sexta-feira, 28 de novembro de 2008
"PSP (E AUTARQUIA) PÔE ORDEM NA VENDA AMBULANTE DO BOTA-ABAIXO"
Este é o título do Jornal as Beiras de hoje. Continuando a citar o diário, “Durante mais de dois anos, os comerciantes de etnia cigana foram ocupando o espaço existente na zona do Bota-Abaixo para ali colocarem os seus espaços de venda. O que é certo é que, dos cinco legalmente previstos para a zona (perto da Loja do Cidadão), já ali estão a expor os seus produtos o triplo.”
“(…) A câmara municipal entendeu, e a meu ver bem, fazer cumprir o que está estipulado”, afirmou o presidente da Junta de Freguesia da Santa Cruz, Pinto dos Santos, já que “há regras e regulamentos que têm de ser cumpridos”.
Para melhor entendermos vou recuar uns anos atrás, porque esta questão não é tão linear quanto parece. Antes disso, e como ressalva de interesses, declaro não ser defensor dos ciganos nem ter qualquer simpatia especial por esta minoria.
Retrocedamos então no tempo. Até ao início da construção do parque de estacionamento, ainda no mandato de Manuel Machado, por volta de 2000 –cujo terreno foi adquirido em hasta pública à autarquia pela Bragaparques, por quase um milhão de contos- os ciganos, juntamente com outros vendedores, numas barracas miseráveis e decrépitas, ocupavam uma parte do então terreno alienado à firma de Braga e aí desenvolviam os seus negócios.
Com a desocupação do terreno, a autarquia agarrou nestas pessoas e, em magote, colocou-as no Largo da Maracha, a vinte metros do anterior local de venda. A sua instalação, naquele Largo, era tão ostensivamente miserável que fomentou várias queixas à Câmara Municipal de Coimbra (CMC), tanto de particulares como de comerciantes instalados na Baixa.
Em 2002, cai Manuel Machado e subiu ao poder Carlos Encarnação. Uma das suas promessas eleitorais era a de regulamentar de vez a venda ambulante. Chamando a si a discussão desta nova regulamentação, o então vice-presidente Pina Prata afirmou várias vezes de que “agora é que se vai de vez resolver esta situação". Enquanto se organizava e ia a discussão pública o novo Regulamento da Venda Ambulante do município de Coimbra –que entraria em vigor em 2003, através da deliberação nº1819, de 10 de Fevereiro de 2003- a Rua da Louça, ao abrigo do Procom, entrou em obras de calcetamento e, pela necessidade de desocupação, os vendedores ciganos foram transferidos para o actual espaço, junto aos antigos Armazéns Amizade. Depois de concluído o arranjo pedonal da Rua da Louça, chegaram a ser desenhados nas pedras do chão do Largo da Maracha uns espaços que, aparentemente, se destinariam aos vendedores ciganos.
A verdade é nem eles saíram mais do espaço que ocupam actualmente, nem nunca foi implementado o “novo” Regulamento da Venda Ambulante –seja por esse motivo ou por outro qualquer, se tentar aceder, na Web, no sítio da CMC, ao malogrado regulamento não conseguirá.
O engraçado (sem graça nenhuma) foi que o novo Regulamento da Venda ambulante, em relação ao anterior, era completamente vanguardista. De tal modo, por exemplo –estou a citar de memória- doutrinava que nenhum vendedor poderia estar a vender a menos de 50 metros de um estabelecimento comercial e a 100 metros de uma igreja.
A verdade é que o cumprimento de tal regulamento morreu na praia. Tudo continuou na mesma ou pior.
Porque, já o escrevi antes aqui neste blogue, goste-se ou não destes vendedores, eles têm direitos (e obrigações) e naturalmente merecem mais respeito. O que se assiste no Bota-Abaixo deveria envergonhar a autarquia. Aquilo não é uma feira, muito menos venda ambulante, muito menos uma paisagem edificante de uma cidade. A autarquia, este executivo, o que fez foi agarrar nesta gente como se fossem “coisas” e arrumá-los num canto mal-cheiroso. Aqui, tenho de admitir que admiro a capacidade de resistência destas pessoas e que deveriam ser um exemplo para os comerciantes tradicionais. Ou seja, foram colocadas num recanto obscuro, junto a vários caixotes de lixo e, aqui o meu pasmo, transformaram aquele canto sem luz numa zona frequentada por pessoas de todas as classes. Pode-se, sem dúvida argumentar outras questões, mas uma coisa é certa, eles, através do barulho –“é só 5 euros, menina, compre, compre”- ou outros meios, a verdade é que vendem. E que eu saiba, pelos vistos não se queixam da crise. Ao que parece, queixam-se para que, mesmo naquelas condições indignas, os deixem trabalhar. Digam-me, sinceramente, se não é curioso.
Em súmula, depois desta longa explanação, penso, já se entende que a medida de ontem da autarquia não passou de mero folclore. Verdadeiramente a câmara não está minimamente interessada em resolver este problema.
Se o estivesse não advogava a continuação, naquelas condições infamantes, dos cinco vendedores inscritos legalmente. Aquele local não serve para cinco nem para ninguém. Pura e simplesmente não presta.
Porque sejamos práticos, e façamos exercícios de retórica. Ontem os fiscais actuaram acompanhados de vários polícias. Alguém acredita que hoje, novamente, não estarão lá o mesmo número de vendedores de ontem? É óbvio que sim.
Abusando da sua paciência, leitor, ainda faço outra pergunta estúpida: porque só devem permanecer ali os cinco vendedores licenciados que transitaram do anterior espaço e não são autorizados outros que lá vendem também? Será que a autarquia está à espera que morram os cinco para então acabar com a venda-ambulante-fixa?
Pode então o leitor interrogar, mas, afinal, que solução defende para estes vendedores?
O que defendo, em primeiro é que lhe deve ser restituída a dignidade que merecem, através de um local aprazível; defendo também que em vez de olharmos para eles como algo desestruturante e prejudicial ao comércio da Baixa, porque não olhar para eles como mais um catalisador de pessoas para a zona histórica? A verdade é que onde eles estiverem juntam compradores; defendo também que a sua venda seja disciplinada, através de pagamento de impostos. Se eles consideram ser várias vezes discriminados nos direitos em relação a outros comerciantes, também devem ser equiparados nas obrigações.
Para terminar –ufa!, não sei como é que você chegou até aqui-, vou sugerir um espaço nobre que poderia ser perfeitamente aproveitado, através de pequenas “barraquinhas”, umas a seguir às outras, para eles e para outros vendedores. Por exemplo, nesta altura de Natal, colocar ali, todos juntos, as várias instituições de solidariedade da cidade a vender os artigos que lhes são ofertados –que, aliás, é o que se faz por essa Europa fora. O local que indico é o que está a servir de estacionamento em frente à Estação-Nova. É um local digno, que se não colidir com a passagem do Metro, e que se for bem inserido “paisagisticamente” todos ficamos a ganhar.
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1 comentário:
concordo com o artigo quase na sua totalidade, só fiquei reticente quanto à utilização do espaço do estacionamento na av emidio navarro.. não estou a dizer que os quero num canto escuro e mal cheiroso, não sou nem pró nem contra os ciganos, simplesmente não acho que a "fachada" principal da cidade seja o local ideal..
porque não um mercadinho onde era a antiga triunfo?
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