domingo, 24 de junho de 2012

BAIXA: UMA MENTIRA CONDESCENDENTE


 Esta noite, última, decorreu mais uma “Noite Branca” na Baixa. Como habitualmente, foi mais uma iniciativa da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra. Desta vez, aproveitando a vinda de Madonna a Coimbra, a actuar hoje no Estádio Cidade de Coimbra perante 40 mil pessoas, espalharam-se pela zona comercial vários espectáculos onde predominaram os dj’s com música “tecno”. Comprometeram-se, através de assinatura, 120 proprietários de estabelecimentos em estarem abertos até à meia-noite.
Durante a tarde e até à hora de jantar, a acompanhar o som martelado, não havia muita gente a passear. A partir das 21h00 a Baixa começou a encher de visitantes e, como já vem sendo hábito, a ajudarem a hotelaria, que, ontem, teve mais uma noite memorável.

O QUE É ISTO?

 Se vale mais uma verdade inconveniente do que uma mentira condescendente, a verdade é que parece que todos continuamos no caminho da falácia. Até o Diário de Coimbra, que -tal como o Diário as Beiras- tantas vezes tem sido acusado de colocar em primeira página as verdades inconvenientes, como, por exemplo, noticiar assaltos, ou falências em perspectiva, desta vez, certamente por omissão, optou também pelo engano. Hoje, na sua terceira página, poderia ler-se que “Mais de 120 lojas, de todo o género, corresponderam ao desafio da APBC, e mantiveram as portas abertas até à meia-noite.”
Vamos lá repor as coisas nos seus devidos lugares, e a haver tourada, é preciso fazer a pega de caras, como quem diz, pegar o boi pelos cornos. Isto é, às 20h00 estavam menos de duas dúzias de lojas comerciais abertas e às 22h00 menos de uma dúzia.
Ora, perante este resultado –que volto a lembrar, os comerciantes deram a sua palavra através de assinatura- dá para interrogar: O QUE É ISTO?
Então temos duas opções, ou enterramos a cabeça num buraco do asfalto e continuamos a fazer de conta que tudo está bem, o que interessa é que se fale da Baixa e blá, blá, blá, ou, pelo contrário, vamos todos fazer o balanço destas actividades. Não se pode continuar a gastar dinheiro público assim –é certo que estes projectos visam a revitalização do centro Histórico enquanto um todo, porém, não podemos esquecer que estes planos são direccionados, sobretudo, para animar o comércio. Ora o que está acontecer é que, sem pagar absolutamente nada nem participar na logística, a hotelaria é que está a apanhar os dividendos. E qual é a consequência? Como o comércio nestas noites não vende, poucos comerciantes, e cada vez menos, estão a levar a sua promessa até ao fim –escusado será dizer que quem fica até à meia-noite, sente-se assim um bocado parvo e com a sensação de estar a ser utilizado.

MAS O QUE FAZER?

 Para esta pergunta, objectivamente e por enquanto, não há resposta. Sabe-se que alguma coisa terá de se fazer diferente para que, nestas alegorias, os visitantes entrem nas lojas, e comprem, de modo a envolverem o interesse dos profissionais do comércio. Uma das boas medidas, por exemplo, poderia ter sido a ideia de João Braga, que propôs à APBC que houvesse um grupo alargado de lojas com desconto até 50 por cento. Não foi avante por falta de interesse participativo dos lojistas –e aqui podemos interrogar uma questão óbvia: se há dezenas de estabelecimentos na Baixa com descontos de 50 por cento e outras várias com diferenças até 40, por que razão não corresponderam? Bom, não há dados objectivos, mas, por parte dos comerciantes, tudo indica que ninguém quer saber do futuro. Estão apenas preocupados em aguentar o presente.

E COMO É QUE SE PORTA O VISITANTE?

 Estas “Noites Brancas”, pelo menos no modelo em que estão programadas, isto é sem algo que espicace o interesse dos visitantes, repetindo-me, não estão a funcionar para o comércio. Neste dia de festa o visitador acompanhado da mulher, da sogra e dos filhos, como se fosse a uma romaria da Senhora da Agonia, entram nas lojas e o seu comportamento é igual ao dia de festa anual do santo padroeiro da aldeia. Entra em grupo, mexem aqui, mexem acolá, como se estivessem num museu interactivo. O mais novo da prole, agarrando num artigo que não conhece a sua utilidade, pergunta ao pai acerca daquilo. O patriarca, como se estivesse lá no lugarejo em frente à casa onde nasceu, explica ao miúdo: “Zezinho, isto era assim, assado e frito. Foi aqui que o paizinho, quando era da tua idade, aprendeu a fazer assim, assado e cozido”. Mas, o “Zezinho, coitadinho, mais conhecedor dos jogos cibernéticos do que coisas tangíveis, não entende patavina. E o papá, dirigindo-se ao dono da loja que está especado a observar todo o desenrolar desta peça, pede ajuda. E o senhor Maurício, o comerciante, com uma paciência de Jó, lá explica ao puto como é que aquilo funciona. É evidente que o rapazinho não percebeu nada, mas, também para o caso, pouco importa. A verdade é que, repentinamente, viraram todos costas e nem obrigado, nem bom-dia, nem boa-noite para o senhor Maurício –deve dar para calcular as trombas com que ele ficou.

1 comentário:

Daniel disse...

Na minha opinião, o problema continua a ser o mesmo: os comerciantes. Se 120 lojas se comprometeram a estarem abertas até à meia-noite, não deviam faltar ao prometido.
Estas iniciativas são excelentes e estão a conseguir atingir o objectivo, que é levar as pessoas para a Baixa, à noite. Agora é preciso que as pessoas entrem nas lojas e comprem, mas isso já é da responsabilidade de cada comerciante, que deve ter ideias e iniciativas que atraiam os clientes.
Com a crise também é normal que as pessoas reduzam o consumo, por isso não podem estar à espera de negócio imediato, devem ver isto como um investimento. As pessoas não compram hoje, mas podem lá voltar amanhã e comprarem aquele artigo que viram quando entraram na loja na última Noite Branca.
Estes eventos também são importantes para mostrar que a Baixa não morreu, que é um local seguro e aprazível para passear e fazer compras.