quarta-feira, 10 de novembro de 2010

FALA-SE TANTO NELE QUE...





 O léxico de uma nação, no fundo a cultura de um povo, vai sendo alterado de acordo com o que se passa dentro dela, política e socialmente. Por exemplo, no Estado Novo, no tocante à esperança, havia expressões que ficaram para sempre: “se Deus Quiser!”; “louvado seja o Deus!”; “que Deus me ajude!”.
No tocante à repressão, fruto de um certo autoritarismo, quando pretendíamos ameaçar alguém, até um bebé para o obrigar a dormir: “se não dormes chamo a polícia!”.
Hoje tudo mudou. Passámos a dividir a responsabilidade em duas entidades, uma que nos transcende e outra terrena. Quando pretendemos colocar a esperança como pedra de toque, soletramos: “Se Deus quiser, o FMI há-de ajudar a endireitar isto!”; Se precisarmos de ajuda, se Deus quiser, o FMI virá em nosso socorro!”.
Já na ameaça velada, curiosamente, talvez porque a polícia se tornou menos agressiva e perdeu toda autoridade que detinha por inerência da farda, hoje, se nos aborrecerem na rua, dizemos: “se continuas a chatear-me chamo o FMI!”; “se não tens outro comportamento chamo o FMI!”. Na escola, se o puto continua a tirar medíocres, ameaçamos: “se não ultrapassares os sete por cento chamo o FMI!”. Quando queremos que o bebé durma, ameaçamos: “ou dormes ou chamo o FMI!”.
Mas, afinal, quem é esta divindade omnipotente e omnipresente que passou a comer connosco à mesa e a ser conversa diária obrigatória?
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