(Esta imagem foi retirada daqui)
O meu filho está no Peru há uma semana. Segundo parece ser normal, talvez por sistemas de multibanco diferenciados, no estrangeiro não se consegue aceder ao saldo bancário. Passando esta anomalia que é bastante prejudicial para o utente e, com os avanços tecnológicos de hoje nem se consegue entender muito bem, ter-se-ia conseguido ultrapassar esta impossibilidade se nos tivéssemos lembrado e pedido uma autorização de acesso via Internet. Acontece que nem o meu filho nem nós, pais, vislumbrámos esta faculdade. Resultado: estando ele a 12 horas de avião de Portugal não lhe é possível saber quanto tem na conta. Claro que poderemos sempre pensar que se ele tivesse apontado os gastos e subtraindo, facilmente chegaria ao resultado. Porém, sabendo nós, pais mais velhos, como os jovens são descuidados naturalmente que nos causa preocupação.
Através de telefone, ontem, o meu filho pediu-nos para tentar saber o montante que tinha disponível, uma vez que não o contabilizou desde o início.
Através de telefone, ontem, o meu filho pediu-nos para tentar saber o montante que tinha disponível, uma vez que não o contabilizou desde o início.
Fui então hoje ao banco que lhe fez a emissão do cartão. Apresentei o caso e, enquanto pai, manifestei a minha inquietação. É evidente que, de uma forma cega, poderia sempre depositar dinheiro na sua conta, mas, só quem é pai sabe, antes de realizar esta operação é preciso fazer sempre um balanço entre a necessidade normal e a urgência. E só mesmo este último estado nos compelirá.
A funcionária, de vinte e poucos anos, é que não quer saber se, sendo pai, estou preocupado ou não. A lei não permite e ponto final. E então que alternativas tenho? Interrogo. Nenhuma. “Só com autorização do titular da conta”, responde a funcionária. Mas se ele está do outro lado do mundo como é que pode? Interrogo. “O regulamento interno do banco não o permite!”
Mas, minha senhora, o legislador não consegue prever tudo. Certamente não se lembrou que no estrangeiro um cliente do seu banco não tem acesso ao saldo através do cartão, interrogo. “Pois, entendo, mas não é possível!”, responde já com alguma aspereza no timbre de voz.
Numa réstia de esperança, pedi para falar com o gerente. “A sub-gerente demora cinco minutos. Está a tomar café e vem já”, respondeu. Olhei para o relógio e vi a hora. Passados 15 minutos chegou a senhora sub-gerente. Lá lhe tentei explicar a impossibilidade de o meu filho aceder ao saldo no Peru, uma vez que não tinha levado autorização de acesso via Internet. Era uma questão de bom senso. Embora, aparentemente, tivesse menos de 30 anos, teria a senhora filhos? Interroguei, na esperança de que falássemos a mesma linguagem de amor aos filhos. Debalde. Tecnocrata não entende a linguagem de afectos. Está amarrada a conceitos legalistas da mesma forma que um comboio só pode circular em trilhos de ferro. Provavelmente, teria sido formada numa qualquer faculdade de economia onde só o formalismo entre pessoas conta. A humanidade na sua simplicidade não tem aqui cabimentação. “É a lei interna do banco que não permite”, repete até à exaustão como um qualquer gira-discos debita o que foi anteriormente gravado. Ali, naquela cabeça, não há espaço nem lugar para proceder de outra forma senão o que lhe foi incutido nos bancos da universidade. É o legalismo puro e duro, sem sentimentos de compreensão pelo outro. É o desrespeito pela pessoa humana.
Lá ratifiquei o meu protesto no Livro de Reclamações. Antecipadamente, sei qual vai ser o veredicto do receptor: “Improcedente por falta de enquadramento legal”. Apesar de tudo, mesmo sabendo que não ganho nada com isso, nestes casos, continuo a escrever a quem dirige este pessoal insensível e maquinal na esperança de que, através da universalidade do trabalho e da experiência empírica, os sensibilizem para serem mais humanos e menos máquinas. É lógico que não vou conseguir. Que culpas terão eles que eu discorde deste tratamento plástico, granítico, de usar e deitar fora? Que culpas terão estas pessoas que eu seja do tempo em que ir ao banco era um prazer, no sentido em que conhecíamos, desde o gerente até ao último empregado, todos pelo nome e eles a nós?
Este é o tempo em que vivemos. É o tempo em que cada um de nós, deixando de ser pessoa, passou a ser número. Mas se eu sei que é assim o que me faz contestar esta duvidosa normatividade?
(ESTE TEXTO FOI ENVIADO À ADMINISTRAÇÃO DO BANCO EM CAUSA)
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