(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
POR JOSÉ XAVIER NUNES
Por vezes nem eu sei as coisas
que sei, tal é a abundância de cultura em que estou mergulhado e de que estou
imbuído. Até me espanta saber que caso não fosse o nosso venerando Presidente
da República com as suas virtudes ainda estaria hoje muito pior do que é suposto
estar. Neste caso fui cultivado... assim a modos de um campo de batatas. Ser
culto é ouvir, por exemplo, o Prof. Marcelo e ficar com a cabeça cheia de
dúvidas e de seguida escutar o Miguel Sousa Tavares e pegar uma carrada de
sono. Mas isto é o que alcança a minha cultura... e a demais de uns quantos
milhões de cidadãos viventes neste país separado de Marrocos por um simples
estreito, ao que consta, com muitos macacos cheios de privilégios. Tantos como
o direito de defecar, urinar e acasalar, nas Portas de Hércules. Já aprendi
tanta coisa na cultura deste país, desde os afluentes de todos os rios até aos
ramais ferroviários de aldeias que nem constam no mapa, que acabei por não
perceber a poesia do Pessoa. O que é a prova de que não devo estar muito atento
ao caldo cultural que vou tragando servido em cálices de petulância e
pedantismo. Adiante. O meu propósito é provar que não sou estúpido, mas
culto... e cultivado. Sei muito bem que a distância da Terra ao Sol é
proporcional na razão directa da distância do Sol à Terra. Que há estrelas que
já morreram e muitos buracos negros... Sei que a batata é um tubérculo, sem
direito a assento parlamentar! Até sei que o meu país é uma democracia, onde se
pode roubar, intrujar e mentir, com plena liberdade... Sei que há ricos e
pobres, mais uns que outros, mas, caramba, na Natureza nada é equilibrado... segundo
a lei da evolução que transforma macacos em homens, como a democracia
capitalista transforma ricos em pessoas distintas. As coisas que eu sei, que eu
aprendi, os sapos que engulo, são resultado de uma cultura de culto. Parece uma
afirmação idiota, mas não passa disso mesmo: uma afirmação de um cultivado... Não
tenho é lá muito bem a certeza se sei cantar o hino nacional, pelo menos num
tom afinado, mas consigo decifrar uma receita culinária e ler o Manual de
Catecismo, por defeito de cultura adquirida... Sei que num ano há quatro
estações, mas não sei quantos apeadeiros... porque todos os meses, senão mesmo
todos os dias, ando a correr atrás de comboios. Por deficiência não obtive
nenhum canudo, logo sou autodidacta. Um título que se consegue a pulso... caso
queiramos contar para a História. Se formos modestos, humildes e nos estejamos
a borrifar para histórias, podemos ser simplesmente... cultivados. O que agrada
a muita gente...
1 comentário:
O meu amigo Zé, tão assertivo como sempre
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