sexta-feira, 29 de abril de 2011

NÃO SE IMPORTE QUE A SUA VEZ CHEGARÁ!

(IMAGEM DA WEB)


  Há cerca de um mês um casal meu amigo perdeu a casa a favor do banco por falta de pagamento. Um deles ficou desempregado e, progressivamente, a situação foi-se avolumando até ao desfecho final.
Esta semana, a filha de uma amiga minha, também por falta de pagamento, aqui na cidade de Coimbra, entregou o andar que ocupava ali para os lados do Vale das Flores. Como se fosse pouco, a minha amiga, mãe da usufrutuária do crédito bancário, é avalista da filha. Mais ainda, como o valor patrimonial dos prédios desceu muito mais do que se diz, tudo indica que mesmo depois de vender a casa em hasta pública pelo banco o seu valor não irá cobrir o valor em dívida. Resultado: duas gerações vão ficar afectadas e em muito maus lençóis.
Penso que, talvez por desconhecimento, nenhum de nós tem bem noção do que está acontecer de Norte a Sul do país. Diariamente, como pedras vindas do céu, estão a cair nas famílias portuguesas tragédias que poucos se darão conta.
Estou em crer que perante uma notícia que lemos num qualquer jornal de uma execução de hipoteca o primeiro pensamento que nos ocorre será: “pois, não calcularam os riscos. Às tantas até compraram casa, carro e barco de recreio. Depois, é claro, tinha de acontecer isto!”. Ou seja, culpamo-los pela sua irresponsabilidade, ao terem assumido créditos que, em caso de uma qualquer infelicidade, não poderiam cumprir. E, rapidamente, este assunto fica encerrado na nossa mente. É como se, no fundo, estivéssemos a maldizer estas vítimas. Nenhum de nós se lembra que a qualquer momento poderá chegar a nossa vez. Quando vejo estas ocorrências, imediatamente, vem-me à mente o extraordinário poema de Martin Niemöller, escrito em 1933.
O que estranho é que, aparentemente, ninguém dá conta que a espada de Dâmocles paulatinamente vai caindo nas cabeças dos nossos vizinhos e, aos poucos, aproxima-se do nosso pescoço.
Quem tem voz para se fazer ouvir, preocupa-se apenas com a alteração do sistema político, sabendo nós que, por este andar e preocupados como andamos, lá queremos saber do que virá aí para as próximas eleições. Fala-se e escreve-se muito mas com frases perdidas no vazio do éter. Não é que não estejam certas, lá isso estão, mas são uma espécie de ramagem, não são o nuclear das coisas. São o acessório em detrimento do essencial. Só para exemplificar, vou mostrar o tipo de discurso que se houve e lê demasiadamente. Ontem, no Jornal Público, escrevia Mário Nogueira, líder da Fenprof, “Exigem-se ainda mais sacrifícios a quem há muito os suporta; diz-se que vive acima das suas possibilidades quem, muitas vezes, pouca possibilidade teve de viver; acusam-se os que discordando de soluções negativas, recusam compromissos com elas…”. (…) “Com a crise dos países ganham muitos, desde logo os especuladores financeiros, os bancos e as entidades que, alegadamente, ajudam as nações em dificuldades.”
Hoje, no Jornal de Notícias (JN), Vítor Bento, economista, presidente da SIBS, Conselheiro de Estado, e sei mais lá o quê, diz que “Por acreditar que só reconhecendo as nossas fraquezas é que podemos alavancar as nossas capacidades”. Continuando a citar o JN, “Foi com críticas em todas as direcções –aos políticos que não resistem às “sereias tentadoras do laxismo, do imediatismo e do facilitismo”, a uma parte da elite económica” que se torna muitas vezes conivente com as ilusões propagandeadas pelos políticos” e aos intelectuais, “em geral bem intencionados”, que influenciam a opinião pública mas que têm “um enorme desconhecimento das coisas práticas da vida e da economia”.
Penso que deu para mostrar o quanto estes dois senhores falam bem, aparentemente com grande fundamentação, mas na prática, no essencial daquilo que preocupa verdadeiramente os portugueses que todos os dias sofrem atentados por parte dos bancos, não dizem nada. Os seus discursos são simplesmente políticos, filosóficos e mais do mesmo e que estamos todos fartos de ouvir todos os dias.
Claro que se eles pregam, certamente, será porque terão fiéis que os escutam. E na omissão, no alheamento das coisas, não estão sós. Apesar desta razia financeira que está a acontecer na sociedade portuguesa, a colectividade nesta longa caminhada mortífera, limita-se a olhar para o horizonte, mas esquece as pessoas que, como tordos, vão caindo ao longo desta vereda de escolhos pontiagudos. De uma forma egoísta estamos a ignorá-los e a abandoná-los à sua sorte, olvidando que a sua sina presente será a nossa ventura amanhã e, do mesmo modo, será o laço onde nos enforcaremos também.
É urgente um pedido de ajuda, um grito de socorro social, um plano de recuperação para quem está a largar coercivamente as suas casas e tudo aquilo que ganhou numa vida de trabalho. Será certo que nem todos poderão manter os seus bens, mas não poderemos ignorar que há cidadãos a perderem os seus lares por escassos milhares de euros.
Estará certo do ponto de vista da justiça estas pessoas estarem a arcar sozinhas com as consequências? Onde está a responsabilidade solidária dos bancos? Não foi a banca que aliciou –sem aspas- todos a contraírem créditos para adquirirem produtos “tóxicos”, supérfluos, ou mesmo bens que deveriam saber à partida que estavam hipervalorizados? Há muito tempo que os bancos deixaram de ser instituições de desenvolvimento social, para serem simplesmente agiotas e usurários no pior que a frase possa conter. E aqui é que bate: se os bancos vendem dinheiro e estabeleceram contratos de crédito assentes na bilateral boa fé exigível em todos os acordos, e agora, se constata que essa avaliação patrimonial está viciada, por que razão ainda nenhum advogado levou nenhum caso até ao Tribunal Constitucional, com base, quer no vício de simulação, quer na alteração de circunstâncias fácticas –plasmado no Código Civil, art.º 437-, quer na violação do direito constitucional de igualdade? Se já houve dois advogados de Coimbra que intentaram acções contra o Governo –um por discordar da “ponte" sobre o feriado e outro sobre o retirar verbas aos ordenados dos funcionários públicos-, por qual a razão de, pelo menos até agora, nenhum ter intentado demandas contra a selvajaria que os bancos estão a perpetrar contra cidadãos indefesos?
O que estamos a assistir diariamente é uma violência consentida por todos. Estas casas de crédito, com a nossa anuência, venderam-nos os venenos para nos suicidarmos, a seguir os caixões e enterram-nos a todos, um a um. E isto tudo dentro da lei.
Ora, a meu ver, que não percebo grande coisa de direito, é fácil de vislumbrar que estamos todos a ser espoliados de uma forma gananciosa e vil. É preciso colocar um travão neste enriquecimento sem causa com base em contratos feridos na boa-fé.
Não se pode admitir que estes “salteadores de estrada” nos levem a casa, a burra e a carroça, os anéis, a vida em muitos casos, e até a própria alma.
Em nome do respeito pelo próximo, em nome pelo nosso futuro que começa agora, não podemos continuar neste ostracismo perante a desgraça do nosso vizinho.
Seja lá quem for que saia vencedor destas próximas eleições é preciso exigir um plano de pagamento prolongado, ou renegociação das dívidas particulares. Não podemos alhear-nos do que se está a passar mesmo à frente dos nossos olhos. É imperioso um programa de salvação Nacional. Ninguém fala disto. Todos estão apenas preocupados com as medidas do FMI, Fundo Monetário Internacional. E as necessidades básicas do cidadão, o seu constitucional e legítimo bem-estar, onde fica?
É preciso denunciar este atentado social. Nesta omissão, estamos todos a ser coniventes. Como moscas numa vidraça à procura de uma saída, andamos todos preocupados e perdidos com a dívida global do país e esquecemos os nossos problemas individuais.

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro amigo, tal como partilhei no meu último comentário, lá teremos de ter um estomago de ferro para digerir tanto erro. Enfim, também participo das dores e também aqui na nossa pacata aldeia de S.Frutuoso já estão a acontecer casos assim... será que teremos de irremediávelmente ir viver debaixo da ponte?