terça-feira, 22 de março de 2011

ATÉ SEMPRE MEU AMIGO LUCAS!

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 Conheci-o pessoalmente pela primeira vez por volta de 1996. Parece-me estar a vê-lo entrar e transpor a porta. Alto, de andar um pouco vacilante, como se fosse uma cana no canavial a dançar ao sabor do vento, era, no entanto, firme de carácter. O que encantava mesmo na figura de Adriano Lucas era o seu deslumbrante sorriso de menino. Era um rir a meio rir, quase a pedir licença para sorrir. Era aquela simplicidade que atraía. Era este trato singelo mas arrebatador que realmente o tornava excepcional aos meus olhos.
Muitas vezes me vinha visitar à loja. Muitas vezes tive a impressão que me comprava coisas sobretudo para me ajudar. Era como se, através do gesto, numa sensibilidade indescritível, em brilho de olhar que não explica mas sente-se, dissesse: “vou-te levar estes livros ou este quadro porque sei que precisas de vender!”.
Durante vários anos, até há cerca de três, vinha amiúde ao meu estabelecimento. Tinha um prazer extraordinário em negociar. Era um conversador nato. A meio do diálogo lá surgia o seu grande amor, o Diário de Coimbra e a inevitável interrogação: “você faz publicidade no jornal, não faz? Porque é que não aposta mais em anúncios? Olhe que tudo o que é publicitado no jornal vende…mas vende mesmo…pode crer!!”.
Se entrava um cliente na loja, sub-repticiamente, sem que o freguês desse por isso, lá começava a conversar e, às tantas, entrava a pergunta: “o senhor é assinante do Diário de Coimbra? É?! Ainda bem, fico muito contente. Prazer! Sou o director, Adriano Lucas" –e estendia a mão com aquela sua simplicidade fora do comum.
Nos últimos anos, estando eu e a minha mulher na loja, dirigia-se-me e interrogava: “já deu hoje um beijinho à sua mulher, já?” –e virava os olhos para ela para ver se acenava com a cabeça. “Olhe que as mulheres devem ser tratadas como flores”, nunca esqueça...estou a ser claro?! Os homens tratam das grandes decisões do mundo e as mulheres dos pormenores. Mas não pense que o seu trabalho é menos importante, muito pelo contrário. Sem elas, nós, os homens, não conseguiríamos viver. Sem o seu amor; sem a sua entrega aos filhos; sem o cuidar de nós. Elas é que mandam, mas como são mais inteligentes do que os homens, fazem de conta que todas as decisões nos cabem a nós. Mas, verdadeiramente, são elas que decidem tudo. Não esqueça…estou a ser claro?! Vá lá…dêem um beijinho um ao outro. Vá lá..." –e nós, envolvidos pela sua ternura, dávamos um beijo de enleio. Algumas vezes em que até estávamos chateados lá colocávamos de parte o aborrecimento.
Hoje, segundo o Diário de Coimbra, o meu amigo Adriano Lucas morreu. Desapareceu um bom homem, um amor de pessoa. Até um dia senhor Lucas. Até sempre. Gostei muito, mas muito, de o conhecer. Foi um prazer…meu amigo. "Estou a ser claro?!...Estou a ser claro?!".


Pode ler aqui a notícia no Diário de Coimbra. Aproveito para apresentar as minhas sentidas condolências à família e a todos os funcionários do jornal.

(AMANHÃ, ÀS 16H00, NA IGREJA DOS OLIVAIS, SERÁ CELEBRADA MISSA DE CORPO PRESENTE. SEGUIDAMENTE O FÉRETRO SERÁ ENCAMINHADO PARA O CEMITÉRIO DE SANTO ANTÓNIO DOS OLIVAIS)



 

1 comentário:

MCL disse...

Sou neta do Eng. Adriano Lucas e fico ainda mais orguhosa do meu avô, quando leio este testemunho, esta despedida. Muito obrigada.