terça-feira, 26 de julho de 2011

EDITORIAL: O QUE QUEREM FAZER DOS CENTROS HISTÓRICOS?





 À hora do almoço passei no Terreiro da Erva e, perante a desolação que é todo o largo com prédios a caírem de desleixo, vi um deles com um cartaz do Bloco de Esquerda, com a seguinte mensagem: “Aqui podia viver gente –Reabilitar a Cidade – Baixar as Rendas Criar Emprego”.
E foi o mote para escrever este texto. Então se se reabilitasse todos os imensos escombros de edifícios velhos na cidade –só falando de Coimbra- quanta nova habitação poderia ser criada?
E vai ter mesmo de acontecer. O Estado ao deixar de apoiar a compra de casa através de juros bonificados criou um problema dobrado a quem precisa de ter um tecto. O que está acontecer? A procura está aumentar e a oferta a diminuir. Naturalmente que o valor das rendas sobe. Ora, sem entrar em grandes análises sobre esta temática, o Estado, neste momento é responsável pela dupla crise que o arrendamento está a viver, sobretudo para quem precisa de um telhado para se abrigar. Durante décadas, para fins eleitorais, serviu-se deste regime de arrendamento da mesma forma que se usa e abusa de uma prostituta. Agora, que já não dá, abandona-o à sua sorte.
O que está a acontecer actualmente é as rendas praticadas serem muito acima do que uma família pode pagar. Em Coimbra as rendas praticadas são todas acima de 400 euros. Facilmente se vê que estando o ordenado mínimo na base de 485 euros, para uma família de fracos recursos, é impossível pagar. E então que solução? Receber uma casa de renda social apoiada? Ir viver para debaixo da ponte? É lógico que casas de renda social não haverá muitas, logo a solução será ir mesmo viver debaixo da ponte.
A menos que este Governo mostre que é mais inteligente do que todos os outros. É preciso que estabeleça um programa de recuperação de todo o edificado das cidades. Que se empreste dinheiro a juro zero aos proprietários, tendo como contrapartida o arrendamento a 5 anos com valores acessíveis, entre os 150 e 200 euros. Estes arrendamentos estariam a cargo das autarquias que abririam concurso de atribuição dos locados a quem mais deles tivesse necessidade.
Com este plano de recuperação criava-se emprego, desenvolvia-se a economia, resolvia-se o problema da carência de habitação e dava-se solução a estes escombros que alastram nas cidades.
Uma grande minoria de proprietários não tem sequer dinheiro para comprar duas telhas –como afirmou sidónio Simões, director do Gabinete para o Centro Histórico, numa recente tertúlia. Em conformidade, estes senhorios pobres precisam de ajuda do Estado. Naturalmente que lhes cabe dar a compensação em género –o Estado não deve dar nada sem exigir algo em troca, a menos que tal se revele impossível.
Por outro lado o que assistimos? Uma grande maioria de donos de prédios, porque não está dependente das rendas que aufere, prefere tê-los encerrados durante anos, pedindo fortunas, do que arrendá-los a preços justos e de bom senso –isto passa-se escandalosamente na habitação e no comércio em Coimbra.
A bem da equidade e da justiça este estado de coisas não pode continuar. Sou um defensor acérrimo da liberdade de cada um vender, comprar, arrendar, alugar, aos preços que bem entenda e em que o Estado não deve meter o bedelho… a menos que, declaradamente, se verifiquem distorções. Ou seja, se verifiquem abusos de posição dominante de uma parte perante outra. E aqui, no arrendamento, muito por culpa dos governos sucessivos, estamos cada vez mais a assistir a um desenfreado excesso. Por conseguinte está na altura de este Governo dar provas de que está atento e colocar o regime de arrendamento a mexer. Atribuir direitos e obrigações a proprietários e a inquilinos. Aos primeiros, proprietários pobres, dando-lhes apoio financeiro é preciso que contratualizem as suas casas a rendas económicas. Aos proprietários ricos, que não precisam de viver do rendimento das rendas, é preciso consignar em lei que apenas poderão ter um locado vazio durante 6 meses, caso contrario, será utilizada a nível excepcional a posse administrativa –em princípio, toda a riqueza tem por obrigação gerar mais riqueza, caso assim não seja cai no parasitismo.
Aos inquilinos mais carenciados serão atribuídas estas novas casas de renda apoiada com a obrigação de, responsabilizando-os através de caução, delas cuidarem criteriosamente na sua conservação.
Igualmente as rendas antigas terão de ser actualizadas num prazo máximo de 5 anos, anualmente, passando dos valores miseráveis para uma renda igual às praticadas por apoio.
Se se estiver à espera das Sociedades de Reabilitação Urbanas para restaurar as cidades, estou convencido, nem daqui a 20 anos essa meta será atingida.
É necessário também que as autarquias se envolvam activamente nestes projectos de reclassificação. Salvo excepções, poucas se têm interessado por este problema que é um cancro da sociedade hodierna.
Nos imensos prédios com comércio no rés-do-chão e sem entradas para os andares superiores, cabe à Câmara Municipal contactar os proprietários e apresentar soluções de entradas comuns aos edifícios contíguos. Não se pode continuar a assobiar para o ar perante as centenas de andares vazios que grassam na Baixa precisamente porque não têm acesso para lhes dar utilidade. Basta apenas começar numa qualquer rua.

1 comentário:

Anónimo disse...

Esta é uma das poucas vezes que estou de acordo com a nossa esquerda «caviar», radical e ortodoxa.Falta apenas eles mencionarem e lembrarem-se dos pequenos proprietários,não englobando,como é hábito,estes no grupo «alvos a abater» do Bloco.Para eles todos os proprietários,empresários,empregadores,donos do que quer que seja,são perigosos capitalistas e potenciais exploradores do povo.Eu acho que não,estes pequenos empresários são o verdadeiro motor da nossa sociedade.A grande maioria dos senhorios,principalmente do centro histórico,são pessoas que vivem com dificuldades,têm imóveis que dão menos prejuízo vazios do que arrendados.Recebem rendas ridiculas,como 5 ou 10 euros por mês,e pagam impostos e taxas exorbitantes sobre estes mesmos imóveis.Pergunto eu:se o sr.Louçã tivesse um T1 arrendado por 12 euros mensais e tivesse um inquilino a reclamar insistentemente por obras na casa,qual seria a sua reacção?Acharia justo,receber de herança um mono que rende 144 euros anuais e, como bónus,um inquilino a reclamar por tudo e por nada?Além de pagar as obrigações devidas aos proprietários ter de fazer uma obra em que o rendimento obtido só dá para pagar 2 ou 3 dias de trabalho de um servente?E o pedreiro?e o material?e o projecto?e..e...?O que o sr.doutor Louçã diria?Teria a mesma opinião?
Abraço,Marco

PS:Desculpe lá o desabafo,Luís.O meu amigo já se referiu várias vezes a estas questões,mas acho que vale sempre a pena expôir casos reais como este,em que uma pessoa é senhorio sem querer,em que lhe deixaram não um bem mas um prejuizo mensal para toda a vida.