sábado, 6 de agosto de 2011

CARTA DO PRESIDENTE DA UNIÃO DE BANCOS AO MINISTRO DA SOLIDARIEDADE SOCIAL




 Meu caro Ministro da Solidariedade e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, espero que esta minha carta o vá encontrar de boa saúde junto dos seus. Se acaso esta missiva o apanhar em cima da sua Vespa Piaggio, entre a sua casa e o ministério, que os ventos do Tejo acariciem o seu rosto e que não lhe façam desarranjo no penteado.
Ainda não tinha tido oportunidade de o cumprimentar e dar-lhe os parabéns por este novo cargo. Aliás, merecido. Merecido não, atribuído pelos mais altos valores do mérito. O futuro da nação reside nos mais novos. E lá nisso o Pedro –posso tratá-lo assim, posso?- é um verdadeiro exemplo para o país. Tão novo, apenas com 37 anos, e já com tão largo currículo político. Só pensar que o amigo nasceu em Maio de 1974, e já é deputado desde 1999. Ai, meu amigo, perante tão elevada e fulgurante carreira na juventude centrista, até fico sem palavras. Sabe que, curiosamente, cá nos bancos que dirijo, estou sempre a recomendar aos nossos associados que invistam nos trabalhadores jovens como o senhor? Pois é verdade. São muito mais aplicados no trabalho, não têm vícios empíricos, e fazem tudo o que lhes ordenamos. Saberá lá o amigo Mota Soares o que é trabalhar com “velhos” de quarenta e picos anos? Olhe, meu caro, nem de borla os aconselho aos meus representados. Volto a repetir, meu amigo Pedro, o futuro desta Nação –com maiúscula-, está nos jovens quadros como senhor, que, apesar de pouca idade, estão carregadíssimos de experiência de vida.
O Pedro desculpe, acabei por me perder nas entrelinhas da economia doméstica. O que me levou a escrever-lhe foi o facto notável –notável não, assombroso- de ouvir ontem a sua apresentação do PES, Plano de Emergência Social.
O amigo pode não acreditar, mas perante o seu, brilhante, notável, admirável, extraordinário discurso até me vieram as lágrimas aos olhos –até aqui se nota uma diferença entre mim que já sou entradote e os mais jovens como o amigo, um homem novo nunca chora. Palavra de honra que me senti comovido até à aorta. Sobretudo quando o Soares anunciou o Mercado Social de Arrendamento. Fantástico, Mota! Fantástico, Mota!
Esta medida, sobretudo esta, em que os bancos vão, através das autarquias, arrendar os prédios que lhe foram entregues por falta de pagamento aos mais desfavorecidos e com rendas entre 250 e 350 euros.
Tal como anunciou, este notabilíssimo plano é o paradigma da Troika, do “três em um”: promove o crescimento económico, a competitividade e a mobilidade social.
Vou explicar melhor, não vá o amigo ficar em dúvida. Repare, promove o crescimento económico, porque, naturalmente, os bancos, nossos associados, estão a viver um momento de letargia anémica e com um pé na falência –não fosse a legítima protecção dada pelo anterior governo e pelo seu actual e estaríamos como uma qualquer microempresa.
Até agora, confesso-lhe, até andava com dores de barriga, saberá o amigo as resoluções de contratos que estão a acontecer diariamente? O senhor não imagina! Olhe que há dias –por favor, não se ria que este caso é muito sério- estive duas horas sentado na sanita de uma das 12 casas-de-banho da minha casa a tentar pensar neste problema gravíssimo. Sim, muito grave! No sentido de vislumbrar o destino que iríamos dar às casas que nos estão a ser entregues a toda a hora. Se não podemos emprestar dinheiro para as vender outra vez, porque não há, como é que íamos descalçar esta bota?
Ora, com este anúncio, o Pedro veio-nos resolver um problema bicudo. Quero dizer, a nós não… a quem precisa de casa e não a pode comprar porque nós não emprestamos dinheiro.
No relativo à “competitividade”, o Soares nem calcula a pedrada no charco que veio agitar as águas.
Nós, a banca, estávamos com mais um grande problema. Como sabe essa cambada de proprietários velhos –apelido-os assim, porque, tal como os trabalhadores, há dois tipos, os mais velhos, donos de casas a cair e com rendas antigas e os mais novos, estes que, aliciados por nós com crédito fácil, compraram nos últimos 15 anos- andavam a chatear toda a gente. Como o amigo, certamente terá ouvido, andam sempre a morder-nos nas canelas. Querem uma revisão do Código de Arrendamento Urbano e um plano de recuperação das cidades. Está de ver que esta gentalha só defende os seus interesses pessoais. O que querem é crédito barato para recuperar os seus edifícios. E onde é que se vai buscar o dinheiro? Mas esta corja de comunistas –sim amigo, já foram o Grande Capital, mas agora, mais pobretes que alegretes, não passam de reles comunistas, arrivistas e agitadores da ordem pública- pensa lá nas dificuldades dos outros? Por exemplo, na nossa? Lá querem eles saber se os banqueiros nos últimos anos, por força da crise, passaram a deixar de comer caviar todos os dias e agora só o podemos fazer uma vez por semana?
Lá querem eles saber que, neste momento de afogo económico, somos uma classe desprotegida e de recursos cada vez mais fracos?
Ora, portanto, continuando –desculpe que às vezes disperso-me, as injustiças provocam-me flatulência verbal- está de ver que esta medida do seu governo é acertada, racional e muito competitiva. Se eles quiserem recuperar as suas casas que se desenrasquem. Vai ver que, assim, vai fazer mexer o sector do arrendamento e da construção civil.
No tocante à “mobilidade social” anunciada pelo amigo, devo dizer-lhe que foi uma jogada de mestre. Gostei mesmo. Eu seja ceguinho se não delirei. É óbvio que uma família a pagar entre 250 e 350 euros de renda e a ganhar uma média de 750 euros por mês não se irão aguentar e terão mesmo de se fazer à mobilidade –claro que não estou preocupado com o pagamento da renda, isso é lá com as autarquias que, mesmo insolventes, para nós continuam a ser boas avalistas.
Olhe, Pedro Mota, gostava imenso de continuar aqui a elogiá-lo. Gostava mesmo. Mas como sei que o amigo tem a Piaggio à espera –que aliás, agora, até para fazer jus ao seu apelido, deveria trocá-la por uma mota de alta cilindrada. Se acaso precisar de crédito, é só avisar.
Receba um grande abraço do tamanho do mundo deste seu enormíssimo e alternadíssimo admirador. Continue, amigo, rebente com esses proprietários comunistas.
Abaixo a revitalização das cidades! Acima a protecção da banca mais desfavorecida!


O presumível presidente da UBP
(assinatura ilegível)

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