Usando a analogia de um meu amigo, provavelmente, desde o 1º de Maio
de 1974 que a cidade não via tanta gente junta. Às 17h30 a Praça da República,
embora com o chão relativamente coberto, ainda apresentava algumas clareiras na
pedra calcetada. Às 17h45, sobre a mensagem de megafone e depois trauteada
pelos populares de “o povo unido jamais será vencido”, os orientadores
começaram a encaminhar as pessoas para a estrada, para seguirem em direcção à
Baixa. Nesta altura, por ventura, estariam presentes cerca de 3000 manifestantes. Por entre os protestantes, Teresa
Portugal, ex-vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra por parte do
Partido Socialista (PS), e depois deputada à Assembleia da República, puxava os
participantes presentes com um slogan: “abaixo o Governo”. Por entre a
assistência pode ver-se também, embora com menos empolgamento, Helena Freitas,
actualmente vice-reitora da Universidade de Coimbra e outrora líder do PS na
Assembleia Municipal –e agora uma das indigitadas para ser candidata à
autarquia de Coimbra pelo partido da rosa.
Sempre com grande civismo a
grande massa de povo, empunhando centenas de cartazes alusivos à crise, foi engrossando sempre a cantarolar frases musicais
divididas entre “está na hora, está na hora, de o Governo ir embora”; “gatunos…
gatunos”; “Governo para a rua, a luta continua”; “fora já daqui, porca miséria
do FMI”; “ai não, ai não, Troika não, Troika não!; “o povo unido jamais será
vencido” e muitos assobios e muitas palmas a marcar o compasso dos slogans.
Embora menos, mas de vez em quando lá se ouvia: “Passos, ladrão, o teu lugar é
na prisão!”. E muitas vezes: "gatuno"! "gatuno"! Tudo sempre acompanhado com o ritmo de bombos e do som estridente saído de tachos e panelas tocados por mãos empunhando paus improvisados e a servirem de baquetas.
Entre os manifestantes havia uma
diversidade digna de nota, pais com filhos ao colo; filhos com os pais
velhinhos pela mão; muitos jovens à procura de um futuro; muitos velhos em
busca de uma velhice condigna; muitos cidadãos contemplados com RSI, Rendimento
Social de Inserção; muitos empresários conhecidos na cidade; muitas centenas de
funcionários públicos, incluindo professores em grande escala; alguns políticos
de nomeada, embora, pareceu-me, mesmo do PS, nem todos lá estiveram. Do PSD ou do CDS/PP não me lembro de ter avistado nenhum, o que também se compreende -a SIC noticiou que Norberto Pires esteve presente.
O certo é que havia uma homogeneização muito grande de todas as classes da cidade. Salienta-se o facto de não se avistar uma única referência a um partido político, ou estrutura sindical, em cartazes ou bandeiras.
O certo é que havia uma homogeneização muito grande de todas as classes da cidade. Salienta-se o facto de não se avistar uma única referência a um partido político, ou estrutura sindical, em cartazes ou bandeiras.
Comerciantes da Baixa não se viram
muitos, mas avistaram-se alguns. Desde o Armindo Gaspar, o Arménio Pratas, o
David, o Francisco Veiga, o Eduardo Carvalho, e até o senhor Carvalho, o decano
dos comerciantes, que com 80 anos ainda trabalha no seu estabelecimento, e mais
alguns que vislumbrei de longe.
Nas janelas dos muitos prédios
que não ostentavam a placa de uma imobiliária a dizer “vende-se”, os residentes,
desde a velhinha ao mais novo da família, todos tiravam fotografias para mais
tarde recordar.
Para além de um carro de
exteriores da RTP, a SIC de Balsemão também estava no terreno. Da TVI não vi
sombra. Junto à 2ª Esquadra, nas Escadas de Montarroio, os muitos repórteres de
imprensa acotovelavam-se para tirar o melhor plano.
Sempre bem organizada, quando
chegou à Praça 8 de Maio, provavelmente já traria cerca de 5 000 pessoas. A
longa fila foi engrossando entre a Câmara Municipal e o Largo da Portagem e em
direcção ao Parque Verde e quando ali chegou, cerca das 19h30, levaria uma
corrente de mais de 10 000 pessoas –a PSP fala em 20 000. Durante quase uma
hora os automobilistas ficaram imobilizados junto ao Turismo para deixarem passar
os milhares de cidadãos indignados contra a política da coligação governamental PSD/CDS-PP.
Sem que o número exacto de
manifestantes seja importante, o certo é que tudo indica que Coimbra está
acordada para o que “der e vier”. Este Governo que se cuide, e outros que aí venham.
A partir de agora a cidade, por uma causa justa em prol de todos, pelo que se
antevê, está pronta a dar-se e a ombrear contra a injustiça.
Foi bom de ver, numa urbe que
raramente dá as mãos seja lá por que for, tantos milhares de pessoas envolvidas
no mesmo protesto. Foi bom verificar que este povo é ordeiro, e apenas quer a reposição
do que lhe foi retirado abusivo e unilateralmente.
Uma grande salva de palmas para
Coimbra.
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