sexta-feira, 25 de março de 2011

AS GUITARRAS DE COIMBRA NO CHIADO








 Desde 16 de Fevereiro, está a decorrer no edifício do Museu Municipal do Chiado, na Rua Ferreira Borges, uma importante exposição sobre a guitarra de Coimbra, desde a sua construção até à homenagem de todos os seus grandes mestres, desde o terceiro quartel do século XIX até aos nossos dias.
Durante a semana, de 3ª a 6ª feira, pode ser visitada das 10 às 18 horas. Aos sábados o horário de ingresso é das 10 às 13 e das 14 às 18 horas. Domingo e segunda-feira estão encerrados os serviços. A mostra vai até 25 de Junho.
Devo salientar que se trata de uma manifestação de cultura muito importante. Tenho a certeza que os conimbricenses, talvez por desconhecimento, estão a passar-lhe ao lado. Ou será que esta exibição está muito “murcha”, no sentido de ir ao encontro do público?
Vamos por partes. Conheço um pouco do meritório trabalho da sua directora Berta Duarte. Sem favor, sei o quanto se tem esforçado para conseguir que este museu, situado no coração da Baixa, estabeleça um entrosamento com toda a sua população. Basta lembrar o centenário do Chiado, comemorado no ano passado, para lembrarmos o grande sucesso e importância que esta grande festa teve, durante oito meses, para o Centro Histórico. Em síntese, conheço e reconheço o empenhamento da directora deste museu.
“Então?...Não estou a perceber…” parece você, leitor, estar a interrogar. Calma, que estas coisas levam o seu tempo. Uma pessoa tem que expor as coisas como deve ser. Mas eu já lá vou.
O que quero dizer é que apesar da enormíssima diligência da minha amiga Berta, parece-me que esta exposição não está atingir o pleno. “E porquê?”, continua você a perguntar. Ora bem, não sei se sei, mas vou tentar responder.
É assim, quanto a mim, nos dias que vão correndo, os museus, salvo grandes exposições temáticas, cada vez estão mais vazios. São lugares de memória…sem vida. Ora, lembremos um pouco, os cemitérios também são lugares de recordação e…sem vida.
Hoje, talvez devido a novos costumes e sobretudo à Internet –que é um instrumento fantástico de acesso ao conhecimento…virtual-, muita coisa está a desaparecer a cada minuto que passa. Um dia próximo, alguém fará um balanço e, entre a coluna do Deve e do Haver, verificar-se-á que aquela, a do Deve, pesa muito mais. E que, perante os nossos olhos, está acontecer um acelerado condenar à morte de demasiadas coisas importantes no nosso tempo e que as estamos a perder. Não sei mesmo se estamos a tomar noção do quanto esta ferramenta está a contribuir diariamente para a nossa infelicidade. Em nome do facilitismo, em nome da não transpiração, em nome da falta de respeito pelo trabalho dos autores, estamos a entrar num beco da qual é impossível o retorno pelos custos associados futuros.
Bom, mas já estava noutra onda. Vamos lá voltar ao museu do Chiado. O que queria dizer é que se hoje os museus estão vazios, e este fenómeno já se verifica há décadas progressivamente –salvo as raras excepções- é preciso inverter esta tendência. E porque estarão vazios e pouco contribuem para a revitalização das zonas antigas? Mais: porque é que os museus são sempre frequentados por visitantes de fora e nunca pelos nativos? Bom, para mim, opinador, responderia que estão vazios de gente exactamente porque não têm vida. Isto é, não interagem com o público, nem os que não entram, nem com os que se dão ao trabalho de visitar.
Vou ser um pouco mais claro. Por exemplo, neste caso das guitarras de Coimbra, cuja exposição vai desde a sua construção até aos grandes executantes, porque razão, naquele banco de carpinteiro não está um artesão a trabalhar? Porque razão não se leva a efeito, dentro do espaço, uma sessão de fados diária ou semanal? Porque razão, na entrada, na rua e junto à montra, sobretudo agora em dias de primavera, não está um ou mais artesãos a trabalhar a madeira de modo a levar as pessoas a entrar e visitar o interior?
Perante o acelerado desaparecimento de profissões, os museus podem e devem concorrer para a preservação de saberes antigos. É este movimento em prole do futuro e em respeito pelo passado que estas casas de cultura deveriam contribuir mais. Até porque, se atentarmos, este interagir com o público visitante, no fundo, estaria a colaborar para o reviver do próprio espaço.
As autarquias não querem saber nada do desaparecimento de mesteres antigos ou indústrias que marcam a sua região –estou a lembrar-me que Coimbra foi desde o século XVII até ao XX uma zona de olaria de excelência. Pois a última fábrica, a Cicade, encerrou em 2008 e destruiu todos os seus moldes sem que a autarquia de Coimbra levantasse um dedo para o conter.
Ora os museus poderiam muito bem impedir que estes artífices desaparecessem. Bastava simplesmente que, para além de comercializar as suas peças, recolhessem os seus moldes e, na fase final de vida, os contratassem para trabalharem ao vivo nestes espaços mortos e sem ideias novas.
Em São Martinho do Bispo, embora a atravessar dificuldades, ainda (sobre)vive o último grande oleiro de Coimbra, o senhor Victor Eliseu, neto do grande Eliseu, um dos maiores santeiros de Coimbra e do país. Tem centenas de moldes de figuras antigas já do tempo do pai e do avô. O que temo é que aconteça o mesmo que à Cicade, por desinteresse de todos nós: a destruição.
Valerá a pena perder um minuto a pensar nisto?

(ESTE TEXTO FOI ENVIADO PARA CONHECIMENTO DA VEREADORA DA CULTURA DA CÂMARA MUNICIPAL DE COIMBRA)

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