Para além do texto "ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS", deixo também as crónicas "O TICO E O TECO DO SONHO"; e "VALHA-NOS SANTA MARIA!".
ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS
O VERDADEIRO BORDA D’ÁGUA
Há anos e anos –se calhar, décadas, séculos,
sei lá!- que passo por ele ali na Rua da Sofia, quase sempre no mesmo sítio,
ora a plastificar documentos ora a vender o Borda
D’Água. Tem 60 anos e dá pelo nome de Rui Jorge Pereira Almeida. Desde que
saiu da tropa que está ali, junto à Pastelaria Palmeira, na Rua dos Colégios, a
plastificar cartões e há cerca de 25 anos que vende o Borda D’Água. Tem noção de que a sua profissão está ameaçada. No
tocante aos plastificados, qualquer dia já ninguém passa cartão a ninguém. No referente à popular cartilha do agricultor, se, por um lado, agora é tudo científico e
em grande escala, por outro, os romenos a venderem gato por lebre, como quem diz, fotocópias, rebentam-lhe com o
negócio. “Antigamente vendia 10
exemplares do Borda D’Água por dia, agora menos de cinco. E é quando é! Quando
recebo a encomenda da Editorial Minerva –a empresa que edita o pequeno jornal
de agricultura- lá vem o apelo para denunciarmos às autoridades qualquer facto anómalo
que detetemos. Ai eu é que vou substituir a polícia? Eles não veem? Se acaso o
fizesse quem garantia a minha integridade no caso de haver represálias? Nunca
vi a PSP ou outro qualquer ramo de polícia civil preocupar-se com isto.
Sinto-me muito prejudicado. É com estas vendas que vivo. Ou melhor, sobrevivo,
porque os pobres não vivem; convivem arrastando-se por aí. Estou reformado por
invalidez e recebo à volta de 250 €. É certo que estou numa casa camarária e
pago apenas 5 euros mas, mesmo assim, só posso comer uma refeição de jeito
diariamente. Vou almoçar à Liga dos Combatentes e pago 4 €. Ao jantar
contento-me com uma sandes porque não dá para mais. O dinheiro não estica.
Não ligo à política. Tanto me faz! Não voto há mais de 30 anos. Estou
profundamente desiludido com esta gente que promete tudo e depois desgraça os
sem esperança. À minha custa não vão para lá. Não fazem nada por mim! Também é
verdade que, pelos menos até agora, nunca me chatearam mas sei lá o dia de amanhã?!?”
O TICO E O TECO DO SONHO
Neste
último Sábado o ambiente na Rua Eduardo Coelho foi de festa. A “nossa” Fátima Santos realizou o seu
sonho. A ex-empregada de décadas da desaparecida Sapataria Paiva -esta empresa que
até Agosto teve duas lojas abertas nesta artéria mantém agora uma encerrada e
outra deu lugar à Hush Puppies, uma
marca internacional franchisada de calçado com 14 estabelecimentos no País e
com cerca de 80 por cento de produção nacional-, a Fátima, coadjuvada pela
presença física do popular boneco de desenhos animados de Walt Disney, inaugurou o Tico
e Teco, um moderno pronto-a-vestir para crianças desde o berço, em enxoval
para recém-nascidos newborn, até aos
10 anos. Nas roupas, numa vasta variedade de modelos que são um amor, podemos
encontrar as marcas patenteadas Mayoral
e Disney. No calçado a Pablosky e a Mayoral conquistaram o bom gosto deste lindíssimo ponto de venda e
que tanto vem engrandecer a antiga rua dos sapateiros.
Depois de atravessar o deserto –em metáfora, a dura prova que
divide a abstração do sonho e a realidade do facto consumado-, a Fátima ostenta
no rosto um sorriso de felicidade. “Estou
muito contente, senhor Luís! Estou a trabalhar nesta rua há mais de vinte anos
e nunca tinha sentido tanto carinho! É um esforço enorme; um passo de gigante o
que estou a dar. Bem-haja a todos quantos contribuíram para a minha realização
pessoal. E para, através do meu trabalho e recusando a inatividade, poder
concorrer para a revitalização social da Baixa. Venham visitar o meu novo
estabelecimento. Tenho a certeza, não ficarão defraudados!”
VALHA-NOS SANTA MARIA!
O Beco de Santa Maria, junto à
Cozinha Económica, está há vários meses sem iluminação pública. Por mais
telefonemas e pedidos de sensibilização que desenvolva, Isaura Mendes, moradora
naquela ruela, frustrada pela situação, não se contém: “não sei que mal fez este beco para merecer ser tratado desta maneira. Ninguém
quer saber de quem aqui mora. Fui operada a um braço, e devido à minha idade,
até tenho medo de sair à noite. Isto virou um urinol público. Quando saio de
manhã até dá vómitos, senhor! Acredite! Há cerca de quatro meses fui assaltada
em pleno dia, seriam cerca de 11h30. Levaram-me um saco, com 120 euros, e um
telemóvel. Será que consideram este beco terra de ninguém e quem cá mora coisas
sem valor?”
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