sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O QUE É QUE SE PASSA COM A BRASILEIRA?



 A Brasileira foi um dos mais importantes cafés de tertúlia de uma ambiência de uma outra Baixa desaparecida. Foi um tempo que não voltará mais. Falo concretamente dos últimos 60 anos. Décadas de memória de um centro histórico vivo, belicoso, cheio de vida, de ruídos, cheiros e movimento. Mas mesmo muito movimento de pessoas a circular.
Neste café de longa história e tradição passaram vultos de grande saber, alguns deles ainda de boa saúde. Leia aqui e tome um pouco da atmosfera dessa época.
Há cerca de quinze anos, quando a Baixa começou a sentir os primeiros ataques em forma de êxodo de consumidores e moradores, vários grandes cafés capitularam. Companheiros diários de um ambiente citadino mas rotineiro, quase bairrista, como o Internacional, o Arcádia, mais recentemente a Central, e então a Brasileira. Com menos clientes e com despesas fixas, sobretudo pessoal, sem que nada fosse feito para o evitar, inexoravelmente encerraram.
Porque o comércio de trapos ainda estava a dar, todos estes estabelecimentos hoteleiros foram transformados em pronto-a-vestir. A Brasileira não fugiu à regra. Até há cerca de um ano foi uma casa de modas.
Foi então que se soube, em Dezembro, aqui, que o Lúcio Borges, um reconhecido pasteleiro de excelência e mérito reconhecido por esse Portugal inteiro, tinha adquirido o trespasse do velho estabelecimento para o transformar em café, padaria e pastelaria. Segundo o seu depoimento na altura, iria ser mantida a mesma traça com sabor a revivalismo.
O tempo foi passando, as obras acabaram concluídas há mais de três meses, e foi colado na montra de vidro um anúncio a oferecer emprego. E a Brasileira foi continuando encerrada. Por essa altura, tentei ouvir o Lúcio, mas ele, num estado que tocava o desalento, só dizia: “se isto continua por mais tempo, não vai haver café para ninguém. Estou saturado! Isto não pode ser! Estou farto de gastar dinheiro! Tenho a minha alma consumida!”.
Entretanto, na mesma ocasião, por fontes fidedignas, soube que por causa de uma birra entre o seu arquitecto responsável pela obra e um técnico da câmara, o projecto nem atava nem desatava. Sei também que o Armindo Gaspar, presidente da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, tomando noção da importância deste propósito para a revitalização da Baixa, na tentativa de ajudar a desbloquear o imbróglio, pediu uma reunião conjunta com o vice-presidente da Câmara Municipal, Barbosa de Melo, e a máquina começou outra vez a andar. Mas os meses foram passando, acabou a Primavera, foi-se o Verão e veio o Outono, e a Brasileira continua à espera da boa-vontade dos homens.
Embora não chegasse à sua fala, o que sei, agora, certamente num estado apopléctico, o Lúcio continua com o estabelecimento encerrado e a consumir-se todos os dias.
Alguma coisa vai mal no reino do licenciamento, sobretudo, quando até se criou o Simplex. Quando toda a gente fala em recuperar a Baixa e, depois, quando surgem investidores, pessoas de trabalho e muito esforço como o Borges, cuja vontade assenta no suor e não no capital, são-lhes criadas barreiras que parecem querer conduzi-los à loucura.
Quem responde pelas noites mal dormidas do Lúcio Borges?
O que é que se passa?
Alguém pode responder?

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