De vez em quando dou por mim a
calcorrear as ruas da Alta e rever rostos conhecidos. Andei por lá mais de uma
dúzia de anos até finais de 1994. Nesta parte cimeira da cidade asneirei, amei,
sonhei e realizei. Nesta semana finda, passei na Rua das Flores e, nem de
propósito, encontrei a Else (Elisabeth) Stelling e a sua amiga Anja (Ana)
Ligtenberg à porta da Casa Pombal, Guesthouse, uma casa de hóspedes
instalada num antigo prédio onde, durante muitos anos, esteve estabelecida a estudantil
Real República Palácio da Loucura.
Depois dos beijinhos da praxe, sem nada combinado, a conversa fluiu
naturalmente sobre o presente e o futuro da Alta e da Baixa. Puxei do bloco e
fala Elisabeth que estás a ser entrevistada para o blogue Questões Nacionais:
“Em 1991, na companhia de uma amiga, desembarquei em Coimbra. Entusiasmei-me
completamente pela cidade. Foi paixão à primeira vista. Adorei todo este
carisma que a urbe comporta, pelos estudantes através do fado, pelas gentes
encantadoras que cá moram e passam por ela e a levam no coração. Sou holandesa.
Estudei em Leiden, na Holanda, que, tal como esta, é também uma cidade
universitária muito antiga. Quando aqui cheguei e comecei a respirar esta
tranquilidade senti-me como se estivesse em casa. Um ano depois frequentei na
Universidade um curso de férias de língua portuguesa e apaixonei-me por um
português. Eu tinha um sonho: abrir um Guesthouse. Foi assim que nasceu a Casa
Pombal –o nome tem a ver com a arribação turística. Esta minha casa de hóspedes
germinou em Abril de 1993 –nesta altura, estava você com o café no Largo da Sé
Velha. Lembro-me muito bem!
No próximo dia 19 de Abril, celebrarei o 20º aniversário, Lustrum IV, da minha “menina”. Vou convidar todos os vizinhos da minha rua para um pick-nick entre as 19 e as
21h00. São muito generosos, pessoas impecáveis, gente honesta, simpática, que
quer ajudar, solidária –e, nesta minha forma de pensar, alargo a todo o povo
português. Esta pequena festa que vou dar na rua é para lhes agradecer a
sua entrega e dedicação. São fantásticos. É uma honra ter confinantes assim.
Nestes 20 anos foi o percorrer de um caminho de muitas pedras pontiagudas
que martirizam os pés do caminhante. Foi muito duro para mim, sendo
estrangeira. Há muita burocracia. Os primeiros 6 anos foram muito difíceis, até
no sentido de captar clientes. Apesar disso, e em balanço de duas décadas, a
Casa Pombal vai de vento em popa.
A administração, na forma de decidir, é um
labirinto que desmotiva o investimento. Quem está à frente dos gabinetes não
sabe nada. Não sente o sofrimento de quem aplica todas as suas economias num
negócio. Às vezes é desmoralizador. Tem de se ter uma vontade muito forte para
continuar em frente. Os serviços, na procura de respostas directas, são um
terror. São muito superficiais no trato: “é drª para aqui, drª para acolá. Não
se preocupe”. Mas, depois, não avançam com nada. Passam um ano dois e nada. E
uma pessoa, aflita com prazos e falta de dinheiro, desespera. Sinto-me ferida
porque o poder local, para além de ao longo de toda a vigência da minha pousada
ter sido sempre pouco eficaz, agora, ao convidar as entidades oficiais da
cidade, respondem que não podem comparecer porque estão numa feira em Barcelona
–mas só comunicam depois de duas ou três insistências. A ideia transmitida é
que desprezam os pequeninos. Só olham para os grandes!”
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