quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

EDITORIAL: ESTA BAIXA QUE TODOS AMAM, MAS CADA UM À SUA MANEIRA

(Leonardo Braga Pinheiro)




1 - Ontem, na Página da Câmara Municipal de Coimbra (Não Oficial), no Facebook, um membro do grupo postou uma foto de um antigo estabelecimento, felizmente ainda em actividade na Baixa e com cerca de um século, com a seguinte legenda: “Contra tudo e contra todos lá vai sobrevivendo.
Em seguida um membro fez o seguinte comentário: “Amigo nem sei como.... Com um empregado que não tem nenhum bom modo de atender clientes... Já me aconteceu a mim, nunca mais entrei naquela casa. Menos um cliente.
Outro agregado escreveu: “eu costumo dizer o meu dinheiro só dou ganhar a quem me atende bem. Um bom ano.
Outro participante escreveu ainda: “permita-me que eu também me pronuncie acerca destes comentários. Não são agradáveis, é verdade, mas infelizmente não é caso único este tipo de comportamento para com os clientes. Também é verdade que não agradamos a todos, mas quem está atrás de um balcão seja patrão ou funcionário deverá primar pela simpatia, pois é uma mais valia para angariar clientes. De certeza que a loja não fechará porque teve um comentário negativo, agora não podemos é esconder o que está mal pois só assim é que se evolui. Também não conheço o proprietário, mas estive muitos anos atrás de um balcão. Também é verdade é que esta loja ficou parada no tempo, o que é bem visível. E parece-me que compete ao proprietário zelar pelo que é seu. Se ele não o fizer não há animação da Baixa, revoltas, críticas, positiva ou negativa, que lhe valham. Estamos no séc. XXI, a agricultura teve uma grande evolução e agora até está na moda. Porque não actualizar-se? Será que não atrairia mais clientela?
2 – No Diário as Beiras de hoje, um advogado colaborador do jornal, com o título da crónica “O futuro da Baixa. Uma questão de mentalidade”, num longo texto de meia-página, perora sobre o estado anémico da Baixa de Coimbra. Segundo a sua explicação, porque trabalha o dia inteiro, decidiu vir depois das 19h00 fazer compras para o Natal e para o Ano Novo. “Mas às 19h05 já estava praticamente tudo fechado”, constatou.
Acerca de o comércio encerrar às 19h00, o digníssimo articulista procurou investigar a razão. Citando entre aspas o que ouviu de pessoas ligadas ao comércio, plasmou: “o comerciante também tem direito a descansar” e “depois das 19h00 também já ninguém vem à Baixa de Coimbra”. Pelo meio ainda ouvi o já tradicional queixume de que as “pessoas preferem ir aos centros comerciais porque têm estacionamento” e “se a câmara instalasse nos edifícios sua propriedade alguns serviços públicos as pessoas viriam à Baixa e assim comprariam no comércio tradicional”.
Acerca desta parte, termina assim: “Como já eram 19h25, fui ao Centro Comercial fazer as minhas compras.
Continuando a reproduzir, “Em outro dia daquela última semana de 2017, nova tentativa e decidimos “ajudar o comércio tradicional indo jantar a um típico restaurante da baixa de Coimbra”. Procurámos um daqueles espaços característicos da restauração portuguesa que todas as cidades têm e que Coimbra, pela sua história, terá certamente também! Escolhemos um restaurante. Começou o calvário: rapidamente fomos confundidos com forasteiros, fomos mal servidos, convivemos de muito perto com uma higiene péssima, uma apresentação de meter dó e, o pior de todos os males: convivemos com as sucessivas tentativas de enganar os clientes (algo que não aconteceu só com a minha mesa, mas que estava a acontecer um pouco por todas as mesas). Após as reclamações, a culpa parecia ser sempre do cliente, pois nós é que não sabemos apreciar o excelente serviço com que nos presenteiam... Sei que há excepções e por isso não quero generalizar, no entanto, após estas duas experiências, vou pensar duas vezes antes de ir à Baixa gastar o meu dinheiro! Esta foi só a minha primeira conclusão. A minha segunda conclusão foi que “assim, a Baixa está mesmo condenada”.
Passando por dar resposta às suas próprias interrogações, para terminar, culpa os comerciantes com a seguinte expressão: “Há que dizê-lo: a principal dificuldade da Baixa de Coimbra é a mentalidade com o que os comerciantes encaram o comércio.
3 - Comecemos pela similitude entre as manifestações dos comentadores do Facebook e do causídico articulista:

a) -Todos amam cegamente a Baixa. Esta cegueira fá-los agir em contra-mão, no interesse contrário do centro histórico;
b) -Em nome desse incondicional amor, como anjos anunciadores da boa-nova, crêem ter a solução para um problema que só é irresolúvel porque os comerciantes não estão dispostos a mudar;
c) -Em nome desse incondicional amor que apregoam, sem terem conhecimento de todas as premissas, julgam-se no direito de julgar uma classe apenas com assento em um ou dois casos em que foram intervenientes -no caso do legisperito é mais grave. O doutor, pela profissão que exerce, pelo equilíbrio entre partes, pela justiça que deve defender, sabe que está a ser profundamente injusto. Embora diga que não, num apriorismo bacoco, parte de citações particulares para o geral, o que não se admite vindo de um jurisconsulto. Basta ler os seus desabafos para se verificar que confunde facilmente o rebanho com o pastor;
d) -Em nome desse incondicional amor que apregoam, sem se aperceberem, pelas suas injustas frases escritas, estão a contribuir para o mais rápido afundamento da zona comercial e também da indústria hoteleira -no caso dos comentadores do Facebook, parecem ignorar que ao particularizar o queixume numa empresa e difundindo-o através das redes sociais com o possível intuito de a prejudicar -mesmo que a razão lhe assista-, correm o risco de serem demandados por difamação;
e) -Quer uns quer outros, no caso o advogado e os comentadores de ocasião, sabem que há instrumentos apropriados para fazerem desaguar o seu desagrado. Entre outros e mais à mão: o Livro de Reclamações. Pediram-no no local próprio? Aposto que não! Como Maria Madalena no santo sepulcro, é mais fácil vir carpir mágoas para as redes sociais ou para os jornais diários. Dá mais status, mais pica!
4 – Diz-nos a experiência, como boa conselheira, que quando apreciamos uma situação sem percorrermos todos os passos necessários para aferir da verdade corremos o sério risco de cairmos no ridículo. Se eu afirmar que, para tratar de um assunto jurisdicional, fui a dois advogados e, cobrando-me principescamente, ambos não me souberam esclarecer, ou seja, fui mal servido, posso afirmar que aqueles profissionais não dignificam a classe? Que a principal dificuldade da advocacia é a mentalidade com o que os advogados encaram a sua profissão? Posso, mas devo tratar disso em local próprio: isto é, a Ordem dos Advogados.

5 – Para terminar, a meu ver, a recuperação da Baixa dispensa completamente este tipo de comentários. Sendo sério, uns e outros têm alguma razão? Têm sim, mas apenas alguma. Não toda, como querem fazer parecer a quem não está dentro das dificuldades da zona comercial. Ou seja, armados em salvíficos, tomando a parte como o todo, querem apenas defender a sua tese destrutiva. Só quem está no convento é que sabe o que lá vai dentro.
Qualquer solução para um problema que se arrasta no tempo é sempre resultado de vários factores: estruturais, conjunturais e ocasionais. Tomarmos apenas uma asserção e dela fazermos a demonização é cair numa análise curta e deficiente. Para melhor exemplificar, é o mesmo que afirmarmos que os incêndios de Junho e Outubro, que ocorreram em Portugal, foram apenas uma consequência do elevado calor atmosférico.

1 comentário:

Anónimo disse...

Não me parece que alguém ame cegamente a Baixa, como diz, nem vi em lado nenhum essas manifestações de amor acrisolado. Isso é um bocado exagerado. Os clientes gostariam é que a que a baixa fosse diferente. O cliente faz escolhas e compete ao comerciante “seduzi-lo”. Não me parece que isso lá vá com tanto azedume. A verdade é que os clientes se sentem desconfortáveis na baixa e se sentem mais confortáveis noutros lados. Quanto às ameaças de difamação por queixas de atendimento de uma empresa em particular, não sei a que propósito vem isso. Em qualquer lugar do mundo, aliás, em qualquer lugar do mundo civilizado, são normais e correntes as reclamações nas redes sociais, de comércio, hotelaria, etc. Imagine que existem mesmo sites dedicados a isso e que isso é visto como um direito de cidadania. É um sinal de maturidade que os comerciantes se habituem a isso.
Ainda não entendi, e digo isto sinceramente, sem nenhuma reserva, o que pretendem os comerciantes da baixa. Se as estruturas associativas que existem actualmente não lhes servem para dizer ou fazerem o que querem, arranjem outras, com alguém mais habilitado à frente. Não são os clientes que o têm que fazer por eles.