quinta-feira, 28 de março de 2013

LEIA O DESPERTAR...


LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Para além  do texto "VAMOS DANÇAR?", deixo também as crónicas "93 ANOS? QUEM DIRIA, DONA ROSA!"; "AS FILAS DO SILÊNCIO"; e o "RANCHO DE COIMBRA VAI REABRIR"



VAMOS DANÇAR?

 Na edição de 25 de Janeiro, último, escrevi que Leonor Mamede, o motor centrifugador da agitação cultural da Alta da cidade, tinha sido desafiada por um grupo de senhoras para que criasse na Baixa um projeto de danças de salão. Como seria de adivinhar, Leonor anuiu imediatamente e exclamou: “vamos a isso!”. Se a ideia foi concebida para um espaço mais central –na altura aventou-se ser o Rancho de Coimbra que, saliente-se, foi logo disponibilizado pela direção, ainda, em funções-, a verdade é que por questões de comodidade, acabou por recair no antigo pavilhão dos CTT, ao fundo da Rua dos Oleiros e onde em tempos funcionou um ginásio. Segundo Fátima Santos, empregada na Sapataria Paiva, na Rua Eduardo Coelho, e uma das discípulas de Leonor, “este projeto de revitalizar a Baixa através da dança está a ser um sucesso e caminha para um futuro sólido e risonho. Já temos uma dúzia de alunos, a maioria mulheres. Está a ser um espetáculo! As aulas são às segundas-feiras, das 19h30 às 21h00. Custa apenas 12,50 euros por mês. Acredita que embrenhada a rodopiar, a executar os passos de danças de salão, salsa, kisomba, samba e outras variantes, nem dou pelo tempo a passar? Olhe que saio de lá completamente feliz e aliviada deste stress que nos angustia. Uma maravilha! Porque razão não se junta a nós, senhor Luís?!”




93 ANOS? QUEM DIRIA, DONA ROSA!

 Na quarta-feira da semana passada os relógios apontavam 15h00. A Rua de Sargento-mor, no pequeno terreiro, estava pejada de pessoas. Algumas delas transportavam no regaço ramos de flores. O motivo que deu origem a este ajuntamento foi um aniversário: Dona Rosa, uma moradora, comemorava 93 anos.
Com alguma ansiedade à mistura, os muitos amigos da anciã, volta e meia, olhavam para a porta da sua residência nos últimos 60 anos, por cima do estabelecimento da “Casa Anita” e propriedade da sua filha com o mesmo nome. Como é normal nas cerimónias de solenidade, passados uns dez minutos, a senhora, com total desenvoltura e fresca como uma flor, desceu e transpôs a velha porta do medieval edifício da Baixa de Coimbra. Por momentos, entre Rosa e construção de antanho, houve uma certa simbiose. Era como se pessoa e coisa se imbricassem no mesmo destino de resistência às agruras do tempo. Embora, saliente-se, Rosa está muito mais bem conservada que o velho prédio histórico. Se ninguém lhe retira as 93 primaveras em flor do Bilhete de identidade também ninguém lhos dará. A verdade é que parece ter menos 20 anos. Quem sabe a mãozinha de Deus, juntando as duas idades, construção e humano, fizesse a soma dos dois e, como prémio de longevidade, desse crédito acumulado à pessoa.


Rosa Azevedo Neto mal transpôs a portada foi logo engolida pela multidão e chapinhada com muitos beijinhos e abraços. Do Centro de Dia da Casa de Repouso Rainha Santa Isabel, das mãos de Ana Maria, técnica responsável por esta briosa instituição de apoio aos mais velhinhos da Baixa, recebeu um grande bouquet de flores. E Rosa, como não poderia deixar de ser, chorou de alegria e contentamento. A seguir cantaram-se os parabéns no largo em frente na presença de todos os amigos comerciantes da zona e, em respeito pela vizinha de tantas décadas, até os pombos pararam de arrulhar.


Anita, a filha, intervalado com uma lágrima, lá ia contando a história da sua mãe querida. “Espectacular mãe”, sublinhava. “Rosa, a minha progenitora, juntamente com o meu pai - Henrique Branco, que foi tipógrafo do Diário de Coimbra e de O Despertar- trabalharam muito para nos criar. A minha mãe sempre construiu estas pequenas flores de seda –e apontava uma prateleira expositora com um dístico “não se vende”. Depois do jantar, íamos para a cama e noite dentro trabalhava para satisfazer encomendas para os desaparecidos José Novais e Último Figurino. Para além destes fornecia também muitas modistas da cidade para, com a sua arte, acompanhar os vestidos em cerimónias, sobretudo nos casamentos. Foi sempre a sua profissão. Olhe aqui este bolero que ela fez para mim” –e apontava um colete branco ricamente  bordado.


Rosa continuava a lacrimejar de satisfação por ter tantos afeiçoados que a adoravam. “Não contava com esta surpresa”, enfatizava em repetição. “Frequento o Centro e são todas minhas amigas. Não contava com isto. Sinto-me muito feliz! Fui sempre bem-disposta. Casei-me com 19 anos, e os rapazes sempre andaram atrás de mim. Desde os oito anos que trabalho com flores. Aprendi com a minha mãe. Apesar de menos do que noutros tempos, ainda faço flores.”
Fique a saber que por aqui, pela Baixa, todos a adoramos e invejamos a sua vitalidade. Gostamos muito de si. Que esta congratulação se repita por muitos e bons anos. Muitos parabéns, Dona Rosa!


AS FILAS DO SILÊNCIO

 Embora houvesse cadeiras vazias, o homem estava em pé na grande sala da administração pública. De vez em quando, como um ai sofrido de dor pelos humanos exalado pelo visor de atendimento por número sequencial, ouvia-se um “clique” a querer indicar que estava um funcionário à espera do próximo cliente. Reparei que, para além do seu olhar parado e fixo, de uma das suas mãos um bastão branco com uma argola na ponta tocava o chão. Era invisual. Se ninguém anunciava o número no placard como é que ele poderia saber quando chegaria a sua vez? Comecei por me questionar.
Chama-se Armindo Claro, tem 41 anos de idade e é completamente cego. Enquanto esperava a minha vez, meti conversa com o Claro. Como é que consegue saber quando chega a sua vez para ser atendido? Já que nenhum empregado, alto e bom som, sublinha os números de atendimento? Interroguei. Responde o Armindo: “Ora bem, normalmente dão-me prioridade. Está previsto na lei. Embora, diga-se, às vezes as pessoas não entendem porque tenho necessidade de lhes passar à frente e reclamam. Aqui, nesta repartição pública, apesar de não ter um segurança, sempre fui bem atendido. Mas, de facto, já que você fala nisso e os visores são mudos, deveriam ter mais atenção a situações como a minha, de invisual. A administração, no mínimo, deveria ter aqui alguém para nos encaminhar. Esquecem as nossas limitações. Olhe, por exemplo, eu recuso-me liminarmente a enviar o IRS pela Internet.”
Fomos interrompidos por um funcionário que saiu do lado de dentro do balcão. Depois de o cumprimentar com simpatia, colocando-lhe a mão no braço, exclamou: “vamos lá então para o primeiro-andar, senhor Armindo?”. E ambos foram engolidos pelos lances de escadas e pela ambiência fria e desumana do edifício.

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O RANCHO DE COIMBRA VAI REABRIR

 Depois de cerca de cinco anos praticamente em hibernação, sem atividade continuada –só esporadicamente se realizavam eventos na sua grandiosa sala e cheia de tantas memórias desde o seu início em julho de 1938-, o Rancho das Tricanas de Coimbra, na Rua do Moreno, vai abrir à cidade. Nesta última quarta-feira, dia 27, realizaram-se eleições para os novos corpos-gerentes.
O timoneiro encarregue de colocar novamente este cruzeiro a navegar e a animar a Baixa de Coimbra, é José Luís Montenegro. Coadjuvado por Francisco Monteiro e uma nova lista de pessoas de boa vontade, em que se inclui o presidente cessante Carlos Clemente, que estão na disposição de sacrificar o seu tempo em prol de um projeto que há muito precisava de ser reanimado. A bem de um passado de glória, de um presente anémico e pouco virado para as recordações que constituem o animus da vida e de um futuro que se pretende legar aos vindouros, este grupo de pessoas pretende contrariar o situacionismo daninho que grassa entre nós.


Ouvindo o comandante e o assessor, respetivamente o Montenegro e o Monteiro, a uma só voz enfatizaram que dar vida a esta gloriosa coletividade onde tantos conimbricenses, estudantes e futricas, passaram a sua adolescência, repleta de incontáveis namoricos e que muitos terminaram em finais felizes com casamentos de enlace, era uma emergência social. Se aquela sala de baile falasse, uma longa história contaria, repleta de cenas dramáticas e hilariantes. Vamos ouvir: “lemos há tempos n’O Despertar uma crónica sobre o Rancho das Tricanas de Coimbra e, comentando, interrogámos: “e se arranjássemos uma nova direção e colocássemos as mãos na massa para reabrir este velho salão? E sobretudo o folclore, que ainda deve ter trajes tão ricos arrumados em baús de naftalina?! Agora até temos na Baixa a denominada “Orquestra de Músicos de Rua de Coimbra”. Sempre poderíamos contar com os instrumentistas, e tudo?! Das palavras passámos aos atos. Falámos com o Carlos Clemente, ainda presidente e que se disponibilizou imediatamente. A seguir contatámos Pinto dos Santos, presidente da Junta de Freguesia de Santa Cruz, e discutimos que uma das mais antigas coletividades da Baixa não podia continuar encerrada. Concordando com a ideia, transmitiu-nos que estava na disposição de apoiar no que pudesse. Disse ainda que sempre que futuramente houvesse atuações do rancho comparticiparia nas despesas. O nosso objetivo principal é abrir o salão à comunidade; reativar a sua atividade cultural, com espetáculos populares de variedades como, por exemplo, fados. Mais à frente, e logo que possível, tentaremos realizar uns bailaricos como antigamente. Os compromissos assumidos pela anterior direção naturalmente que serão respeitados, como o contrato com a Associação Integrar, nos banhos públicos.
A lista única concorrente às eleições, hoje já naturalmente eleita, é constituída na Assembleia-geral pelo presidente José Carlos Clemente e vice-presidente Gil Rodrigues; 1º secretário Jaime Manuel Correia e segundo secretário Gil Maia Simões. A direção é constituída pelo presidente José Luís Montenegro e vice-presidente Francisco Monteiro; pelos secretários Luís Quintans e José Benedito; a tesoureira será Cátia Caixeiro Travassos e acompanhada pelos vogais Victor Medina e Fátima Gonçalves do Salvado. Os suplentes na tesouraria serão o José Vilas e o Nuno Damas. O presidente do Conselho Fiscal será Júlio Gaspar das Neves e o relator Ivo Rodrigues; serão acompanhados pelo vogal Arlindo Carvalho.


Tendo em conta a hora antecipada em que escrevemos, não se sabe se teria havido oposição a esta nova dinâmica diretiva, mas uma constatação emerge: as forças vivas da cidade, nomeadamente a Câmara Municipal de Coimbra, devem dar todo o apoio necessário a este grupo de carolas que amam o Centro Histórico de Coimbra e desinteressadamente contribuem para a sua revitalização.




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