quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O HOMEM DO BARRETE VERMELHO






 Não sei se sabem mas eu sou uma espécie de "abutre" –começo por pedir desculpas pela frase a mim próprio-, ando sempre à procura de coisas ou pessoas diferentes. Como devem calcular, para um talentoso como eu –isto é para equilibrar o insulto de há bocado-, qualquer banalidade ou generalidade não chama a atenção. Pronto, isto para explicar porque é que, às vezes, trago aqui histórias que não interessam a ninguém. Não é o caso desta que vou contar a seguir.
Olhei para ele, com aquele barrete vermelho, e disse cá para o “je”: é pá, aqui está uma imagem curiosa. Então, depois de pedir a licença da praxe, Clix. Digam lá – cliquem em cima e olhem para a fotografia- está ou não está curiosa? Primeiro é o barrete na ponta da cabeça, como se estivesse a provocar quem passa. Depois é o ar de “livreiro afegão, de Cabul” que se desprende do seu rosto. E, inevitavelmente, é o olhar triste deste ancião.
Chama-se Arlindo Lucas Cortez. Tem 68 anos e está a viver há pouco tempo na Baixa, “ali naquela pensão daquela rua estreita, está a ver onde é?” –interroga-me. “Sou viúvo, sem filhos. Estive cerca de três anos na Misericórdia em São Martinho do Bispo -conhece? É onde funcionou o Albergue, está ver, não está? Tratavam-me bem, mas era uma prisão, sabe como é, uma pessoa não gosta de se sentir presa. Aqui estou bem, vou dando os meus passeios, há gente sempre a passar. Gosto disto, pronto, que se há-de fazer? Sabe que eu fui sacristão na Igreja de São Bartolomeu? Pois fui mesmo, durante muitos anos. Na década de 1950/1960. Sabe quem era o pároco?” –como sou mesmo ignorante, abanei a cabeça.”Não sabe? Ó homem, não diga a ninguém que escreve lá nessa coisa de blogue. Você sabe muito pouco. Então não era o Nunes Pereira? Lembro-me muito bem dele. Estive muitos anos a coadjuvá-lo à missa.
Fui ali ao banco a ver se já chegou a minha reforma, mas ainda não. Fui pintor de construção civil. Sou eu que pago a minha hospedagem na pensão com a reformazita. Não fica grande coisa, mas que quer? Perguntou-me, há bocado, o que vai acontecer quando eu não puder andar? Eu sei lá! Seja o que Deus quiser. Pode ser que eu arranje para a Casa dos Pobres. Conheço o director, o senhor Aníbal Almeida, é boa pessoa, já falei com ele, mas, ao que parece, não há vagas. Pode ser que um dia, quando forem para a casa nova, quem sabe? Vamos lá ver…até breve e obrigado por ter falado comigo…”

1 comentário:

Anónimo disse...

Nunes Pereira, o grande homem que me batizou e desenhou a carbão o meu retrato.