terça-feira, 23 de dezembro de 2008

O CULTO DA IMAGEM?



Eu, provavelmente contra a sua opinião, acho que a cidade de Coimbra é esquisita. Ou melhor dizendo, dentro do todo nacional é o melhor paradigma do pacovismo lusitano. Quem percorre as ruas da cidade, como fotógrafo ocasional, olha um rosto ali, outra expressão acolá, vai-se apercebendo de alguns cromos sociais que existem cá no burgo. Claro que também me incluo no lote.
Lá vou eu falar outra vez do filósofo José Gil e do seu livro de 2005 “O país da não-inscrição”. Desculpem lá!, mas, para além de eu não conhecer muitos filósofos, este, quanto a mim, com três pinceladas, é o que melhor retrata, duma forma caricatural, as nossas gentes.
E porque fiz eu esta introdução, interroga você? Olhe, há cerca de dois meses, quatro dezenas de comerciantes foram à reunião do executivo lamentar o estado de abandono em que estavam votados e cujas consequências têm sido imensos assaltos durante a noite aos seus estabelecimentos. Logo a seguir vieram as duas instituições representativas dos comerciantes, a ACIC e a APBC, no Diário de Coimbra, desmentir: “que não senhor, não era verdade dizer-se que a Baixa estava a sofrer uma vaga de assaltos, o que se passava aqui era igual ao resto do país”. Digam lá se não é estranha esta tomada de posição? No mínimo, levando em conta o bom senso, o que se esperava destas entidades é que se colocassem ao lado dos comerciantes lesados. Era, ou não era? Vamos lá nós entender isto!
Mas há mais: no mesmo jornal um comerciante, proprietário de duas ourivesarias na zona histórica, contrariando os factos provados, afirmava, preto no branco: “não senhor, não havia insegurança nenhuma. Podiam contar-se pelos dedos as casas assaltadas na Baixa”. Como se fosse pouco, ainda dizia mais: “a Baixa é tão segura que eu chego a transportar, durante o dia, ouro dentro de pastas entre os meus estabelecimentos”. Lindo! Este desapego, arriscando, com as suas declarações, ser assaltado um dia destes, é simplesmente sublime.
Na segunda-feira, dia 22, o Diário de Coimbra, em primeira página, noticiava com foto em grande plano, que um comerciante tinha sido bafejado com a sorte. No caso em análise, tinha ganho 300.000 euros na lotaria do Natal. Por coincidência também dono de uma ourivesaria na Baixa. Bonito! Com este gesto altruísta, este homem merecia ganhar mais uma medalha.
Digam-me lá, se fosse convosco, se tivessem ganho um prémio chorudo, expunham-se assim? Pois não! Aí é que se vê a fibra deste comerciante.
Outro caso ainda e, por coincidência, também dono de ourivesarias: quem entra em Coimbra de norte para sul, na Casa do Sal, próximo da Estação de Coimbra B, é surpreendido com o cartaz que reproduzo. E o que tem o cartaz de especial, interroga você? Não sei, há qualquer coisa no cartaz que não bate certo. Olhando o “outdoor” publicitário verificamos que, para além de fazer publicidade a várias marcas de relógios, naturalmente foca também a ourivesaria que os vende. Até aqui, quanto a mim, tudo normal. A fotografia em grande plano do proprietário é que não entendo. Você entende? Se calhar, com o meu habitual mau-feitio, lá estou eu no corte. “É inveja”, pensa você. Se calhar até tem razão. Às tantas é isso mesmo!
Mas uma coisa é certa, há aqui qualquer coisa que não bate certo. Será que os seus egos serão tão grandes que não cabem numa cidade “não-inscrita” como Coimbra? Farto-me de matutar e não chego a nenhuma conclusão.
Uma coisa garanto, e serve de ressalva de interesses: eu não tenho nada contra os vendedores de ourivesaria da cidade. Palavra de honra. Juro pela minha avozinha.

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