segunda-feira, 24 de outubro de 2011

A PARTIDA DO MEU SANGUE

(FOTO DA WEB)



 Ontem levei a minha filha e o meu neto ao Porto. Foram apanhar o avião que os transportaria para a Bélgica. No aeroporto, na despedida, chorei a bom chorar. Dizem que os homens não choram…
Uma coisa é nós lermos no jornal que os jovens estão a ir embora de Portugal, outra é sentirmos na carne a dor da separação de um nosso filho, de pouco mais de 30 anos, que, pela impossibilidade de aqui viver condignamente, se vê obrigado a partir para longe. É evidente que, em jeito de desabafo, poderemos sempre dizer que somos um povo migrante. Afinal nos idos anos de 1960 cerca de um milhão de portugueses procuraram uma vida melhor no estrangeiro. Mas, hoje, a meu ver, é mais penoso para quem fica do para quem parte. Quem fica sente que algo falhou, e continua a falhar, na permanência dos jovens que são -deveriam ser- o futuro da Nação.
Falo por mim, sou filho de gente humilde e muito pobre. Desde muito novo, lembro-me, disse para mim que faria tudo para dar uma vida digna aos meus filhos. Melhor do que a que tive. Trabalhei muito para lhes conceder tudo o que eu considerava essencial e que, na minha época e devido às circunstâncias, não foi possível ter tido. Achei que, com muito suor e lágrimas, tinha construído as bases do seu futuro. Dei-lhes a possibilidade de tirarem um curso universitário, proporcionei-lhes meios para frequentarem o Conservatório de Música. Hoje, aparentemente, tudo tão fácil, mas impossível no Estado Novo para a maioria das famílias como a minha. Esqueci-me que não tinha meios de influência, a vulgar cunha, para lhes garantir um emprego a ganhar muito bem e que lhes permitisse fazer face a um custo de vida impossível. É certo que nunca pedi a ninguém para me arranjarem um lugar. Sempre entendi que, num país equilibrado, justo e equidistante em relação ao cidadão, na ocupação de lugares contariam sempre os factores classificação, grau de saber e competência. A minha filha é psicóloga –anterior ao acordo de Bolonha- e fez mestrado.
Porém, desde há muito verifiquei que este país não é para os mais capazes intelectualmente, mas para os mais desenrascados na cunha. O preenchimento de vagas é para os filhos-famílias, para os nomes sonantes. Basta ver os quadros de professores numa universidade pública. Atente-se numa qualquer Câmara Municipal. É a sucessão dinástica em toda a sua plenitude… em democracia. E falava-se do clientelismo no Antigo Regime!
Quem se despede de alguém, como eu ontem, que ama e que se vê obrigado a partir para longe, porque aqui não existem condições, sofre a bom sofrer. Sobretudo, e esta é a diferença em relação as anos de sessenta, é que esta geração de pais, como eu, sacrificou-se muito para dar formação aos filhos, para que estes desenvolvessem a sua vocação, e, ao mesmo tempo, servisse de instrumento forte na realização das suas vidas. Nos idos anos de 1960 não era assim. Só poucas famílias podiam oferecer um futuro aos seus primogénitos. A maioria, que não tinha nada para dar, colocava-os a trabalhar como meio de rendimento para a prole. Era por isso mesmo que a emigração nesta altura era apenas um único meio de saltar a barra da pobreza. Era conjuntural em relação ao país e estrutural em relação à Europa. Hoje, a meu ver, esta migração é o inverso. É estrutural em relação a Portugal e conjuntural em relação ao mundo. Quero dizer que, na relação directa comparativa, hoje, os pais, as famílias, são remediados cá dentro, com tendência a empobrecer a curto prazo, mas pobres em relação ao exterior.
É uma dor de alma ver que não conseguimos segurar os nossos filhos aqui por falta de trabalho e de rendibilidade que lhes permita lutar por uma vida melhor.
Estou ressabiado com o nosso país. Estou frustrado. Portugal, a continuar com estas políticas continuadas de empobrecimento social, não é para os jovens, não é para os velhos, não é para ninguém. Parafraseando António Barreto, é o desaparecimento, enquanto nação identitária, que está em marcha.
Pobre de nós, geração de 1940, 50, 60, que tantos sofremos a acreditar que valia a pena lutar por um amanhã melhor.

2 comentários:

Sónia da Veiga disse...

Luís, sinto a sua dor...
Também eu não sei como será o futuro e temo pela herança que estas políticas estapafúrdias do consumismo e das aparências deixarão para os meus filhos...
Dantes trabalhava-se e amealhava-se, mas hoje já não é assim - tudo se esvai em impostos, taxas, burocracias e tretas mais que só nos sugam a vida, a paciência, o dinheiro e, com todo o stresse, até a saúde.
Fique feliz porque o futuro da sua descendência é agora mais risonho num país onde as pessoas sabem o que é respeito e cidadania. Poderá ter os seus quês (qual os não tem, especialmente, com economia global e crise generalizada), mas estão melhor lá do que nesta República das Bananas Importadas!
Beijinhos para quem partiu, votos de muitas felicidades e tudo de bom, e um grande abraço para quem fica!!!

LUIS FERNANDES disse...

Muito obrigada, Sónia. Só quem passa por esta experiência sabe e sente o que eu senti. Uma tristeza. Abraço e obrigada pela solidariedade.