O homem passa na ponte a pedalar,
por entre muitas pessoas em passeio,
alheio à curiosidade de um olhar,
ofusca o rio, corta o barco ao meio,
mostra o passado e o agriculturar,
de uma época de calma e com anseio,
vem da horta, da terra do mondegar,
planta, sacha, rega, cuida em pastoreio,
não trocaria esta vida de aconchegar
por nada deste mundo de regateio,
quer só paz e que o deixem abraçar
o que tem, mas chega de entremeio,
não ambiciona um carro para viajar,
a bicicleta é o seu mundo, o seu seio,
tenha força nas pernas para continuar,
feliz entre as couves, este é o seu esteio,
sabe ser uma peça de museu no rodar,
obra de arte numa cidade de devaneio,
onde o parecer é o ser sem se duvidar,
religião que se acredita sem bloqueio,
em tempo onde o tempo deixou de contar,
onde um fim justifica qualquer meio,
mesmo que seja declaradamente a enganar,
onde o sentido da palavra deixou de ser feio,
já ninguém repara, condena este abandalhar,
mais depressa reprova o homem no derreio
que bandido à vontade, descarado, a roubar,
é a cultura contrária, o esvaziar do fraseio,
o não esforço pela facilidade de não transpirar,
sabendo ele que a sua lavra é o seu galhardeio,
olha para todos que o olham, parece adivinhar,
o que vai acontecer neste futuro de batoteio,
mas nada diz, apenas pensa, continua a pedalar.
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