terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O REMOER DA LOUCURA





  O Luís Miguel é um demente que vagueia pelas ruas da Baixa. Já escrevi muito sobre este rapaz aqui. Segundo se consta, foi Aspirante na tropa. Conta-se também, por aqui, que teve um grande acidente no qual veio a resultar numa incapacidade psico-demencial total.
Hoje escrevo este pequeno trecho porque estava a beber o meu café matinal no estabelecimento do senhor Jorge, na Rua das Padeiras. Como já é hábito, o “aspirante” –é assim que ficou conhecido aqui na Baixa- entrou e dirigiu-se ao balcão. Como já tenho visto de outras vezes, o dono da pequena pastelaria serve-lhe um café gratuitamente. Hoje, foi interessante de ver, o Luís Miguel, enquanto sorvia o líquido escuro, como se estivesse em solilóquio, a falar consigo mesmo, a remoer uma qualquer passagem que o marcou, falava sozinho. Gesticulando, apontando o indicador à cabeça, vociferava: “ai jasus! Nãa pode sher! Mi sher aspirante…tropa! Ne sher capetão…sher aspirante. Ai jasus! Ai jeasus!” -dizia estas frases entrecortadas por prolongados gemidos, quase de dor.
Enquanto eu ia bebendo o meu café, aos poucos, ia memorizando os seus gestos exasperados em forma de lamento. O que se passaria na sua mente? Alguém sabe? É evidente que não. O que é de admirar é que, como disco gravado, ele mantém algumas memórias activas. Por outro lado, e curiosamente, sabe quem lhe faz bem. Nunca é agressivo para quem o respeita. Não é interessante esta sua manifestação emocional?
O mundo das emoções continua a ser um grande enigma…

2 comentários:

Anónimo disse...

Mais conhecido pelo cinquenta.

Anónimo disse...

Mais conhecido pelo cinquenta.