(IMAGEM DA WEB)
Hoje, de manhã, estava numa clínica para fazer análises. Na vez de ser atendido, à minha frente, estava um casal de meia-idade. A funcionária dirigiu-se à senhora com uma folha para que esta, antes de fazer os exames, lesse e assinasse. A mulher respondeu: “sei assinar mas não sei ler. E o meu marido, aqui ao lado, também não conhece uma letra.”
Loura, de cabelo oxigenado, vestia modestamente e tinha bom aspecto. Teria cerca de 45 anos. Exprimia-se razoavelmente sem grande dificuldade. Ao lado, o marido, a mesma coisa, vestia medianamente. Ninguém diria que este casal não conseguiria distinguir um A de um B.
Loura, de cabelo oxigenado, vestia modestamente e tinha bom aspecto. Teria cerca de 45 anos. Exprimia-se razoavelmente sem grande dificuldade. Ao lado, o marido, a mesma coisa, vestia medianamente. Ninguém diria que este casal não conseguiria distinguir um A de um B.
Pode até parecer um pouco absurdo da minha parte, mas quando ouvi a senhora dizer que não sabia ler, o efeito em mim, foi o mesmo que dizer, a frio, que tinha Sida. Fui apanhado de surpresa. É certo que eu sabia que, infelizmente em Portugal, ainda temos mais de 500 mil analfabetos puros –isto é, que não conseguem ler uma frase-, porém, no meu imaginário, pensava que estes milhares de portugueses seriam correspondentes a uma faixa etária acima dos 70 anos. Talvez fosse influenciado pelo facto de os meus pais também não saberem ler e -pela idade deles, que teriam agora 80 anos se fossem vivos- talvez tivesse feito associação -vi agora, através da Internet, que temos 658 mil pessoas com mais de 15 anos que não sabem ler nem escrever.
Não resisti em falar com o marido. Como é que sendo tão novos e hoje, com as imensas possibilidades de aceder ao ensino –basta lembrar as “Novas Oportunidades”, vocês não sabem ler? Interroguei.
-Já é tarde! –Respondeu.
-Já é tarde, como? O senhor deve ter quarenta e poucos anos, não?
-50 anos.
-Ora, está a ver?! Vocês, enquanto casal, são muito novos…
-Não vale a pena…
-Não vale a pena? Então, não lhe faz falta ter acesso ao que está escrito aqui –e apontei o jornal.
-Não, não me faz falta nenhuma. Para saber o que dizem os jornais vejo as notícias na televisão. Para trabalhar nunca me fez falta. Trabalhei sempre, e os meus patrões nunca souberam que eu não sabia ler.
Olhe que cheguei a ser encarregado na construção civil e dar as áreas de construção e nunca me fez falta.
Cheguei a trabalhar na Mota-Engil vários anos. Nunca souberam que eu era analfabeto.
-Mas, diga-me, a que se deve o facto de o senhor não saber ler? Tendo em conta que eu tenho 55 anos e, na minha aldeia, todos foram à escola. Era obrigatório…
-Era obrigatório, mas se um aluno faltasse ninguém ia atrás dele. A minha mãe era muito pobre. O meu pai não vivia com ela. Comecei logo em criança a trabalhar. Passei muita fome. Nunca andei na escola.
-E a razão de a sua esposa também não saber ler, o facto de ela ser também analfabeta pesou na sua escolha? Isto é, tendo em conta que se você tem casado com alguém mais letrado poderia vir a sentir-se inferiorizado?
Não, não pesou nada. Calhou assim.
-E filhos? Tem?
-Sim, temos dois. Sabem todos ler. Quando temos alguma dificuldade em perceber alguma coisa eles ajudam.
-E a vossa vida económica, melhorou? Tendo em conta que o senhor é filho da pobreza?!
-Felizmente, sim. Temos trabalhado muito. Muito mesmo. Nem o senhor imagina. Estou aqui consumido. Tenho uma debulhadeira prometida para as 10h00… se demorar muito a fazer as análises, tenho de ir embora. Fica cá a minha mulher e depois volto…
HOJE FOI A ABERTURA SOLENE DE AULAS NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA. TALVEZ VALHA A PENA REFLECTIR SOBRE O SABER LER E ESCREVER
LEIA AQUI OUTRA HISTÓRIA DE QUEM NÃO SABE LER
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