quinta-feira, 20 de setembro de 2012

UM COMENTÁRIO E O CONTRADITÓRIO




João Carlos Santos deixou um novo comentário na sua mensagem "CARTA ABERTA AO SENHOR BISPO DE COIMBRA":


 É incrível como é que um agnóstico se pronuncia desta forma sobre questões religiosas sem se informar primeiro.
Se a Cafum está assim tão interessada, porque é que não é ela a contactar a Confraria e a oferecer os seus préstimos gratuitamente, já que a instituição não tem dinheiro para resolver o problema? E esqueceram-se de que os trabalhos dependem da DRCC ou do IPPAR ou dos dois? O Mosteiro é Monumento Nacional e os responsáveis têm de zelar por esses bens patrimoniais.
Quer as igrejas abertas dia e noite? Pois bem, e quem é que paga aos funcionários? Vai para lá o senhor tomar conta da porta? Que eu saiba, o Mosteiro de Santa Clara-a-Nova mantém as portas abertas. As pessoas não deixam de entrar. Além do mais, como refere no DC o presidente da Confraria, os verdadeiros devotos têm à sua disposição o túmulo da Rainha Santa, que é muito mais importante do que uma imagem. Mas é natural que um agnóstico, sem quaisquer fundamentos religiosos se deixe levar pela idolatria para dizer uma enormidade dessas.
E já agora, em vez de reclamar, porque é que não contribui para as despesas do culto de Santa Justa, da Graça, São Tiago, São Bartolomeu e Santa Cruz, para garantir ordenado suficiente para a manutenção de um guarda? Ou julga que as pessoas vivem do ar? Sim, que a situação de crise não deve servir para a Igreja explorar a situação difícil em que as pessoas se encontram aproveitando-se da desgraça alheia para resolver os seus problemas, como o senhor pretende com os desempregados e reformados.
E agora é o Senhor Bispo que é o culpado da crise e da falta de apoios de pessoas como o senhor, que tudo exigem e nada fazem para ajudar a resolver o problema?
Tenham juízo. Espero que tenham a honestidade e coragem de publicar esta minha resposta.
João Carlos Santos

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NOTA DO EDITOR

 Muito obrigado, senhor João Carlos Santos, por ter comentado. Vou começar pelo fim a rebater os seus argumentos. O senhor, estou certo, nunca leu este blogue, caiu agora aqui de para-quedas, por acaso. Se conhecesse, deveria saber que aqui não se discrimina ninguém, aqui todos os comentários são publicadas, sejam de hereges, blasfemos, homossexuais, hetero ou bissexuais, partidários políticos ou o contrário, inteligentes ou asininos, e desde que não se caia na ofensa gratuita –até os desabafos anónimos, apesar de ir contra o “estatuto” editorial.
Quanto à sua recomendação de “tenham Juízo”, é para quem? Para mim? Ou refere-se a uma provável “maioria silenciosa” a que julga que encabeço? Não, meu caro, esta carta é apenas escrita e representa uma pessoa: eu próprio. Já agora, aproveito para lhe dizer que poderia ter conceituado o “juízo” –o que é ter juízo para si? Pode ajudar-me? É bom senso? E se for, o que é o bom senso? Não me deixe na dúvida metódica. Quem sabe, com o seu auxílio, possa melhorar o meu juízo ou senso? Se puder, escreva a dar-me uma análise aproximada.
Vou continuar a tentar dar resposta ao seu texto, agora de cima para baixo:

“É incrível como é que um agnóstico se pronuncia desta forma sobre questões religiosas sem se informar primeiro.”

-Primeiro, meu caro João, um agnóstico, como sabe, é neutro, é um observador atento, e não é tão desligado do fenómeno das religiões como parece. Contrariamente ao que o senhor quer indicar, e quase rotulando-me como estúpido, informei-me antes. Foi a dona Raquel Santos que me contactou e posteriormente o Diário de Coimbra pegou no assunto com o devido distanciamento jornalístico necessário.

“Se a Cafum está assim tão interessada, porque é que não é ela a contactar a Confraria e a oferecer os seus préstimos gratuitamente, já que a instituição não tem dinheiro para resolver o problema?”

-Meu caro Santos, vamos por partes; não tenho interesses em recomendar a Cafum. Falei nesta firma porque conheço muito bem o seu responsável trabalho. Apenas isto. Primeiro, não sei que cargo ocupa na Confraria, mas, presumo que ao defender assim, só pode. No entanto, sobre o seu douto olhar, a Cafum para além de ter o dever de contactar a Confraria da Rainha Santa ainda deveria oferecer o serviço de desinfestação? É muito imparcial a sua argumentação, sim senhor! Para falar assim, calculo que não seja administrador em nenhuma empresa privada.

“E esqueceram-se de que os trabalhos dependem da DRCC ou do IPPAR ou dos dois? O Mosteiro é Monumento Nacional e os responsáveis têm de zelar por esses bens patrimoniais.”

-Meu caro João, apesar de ser muito ignorante, sei isso das dependências e obrigatoriedade de superintendência. No meu entendimento bacoco, o zelar pelos bens patrimoniais monumentais da esfera pública, como é o caso, implica celeridade e pragmatismo na acção. Sobretudo quando está em causa interesses de terceiros, neste caso na revitalização da cidade, do turismo, nos visitantes, e sobretudo dos fiéis, porque são estes que reclamam uma maior eficiência no trato e na reposição do antecedente. Para mim, como deve calcular, na questão da transferência da imagem, não me causa dano, mas, pelo costume, é preciso levar em conta o sentimento dos fiéis. Ou, para si, o que eles pensam não interessa nada?

“Quer as igrejas abertas dia e noite? Pois bem, e quem é que paga aos funcionários? Vai para lá o senhor tomar conta da porta?”

-Meu amável arguente, a sua alegação deixa-me petrificado. Meu caro, como escrevi na carta aberta ao senhor Bispo, o que defendo é que as igrejas, pela sua monumentalidade, são património colectivo e, como tal, a diocese, enquanto parte administrante mas recebendo subvenções do Estado para a sua continuidade, tem obrigação –vou repetir, tem obrigação- de contribuir para a revitalização da Baixa e da cidade.
Quanto aos funcionários, saberá o senhor melhor do que eu de que é uma falsa questão. Meu caro, numa frase única: até agora nunca houve vontade de abrir todas as igrejas ao público e cooperar com os fiéis e com a urbe. O que não faltam são voluntários. Mas, com pouca experiência no assunto mas alguma, sei que os administrantes, no caso comissões fabriqueiras e às vezes, em alguns casos, o pároco –quando o há-, não gostam de invasores. Preferem o encerramento que é para os voluntários não saberem muito do que se passa. Ainda lhe digo mais, porque já tive um acaso em que fui interveniente e deu para eu perceber o que se passa. Todas as igrejas, exceptuando o acesso às homilias, na sua administração a cobrar entradas deveriam estar entregues a uma empresa vocacionada para o turismo e que faria a sua segurança. Faz algum sentido não haver profissionais de turismo a tratar com milhares de visitantes estrangeiros e serem particulares na sua bondade e generosidade a desempenharem esta prática?
Porque não é assim? Porque, como disse atrás, não interessa colocar lá gente de fora. E para isso, para manter o situacionismo, opta-se por encerrar os templos. É uma solução bem à portuguesa, com certeza.
Quanto ao pagamento de funcionários, como alega, saberá o senhor melhor do que eu que o rendimento auferido nas entradas dá perfeitamente para isso. Se houvesse vontade, é claro, mas não há. Concordo completamente com o pagamento nos monumentos –estes, e com as verbas das entradas, devem ser auto-sustentáveis. Porém há uma questão importantíssima: deve-se cobrar mas, em compensação, deve dar-se a contraprestação do serviço. Ou seja, visitas guiadas por licenciados em artes e faladas em inglês, francês e alemão.
Meu caro, se preciso for, e servir para abrir as igrejas da Baixa ao público, pode contar comigo.

“Que eu saiba, o Mosteiro de Santa Clara-a-Nova mantém as portas abertas. As pessoas não deixam de entrar.”

-Segundo as informações da senhora Raquel Santos, e também expressadas no Diário de Coimbra, o Mosteiro de Santa Clara-a-Nova apenas mantém as portas abertas para as homilias. Fora delas a entrada é feita pela parte lateral, pela sacristia. As pessoas não deixam de entrar, concordo. Porém, deve tomar em conta que se está a retirar dignidade ao monumento e a desvalorizar a fé de muitos crentes que se dirigem ao convento. Acredito que, pelo anteriormente explanado, não está de acordo com esta minha premissa.

“Além do mais, como refere no DC o presidente da Confraria, os verdadeiros devotos têm à sua disposição o túmulo da Rainha Santa, que é muito mais importante do que uma imagem. Mas é natural que um agnóstico, sem quaisquer fundamentos religiosos se deixe levar pela idolatria para dizer uma enormidade dessas.”

-Refere os “verdadeiros devotos”. Há falsos devotos? Qual é o critério para os destrinçar? Como é que separa o trigo do joio?
O túmulo é mais importante do que a imagem para os crentes? Não leve a mal a pergunta, tem a certeza de que o senhor não pratica a religião Jeová? Se é católico praticante, com o devido respeito, mas o senhor não sabe nada de psicologia da religião (de Carl Jung). Aliás, duvido até que saiba o que trata. Não se preocupe, eu ajudo, afinal os amigos são mesmo para as ocasiões. Começo por lhe dizer que é o estudo que trata as experiências religiosas e as crenças, associando a antropologia e a psicanálise –no Cristianismo é a base da Teologia.
Para um crente, expressar o seu sofrimento e projectar a ajuda em uma imagem de terracota, madeira ou outro qualquer significa a humanização da fé. O falar “tu lá, tu cá” com a figura que se tem à frente. Uma representação física de uma qualquer imagem de santo para o crédulo é a imagem de Deus personificada. É a representação, de facto, de algo que lhe é transcendente, que ele, pela sua fé, aceita, mas não é palpável, visível ao olhar. Aquela configuração faz a ponte entre o materializado e o espírito de Deus, enquanto invisível Senhor do Universo. Digamos que o piedoso, no acto de oração, projecta naquela imagem material todo seu acreditar, o seu “re-ligar”, transcendente a Deus.
Isto é beatice? Meu caro, como agnóstico digo-lhe que não. Beatice é uma devoção fingida, uma hipocrisia. Ora quem revê Cristo numa imagem não está a fingir. É uma cerimónia solene sublime de entrega a Deus em toda a sua humildade de humano, finito, inconsequente e pecador. Enquanto acto individual e que implica introspecção, projectar a fé numa figura, é um exercício de vontade, racional, e não implica fingimento. 
Se a devoção for manifestada em público, isso sim, já poderá ser considerado hipocrisia.
No entanto, sempre gostaria de acrescentar que, em paridade com a dinâmica dos tempos e o desenvolvimento, tendo em conta a história e de que, de certo modo, o conhecimento suscita maiores dúvidas existenciais, é natural que as religiões atinjam um estado de maturidade que, aos poucos, apesar da simbologia, muitos rituais desapareçam, este, o culto pela imagem poderá ser um deles –excepto as procissões, que enquanto ritual religioso e profano, estão tão entranhadas nos costumes do povo que nunca o deixará desaparecer; na liturgia, o sacramento da confissão ao pároco; a genuflexão –inclinar-se e dobrar os joelhos perante o sacrário- e outros gestos durante a homilia.
Não lhe vou explicar o que significa idolatria, porque, se o fizesse, iria entrar em contradição com o que escrevi atrás. Mas sempre lhe adianto que a linguagem idólatra é muito usada pelos ateus e pela religião de Jeová. O senhor Carlos Santos tem a certeza, por convicção, de que é mesmo Católico Apostólico Romano? Não haverá uma certa confusão na sua cabeça?
Vou ficar por aqui. Sabe porquê? Porque, ao obriga-lo a ler um lençol destes, já basta para o castigar. Mas se, eventualmente, pretender mais algum esclarecimento adicional não hesite em contactar-me. Espero que tenha aprendido alguma coisa com um estúpido agnóstico. Muito obrigado pela ocasião que me deu em poder deitar tudo cá para fora e que me andava a fazer um nó na garganta.



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