tememos os ventos estranhos do incerto? Porque não voarmos até ao norte? Se não nos dermos bem, com a mesma certeza de que amanhã será outro dia e no próximo ano haverá outra primavera, como as andorinhas a gozar o prazer da mudança, começaremos de novo, de palha-em-palha, a construir um outro lar, uma outra casinha.
A natureza é tão pródiga nos ensinamentos. E nós, como folha solta que somos, a esvoaçar ao vento e sem saber onde vai cair e que quando tombar vai desaparecer em pó, continuamos a teimar que controlamos o destino e somos donos de tudo e de todos. Esquecemos que somos somente a possível soma entre a nossa determinação e outras vontades indeterminadas. Como “invisuais” que vêem mas não querem ver… não vemos! O resultado desta cegueira é uma tragédia para a humanidade.
Assim é a nossa vida. Tão cheia de calor, como um verão solarengo, inevitavelmente, teremos períodos frios mas, como na natureza, em vai e vem, as temperaturas quentes retornarão. E, se por motivos imponderáveis, nos tornámos andorinhas de trouxa às costas, aceitemos com a mesma naturalidade com que aqueles passarinhos acolhem o seu destino fatalista. Não tenhamos medo de voar em frente. Quem sabe se no norte não estará um outro futuro sorridente. Porque, avessos ao risco e acomodados, haveremos de ter medo do desconhecido e de abandonar o nosso beiral? Serão apenas as recordações que nos prendem? Valerá a pena continuarmos no aconchego cómodo do ninho, mesmo não nos sentindo amados e pouco reconhecidos, só porque tememos os ventos estranhos do incerto? Porque não voarmos até ao norte? Se não nos dermos bem, com a mesma certeza de que amanhã será outro dia e no próximo ano haverá outra primavera, como as andorinhas a gozar o prazer da mudança, começaremos de novo, de palha-em-palha, a construir um outro lar, uma outra casinha.
A natureza é tão pródiga nos ensinamentos. E nós, como folha solta que somos, a esvoaçar ao vento e sem saber onde vai cair e que quando tombar vai desaparecer em pó, continuamos a teimar que controlamos o destino e somos donos de tudo e de todos. Esquecemos que somos somente a possível soma entre a nossa determinação e outras vontades indeterminadas. Como “invisuais” que vêem mas não querem ver… não vemos! O resultado desta cegueira é uma tragédia para a humanidade.
A ÚLTIMA AVENTURA DA ODISSEIA DE HOMERO
Na penúltima segunda-feira, repentinamente,
Homero Cristina Serra sucumbiu. Num labor simples agrícola, a podar videiras,
uma intensa e derradeira dor no peito conseguiu o que nem uma mina pessoal, na
guerra colonial e ao fazer amputar-lhe uma perna, almejou: derrubar o homem de
vontade férrea, humilde, íntegro e amigo de tanta gente.
O Homero foi presidente da Junta
de Freguesia de Luso durante 24 anos, seis mandatos consecutivos a representar
o Partido Socialista, e, mais que certo, afastado pela impossibilidade legal de
se poder recandidatar.
Conheci o “Mero”, como era reconhecido por todos, desde criança. Ambos
nascemos na mesma aldeia, a sua amada terra de Várzeas. O Serra era um varziense de gema. Tema de algumas
conversas passadas entre nós, para seu profundo desgosto, nem sempre foi compreendido
pelos seus conterrâneos.
Pedi algumas pessoas que de perto privaram e
acompanharam o seu percurso pessoal e político que me dessem o seu testemunho
acerca do homem que sempre admirei. Um deles é o Luís Fernandes (Peças),
natural de Várzeas e a viver no Luso há muitos anos. “O “Mero” era um tipo de pessoa capaz de dar a camisa para o próximo,
enfatiza. Qualquer freguês, independentemente
da cor política, sendo rico, remediado ou pobre, que lhe pedisse um favor,
mesmo quase impossível, ele fazia tudo para acorrer ao solicitado. Era um edil
amado por todos. Ele era aquela pessoa que estava a liderar a Junta de Freguesia
para ajudar o próximo. Era o modelo do que entendemos como servir a causa
pública. Se não estivesse limitado pela lei e se voltasse a candidatar-se ganhava
outra vez. Quando havia uma obra na freguesia ele estava lá. Acompanhava e
trabalhava ao lado dos operários. Era um homem do povo, simples e sensível aos
problemas alheios. Ele não distinguia ninguém. Eu lidei muito com ele. Os
varzienses nunca entenderam a razão da nossa aldeia ficar para última na
requalificação. Não souberam compreender que ele queria fazer da nossa terra a
melhor de todas mas, para isso, era preciso esperar pela aprovação dos projetos
candidatos a fundos comunitários. O “Mero” dizia-me muitas vezes: “Várzeas vai
ser diferente. Tu vais ver!”. E foi mesmo! Está lá uma obra digna de levar o
seu nome.”
Sílvio Gomes Fernandes, outro amigo de Homero
Serra e que o conheceu bem, diz o seguinte: “Foi
a figura com mais destaque nesta terra, dos burriqueiros –do Luso-, depois do
25 de Abril. Foi o melhor presidente da Junta de Freguesia de sempre.
Dificilmente, de quem vier a seguir, alguém ocupará o seu lugar com o mesmo
espírito de missão. Era um homem do povo. Muito dado e que vivia para resolver
os problemas dos outros. Era muito bem recebido em todos os lugares da
freguesia. Que eu conheça, não tinha inimigos pessoais. A haver seria a nível
político. Tinha uma frase muito engraçada para os designar: chamava-lhes
“caceteiros”.
Outro amigo que o conheceu bem foi o José Duarte
Moura. Ao meu pedido, respondeu assim:
“Não vai haver outro presidente da Junta como ele. Naturalmente que já foi
substituído e outros virão mas têm outros interesses calculistas, pessoais e
políticos. O “Mero” era diferente. Era a simplicidade em pessoa. Estava ali
para ajudar e nunca para medir as pessoas pelo que representavam na coletividade.
Não discriminava quem quer que fosse. Era amigo até do inimigo. Vou sentir
muita saudade dele e acredito que muitos mais sentirão o mesmo. Foi num choque
muito grande!”
Nesta homenagem singela ao homem simples, em
meu nome, em nome de milhares de fregueses, constituídos por lusenses,
varzienses e povoações limítrofes, que acredito sentirem o mesmo, para a
família enlutada um abraço de solidariedade nesta hora de tão grande
sofrimento. Para o “Mero”, em sua
memória, nesta despedida sem avisar, uma grande salva de palmas!
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