Estava eu ontem, “descansadinho da silva”, a tirar uns “bonecos” aos putos, todos “encartolados”, que passavam em fila a imitar o Cortejo da Queima das Fitas nas ruas da calçada. Mentalmente ia pensando se estaria certo vestir estas crianças com fatos de adulto. Não sei muito bem se me conseguirão entender –se até eu tenho dificuldade-, mas o que quero dizer é que tenho saudades de ver uma criança vestida simplesmente como tal, com calções e até com joelhos esmurrados. E saberão os amigos quando é que o consigo? Façam o favor de não rir na minha cara, caso contrário não escrevo mais. Homessa!? Pois é… é exactamente nos mais pobres. Tentem comparar uma criança humilde com uma remediada e ambas a brincar. Não têm semelhanças. É como se o maltrapilho se esquecesse da sua condição miserável e a felicidade, em toda a sua pujança, se reflectisse naquele rosto.
Estava eu então nesta grande viagem através do pensamento quando me senti a abanar todo. Eu seja ceguinho se não pensei, “queres ver que fui abalroado?”. Mas não, felizmente para mim, era só o Carlitos “popó” a tentar acordar-me da minha letargia. Meio titubeante, lá me foi dizendo: “vaa….iii fa… llaar… com o chee…fe imedia…taaa…mente!”. E lá fui eu a correr para sede do blogue Questões Nacionais.
-Bom dia, chefe. Mandou chamar-me?
Disse isto assim numa voz melosa, a ver se o gajo se chega com algum. Não é por nada mas já lá vai mais de um ano que não vejo um simples nota de vinte… pelo menos vindo do mastronço. O que me vale são as minhas correspondências com os jornais internacionais.
Se não fosse o amor da minha vida, a Rosete “Sempre em Cima”, há muito que tinha mandado este filho da mãe para o outro lado. Mas que querem? Não é verdade que os homens são como os barcos? Todos têm sempre de ter uma âncora?! O que mais me chateia é que não levo nada dali. É como se andasse a correr atrás do vento e a tentar abraçá-lo…
-B’tarde…
É muito estúpido tal gajo. É sempre a mesma coisa. Até parece que quer poupar nas sílabas. Assim poupasse o animal nas prendas que dá à minha Rosete. Já se entende a razão de eu não receber ordenado há mais de um ano… e da minha musa nem um simples beijo.
-O chefe mandou chamar-me? –Voltei a repetir.
-Claro. Não foi ter consigo o nosso mensageiro oficial, o Carlitos “popó”?
Disse isto assim, como se estivesse a mastigar as palavras. Ai, Senhor, o que isto me irrita…
-Então diga?!
-Preciso que amanhã, às 11h00, esteja na Rua Adelino Veiga, para fazer a reportagem da inauguração da nova sede do Partido Comunista Português. Vai lá estar o secretário-geral, o camarada Jerónimo…
-“O camarada Jerónimo”? Não me diga que o chefe agora também virou vermelho? Mas você não é de todos?
-Olhe lá, que maneiras são essas de falar? Você está farto de saber que jornalista não tem partido… que mania a sua de me azucrinar a cabeça?!
-O chefe desculpe, pelas mamas da Rosete, que o senhor tão bem conhece, que não queria ofender…
Está bem. Passemos à frente, que essa sua conversa não me enche barriga…
-Ai os comunas vão sair da Rua da Sofia?
-É óbvio. Se vão mudar de sede?! Parece que compraram o edifício…
-Como? Compraram o prédio? Ó chefe, mas isso é uma grande “cacha”. Pode ser que agora, sendo proprietários aqui na cidade, comecem a entender melhor os senhorios e não olhem para eles como modelos do “grande capital”. Não se esqueça que o “Chico” Queirós, para além de ser comunista, é o vereador do pelouro da habitação…
-Ó “Olho de Lince”, faça-me um favor, deixe-se de merdas, pode ser?! Poupe-me, alma de Deus!
-Ó Chefe, não se irrite. Está bem, pronto. Amanhã estou lá! Já agora não tem p’ra aí uma notita de vinte? Estou mesmo nas lonas. Até precisava de comprar uma roupita…
-tome lá 5 euros que chega muito bem. Aliás, para ir para junto dos comunistas nem precisa de ir bem vestido. Antes pelo contrário.
Por acaso o caramelo até tinha razão. Nem me devia preocupar com a “farpela”. De certeza que o Jerónimo viria de fato-macaco, de serralheiro, vestido. Ai, de certeza absoluta. Não estou a ver o camarada vestido de fato numa inauguração de uma nova sede. Mas eu sei lá!
E, hoje de manhã, lá pus as alpercatas ao caminho. Enquanto percorria os cerca de 150 metros entre a Igreja de Santa Cruz ia pensando nas razões que estariam por detrás desta mudança. Ora bem, a Rua da Sofia… Sofia…deusa da sabedoria… mãe de Deus…Espírito Santo…pois, realmente, vendo bem a coisa, os comunistas no seu pragmatismo e racionalidade não têm nada a ver com aquela artéria. Já com a Rua Adelino Veiga, poeta popular, trabalhador… está visto porque é que trocaram.
Eram cerca de 11h00 quando cheguei ao prédio das desaparecidas Modas Veiga –pelo menos deste local, que, felizmente, o Francisco Veiga continua na Rua Eduardo Coelho. Ai de mim de são fizesse esta rectificação.
O pequeno largo, onde há cerca de três décadas existiu o “Texas Bar” estava repleto de gente. Sobretudo mulheres todas aperaltadas e já um bocadito entradotas nos “entas”. Entende-se porquê, estavam todas à espera do camarada Jerónimo.
O pequeno largo, onde há cerca de três décadas existiu o “Texas Bar” estava repleto de gente. Sobretudo mulheres todas aperaltadas e já um bocadito entradotas nos “entas”. Entende-se porquê, estavam todas à espera do camarada Jerónimo.
Estava lá o pessoal todo do partido, o António Moreira, da União dos Sindicatos de Coimbra; o Mário Nogueira, que parecia um turista, com a carteira a tiracolo e os óculos de sol pendurados na camisa –reparei que estava um bocadito tristonho, suponho que foi por causa do chumbo do Tribunal Constitucional à avaliação dos professores;
estava lá o Manuel Rocha e a sua lindérrima esposa –desculpem lá este aparte, jornalista não deveria ter olhos para ninguém em especial, mas que querem? É muito bonita a esposa do cabeça de lista da CDU por Coimbra, pronto!;
estava lá o “camarada” –salvo seja, é claro- Barbosa de Melo, presidente da Câmara Municipal, sempre de braços cruzados, em posição de defesa; estava lá a “Mizé” Azevedo, a vice-presidente da autarquia;
Estava o Francisco Queirós, o vereador da Habitação da Câmara Municipal; estava lá o “Spider Man”, o maior entertainer conimbricense além fronteiras de todos os tempos, com um blusão vermelho que até parecia a bandeira do partido. Foi então que eu vi as frases estampadas: “Ibiza Fuck In Island”. Por acaso não percebo nada de inglês, mas, mentalmente, pensei cá com os meus botões que a mensagem, falando na Islândia, não deveria ter nada de especial. Sei lá, imaginemos que, por exemplo, dizia o seguinte, “Ibiza Fuck In PCP”, isso já deveria ser chato, não sei, penso eu;
lá estava o Quirino, como que a representar os comerciantes. Sim, porque dos homens do comércio estavam lá poucos, sei lá, não fosse alguém confundi-los.
Enquanto não chegava o camarada Jerónimo, que nestas coisas de inaugurações é como os casamentos, tal como a noiva, o corta-fitas é sempre o último a chegar, fui dar uma volta ao interior do edifício, foi então que dei de caras com aquele anjo de cabelo ruivo-avermelhado. Ai “Jasus”, Nosso Senhor! Perante aquela imagem de Virgem Santíssima até esqueci a minha Rosete: era a Rita Costa, funcionária do partido.
Desci as escadas e estava já o terreiro completo de pessoas. As velhotas estavam com um estranho frenesim no corpo. O que teriam? Ainda tentei interrogar uma, mas qual quê? Só tinham olhos para o cabo da rua, a ver se avistavam o seu galã.
Palavra de honra, tive de me afastar de tanta voluptuosidade e fui em direcção à Estação Nova. Foi então que vi um tipo de cara de enterro e com fato preto. Pensei cá para mim, “queres ver que morreu alguém? Este fulano deve ser funcionário da Servilusa!”
E segui atrás dele, foi então que vi todo aquele maralhal de velhas a correr para o fulano. Mas o que é isto, meu Deus?! Foi então que dei uma bruta chapada na minha fronte. Vejam bem, era o camarada Jerónimo e eu não reconhecera. Cá na minha inocência pensei que o secretário-geral fosse vestido de vermelho, ou vá lá, assim de fato azul-oceano… agora de preto?!
E começou os preparativos para o discurso do líder. Ouviu-se um “trovão”, quer dizer, parecia mas não era. Foi simplesmente o Rui Damasceno que foi ler um poema. Com aquele seu vozeirão assustou os pombos todos e até a menina Ernestina, que mora num andar mais abaixo, veio à janela toda com ar de assarapantada. É que ela deitou-se tarde, esteve a fazer serão até quase o sol raiar. O seu “Jocas” vem sempre à sexta-feira para pagar a semanada.
E veio o tão esperado discurso de Jerónimo de Sousa. A dona Ermelinda compôs o rosto, remexeu o pescoço, ergueu o punho e gritou: “PCP…PCP…PCP!”
Começou Jerónimo, “Camaradas, amigos, simpatizantes, hoje, após 90 anos, em Coimbra inauguramos uma nova sede. É nossa. Comprámo-la e graças ao muito trabalho desinteressado de camaradas estamos aqui na Baixa, contribuindo para lhe dar vida, para receber todos os pequenos empresários, pequenos comerciantes e todos aqueles que precisem de nós na cidade de Coimbra. Quando se diz que os políticos são todos iguais, nós somos diferentes. Este novo Centro de Trabalho do PCP está aberto a todos.”
E mais uma vez se ouviu uma grande gritaria: “PCP… PCP… PCP!”
8 comentários:
Gritar eles gritam muito,não se percebe é o que dizem.
Obs:A mensagem no blusão do Paulo Eno é:«Ibiza fuckin island» e não «... fuck in ...»,traduzindo a frase é «Ibiza ilha fodida(ou do caralho).É,portanto,um elogio no calão inglês.Islândia em inglês é Iceland.
Desculpe lá a rectificação Luís.Mas ,de qualquer maneira eu apreciava qualquer outra mensagem com estas duas palavras:FUCK PCP.
Marco
Notei uma falha nesta inauguração. Com tanta democracia, foram convidados os Politicos da Praça 8 de Maio " COLIGAÇÃO POR COIMBRA" e foi esquecida a Junta de Freguesia de S. Bartolomeu.
Querem ver que o raio do convite não foi feito, porque tem na Presidência um Independente, embora eleito nas Listas do PS?
Isto da politica é tramado. Será que foi feita a reorganização Administrativa e S. Bartolomeu desapareceu do mapa da CDU!
Camaradas o Protocolo falhou.
Concordo plenamente, deviam convidar o executivo da junta e até mesmo a Assembleia da Junta de Freguesia.
Bem sei que a CDU deixou de ter representação na Freguesia, mas muito por culpa propria e ai tambem pr culpa minha porque foi a minha candidatura como independente no bloco que fez com que a CDU deixasse de ter representação na Assembleia.
Mas penso que foi uma falha da organização e nada mais.
Quero louvar a vinda da Sede da CDU para a minha Freguesia de São Bartolomeu.
Caro Marco pareçe o novo Salazar a falar, melhor a escrever, deve ser tiques de andar a ler o que Sócrates escreve.
É preciso saber viver em democracia, esse odio ao PCP é doentio.
Amigo Jorge,democracia é isto,é podermos dizer o que sentimos e pensamos.Uns pensam-no e não dizem outros expressam-no.E não é ódio,é só a minha opinião.
Marco
Olá Luís
Posso "roubar-lhe" uma foto do camarada Jerónimo para publicar na Revista C?
Se sim, como quer que a assine?
Muito obrigado.
Um abraço,
Vasco Garcia
Ó Vasco, sinceramente, deveria ser aposto o nome do "Olho de Lince", mas como ele está em serviço no Paquistão -por causa da morte do Osama Bi Laden-, coloque, se faz favor, o nome do director cá do jornaleco, Luís Fernandes, que por acaso sou eu, vaidoso assumido e açambarcador do trabalho alheio.
Esteja à vontade, camarada Vasco. Publique lá isso.
Abraço.
Muito obrigado.
Continue com o bom trabalho e dê os meus parabéns ao "olho de lince" :)
Qualquer coisa, disponha.
Um abraço,
Vasco
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