terça-feira, 12 de novembro de 2013

BAIXA: EM BUSCA DA DIVERSIDADE PERDIDA



 Nos últimos dias abriram duas frutarias na Rua das Padeiras. Perante este facto perfeitamente normal, numa zona comercial que teima em não se deixar abater, poderemos interrogar: mas o que terá isto de especial? Em face destes dados disponibilizados, diremos, absolutamente nada. Mas se informar que a vinte metros há três estabelecimentos de venda de fruta instalados há décadas talvez já venha baralhar os dados. Se escrever que no ano passado mudou de ramo um ponto de venda destes produtos na Rua do Paço do Conde talvez venha complicar ainda mais a questão. Ou se calhar não! Provavelmente o leitor estará a pensar onde quero chegar com este arrazoado. Para piorar mais as coisas, vou ainda dizer que nestas últimas semanas abriram duas lojas de artesanato numa zona já sobre-lotada com oferta; um estabelecimento de roupas para criança; uma sapataria no lugar de outra que não se estava a tornar rentável; e, nos últimos meses, abriram dois cafés –em Junho tinha encerrado um. E também duas lojas de chineses –uma delas por motivo de mudança.  Claro que no oceano da mimética há sempre quem sopre ventos de leste: deu à luz um novo estabelecimento de cigarros electrónicos na Rua Visconde da Luz.
Talvez já se consiga antever onde quero chegar. O que pretendo mostrar é que a oferta nesta zona histórica continua anárquica e sem qualquer planeamento das entidades competentes. Quem se lembra da outrora Baixa comercial desaparecida saberá que a sua atractividade residia essencialmente na extensa oferta. Aqui havia de tudo. Desde uma pilha até ao objecto mais difícil de encontrar no mercado nacional –já para não recordar a pequena oficina de pequenos arranjos de recuperação de objectos. Tudo isso se esfumou na bruma da modernidade. Para quem não conhecer, agora, tentar adquirir uma simples pilha pode ser um problema de difícil solução. Salvo excepções, hoje a oferta nesta zona é uma repetição cansativa, de mais do mesmo, que não procura servir o público consumidor mas antes o desejo de quem não quer arriscar muito e aposta no facilitismo. A consequência desta falta de planeamento é a destruição de todos: os que já estão instalados, os que vêm de novo e, para piorar, a degradação comercial acentua-se cada vez mais.
Sabemos todos que é legítimo a procura de uma vida melhor e não se contesta. Aliás é de valorizar as pessoas negarem o ócio a favor de um negócio. Indo até mais longe, é um direito constitucional consagrado, na liberdade de cada um poder eleger o seu caminho profissional –e aqui incluo os estudantes universitários. Sou absolutamente contra cláusulas-barreiras que dificultem a vontade individual de cada um escolher o seu futuro. O que defendo é que na hora de entrar num qualquer curso profissional ou universitário, investimento comercial, industrial, ou de serviços, o Estado, buscando a diversidade social na razão de defender os interesses de todos, tem uma obrigação redobrada de informar os candidatos das consequências de escolherem uma área cuja oferta exceda a procura.
Voltando à Baixa, nesta chamada de atenção procurando evitar o mal maior, a autarquia deveria chamar a si este alerta. Na hora em que os serviços de atendimento tomem conhecimento de que alguém pretende abrir uma loja numa qualquer rua, ou através do pedido prévio de licenciamento, deveria imediatamente ser contactado o investidor e, de uma forma franca, mostrando-lhe outras opções, dizer-lhe que se pretende abrir uma frutaria numa zona onde já existem três com largas décadas de experiência pode ser um mau passo para todos. Este acautelamento será sempre e apenas um esclarecimento e no sentido da prevenção. Se o proponente persistir na ideia, paciência! Salvo melhor opinião, legalmente não se poderá fazer mais do que um aconselhamento formal. Mas terá mesmo de se fazer. Agora que começou uma nova era autárquica, com novo executivo, não será altura de se perguntar: o que se quer fazer da Baixa?

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